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Nós podemos definir "a mídia" de acordo se, ou não, um dado um meio, professa a si mesmo como "objetivo" -nos três sentidos da palavra, por exemplo, que ela "reporta objetivamente" a realidade; que se define a si mesmo como uma parte de uma condição objetiva ou natural da realidade; e que isso assume que a realidade pode ser refletida e representada como um objeto através de um observador da realidade. "A Mídia" -usada aqui no singular mas no sentido coletivo -coloca em parênteses o subjetivo e isola ele da estrutura básica da mediação, que é afirmada como o olhar reflexivo do social, "imparcial", "balançado", reportagem puramente empírica. Através de uma deliberada desfocagem da linha entre o objetivo e o subjetivo -como um infotretenimento¹, ou as "novelas" que tanta gente acredita serem "reais", ou acreditam representarem a "vida-real" dos policiais -ou na propaganda -ou nos programas de entrevista -a mídia constrói a imagem de uma falsa subjetividade, embalada e vendida para o consumidor como um simulacro dos seus próprios "sentimentos" e "opiniões pessoais" ou subjetividade. E ao mesmo tempo, a Mídia constrói (ou é construída por) uma falsa objetividade, uma falsa totalidade, a qual se impõe como a visão de mundo que possui autoridade, muito maior do que qualquer assunto -inevitável, inescapável, uma verdadeira força da natureza. Assim, cada "sentimento" ou "opinião pessoal" nasce dentro do consumidor como se ele sentisse isso como uma profunda, objetiva e pessoal verdade. Compro isso porque eu gosto, porque é melhor; apóio a Guerra porque é justa é honrável, e porque ela produz algum entretenimento excitante ("Tempestade no Deserto²", uma mini-série de horário nobre feita-pra-TV). Isso aparentemente refuta o meramente subjetivo (ou a legitimação disso como "arte"), a Mídia ativamente recupera o assunto e o reproduz como um elemento dentro de seu grande objeto, a reflexão total do olhar total: -a mercadoria perfeita em si mesma. Claro que toda mídia se comporta assim em alguma extensão, e possa talvez estar resistindo conscientemente ou estar inserido "criticamente" em alguma dimensão. Livros podem ser tão venenosos quanto as rádios TOP 40, e tão falsamente objetivos quanto os noticiários. A grande diferença é que qualquer um pode produzir um livro. Ele se tornou um "meio intimista", na qual faculdades críticas são utilizadas, porque agora nós sabemos e entendemos que o livro é subjetivo. Cada livro, como Calvino³ apontou, personaliza uma política pessoal -da qual o autor está consciente ou não. Nosso cuidado nesse sentido aumentou na proporção direta do nosso acesso ao meio. E precisamente por causa do livro não possuir mais a aura de objetividade que um dia teve, eu diria no séc. XVI, essa aura migrou da mídia intimista para "A Mídia", a mídia "pública", como as redes de televisão. A mídia nesse sentido permanece com uma definição fechada e inacessível para minha subjetividade. A mídia quer construir minha objetividade e não ser construída. Se assim fosse permitido, ela se tornaria -novamente por definição -outro meio intimista, privado de seu apelo objetivo, reduzido (em termos espetaculares) a uma relativa insignificância. Obviamente a Mídia irá resistir a essa eventualidade -mas irá fazê-lo precisamente ao nos convidar a investir nossas subjetividades em suas energias totais. Ela irá recuperar minha subjetividade, colocá-la entre parênteses, e usá-la para reforçar sua própria falsa objetividade. Irá me vender a ilusão de que eu estou "me expressando", ao mesmo tempo que me vende o modo de vida da minha "escolha", ou me convida para "aparecer" dentro do olhar da representação.