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A tradução brasileira de Wide Sargasso Sea, de Jean Rhys

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Abstract

Este artigo tem o objetivo de analisar a tradução brasileira do romance Wide Sargasso Sea (1966), da escritora Jean Rhys, com ênfase na mediação cultural realizada pela tradutora Léa Viveiros de Castro, a partir de questões de gênero e étnico-raciais. Para tanto, a análise embasa-se nas perspectivas de tradução feminista e pós-colonial para cotejo do corpus – composto pelo romance Wide Sargasso Sea e a tradução brasileira Vasto Mar de Sargaços (Rocco, 2012). Os resultados apontam para necessidade urgente de traduções engajadas em transmitir o viés político das obras traduzidas, uma vez que o cotejo apresentado neste trabalho evidencia escolhas de tradução que podem vir a interferir no sentido proposto pelo texto fonte e, em certos casos, operar até mesmo de modo contrário ao que este pretende, atenuando seu potencial feminista pós-colonial.
ISSN: 2317-2347 v. 7, n. 2 (2018)
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A tradução brasileira de Wide Sargasso Sea, de Jean Rhys: uma crítica
feminista pós-colonial / The Brazilian translation of Wide Sargasso Sea,
by Jean Rhys: a postcolonial feminist critiscism
Naylane Araújo Matos *
RESUMO
Este artigo tem o objetivo de analisar a tradução brasileira do romance Wide Sargasso Sea (1966), da
escritora Jean Rhys, com ênfase na mediação cultural realizada pela tradutora Léa Viveiros de Castro, a
partir de questões de gênero e étnico-raciais. Para tanto, a análise embasa-se nas perspectivas de tradução
feminista e pós-colonial para cotejo do corpus composto pelo romance Wide Sargasso Sea e a tradução
brasileira Vasto Mar de Sargaços (Rocco, 2012). Os resultados apontam para necessidade urgente de
traduções engajadas em transmitir o viés político das obras traduzidas, uma vez que o cotejo apresentado
neste trabalho evidencia escolhas de tradução que podem vir a interferir no sentido proposto pelo texto
fonte e, em certos casos, operar até mesmo de modo contrário ao que este pretende, atenuando seu
potencial feminista pós-colonial.
PALAVRAS-CHAVE: Wide Sargassso Sea; Tradução; Mediação cultural; Feminismo; Pós-colonialismo.
ABSTRACT
This essay aims to analyze the Brazilian translation of the novel Wide Sargasso Sea (1966), by Jean Rhys,
focusing on cultural mediation developed by the translator Léa Viveiros de Castro, drawing from gender
and ethnic-racial issues. Thus, the analysis is based on feminist and postcolonial perspectives of
translation to make a comparison between the texts of the corpus composed by the novel Wide Sargasso
Sea and its Brazilian translation Vasto Mar de Sargaços (Rocco, 2012). The results point out to an urgent
need for translations that are committed to transmit the political bias of the translated works, since the
comparison presented in this research reveals translation choices that may interfere in the sense
proposed by the source text and, in certain cases, operate even in opposition to what it intends,
attenuating its postcolonial feminist potential.
KEYWORDS: Wide Sargasso Sea; Translation; Cultural mediation; Feminism; Postcolonialism.
1 Introdução
O romance Wide Sargasso Sea, da escritora dominicana Jean Rhys (pseudônimo
literário de Ella Gwendolen Rees Williams), publicado na Inglaterra, em 1966, tornou-
se amplamente conhecido pela relação hipertextual (GENETTE, 1997)
1
que estabelece
com o romance Jane Eyre (1847), da escritora inglesa Charlotte Brontë. Em Wide
Sargasso Sea, a personagem secundária Bertha Antoinetta representada como a
* Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução, da Universidade Federal de Santa
Catarina UFSC, naylaneam@gmail.com.
1
Com base na concepção de hipertextualidade apresentada por Genette (1997), um hipertexto é um texto
B derivado de um texto A (hipotexto). Nesse sentido, a obra de Charlotte Brontë foi limiar para o
romance de Jean Rhys e Wide Sargasso Sea é um hipertexto derivado do hipotexto Jane Eyre.
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jamaicana louca do sótão , de Jane Eyre, ganha protagonismo e rompe com o
silenciamento que lhe é imposto no romance colonial
2
.
A obra de Jean Rhys possibilita conhecer Bertha a partir de uma perspectiva das
Índias Ocidentais, com aspectos de sua vida anterior não narrados em Jane Eyre (JE),
sua trajetória e vivências até a chegada na Inglaterra. Assim, Wide Sargasso Sea (WSS)
é reconhecido pela crítica como prequel
3
, ou pré-sequência em português, pós-colonial
e feminista de JE (MUSTE, 2017). Esta estratégia de reescrita nos possibilita conhecer
outra versão da história de uma personagem que ficou presa entre a cultura branca e a
cultura negra; a possibilidade de compreensão de uma alma aprisionada pela falta de
liberdade de que dispõem as mulheres para decidirem seu próprio destino; a
representação de uma vida apagada pelo imperialismo inglês e pela dominação
masculina.
No Brasil, a tradução de Wide Sargasso Sea foi publicada em 2012, pela editora
Rocco, e traduzida por Léa Viveiros de Castro sob o título literal de Vasto Mar de
Sargaços. Para Lefevere (1992), a tradução e suas imagens acerca da obra, do/a
autor/a, dos personagens têm grande poder na cultura de chegada e são construídas
por meio de fortes influências ideológicas. As influências, muitas vezes, são impostas
ao tradutor/a por questões de patronato ou estão baseadas em sua visão de mundo.
Considerando o viés político feminista e pós-colonial da obra de Rhys, este trabalho tem
o objetivo de analisar as imagens construídas pela tradutora brasileira especialmente
aquelas relacionadas à representação da protagonista Antoinette e de que forma elas
potencializam ou atenuam o caráter político da obra.
Desse modo, pretende-se refletir sobre os processos socioculturais imbricados na
construção dessas imagens, uma vez que o/a leitor/a brasileiro/a que não em língua
inglesa terá acesso à história subversiva por meio das imagens da tradução. É
importante salientar que uma série de fatores pode interferir no modo como a
personagem Antoinette é representada em contexto brasileiro, desde questões
2
O termo romance colonial está conforme seu uso pelos pesquisadores pós-coloniais para se referir a
romances que, direta ou indiretamente, têm sido revisitados pela ficção inglesa pós-colonial, quer seja por
negação, imitação, negociação ou apropriação, como coloca Watson (2015).
3
O Cambridge Dictionary define prequel como um filme, livro ou peça que desenvolve a história de uma
obra anterior, narrando o que aconteceu antes dos episódios da obra preliminar. Como exemplo, o
dicionário utiliza a própria referência de WSS: Jean Rhys's novel" Wide Sargasso Sea" is a
prequel to Charlotte Bronte's "Jane Eyre".” Disponível em:
https://dictionary.cambridge.org/pt/dicionario/ingles/prequel.
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linguísticas pela ausência de uma equivalência absoluta entre as línguas até questões
ideológicas que moldam o texto de chegada (RICOEUR, 2011).
Embora muitos estudos tenham emergido na área da tradução, Sherry Simon
(2005) evidencia que a história não tem sido muito consciente em relação aos
tradutores/as e que a menção a eles/as raramente reforça suas tarefas enquanto
mediadores/as culturais. Esse “não-lugar” em que se encontra o/a tradutor/a é inclusive
refletido no espaço físico quando seus nomes não aparecem nas capas das obras
traduzidas, como acontece com a tradução brasileira de Wide Sargasso Sea. Por isso,
busco destacar a mediação que Léa Viveiros de Castro realiza ao construir a imagem da
personagem Antoinette, levando em conta as diferenças socioculturais entre a língua
fonte e a língua alvo.
Para tanto, embaso-me nas perspectivas de tradução feminista e pós-colonial
para cotejo do corpus composto pelo romance Wide Sargasso Sea (1966) e a tradução
brasileira Vasto Mar de Sargaços (2012) , enfatizando o modo como Léa Viveiros de
Castro realiza a mediação cultural e representa a personagem Antoinette, a partir de
questões de gênero e étnico-raciais.
No viés pós-colonial, Rajagopalan (1998) aponta a tradução como reescrita,
como reinvenção do original, como uma luta para representar o próprio passado. Assim,
a tradução pode exercer papel de denúncia, na qual o/a colonizado/a, outrora
dominado/a pelo assujeitamento discursivo instrumentalizado pelas traduções da
cultura, pode subverter os efeitos do colonialismo por meio da oferta de
traduções/discursos alternativas/os, a fim de contestar uma representação hegemônica.
Como coloca o autor,
Nas palavras de Niranjana: "O desejo pós-colonial de re-traduzir está
relacionado ao desejo de reescrever a história. O ato de reescrever se
baseia num ato de ler, pois a tradução dentro de um contexto pós-
colonial envolve aquilo que Benjamin chamaria 'citação' e não
'esquecimento absoluto'. Aqui não há uma simples ruptura com o
passado, mas uma reescritura radical do mesmo."
A resistência do colonizado ao colonizador tem êxito na medida em
que o primeiro põe em cheque a representação hegemônica sobre si e
seu passado e consegue, na medida do possível e de forma cada vez
mais eficaz, intervir no processo até então assimétrico e
completamente desfavorável a ele, inscrevendo naquele processo uma
heterogeneidade até então completamente desconhecida e por fim
subvertendo-o. (RAJAGOPALAN, 1998, s/p.)
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A perspectiva pós-colonial possibilita, portanto, uma releitura/tradução de
discursos universalizantes, apoiados em binarismos essenciais para estabelecer relações
hierárquicas, especialmente os demarcados pelo imperialismo: homem/mulher;
colonizador/colonizado; humano/animal; branco/negro. Igualmente, como conclui
Funck (2016, p. 373), a tarefa da teoria feminista é a de expor a artificialidade das
oposições binárias como feminino/masculino, nós/outros, de forma a subverter o que se
acredita estar na natureza das coisas”.
Dada a semelhança entre o pós-colonialismo e o feminismo enquanto projetos
políticos, ao se encontrarem, ambos buscam operar como uma estratégia de leitura,
buscando subverter as exclusões de um cânone não pela substituição de um grupo de
textos por outros, mas pelo conjunto de práticas de leitura alternativas (FUNCK, 2016).
Assim, o feminismo no pós-colonialismo exige uma leitura crítica de textos coloniais
(como Jane Eyre) e pós-coloniais (como Wide Sargasso Sea) pautada no gênero. Essa
crítica deve se deter sobre as diversas formas de ler o gênero “no mundo, na palavra e
no texto” (BAHRI, 2013, p. 660).
Partindo dessa perspectiva, há uma fortuna crítica menciono algumas autoras
como Friedman (2017 [1998]), Funck (2016 [2011]), Spivak (1985) que evidencia a
releitura feminista pós-colonial que Jean Rhys faz de Jane Eyre em Wide Sargasso Sea.
No campo dos Estudos Feministas de Tradução, por sua vez, pesquisadoras chamam
atenção para a importância de traduções engajadas em transmitir o viés político das
obras traduzidas, como veremos na análise apresentada neste trabalho.
2 Questões de gênero
Os Estudos Feministas de Tradução têm se debruçado tanto sobre as teorias de
tradução, e como elas refletem a divisão social de gênero, quanto sobre as
possibilidades de práticas de tradução que busquem subverter hierarquias da sociedade
patriarcal. Nesse sentido, pesquisadoras como Luise von Flotow (1991), Sherry Simon
(2012), Olga Castro (2017) apenas para citar algumas , em diferentes contextos, têm
apresentado formas de visibilizar o trabalho de mulheres no campo da tradução e
proposto alternativas para defrontar o caráter sexista da linguagem. A tradução engajada
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de obras escritas por mulheres é vista como uma importante ferramenta para a
construção de novas práticas na cultura escrita.
Assim, uma obra feminista como Wide Sargasso Sea demanda de sua tradutora
engajamento para fazer uso de estratégias que considerem as implicações políticas mais
do que priorizem os valores da língua, do sistema literário e da cultura alvo, como
defende Reimóndez (2015). Em sua análise da tradução galega de WSS, a autora
identifica uma série do que ela considera ser erros de tradução, que demonstram a falta
de cuidado do tradutor e do mercado editorial com a obra de Rhys. Segundo a autora, os
erros evidenciam a influência e também a posição do tradutor (homem) branco e
detentor de poder que, com suas escolhas tradutórias, reforça uma posição
explicitamente colonial e patriarcal.
A análise que apresento neste tópico compreende as escolhas da tradução
brasileira relativas ao uso do masculino universal na linguagem; a ênfase ou o
apagamento da voz feminina na narrativa; as imagens construídas para representar
Antoinette; e as escolhas que reforçam o poder patriarcal colonial.
2.1 Voz feminina versus masculino universal
Os estudos feministas na literatura e na tradução têm defendido uma escrita
feminina que exponha as experiências e variáveis das mulheres, inclusive inscrevendo
uma linguagem que as inclua, como propõe Cixous (2017 [1975]). O uso do masculino
universal na linguagem silencia e apaga as mulheres. Na tradução do inglês (EN) para o
português (PT), os/as tradutores/as se deparam com situações em que se é necessário
fazer uma escolha e marcar o gênero, a exemplo de pronomes e adjetivos, como
podemos observar nos trechos abaixo:
Tabela 1. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
1
She was my father’s second wife,
far too young for him they thought
[…] (p. 9)
Ela era a segunda esposa do meu pai,
jovem demais para ele, na opinião
delas [...] (p. 11)
2
“When they get like that”, she said,
“first they must cry, then they must
sleep […]” (p. 91)
“Quando elas ficam desse jeito”, ela
disse, “primeiro têm que chorar,
depois têm que dormir [...]” (p. 149)
Fonte: elaboração própria.
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Em ambos os exemplos, a tradutora reafirma a voz feminina do texto. No
primeiro caso, temos uma descrição que a protagonista Antoinette faz de sua mãe
Anette. O pronome they refere-se às damas jamaicanas. O segundo exemplo é a
narração do marido de Antoinette sobre uma fala de Christophine, uma serva da
Martinica. O pronome they refere-se às mulheres crioulas. Logo, ao traduzir os
pronomes no feminino, Léa Viveiros de Castro visibiliza as personagens femininas,
diferentemente do que ocorre em outras passagens da tradução em que, mesmo se
referindo às mulheres, o pronome é traduzido no masculino universal. Reimóndez
(2015) apresenta exemplos em que o tradutor galego apaga a voz feminina no texto,
colocando no masculino adjetivos utilizados para se referir a personagens femininas.
Isto também ocorre na tradução brasileira:
Tabela 2. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
3
“Now we are marroned”, my
mother said, “now what will
become of us?” (p. 10)
--- Agora nós estamos ilhados
disse minha mãe ; agora, o que vai
ser de nós? (p. 12)
4
I lay awake all night […] (p. 93)
Fiquei acordado a noite inteira [...]
(p. 152)
Fonte: elaboração própria.
Casos como este, em que o adjetivo qualifica um pronome que se refere
unicamente à/s mulher/es no primeiro exemplo, we, Antoinette e sua mãe; no
segundo, I, Antoinette , a marca de gênero é evidentemente necessária e não
poderia/deveria aparecer no masculino sob o risco de apagar as mulheres no texto de
Rhys. Entretanto, há exemplos em que o texto em inglês não demarca o gênero, assim,
como observa Marília Leite (2017, p. 88), “deve-se reconhecer que em alguns casos não
é fácil forçar os limites da língua, principalmente em uma tradução comercial”.
Tabela 3. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
5
“[…] I dare say we would have
died if she’d turned against us and
that would have been a better fate.
To die and be forgotten and at
peace. Not to know that one is
abandoned, lied about, helpless. All
the ones who died who says a
good word for them now?” (p. 12)
--- [...] Eu me arrisco a dizer que nós
teríamos morrido se ela se tivesse
voltado contra nós, e esse teria sido
um destino melhor. Morrer e cair no
esquecimento, ter paz. Não saber que
se está abandonado, difamado,
indefeso. Todos aqueles que
morreram... Quem tem uma palavra
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boa para dizer sobre eles agora? (p.
16)
Fonte: elaboração própria.
Note-se que em inglês não há marca de gênero. Em português, entretanto,
embora o trecho seja uma fala da mãe de Antoinette para ela, fazer uso do feminino
genérico não seria comum à língua e, como de costume, o masculino impera, em uma
demonstração de como a linguagem reproduz a configuração social, neste caso, a
predominância do masculino sobre o feminino, como no exemplo abaixo, em que
Antoinette narra a fala de sua amiga negra Tia. Ambas, enunciadora e interlocutora
femininas, mas a narração permanece no masculino.
Tabela 4. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
6
That’s not what she hear, she said.
She hear all we poor like beggar.
(p. 14)
Ela disse que não foi isso que ouvira
dizer. Ouvira dizer que nós todos
estávamos pobres como mendigos.
(p. 19)
Fonte: elaboração própria.
Até mesmo nos casos em que poderia haver uma neutralidade da marca de
gênero na tradução, o uso do masculino prevalece:
Tabela 5. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
7
Plenty white people in Jamaica.
Real white people, they got gold
money. They didn’t look at us,
nobody see them come near us. (p.
14)
Tinha muita gente branca na
Jamaica. Gente branca de verdade,
que tinha muito ouro. Eles não
olhavam para nós, não chegavam
perto de nós. (p. 19)
Fonte: elaboração própria.
A opção pelo uso de “gente”, singular, ao invés de “pessoas”, plural” interfere
na tradução do pronome (3ª pessoa do plural), que acaba sendo traduzido no masculino.
People/pessoas é um substantivo feminino plural em PT, logo, o pronome que se refere
ao substantivo também poderia estar no feminino: elas, as pessoas, neutralizando a
marca de gênero.
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2.2 Imagens de Antoinette
Wide Sargasso Sea é dividido em três partes. A segunda e maior delas tem
importante influência na representação da protagonista Antoinette, que é feita,
principalmente, pela perspectiva do homem inglês com quem ela foi obrigada a se casar.
Logo no início da sua descrição sobre a esposa, o/a leitor/a brasileiro se depara com
uma referência que não está presente no texto fonte, mas que é completamente familiar
à cultura literária de chegada:
Tabela 6. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
1
Long, sad, dark, alien eyes. (p. 39)
Olhos oblíquos, tristes, escuros e
estrangeiros. (p. 63)
Fonte: elaboração própria.
Ao optar por traduzir long eyes como “olhos oblíquos”, a tradutora traz para o
texto a referência machadiana e aproxima a personagem caribenha da personagem
brasileira Capitu. Familiarizado/a com a personagem brasileira e o famoso dilema sobre
sua suposta traição a Betinho, o/a leitor/a da tradução carrega esta referência, que é
novamente retomada no final da narrativa, agora pela perspectiva de Antoinette.
Tabela 7. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
2
Sandi often came to see me when
that man was away and when I
went out driving I would meet him.
I could go out driving then. The
servants knew, but none of them
told. (p. 110)
Sandi vinha sempre me visitar
quando aquele homem estava fora, e,
quando eu saía dirigindo, eu me
encontrava com ele. Os empregados
sabiam, mas nenhum deles contava.
(p. 184)
Fonte: elaboração própria.
Diante desta passagem e da referência machadiana, o mesmo dilema pode ser
suscitado: Antoinette traiu ou não o marido? Assim como Machado, Rhys, ou melhor, a
tradutora, não oferece provas da traição e nem centraliza tal questão, embora
intensifique o advérbio de frequência. Ademais, diante do momento em que se encontra
a passagem acima em meio aos delírios de Antoinette presa no sótão da mansão
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inglesa qualquer fato por ela narrado poderia ser questionado. Igualmente, a descrição
inicial que remete Antoinette a Capitu é feita pela perspectiva sexista do seu marido.
Tirando a referência machadiana, outra questão chama atenção nessa passagem,
a supressão de uma importante frase para (re)pensar papéis de gênero. Toda a frase “I
could go out driving thenfoi suprimida da tradução. Pensando no tempo histórico em
que se passa WSS (1830-1845), é fundamental que se evidencie o fato de mulheres
realizarem atividades estigmatizadas como masculinas. Embora, hoje, pareça irrelevante
enfatizar que uma mulher pode dirigir, é preciso levar em conta o período em que se
passa a obra traduzida, sob o risco de apagar o fato de que diferenças de gênero foram e
são uma realidade social.
Outra passagem em que Rhys problematiza papéis de gênero com relação a
Antoinette é quando ela atira uma pedra no poço e o marido narra:
Tabela 8. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
3
She threw like a boy, with a sure
graceful movement […] (p. 52)
Ela atirou como um menino, com um
movimento seguro e gracioso [...] (p.
84)
Fonte: elaboração própria.
Certamente, considerando o potencial feminista de WSS, muitas são as questões
passíveis de ampliação. Entretanto, concentrarei minha discussão na desconstrução da
imagem de Antoinette como louca, possibilitado pelo texto fonte, pois, como fica
expresso nos paratextos da edição brasileira, essa questão é central na obra, que é
como a personagem é representada no hipotexto Jane Eyre.
Desde JE, atribui-se a loucura de Antoinette ao fato de ela ser filha de uma
louca, como uma questão natural e hereditária. Em WSS, Rhys empenha-se em
desconstruir essa ideia de Antoinette e sua mãe como naturalmente loucas, e reforçar
que ambas são levadas à loucura pelas circunstâncias de suas vidas. Anette, a mãe, vive
deprimida com a perda de um passado de glória, a situação decadente, a sensação de
não pertencimento, o isolamento duplo pela comunidade branca e pela comunidade
negra , a tristeza por ter um filho doente e posteriormente a perda deste e de sua casa,
sua memória.
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Cabe contextualizar que WSS se passa no período histórico entre 1830 e 1845,
com o intuito de problematizar os conflitos coloniais posteriores ao Ato de
Emancipação das colônias britânicas, em 1833, e o Período de Aprendizagem, na
Jamaica (1834-1838). Por meio de Antoinette e sua mãe, ambas crioulas
4
, Rhys explora
o processo de crioulização no Caribe, advindo da escravização, logo, em primeira
instância, envolvendo brancos (Europa) e negros (África), e embasado na relação de
superioridade e inferioridade. Entretanto, nesse processo, a ideia de inferioridade
cultural aparece de modo muito mais complexo e deslocador que o binarismo biológico
que estabeleceu a dominação sobre os povos negros. A inferioridade cultural também se
estendeu aos colonizadores brancos, que foram considerados degenerados pelo contato
com outras raças. Por outro lado, como os/as crioulos/as brancos/as no Caribe tinham a
sua subsistência advinda da expropriação de terras nativas e da escravização de povos
africanos, eles/elas tendiam a reproduzir o racismo decorrente da superioridade branca
(ASCROFT et al., 2007).
Em meio a esse contexto, Antoinette vivencia os sentimentos de solidão e
rejeição. Rejeição dos/as negros/as e dos/as ingleses/as incluindo seu marido. No
casamento, a crioula tinha que lidar com a superioridade branca patriarcal de seu marido
inglês, que depois a leva para a Inglaterra e a prende em um sótão como uma louca
agressiva. A loucura, a agressividade e a selvageria atribuídas a Bertha em JE são
retomadas em WSS a fim de problematizar como esses atributos vão sendo construídos
socialmente. Quando uma mulher se volta contra o marido, independente das
circunstâncias, ela é tachada de louca. Quando uma mulher rejeita um/a filho/a, ela
também é tachada de louca em função do construto social da maternidade compulsória.
Quando uma mulher não atende aos padrões sociais, ela certamente será tachada de
louca.
Tabela 9. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
4
“Look the crazy girl, you crazy like
your mother. Your aunt frightened
to have you in the house. She send
you to the nuns to lock up. Your
--- Olha a menina maluca, você é
maluca igual a sua mãe. Sua tia está
com medo de ter você em casa. Ela
mandou você para ficar trancada
4
Neste caso, o termo crioula, vindo do inglês creole, é usado em sua acepção originária: pessoa branca,
de descendência europeia, nascida e crescida em uma colônia tropical (ASCROFT et al., 2007).
.
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mother walk about with no shoes
and stockings on her feet, she sans
culottes. She try to kill her husband
and she try to kill you too that day
you go to see her. She have eyes
like a zombie and you have eyes
like a zombie too. […]” (p. 29-30)
com as freiras. Sua mãe anda sem
sapatos nem meias nos pés, ela sans
culottes. Ela tentou matar o marido e
tentou matar você também naquela
dia que você foi visitar. Ela tem
olhos de zumbi e você também tem
olhos de zumbi. (p. 44-45)
Fonte: elaboração própria.
A passagem acima é a fala de uma menina negra para Antoinette no momento
em que ela chega ao convento. Observa-se que a tradução caminha lado a lado com o
texto fonte. Chamam Antoinette de louca por considerarem sua mãe louca. A fala da
menina reproduz o discurso patriarcal. As circunstâncias da instabilidade emocional de
sua mãe não são levadas em conta. Ela é simplesmente considerada louca pela maioria
dos/as personagens, inclusive por ser uma crioula branca:
Tabela 10. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
5
[…] and soon the madness that is in
her, and in all these white Creoles,
come out. (p. 57)
[...] e logo a loucura que havia nela,
e em todas essas crioulas brancas,
aflorou. (p. 93)
Fonte: elaboração própria.
Todavia, várias nuanças no texto fonte que contrapõem a naturalização dos
fenômenos sociais e problematizam a construção histórica e cultural destes,
possibilitando, por exemplo, que o/a leitor/a entenda o estado emocional de Anette e as
razões da sua agressividade para com seu marido e para com Antoinette. Como diz a
protagonista, “Sempre existe o outro lado, sempre” (RHYS, 2012, p. 126). Entretanto, o
trabalho cultural a ser realizado pelo texto traduzido depende do tipo de leitura proposta
por seu/sua leitor/a e, sobretudo, pelo tipo de leitura que a tradutora realizou, uma vez
que a leitura da tradução será enormemente influenciada por esta primeira leitura. É
nesse sentido que os Estudos Feministas de Tradução reforçam o papel dos/as
tradutores/as como agentes responsáveis por transmitirem o cunho político de uma obra
como WSS.
Um/a leitor/a feminista não encontrará dificuldades para compreender a situação
de Antoinette. Um/a leitor/a não engajado/a, entretanto, pode facilmente se convencer
com o ponto de vista de personagens que a consideram louca. Tendo isso em vista, Léa
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Viveiros de Castro tem importante papel no modo como constrói as imagens de
Antoinette. Os exemplos a seguir nos mostram que parece não haver uma consciência
das implicações políticas de certas escolhas da tradutora. Novamente, é possível
perceber que não uma regularidade quanto à intensificação ou suavização da ideia
presente no texto fonte. Há muitas descrições de Antoinette e sua mãe, como nos
exemplos 4 e 5, em que o texto traduzido caminha lado a lado com o texto fonte.
Aqui também saliento as diversas ocorrências em que as mulheres são
adjetivadas como loucas em equivalência à crazy, diferentemente do que menciona
Reimóndez (2015) quanto à tradução galega, na qual a imagem de Antoinette é
profundamente alterada, reforçando a ideia da mulher como louca, mesmo quando o
texto em inglês usa o adjetivo fool. Quanto às ocorrências de fool, na tradução
brasileira, elas aparecem como “tola” e “boba”. No geral, as descrições de Antoinette
corroboram com a ideia trazida no texto fonte. Entretanto, há momentos em que a
imagem da mãe de Antoinette, por exemplo, como louca, é potencializada.
Tabela 11. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
7
“And that her mother was mad.
Another lie?
[…]
“They drive her to it. When she
lose her son she lose herself for a
while and they shut her away. They
tell her she is mad, they act like she
is mad. Question, question. But no
kind word, no friends, and her
husban’he he go off, he leave her.
They won’t let me see her. I try, but
no. They won’t Antoinette to see
her. In the end mad I don’t know
she give up, she care for nothing.
[…]” (p. 94)
--- E disse que a mãe dela era louca.
Outra mentira?
[...]
--- Eles a levaram a isso. Quando ela
perdeu o filho, perdeu
temporariamente o juízo, e eles a
isolaram. Disseram que estava
maluca, agiram como se estivesse
maluca. Perguntas, perguntas. Mas
nenhuma palavra gentil, nenhum
amigo e o marido foi embora,
abandonou-a. Não me deixaram vê-
la. Eu tentei, mas não consegui. Não
deixavam Antoinette vê-la. No fim,
louca eu não sei, ela desistiu, não
ligava mais pra nada. [...] (p. 155)
Fonte: elaboração própria.
O exemplo acima é uma evidente passagem em que o texto fonte busca
desconstruir a imagem de Anette como louca. Christophine fala com convicção das
razões que levaram a mãe de Antoinette à possível loucura. Todavia, a escolha de
“perdeu temporariamente o juízo” para “she lose herself for a while”, na tradução, opera
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99
como se a personagem tivesse, de fato, perdido o juízo, ficado louca. Perder-se não
necessariamente está relacionado a perder o juízo, a sanidade. Assim, a tradução
acentua a ideia de loucura que o texto fonte justamente busca desconstruir. Igualmente,
altera a fala da serva negra Christophine, assim como acontece em outros exemplos que
veremos a seguir.
2.3 Poder patriarcal colonial
Ressalvo que as divisões entre os tópicos não são absolutas. Este tópico não
apenas suscita questões de gênero, mas também questões étnico-raciais, afinal, o poder
patriarcal colonial alimentou-se tanto do sexismo quanto do racismo. Por isso, algumas
reflexões de gênero serão retomadas e outras étnico-raciais começarão a aparecer desde
então, uma vez que elas estão amalgamadas na narrativa.
Convém desenvolver essa discussão a partir da figura do marido de Antoinette,
tendo em vista que este personagem é um representante do poder patriarcal colonial.
Também, para contrastar como há mais cuidado com a representação e reverência à
figura masculina branca na tradução. A primeira distinção entre Antoinette e seu marido
é marcada pelo fato de ela ser uma mulher crioula. O marido sempre a coloca em uma
relação de inferioridade por ela não ser inglesa/europeia:
Tabela 12. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
1
Creole of pure English descendent
she may be, but they are not
English or European either. (p. 39)
Ela pode ser crioula de pura
descendência inglesa, mas eles não
são ingleses nem europeus. (p. 63)
2
Looking up smiling, she might have
been any pretty girl […] (p. 42)
Assim, sorrindo, ela poderia ser
qualquer bela garota inglesa [...] (p.
67)
Fonte: elaboração própria.
Em função dessa diferença cultural, o homem desde antes do casamento,
demonstra total desprezo por Antoinette:
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100
Tabela 13. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
3
It was all very brightly coloured,
very strange, but it mean nothing to
me. Nor did she, the girl I was to
marry. (p. 45)
Era tudo muito colorido, muito
estranho, mas não significava nada
para mim. E nem ela, a moça com
quem eu ia me casar. (p. 73)
Fonte: elaboração própria.
Assim, sobre a cerimônia do casamento, ele narra:
Tabela 14. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
4
The strong taste of punch, the
cleaner taste of champagne, my
bride in white but I hardly
remember what she looked like. (p.
46)
O gosto forte de ponche, o gosto
mais puro do champanhe, minha
noiva de branco, mas eu não me
lembro do seu semblante. (p. 73)
Fonte: elaboração própria.
Depois do casamento, o marido trata Antoinette de modo desprezível e seu poder
sobre ela em função do seu gênero fica evidente. Antoinette não passa de um objeto
sexual para o marido que, como bom representante de uma cultura patriarcal e
opressora, quer dominá-la e ter posse sobre ela:
Tabela 15. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
5
As for the happiness I gave her, that
was worse than nothing. I did not
love her. I was thirsty for her, but
that is not love. I felt very little
tenderness for her, she was a
stranger to me, a stranger who did
not think or feel as I did.
One afternoon the sight of a dress
which she’d left lying on her
bedroom floor made me breathless
and savage with desire. When I was
exhausted I turned away from her
and slept, still without a word or a
caress. (p. 55)
Quanto à felicidade que eu lhe
proporcionava, isso era pior que
nada. Eu não a amava. Eu tinha sede
dela, mas isso não é amor. Eu sentia
muito pouca ternura por ela, ela era
uma estranha para mim, uma
estranha que não pensava nem sentia
como eu.
Uma tarde, a visão de um vestido
que ela deixara no chão de seu
quarto deixou-me ofegante e
selvagem de desejo. Quando fiquei
exausto, afastei-me dela e dormi,
sem uma palavra ou uma carícia. (p.
90)
6
She’ll not laugh in the sun again.
She’ll not dress up and smile at
herself in that damnable looking-
glass. So pleased, so satisfied.
Ela não vai mais rir sob o sol. Ela
não vai mais se enfeitar e sorrir para
si mesma naquele maldito espelho.
Tão confiante, tão satisfeita.
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Vain, silly creature. Made for
loving? Yes, but she’ll have no
lover, for I don’t want her and
she’ll see no other.
[…]
She’s mad but mine, mine. (p. 99)
Criatura vaidosa e tola. Feita para
amar? Sim, mas não vai ter nenhum
amante, porque eu não a quero e ela
não verá mais ninguém.
[...]
Ela é louca, mas é minha, minha. (p.
164)
Fonte: elaboração própria.
Os exemplos são suficientes para percebermos que a indiferença, o desprezo e o
sexismo presentes no texto fonte são reproduzidos na tradução. Nem potencializados,
nem suavizados. Não encontramos supressões ou alterações do sentido do texto fonte.
Entretanto, embora o texto de Rhys aborde categorias de identidade e poder de maneira
deslocadora, a tradução mantém uma reverência a esta figura do homem branco inglês.
Um exemplo significativo disso é quando a personagem Christophine se dirige ao
homem e o confronta. Na tradução, o tom de Christophine é alterado, como em uma
tentativa de amenizar o fato de uma mulher serva negra confrontar um homem branco
inglês.
Christophine é uma figura imponente e importante em WSS. Sua voz aparece
contundentemente e ecoa na mente de outros/as personagens. Ao dirigir-se ao homem, a
serva o trata por you (um pronome de tratamento informal), mas na tradução todas as
vezes que este you aparece ele é substituído por “senhor” (um pronome de tratamento
formal e respeitoso), construindo subserviência no lugar de contestação. Outra serva que
também contesta a autoridade do homem chamando-o por you é Amélie, mas na
tradução também aparece como “senhor”. A escolha de “senhor” poderia ser mais
comum no caso de o texto fonte apresentar os pronomes de tratamento formais Sir ou
master, como aparece na fala de outros personagens negros para se referir aos homens
brancos. Esta diferença lexical marcada no texto fonte é um dos detalhes da obra que
evidencia a resistência e contestação de Christophine, por isso a importância de mantê-
la na tradução.
Em outro exemplo, uma supressão em uma das falas em que Christophine
questiona o homem branco apaga uma relevante questão em WSS, a tutela da mulher
casada.
Tabela 16. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
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102
8
“[…] Everybody know that you
marry her for her money and you
take it all. […]” (p. 92)
--- […] Todo mundo sabe que o
senhor casou com ela pelo dinheiro e
ficou com tudo. […] (p. 150)
Fonte: elaboração própria.
Ao suprimir o pronome possessivo, a tradução oculta o importante fato de que o
dinheiro em questão era o dinheiro de Antoinette e não outro. Assim, pequenos detalhes
da tradução vão reforçando a autoridade do homem, representante do poder patriarcal
colonial, que Rhys justamente coloca em dúvida. Igualmente, atenua o potencial
feminista da obra. Nesse sentido, o fato de mulheres escreverem e traduzirem literatura
não garante a circulação de obras engajadas na luta contra o patriarcado, nem obras
livres de reproduzirem ideais sexistas.
Um contundente exemplo na tradução brasileira de WSS é a passagem em que
Christophine, ao explicar para o marido de Antoinette que sua mãe foi levada à loucura,
relata a situação de estupro que a mulher vivia:
Tabela 17.Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
9
“[…] In the end mad I don’t
know she give up, she care for
nothing. That man who is in charge
of her he take her whenever he
want and his woman talk. That
man, and others. Then they have
her. Ah there is no God.” (p. 94)
--- [...] No fim, louca eu não sei, ela
desistiu, não ligava mais pra nada.
Aquele homem que estava
encarregado dela fazia sexo com ela
quando tinha vontade e a mulher
dele contava. Aquele homem e
outros. Por isso eles a guardavam.
Ah, Deus não existe. (p. 155)
Fonte: elaboração própria.
É importante rememorar o período histórico em que foi produzido WSS, anterior
às crescentes discussões feministas da segunda onda. Assim, embora o texto fonte não
traga a palavra estupro, é evidente que a personagem está narrando uma situação de
violência sexual. Não há o menor indício de que havia o consentimento da mulher, ela
claramente era violentada. Portanto, a opção por “fazia sexo” aponta para uma escolha
que reproduz a cultura misógina. Os homens referidos no texto a tomavam quando
queriam, ou seja, a estupravam quando queriam, não faziam sexo com ela, não havia
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consentimento. Eles também não a guardavam, como coloca a tradução, eles a tinham
como um objeto sexual.
O texto traduzido opera contrário à denúncia presente no texto fonte. A frase
“Por isso eles a guardavam” sugere um cuidado da parte dos homens que não existe no
texto fonte, tornando, inclusive, desconexa a frase seguinte, “Ah, Deus não existe”. Em
inglês, a frase “Ah there is no God” reforça a falta de compaixão e de justiça enfrentada
por Anette e corrobora com o questionamento levantado ironicamente em outros
momentos da obra sobre se esse Deus não seria apenas justo com os/as brancos/as
ingleses. A falta de sensibilidade e conscientização para com tais elementos
emaranhados na narrativa comprometem a imagem da obra de Rhys na cultura de
chegada e também chama atenção para o fato da cultura escrita refletir e reproduzir os
axiomas do patriarcado.
Este exemplo nos auxilia a refletir como o patriarcado e suas manifestações
sexistas e racistas estão estruturadas na nossa sociedade, de modo que toda a cultura
escrita também está envolvida nessas manifestações. Por isso, os Estudos Feministas de
Tradução estão engajados em modificar essas opressões sociais por meio da oferta de
traduções e trabalhos conscientes da importância de atuações políticas. No caso desse
exemplo de tradução, uma estratégia como a supplementing (FLOTOW, 1991), na qual
a tradutora feminista está consciente do seu papel político como mediadora e por isso
pode fazer alterações no texto traduzido, seria de extrema importância para que ideias
sexistas não fossem reproduzidas e reforçadas na cultura de chegada.
Para corroborar com a discussão sobre o poder patriarcal imperial, vejamos a
seguir como Léa Viveiros de Castro aborda certas questões étnico-raciais na tradução.
3 Questões étnico-raciais
Em WSS, Rhys explora o uso de diferentes termos raciais, como: black, negro,
nigger, coulored, half-cast, light brown e yellow bastard. Um dos problemas da
tradução galega apontados por Reimóndez (2015) é justamente a falta de atenção com
tais termos, reduzidos a apenas o uso de negro/a e mulato/a. Na tradução brasileira,
nota-se que a tradutora dedicou atenção especial a estes termos, traduzindo-os de acordo
com o propósito de enunciação, como podemos constatar:
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104
Tabela 18. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
1
I never looked at any strange negro.
(p. 13)
Eu nunca olhei para nenhum negro
estranho. (p. 17)
2
“Keep them then, you cheating
nigger.” (p. 14)
--- Então pode ficar com elas, sua
negrinha trapaceira. (p. 18)
3
“[…] Didn’t you fly at me like a
little wild cat when I said nigger.
Not nigger, nor even negro. Black
people I must say.” (p. 19)
--- [...] Você voou no meu pescoço
como uma gata selvagem quando eu
usei a expressão pretinho. Nem
pretinho nem preto. Eu posso
dizer gente negra. (p. 27)
4
A coloured man with a machete in
his hand was holding the bridle. (p.
26)
Um homem de cor com um facão na
mão estava segurando as rédeas. (p.
38)
5
[…] myself, my wife Antoinette
and a little half-cast servant who
was called Amélie. (p. 38)
[...] eu, minha esposa Antoinette e
uma empregadinha mestiça chamada
Amélie. (p. 61)
6
“[…] You like the light brown girls
better, don’t you? [...]” (p. 88)
--- [...] Você prefere as mocinhas
marronzinhas não é? [...] (p. 144)
7
“It’s lies all that yellow bastard tell
you. […]” (p. 94)
--- Tudo o que aquele filho da mãe
amarelo contou para o senhor é
mentira. (p. 155)
Fonte: elaboração própria.
Em função da diversidade racial, resultante da história racial do Brasil, os termos
traduzidos não operaram como uma barreira, sendo possível adaptá-los à cultura de
chegada. No que tange às questões raciais, Reimóndez (2015) também chama atenção
para as ocorrências em que Rhys usa os termos boy e girl para se referir aos servos/as
negros/as e que na tradução galega o tradutor faz escolhas de sinônimos desses termos,
impossibilitando a compreensão de que estes não se referem à idade, mas à cor e à
posição social. O mesmo ocorre na tradução brasileira, na qual os termos, mesmo
quando usados para se referir aos servos/as negros/as, aparecem como menino e,
geralmente, moça.
Quanto à linguagem utilizada para diferenciar negros/as, brancos/as e
crioulos/as, isso quase que desaparece em função da tradução. A tradução mantém as
palavras estrangeiras usadas no texto em inglês. Então, quando no texto há uma palavra,
expressão ou frase em outras línguas que não o inglês, como o patuá, por exemplo, elas
são mantidas. No entanto, quando a marca de diferença é no próprio inglês (Black
English e British English), ela desaparece:
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105
Tabela 19. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
8
[...] “because she pretty like pretty
self”, Christophine said. (p. 9)
[...] “porque ela é muito cheia de si,
Christophine dizia. (p. 11)
Fonte: elaboração própria.
A frase em inglês enfatiza o uso do inglês caribenho, sendo uma variação
linguística de: “She is pretty like prettiness itself.” (RAISKIN, 1999). Em português, a
marca não é possível de ser mantida. Por isso estratégias paratextuais como prefacing e
footnoting, defendidas por Flotow (1991), fariam toda diferença para expor questões
como essas, em que os limites da língua podem apagar certas marcas.
Outra referência linguística perdida na tradução é o uso do adjetivo marroned,
que na tradução aparece como “ilhados” e depois como “náufraga”. O adjetivo usado
por Rhys vem da palavra jamaicana marrons, usada para se referir aos escravos/as
fugitivos/as e seus/suas descendentes que escaparam para as montanhas e viviam a
liberdade em comunidades (RAISKIN, 1999). Ao usar as palavras “ilhados” e
“náufraga”, a tradução apaga essa referência. Novamente, um paratexto poderia
possibilitar esta informação ao leitor/a brasileiro/a.
Retomando a figura de Christophine, como principal representante da cultura
afro-caribenha, vimos que a tradução brasileira altera a sua representação,
especialmente sua forma de confrontar o marido de Antoinette, representante do poder
patriarcal colonial, e seu comportamento transgressor. Além de apagar o socioleto usado
pela mulher negra martinicana, a tradução simplifica suas práticas. Estou me referindo à
obeah, um sistema de crenças e práticas religiosas, de origem africana, usado pelos/as
seus/suas praticantes para conseguir proteção, dinheiro, sucesso no amor, curas de
doenças, etc. Embora a tradução mantenha a palavra estrangeira, Christophine é
qualificada como feiticeira por praticar obeah:
Tabela 20. Cotejo entre o texto fonte (RHYS, 1999) e a tradução brasileira (RHYS, 2012)
10
“[...] It’s evidently useful to keep a
Martinique obeah woman on the
premises.” (p. 17-18)
“[…] É sempre útil ter uma feiticeira
da Martinica por perto.” (p. 24)
Fonte: elaboração própria.
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106
Obviamente, pelas descrições textuais ao longo na narrativa, o/a leitor/a
brasileiro/a pode entender que obeah é um conjunto de práticas religiosas africanas,
ainda mais quando práticas similares são tão comuns na nossa cultura. Entretanto, a
escolha de “feiticeira” para obeah woman parece reduzir a complexidade desse conjunto
de práticas, como se tudo que fosse proveniente das religiões africanas fosse feitiço.
Assim, diante dos exemplos trazidos desde o tópico anterior, constatamos que a
imagem de Christophine, tão imponente em WSS, perde um pouco de sua força na
tradução brasileira. Também, as marcas linguísticas de diferenciação racial são
apagadas. Entretanto, o cuidado com a tradução dos termos relativos à cor dos/as
personagens possibilita que o enredamento das categorias raciais seja de alguma forma
possibilitado ao leitor/a na língua da tradução.
Considerações finais
Wide Sargasso Sea é uma obra que apresenta grande preocupação com as
questões identitárias sob a perspectiva de gênero, motivada pela leitura crítica que Jean
Rhys realizou do clássico colonial Jane Eyre. Devido ao seu caráter revisionista, o
romance tem sido uma referência literária para as discussões feministas pós-coloniais.
Certamente, o potencial político da obra de Rhys atinge leitores de diversas culturas por
meio de traduções que, segundo Lefevere (1992), são o tipo de reescrita mais influente e
capaz de projetar imagens que têm grande poder na cultura de chegada.
Pode-se afirmar que a tradução brasileira de WSS não apresenta coerência quanto
à representação de Antoinette e sua mãe. Embora, em algumas passagens a tradutora
suavize a imagem delas como loucas, selvagens e agressivas, em outras, essas
perspectivas são reforçadas. Também,supressões e alterações nas suas vozes, assim
como na da personagem Christophine, que tem sua imagem inferiorizada pelas escolhas
de tradução. Quanto às questões de gênero, o uso do masculino universal predomina,
mesmo quando o texto fonte tem voz feminina, demonstrando como a linguagem
reproduz a configuração social, neste caso, a predominância do masculino sobre o
feminino.
As alterações no texto traduzido ocorrem mais facilmente quando se trata da
imagem de personagens femininas. Há diversas alterações negativas na imagem de
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107
Antoinette, sua mãe e principalmente de Christophine. Enquanto que a imagem do
marido ou não se afasta do texto fonte ou é valorizada. Assim, percebe-se mais cuidado
e reverência à figura do homem branco inglês. Isso, somado a outras escolhas de
tradução, suaviza o potencial feminista da obra. Nesse sentido, o fato de mulheres
escreverem e traduzirem literatura não garante a circulação de obras engajadas na luta
contra o patriarcado, nem obras livres de reproduzirem aspectos misóginos e/ou racistas.
Infelizmente, a luta pelo patriarcado não está perto de acabar. Embora vejamos
nos aparatos culturais como a literatura e a tradução ferramentas de subversão,
devemos, enquanto tradutoras e pesquisadoras, continuar na tarefa de traduzir,
questionar textos sobre tradução e criticar traduções que, mesmo de obras engajadas,
continuam a reproduzir desigualdades e opressões sociais. Também, insistir na mudança
do mercado editorial, pois nem da tradutora depende uma tradução. Via de regra,
além de invisibilizar o trabalho de tradutores, o mercado editorial não costuma
proporcionar-lhes um espaço, como prefácios e notas, por exemplo, para expor e
problematizar as questões de tradução.
Vimos que um espaço como este na tradução brasileira de WSS faria diferença
para informar o/a leitor/a sobre as marcas linguísticas de diferenciação racial que foram
apagadas na língua de chegada. Embora a tradutora tenha dedicado atenção especial à
complexidade de termos relacionados à categoria raça, conseguindo traduzi-los de
acordo com o propósito de enunciação, o fato de ela não ter um espaço para expor as
suas questões de tradução faz com que o/a leitor/a perca importantes referências
apagadas em função da barreira entre as línguas.
As traduções têm possibilitado a democratização do acesso à literatura
estrangeira feminista e pós-colonial. Por isso, é muito importante que estas traduções
estejam engajadas em transmitir os ideais políticos das obras. Nesse sentido, a análise
da tradução brasileira de WSS nos mostra que, evidentemente, algumas escolhas ainda
que sutis de tradução podem vir a interferir no sentido proposto pelo texto fonte e, em
certos casos, operar até mesmo de modo contrário ao que este pretende. No entanto, é
sensato ressalvar que, muitas vezes os/as tradutores/as trabalham sob pressões de prazos
e, em função de sua baixa remuneração, precisam traduzir muito para conseguirem se
manter, ou então, desenvolver outras atividades remuneradas paralelamente; tudo isso,
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108
muitas vezes não lhes permite realizar uma leitura cuidadosa e especializada das obras a
serem traduzidas, a fim de evidenciarem as diversas nuanças do texto fonte.
Ademais, muitas vezes, ao realizarem traduções de obras tão complexas, como
WSS, os/as tradutores/as não têm acesso a materiais complementares que auxiliem no
desenvolvimento do seu trabalho. Diante dessas questões, o mercado editorial é que
deveria ser responsabilizado pela circulação de traduções deficientes, que não
apresentam na cultura de chegada todo o potencial da obra na língua fonte. Uma
possível alternativa para o aprimoramento de traduções de textos feministas no Brasil é
a construção de uma rede de tradutoras feministas engajadas em cada vez mais traduzir
e publicar por grandes editoras. Frente a esta dificuldade, em função dos interesses,
muitas vezes puramente mercadológicos, do mercado editorial, seguimos na luta para
que Antoinettes possam ser traduzidas com todo seu potencial feminista pós-colonial.
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2017.
Recebimento: 17/07/2018
Aceite: 27/08/2018
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Os feminismos são uma dessas teorias marco cujas contribuições revelam-se em todos os âmbitos da sociedade, inclusive nos Estudos da Tradução. A materialização mais evidente dessa interação é o surgimento, nos anos 80, de uma corrente de tradução feminista no Canadá, capaz de colocar o gênero como centro do debate sobre tradução. Na atualidade, apesar das críticas e posteriores redefinições do conceito de tradução feminista, a proposta canadense continua sendo vista como paradigma da interação entre feminismos e tradução em geral. Neste artigo, proponho novas abordagens à prática de traduzir e paratraduzir a partir dos feminismos, dentro de uma terceira onda de tradução feminista. Além disso, pretendo abrir o debate (re)examinando áreas de interesse mútuo para os estudos de tradução e os feminismos no plano conceitual, historiográfico e crítico, tendo como propósito o surgimento de novas linhas de pesquisa futuras.
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Lori Chamberlain’s eye-opening article “Gender and the Metaphorics of Translation”, originally published in 1988, first described translators in general as “handmaidens to authors”. This fruitful analysis helped open up interesting avenues for feminist translation. On the one hand, it highlighted the need for a reformulation of the actual theoretical concepts underlying traditional translation theory; while on the other, it opened up questions regarding the status of women translators in practice. However, further studies have questioned this idea of the translator as female and inferior. For example, postcolonial approaches have shown that Western translators have usually exercised their power to interpret the Other in ways that were complicit with colonial endeavours. It is in this framework that this article explores the power implications of translation for the Galician literary system. The Galician literary system may be interesting as it can be seen as a non-hegemonic system (inside Europe) or a hegemonic one (outside Europe). The analysis of two translations, that of Jean Rhys’ Wide Sargasso Sea by Manuel Forcadela, and that of Sandra Cisneros’ Loose Woman by Marilar Aleixandre shall explore two opposing trends. The first one is a trend in which the discourse of the non-hegemonic position of Galician actually allows for patriarchal and colonial interventions in translation, while the other one takes feminist solidarity as a base for a relationship with the female postcolonial Other.
Book
With Gender in Translation, Sherry Simon presents a study of the feminist issues surrounding translation studies. She argues that translation of feminist texts is a cultural intervention, seeking to create new cultural meanings and bring social change.
London: Penguin Popular Classics
  • Charlotte Jane Brontë
  • Eyre
BRONTË, Charlotte. Jane Eyre. London: Penguin Popular Classics, 1994. [1847]