ArticlePDF Available

Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o discurso de ódio no cenário político

Authors:

Abstract

O presente estudo objetiva conceituar e analisar o aumento dos extremismos e do discurso de ódio no cenário político, principalmente no Brasil. Busca-se verificar se os fenômenos são legítimos e inerentes à escolha de vida em sociedade, regida por um Estado Democrático de Direito, cuja tutela do direito de liberdade de expressão é fundamental, ou, se os limites impostos à liberdade de expressão legitimam que se censure os extremistas. Em sendo legítimo, a quem compete essa censura. Faz-se uma introdução sobre o ser humano, como ser social, e a necessidade do Estado como ente responsável pela regulação das interações humanas. Em seguida trata-se da democracia e seus fundamentos, cuja liberdade de expressão encontra papel de destaque. Aborda-se o aumento dos extremismos políticos no século XXI, exteriorizado, dentre outros, pelo discurso de ódio. Ao fim é abordada a dualidade entre a democracia e a liberdade de expressão, especialmente sobre a possiblidade (ou não) de impedimento ao discurso de ódio. Por meio do método hipotético-dedutivo, propõe-se uma conclusão que direciona para a necessidade da existência de mecanismos de defesa da democracia e contenção à irrestrita liberdade de expressão no sentido de não se tolerar os intolerantes.
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
Instituto de Investigaciones Jurídicas de la Universidad Nacional Autónoma de México
1 de 35
Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão
e o discurso de ódio no cenário político
Democracy and its enemies: freedom of expression
and hate speech in the political scene
Luiz Felipe Ferreira dos Santos
https://orcid.org/0000-0002-1673-8398
Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa. Brasil
Correo electrónico: luizfelipe@sfmn.com.br
Marília de Ávila e Silva Sampaio
https://orcid.org/0000-0002-7802-1763
Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa. Brasil
Correo electrónico: marilia.sampaio@idp.edu.br
Recepción: 29 de julio de 2024
Aceptación: 20 de agosto de 2024
Publicación: 8 de enero de 2025
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Resumo: O presente estudo objetiva conceituar e analisar o aumento dos extremismos e do
discurso de ódio no cenário político, principalmente no Brasil. Busca-se vericar se os fenô-
menos são legítimos e inerentes à escolha de vida em sociedade, regida por um Estado De-
mocrático de Direito, cuja tutela do direito de liberdade de expressão é fundamental, ou, se os
limites impostos à liberdade de expressão legitimam que se censure os extremistas. Em sendo
legítimo, a quem compete essa censura. Faz-se uma introdução sobre o ser humano, como ser
social, e a necessidade do Estado como ente responsável pela regulação das interações hu-
manas. Em seguida trata-se da democracia e seus fundamentos, cuja liberdade de expressão
encontra papel de destaque. Aborda-se o aumento dos extremismos políticos no século XXI,
exteriorizado, dentre outros, pelo discurso de ódio. Ao m é abordada a dualidade entre a de-
mocracia e a liberdade de expressão, especialmente sobre a possiblidade (ou não) de impedi-
mento ao discurso de ódio. Por meio do método hipotético-dedutivo, propõe-se uma conclu-
são que direciona para a necessidade da existência de mecanismos de defesa da democracia
e contenção à irrestrita liberdade de expressão no sentido de não se tolerar os intolerantes.
Palavras-chave: liberdade de expressão; democracia; extremismo político; discurso de
ódio.
Ferreira dos Santos / Ávila e Silva Sampaio Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o dis curso de ódio...
2 de 35
Abstract: The present study aims to analyze the increase in extremism and hate speech in the
political scene, mainly in Brazil. Then the aim it to verifying whether the phenomena are le-
gitimate and inherent to the choice of life in society, governed by a Democratic State of Law,
whose protection of the right to freedom of expression, in all its dimensions, is fundamental,
or, if the limits Taxes on freedom of expression legitimize the censorship of extremists. If it is
legitimate, who is responsible for this censorship? The human being is introduced, as a social
being, and the need for the State as the entity responsible for regulating human interactions.
Then it is about democracy and its foundations, whose freedom of expression nds a promi-
nent role. The increase in political extremism in the 21st century is addressed, externalized,
among others, by hate speech. At the end, the duality between democracy and freedom of
expression is addressed, especially on the possibility (or not) of preventing hate speech. The
conclusion proposed directs to the need for the existence of mechanisms to defend democracy
and contain unrestricted freedom of expression in the sense of not tolerating the intolerant.
Keywords: freedom of expression; democracy; political extremism; hate speech.
Sumário: I. Introdução. II. A sociedade, a democracia e a liberdade de ex-
pressão. III. O século XXI e o aumento dos extremismos. IV. O paradoxo da
democracia: a legitimidade democrática aos limites à liberdade de expressão.
V. Conclusões. VI. Bibliograa.
I. Introdução
A vida em sociedade pode ser explicada com fundamento em duas teorias
principais, de modo que a primeira sustenta existir uma necessidade natural
de o homem buscar compartilhar a vida com seus semelhantes e a segun-
da explica o fenômeno como decorrência de um contrato, ou seja, um ato
de escolha.
No que se refere à teoria natural, diz-se que o ser humano possui ne-
cessidade de viver em sociedade, sendo clássica a expressão de Aristóteles
no sentido de que o homem é, por natureza, um animal sociável e “quem
vive só, bastando-se a si mesmo, ou é Deus ou fera” (Aristóteles, 2017).
Sobre a losoa moral, ou a ciência da natureza humana, pode-se conside-
rar o homem como “nascido para ação e como inuenciado em suas atitu-
des pelo gosto e pelo sentimento, perseguindo um objeto e evitando outro,
de acordo com o valor que esses objetos parecem possuir e segundo a pers-
pectiva que se apresentam” (Hume, 2004; Oreste, 1947). Assim, trata-se
de um ser racional e sociável, impulsionado por sua natureza e à procura de
prazeres e da felicidade (Freud, 2005).
A necessidade social do homem torna imprescindível a existência de um
modo de regulação das suas interações, razão pela qual é possível sustentar
3 de 35
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
ser a origem do Direito comum à do próprio homem (Pinheiro, Bahia & San-
tos, 2022). Na linha evolutiva da sociedade tem-se a existência de diferentes
tipos de sistemas de regulação das interações sociais, desde os mais simples
modelos tribais, regidos por costumes e sob autoridade de um chefe, até os
mais complexos sistemas democráticos (Dahl, 2016).
Nos termos defendidos por Bobbio, a democracia mostra-se o caminho
para o alcance de uma paz estável (Bobbio, 2019, p. 21). Assim, ao lado
da sociedade e do direito, tem relevante papel o estudo, a discussão e o apri-
moramento da democracia, cujos antecedentes históricos mais importantes
remontam à Grécia antiga, mas “[...] é bem provável que tenha existido al-
guma forma de democracia em governos tribais muito antes da história re-
gistrada” (Dahl, 2016, p. 19), ou seja, é mais do que milenar.
Sabe-se que, a depender do conceito que se empregue para democracia,
considerando os elementos que a caracterizam, muitas das democracias anti-
gas e algumas das atuais não seriam dignas do nome. Nesse sentido, tem-se
os conceitos mínimos e máximos da democracia (Schumpeter, 1961, 2003;
Habermas, 2003)1, existindo razoável consenso no sentido de que, para
sua existência, é imprescindível o respeito aos direitos fundamentais básicos
do ser humano, dentre eles, o da liberdade de expressão.
O governo do povo pressupõe inclusão, participação popular,
na formação de um Estado que organiza as decisões políticas, em benefício
da coletividade. A união pelo diálogo visa a paz. Assim, sem ampla possi-
bilidade de debate, não é possível que as deliberações coletivas sejam feitas
de modo informado e livre. Esse pressuposto liberal encontra-se, entretanto,
sob ataque.
Na sociedade contemporânea, o franco acesso aos meios de comuni-
cação, em especial às redes sociais e aos aplicativos de mensagens, em vez
1
Para o Schumpeter (1961), a democracia se faz presente quando há direito a eleições
por meio do voto, “No intuito de simplicar o caso, limitamos esse tipo de concorrência, que
denirá a democracia, à concorrência livre pelo voto livre. Essa ação justica-se pelo fato
de que a democracia parece implicar um método reconhecido, através do qual se desenrola
a luta competitiva, e que o método eleitoral é praticamente o único exequível, qualquer que
seja o tamanho da comunidade” (p. 323). Para Habermas (2003), “A ideia básica é a seguinte:
o princípio da democracia resulta da interligação que existe entre o princípio do discurso e a
forma jurídica. Eu vejo esse entrelaçamento como uma gênese lógica de direitos, a qual pode
ser reconstruída passo a passo. Ela começa com a aplicação do princípio discursivo ao direito
a liberdades subjetivas de ação em geral [...] e termina quando acontece a institucionalização
jurídica de condições para um exercício discursivo da autonomia política, a qual pode equipar
retroativamente a autonomia privada, inicialmente abstrata, com a forma jurídica” (p. 158).
Ferreira dos Santos / Ávila e Silva Sampaio Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o dis curso de ódio...
4 de 35
de prestigiar o esclarecimento, dissemina a desinformação, com um número
cada vez maior de fake news e de discursos de ódio. Se a internet e as redes
sociais, de um lado, são ferramentas para a liberdade de comunicação, de ou-
tro, esses instrumentos, deixados à lei do mais forte, são fonte de abusos
que ameaçam o sistema democrático (Vargas e Castillo, 2022), notadamente
com o surgimento do fenômeno da desinformação, que alcança máxima re-
levância e gravidade quando proferido por altos players da política.
Outro aspecto relevante em termos de redes sociais é a atuação dos algo-
ritmos, que inuenciam e inuenciaram diretamente questões políticas im-
portantes (Callejón, 2022). Com efeito, a ilusão de vez e voz do cidadão,
por meio das redes sociais, encobre o grande poder que as plataformas pos-
suem sobre a disseminação de informações. Trata-se de assunto complexo
que a sua análise demandaria estudo próprio.
Fato é que existe uma dualidade, isto é, liberdade de expressão e desin-
formação. Da dualidade, surge um verdadeiro paradoxo, qual seja, de um
lado há a liberdade de expressão como direito fundamental inerente à demo-
cracia e, do outro, existe a sua utilização odiosa, para enviesar a autonomia
popular. Disso emergem questões a serem respondidas, como: até que ponto
o direito fundamental à liberdade de expressão salvaguarda desinformação
e como esse tema dialoga com o sistema democrático.
Não interessa para o presente estudo qualquer desinformação, mas ape-
nas aquela que tem impacto no cenário político e como fonte potencial
de abalo à democracia. Tem-se em particular consideração o discurso de ódio
no cenário político. Não serão analisadas questões relacionadas ao terro-
rismo internacional como em questões domésticas, a exemplo das inadjeti-
váveis apologias a massacres ocorridos em escolas e creches, entre outros,
que também podem ser inseridas como categorias do discurso de ódio.
Com os questionamentos acima, endereça-se a necessidade de inves-
tigar se o sistema jurídico possui elementos para proteger as bases demo-
cráticas e os direitos fundamentais no que tange à propagação de discurso
de ódio de cunho político ou se esse discurso está amparado pela liberdade
de expressão. Em não estando, a quem compete limitar esses discursos. Eis o
que se objetiva investigar com o presente artigo.
O trabalho partiu de uma pesquisa bibliográca, em especial com a con-
sulta de artigos disponíveis em revistas especializadas. Alguns dos artigos
consultados utilizaram base de dados empíricas. Após a pesquisa, por meio
de métodos hipotético-dedutivo (Rodrigues, 2023; Abreu, 2022), propôs-se
que a solução do paradoxo apresentado passa pela proposta de Karl Popper,
5 de 35
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
no sentido de que ser democrático não tolerar os intolerantes, cabendo a sal-
vaguarda do discurso principalmente ao Poder Judiciário, que deve se pautar
pelo sistema jurídico posto.
II. A sociedade, a democracia e a liberdade de expressão
Abordou-se na introdução do presente ensaio o fato de o homem ser essen-
cialmente um ser social. É da sua natureza a vida em sociedade, a qual vi-
vência momentos de extrema complexidade, isso em decorrência dos mais
variados fatores como, por exemplo, o aumento nas expectativas sociais, au-
mento na quantidade e velocidade nas informações – as quais nem sempre
estão associadas à qualidade.
É notável o liame entre o aumento na quantidade e velocidade nas in-
formações com as expetativas das pessoas. Explica-se. Parece intuitivo ar-
mar que “não se deseja o que não se conhece” (Laplanche, 2001)2 e a partir
do momento em que o ser humano passa a ter contato com diferentes expe-
riências e expectativas, passa a desejar mais e mais.
A vida em sociedade, seja ela simples ou complexa, traz a necessida-
de da formação do Estado, pois “la existência de los indivíduos es efecto
no sólo de las fuerzas naturales que crean de uma manera inconsciente, sino
también de las acciones voluntarias, reexivas, conscientes” (Jellinek, 2000,
p. 190). Contrastados os anseios sociais —ilimitados por natureza— e a ne-
cessidade de regulação e controle, na medida em que os bens são limitados,
surge o Estado como fonte de Poder (Jellinek, 2000, p. 193), cujas funções
estão a de produzir a pacicação social e o bem comum (Dallari, 2003).
A formação do Estado engloba as formas de controle e execução de Po-
der, bem como a discussão sobre quem deve exercê-lo, se representantes
2
A despeito das teorias psicanalíticas e psicológicas a respeito do desejo, que o carac-
terizam como ilimitados e inatos, conforme lição de Jean Laplanche, cuja base é a teoria de
Freud: “A concepção freudiana do desejo refere-se especialmente ao desejo inconsciente,
ligado a signos infantis indestrutíveis. Note-se, no entanto, que o uso feito por Freud do termo
desejo nem sempre se atém rigorosamente à denição acima; é assim que ele fala de desejo
de dormir, desejo pré-consciente, e até formula, às vezes, o resultado do conito como o
compromisso entre “... duas realizações de desejo opostas, cada uma das quais encontra a sua
fonte num sistema psíquico diferente”. Laplanche (2001). A frase descrita acima é atribuída
ao poeta romano Públio Ovídio Naso. (informação extraída dos sites Portal de Literatura e
Citações e Frases Famosas. Disponível em: https://www.portaldaliteratura.com/pensamentos.
php?id=823 e https://citacoes.in/autores/ovidio/
Ferreira dos Santos / Ávila e Silva Sampaio Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o dis curso de ódio...
6 de 35
eleitos, se uma elite pensante, se uma elite nanceira, entre outros (Popper,
2012). A margem de argumentos sobre a preponderância de um regime sobre
o outro, elege-se a democracia como o modelo mais factível para proporcio-
nar uma estável pacicação social, notadamente por ser o regime das leis
(Bobbio, 2019), que devem estar em consonância com uma ordem jurídi-
ca justa.
Conforme prenunciado na introdução, o Estado Democrático de Direito
aceita uma conceituação minimalista ou maximizada. A primeira se conten-
ta com existência de eleições e leis, sem que seja vital a análise da qualida-
de dessas leis e a segunda condiciona à existência democrática a obediência
e o respeito aos direitos fundamentais da pessoa humana (Vieira, 2007).3
No ponto de importância para o presente estudo, tem-se que a existência e o
respeito às leis, ao menos em conformidade com a constituição e os direitos
fundamentais, é condição sine qua non para caracterização de um Estado
como democrático e, sobre a democracia e as demais formas de governos,
Bobbio não tem “nenhuma hesitação em dizer que prefere o governo das leis
3
Importa transcrever o pensamento de Vieira (2007, p. 15): “A noção de que o Estado
não tem apenas a obrigação de tratar os cidadãos de maneira igual perante a lei, mas tam-
bém o dever de assegurar a justiça substantiva foi acompanhada pelo argumento, proposto
por novos teóricos jurídicos, de que o conceito tradicional de Estado de Direito se tornou
incompatível com a nova realidade”. Ainda: “O Estado de Direito deveria ser formado, para
Hayek, pelos seguintes elementos: (a) a lei deveria ser geral, abstrata e prospectiva [...] (b) a
lei deveria ser conhecida e certa [...] (c) a lei deveria ser aplicada de forma equânime a todos
os cidadãos e agentes públicos [...] (d) deveria haver uma separação entre aqueles que fazem
as leis e aqueles com a competência para aplicá-las [...] (e) deveria haver a possibilidade de
revisão judicial das decisões discricionárias da administração [...] (f) a legislação e a política
deveriam também ser separadas e a coerção estatal legitimada apenas pela legislação [...] e (g)
deveria haver uma carta de direitos não taxativa para proteger a esfera privada”. Especica-
mente sobre Estado Democrático de Direito Silva discorre: “A democracia, como realização
de valores (igualdade, liberdade e dignidade da pessoa) de convivência humana, é conceito
mais abrangente que o de Estado de Direito, que surgiu da expressão jurídica da democracia
liberal.”; sobre a diferença entre Estado Liberal de Direito e Estado Social de Direito, Lenio
Streck e José Luis Morais defendem: [...] o Estado Democrático de Direito teria a caracte-
rística de ultrapassar não só a formulação do Estado Liberal de Direito, como também a do
Estado Social de Direito —vinculado ao welfare state capitalista— impondo à ordem jurídica
e à atividade estatal um conteúdo utópico de transformação da realidade. Dito de outro modo,
o Estado Democrático de Direito é plus normativo em relação às formulações anteriores. A
novidade que apresenta o Estado Democrático de Direito é muito mais em um sentido teleo-
lógico de sua normatividade do que nos instrumentos utilizados ou mesmo na maioria de seus
conteúdos, os quais vêm sendo construídos de alguma data (2013, p. 114).
7 de 35
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
e não o governo dos homens. O governo das leis celebra hoje seu triunfo
na democracia” (Bobbio, 2019, p. 264-5).
O Constituinte Brasileiro, ao interromper os mais de vinte anos de regi-
me ditatorial então vigentes, promulgou a Constituição Federal em 05 de ou-
tubro de 1988 e, já em seu artigo 1º, estipulou que a República Federativa
do Brasil se constitui em um Estado Democrático de Direito, tendo como
fundamentos, dentre outros, a cidadania, a dignidade da pessoa humana e o
pluralismo político (incisos II, III e V, do mencionado artigo).
No artigo 1º, ao estabelecer a existência de um Estado Democrático
de Direito, o constituinte originário trouxe uma grande carga axiológica e va-
lorativa a ser respeitada na República Federativa do Brasil. No caso, a de-
mocracia brasileira não se legitima somente pela existência do voto e das
leis. Há algo a mais. Sobre o tema, Bernardo Gonçalves Fernandes ensina
que, “para muitos autores, o Estado Democrático de Direito seria a união
de dois princípios fundamentais, o Estado de Direito e o Estado Democráti-
co” (Fernandes, 2014, p. 286) e “na realidade, o Estado Democrático de Di-
reito é muito mais que um princípio, congurando-se verdadeiro paradigma
[...] que compõe e dota de sentido as práticas jurídicas contemporâneas”
(Fernandes, 2014, p. 286).4
Em seguida, a Lei Fundamental ordena ser objetivo da República a cons-
tituição de uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3º, I) (Fernandes 2014).
Mais uma vez está-se a tratar de normas com singular conteúdo valorativo.5
4
Ainda, importa a lição de Canotilho: O Estado constitucional não é nem deve ser apenas
um Estado de direito. Se o princípio do Estado de direito se revelou como uma ‘linha maginot’
entre “Estados que têm uma constituição” e “Estados que não têm uma constituição”, isso
não signica que o Estado Constitucional moderno possa limitar-se a ser apenas um Estado
de direito. Ele tem de estruturar-se como Estado de direito democrático, isto é, como uma
ordem de domínio legitimada pelo povo. A articulação do ‘direito’ e do ‘poder’ no Estado
constitucional signica, assim, que o poder do Estado deve organizar-se e exercer-se em ter-
mo democráticos. O princípio da soberania popular é, pois, uma das traves mestras do Estado
Constitucional. O poder político deriva do “poder dos cidadãos”. (2003, p. 97-8).
5
Sobre a classicação das normas, bem como sua carga valorativa e a responsabilidade
do operador do direito, Freitas Filho (2009) traz uma síntese de abalizada doutrina com rela-
ção à classicação das normas jurídicas, passando pelos entendimentos de Ronald Dworkin,
Josef Esser, Humberto Ávila e Judith Martins-Costa, propondo ao nal uma classicação dos
princípios, regras, cláusulas gerais e conceitos jurídicos indeterminados, de modo a apresentar
as chamadas meta-normas, cujo grau de fundamentação nas decisões judiciais é especial-
mente superior do que quando da aplicação das regras caraterizadas por serem disjuntivas
(método se – então).
Ferreira dos Santos / Ávila e Silva Sampaio Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o dis curso de ódio...
8 de 35
Ao tratar sobre os direitos e garantias fundamentais, a Constituição Fe-
deral preceitua expressamente o direito à livre manifestação de pensamen-
to (art. 5º, IV), o que também está previsto na Convenção Americana sobre
Direitos Humanos, em seu artigo 13, sendo importante a ressalva descrita
no §5º, segundo a qual traz importantes e oportunas limitações à liberdade
de expressão (Decreto 678, de 06 de novembro de 1992).
A liberdade constitucionalmente assegurada pode se distinguir no que
se refere à sua forma, em cinco grandes grupos, isto é, liberdade da pes-
soa física, de pensamento, de expressão coletiva, de ação prossional e de
conteúdo econômico e social (Silva, 2017, pp. 234 e 237). A Constituição
Federal prevê expressamente o direito de reunião, pacíca, sem armas,
em locais abertos ao público (art. 5º, XVI). Ainda, no seu artigo 220 pre-
ceitua que “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a in-
formação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer
restrição, observado o disposto nesta Constituição.”, de forma que nenhuma
lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de in-
formação jornalística em qualquer veículo de comunicação social.
A democracia possui como corolários necessários o direito ao voto,
a participação social e o direito de ser ouvido, isto é, o cidadão tem o direito
de expressar-se livremente, o que ganha contornos especiais em temos de in-
ternet e redes sociais como espaços de excelência para a liberdade de expres-
são (Monts, 2021). Nesse passo, a “liberdade de expressão é um dos mais
relevantes e preciosos direitos fundamentais, correspondendo a uma das mais
antigas reivindicações dos homens de todos os tempos” e “[...] é, então, enal-
tecida como instrumento para o funcionamento e preservação do sistema
democrático (o pluralismo de opiniões é vital para a formação da vontade
livre)” (Mendes & Branco, 2018, p. 267).
No Brasil, a liberdade de expressão teve grande relevo na Constitui-
ção Federal, dentre outros, pelo fato de que antes de 1988 o Brasil passou
por um período em que a censura e a mitigação a outros importantes direitos
fundamentais eram atos realizados senão pelo Estado, à sua condescendên-
cia (Gaspari, 2014). Nesse contexto, a liberdade de expressão possui assen-
to constitucional e especial importância no Estado Democrático de Direito
vigente.
9 de 35
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
III. O século XXI e o aumento dos extremismos
Antes de tratar do aumento dos extremismos no presente século, é necessário
empreender uma tarefa hercúlea de conceituar o que se denomina por extre-
mismos e polarização no campo político social. O “termo polarização é uti-
lizado quando se constata a existência de dois polos que canalizam processos
de identificação reduzindo a complexidade de identidades e tendências polí-
ticas a duas alternativas” (Faria et al., 2022), marcadas por um antagonismo
ideológico. Radicalização seria a adoção de crenças extremistas que justifi-
cam o uso da violência para a mudança social e/ou política (Jugl et al., 2021).
A despeito da complexidade da formação do conceito, em razão da limi-
tação metodológica que se faz no presente estudo, há necessidade de tomar
como pressupostos os conceitos empregados acima, nos quais diz-se polari-
zada politicamente a sociedade política que se radicaliza com pontos de vis-
ta extremamente antagônicos, como, por exemplo, onde um pensa em uma
reforma agrária sem que haja sequer contraprestação no momento da desa-
propriação e outro que pense em um liberalismo permissivo a grandes lati-
fúndios, independente de serem ou não produtivos.
O exemplo se faz no mundo acadêmico e para uma visualização do que
seria a polarização. Não que se objetive simplicar o debate, mas a intenção
é tornar compreensível ao leitor o fenômeno da polarização política.
O extremismo, para os ns deste artigo, pode ser conceituado como
a exteriorização dos interesses e pensamentos políticos de modo a não ou-
vir nem aceitar como legítima —mesmo que se divirja— as posições an-
tagônicas. Os extremistas veem os opositores como adversários e, para
legitimarem-se, proferem discursos ofensivos, desrespeitosos e desprovidos
de argumentos cienticamente legítimos.
Fixadas as premissas, importa analisar a experiência atual. O cenário
norte-americano é um bom exemplo. A eleição de um candidato de extre-
ma direita foi um marco para o aumento signicativo não só da polarização,
inerente ao sistema político estadunidense reconhecidamente polarizado en-
tre o partido social e o partido democrata, mas principalmente no que se re-
fere ao aumento do extremismo fomentado pelo representante do partido
republicano.
Steven Levitsky e Daniel Ziblatt (2018), em estudo que se tronou no-
tavelmente difundido, analisaram como as democracias morreram em di-
versos países nos últimos tempos, concluindo que as rupturas democráticas
raramente ocorrem como nos tempos antigos, isto é, em quarteladas. Atual-
Ferreira dos Santos / Ávila e Silva Sampaio Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o dis curso de ódio...
10 de 35
mente, o risco às democracias se faz presente quando outsiders, demago-
gos, extremistas, que tratam adversários como inimigos, rejeitam as regras
do jogo, toleram ou encorajam a violência e buscam restringir as liberdades,
são postos no poder. Segundo os autores, Donald Trump reunia todas as ca-
racterísticas mencionadas acima.
Notável é o paralelo que pode ser realizado entre as condutas da extrema
direita norte-americana com a extrema direita brasileira. São características
comuns a ambos a utilização de comunicação direta com seus eleitores, ata-
ques tanto à imprensa como a seus opositores (políticos ou não), a utilização
de um nacionalismo expressivo e um discurso de despolitização. No que
se refere aos ataques diretos, objetos de discursos odiosos, vale a transcrição:
O líder, por meio da comunicação direta, também se coloca como represen-
tante do povo sem intermediários. Sem intermediários, nesse caso, também in-
clui as chamadas mídias tradicionais. Tanto o brasileiro [Jair Bolsonaro] quanto
Trump, não só buscam essa comunicação direta com o cidadão, mas também
se colocam como os detentores da verdade em contraposição à uma mídia
que mente. Os ataques à mídia são diretos e explícitos, como nos tweets de Bol-
sonaro. [...] Donald Trump também ataca de maneira direta prossionais da im-
prensa estadunidense e os media de maneira geral, que zeram reportagens
com críticas ao então candidato [...].
Além da mídia tradicional, opositores políticos também são constantes al-
vos de ataques dos dois presidenciáveis. Alinhados ao tema processo eleitoral,
os ataques aos candidatos adversários foram bastante recorrentes na campanha
de Donald Trump, que dedicou boa parte de seus tweets para atacar a candi-
data democrata Hillary Clinton [...]. Assim como Trump, Bolsonaro também
fez ataques diretos ao seu opositor Fernando Haddad [...]. (Baptista et al., 2022,
p. 112)
Especicamente sobre o que se pode chamar e extrema direita brasi-
leira, Walter Barreto Júnior (2021) dedicou uma pesquisa em que cataloga
1.500 frases ofensivas proferidas pelo ex-presidente “Jair Bolsonaro e seus
seguidores”.6
6
Ao que interessa para o presente estudo, vale listar algumas fases: “Eu não aceito re-
sultado das eleições diferente da minha eleição” (f. 28); “Esses marginais vermelhos serão
banidos de nossa pátria” (f. 30); “Não há dúvida né [que o nazismo é de esquerda]? Como é
o nome do partido? Partido Nacional Socialista da Alemanha, né? (f. 37); “Quem quiser vir
aqui [ao Brasil] fazer sexo com uma mulher, que à vontade. O Brasil não pode ser um país
11 de 35
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
No que se refere à polarização política, Mário Fuks e Pedro Marques
buscaram mensurá-la tanto no caso brasileiro, como no norte-americano.
Repita-se que, diferente dos Estados Unidos, em que há uma dualidade par-
tidária, no Brasil há um pluripartidarismo que deveria, em tese, diminuir
a polarização em especial em decorrência da existência de partidos políticos
de centro.
Contudo, o estudo mostrou “a presença de polarização afetiva, principal-
mente em relação às lideranças políticas, uma moderada e assimétrica polari-
zação da identicação ideológica e a inexistência de polarização na posição
em relação a issues” (Fuks & Marques, 2020, p. 11). Continuam: “Dando-
-se principalmente com base afetiva, a polarização do eleitorado brasileiro
nos oferece o pior dos mundos. Signica que o grande público não vê na dis-
puta uma disputa prioritariamente programática” (Fuks & Marques, 2020,
p. 11), o que acaba por ser mais danoso à democracia. Em 2022, os autores
tornaram a abordar o tema, oportunidade em que concluíram que, diferen-
temente do que ocorre nos Estados Unidos, onde a polarização bipartidária
de turismo gay. Temos família” (f. 38); “Daqueles governadores de ‘paraíba’, o pior é o do
Maranhão. Tem que ter nada com esses caras” (f. 41); “Vontade de encher tua boca com uma
porrada, tá? Seu safado.” (f. 99); “Se a gente não tiver voto impresso em 2022, pode esquecer
a eleição” (f. 127); “Se bem que para mim, de acordo com a bíblia e a Constituição, o casa-
mento é entre um homem e uma mulher. Mas não vou discutir esse assunto.” (f. 128); “Muita
denúncia de fraude. [...] vamos ter problema pior do que nos Estados Unidos” (f. 130); “Quem
decide se o povo vai viver em uma democracia ou ditadura são as suas Forças Armadas. Não
tem ditadura onde as Forças Armadas não a apoiam” (f. 133); “eu sou, realmente, a consti-
tuição” (f. 150); “Vai ter voto impresso em 2020 e ponto-nal. Não vou nem falar mais nada.
Vai ter voto impresso. Se não tiver voto impresso é sinal de que não vai ter eleição. Acho que
o recado está dado” (f. 155); “Alguns idiotas até hoje cam em casa” (f. 165); “A esquerda
não toma cloroquina porque vai matar o verme que eles são” (f. 169); “O comunista gordo” (f.
170); “Tenho as forças Armadas ao meu lado [...] Poderão ir um dia às ruas para garantir a sua
liberdade e seu bem maior” (f. 183); “Tem que todo mundo comprar fuzil, pô. Povo armado
jamais será escravizado. Eu sei que custa caro. Daí tem um idiota que diz: ‘ah, tem que com-
prar feijão’. Cara, se não quer comprar fuzil, não enche o saco de quem quer comprar”; “Ou
o chefe desse Poder enquadra os seus ou esse Poder pode sofrer aquilo que não queremos.
Porque nós valorizamos e reconhecemos o Poder de cada República. Nós todos aqui na praça
do Três Poderes juramos respeitar a nossa Constituição. Quem age fora dela se enquadra ou
pede para sair” (f. 236); “Qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes, este presidente
não mais cumprirá. A paciência do nosso povo já se esgotou. Ele tem tempo ainda de pedir seu
boné e ir cuidar da sua vida. Ele, para nós, não existe mais! Liberdade para os presos políticos!
Fim da censura! Fim da perseguição àqueles conservadores, àqueles que pensam no Brasil” (f.
237); “Ou esse ministro se enquadra, ou ele pede para sair. Sai, Alexandre de Moraes! Deixa
de ser canalha!” (f. 238) (Barreto Júnior, 2021).
Ferreira dos Santos / Ávila e Silva Sampaio Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o dis curso de ódio...
12 de 35
se intensica há décadas, no Brasil há um “antagonismo afetivo” recente,
somado a uma radicalização ideológica da direita, o que representa um anta-
gonismo assimétrico, seguindo uma recente reorganização da direita desde
2006 (Fuks & Marques, 2022, p. 579).
Verica-se no Brasil a existência de uma polarização afetiva que trans-
cende as questões partidárias – notadamente pelo fato de que a delidade
à ideologia partidária no Brasil é deveras complexa. Com a análise acima,
é possível traçar um link entre a polarização política, com características
de radicalização ideológicas, com o surgimento de líderes carismáticos
que se utilizam de discursos discriminatórios. A inuência do líder carismá-
tico, que fala diretamente com seus eleitores, não é de menor importância.
Ao tratar de como as democracias morrem, Steven Levitsky e Daniel Ziblatt
abordam as quatro características que ensejam risco à democracia, de modo
que a incitação à violência, exteriorizada pelo discurso de ódio possui papel
relevante.
Ponto comum de líderes ditatoriais é a utilização de discursos populistas,
ideológicos, demagogos e racistas.7 Pode-se dizer que “na maioria das ve-
zes, a ideologia era um ato de fé” (Dikötter, 2022, p. 17), cuja característica
é da crença dogmática e acrítica. Acredita-se no líder carismático que possui,
no mais das vezes, um viés antidemocrático. Trata-se de receita perigosa,
notadamente pelo fato de que, com o aumento na velocidade da informação,
esses líderes atingem uma grande quantidade de pessoas que, por vezes acrí-
ticas, desmotivadas e economicamente frágeis, cam à mercê de uma quebra
de regime.
7
O professor catedrático de humanidades da Universidade de Hong Kong e membro
sênior da Hoover Institution, Frank Dikötter (2022), apresenta as características dos mais
notáveis ditadores do século XX, de modo que em comum pode-se notar um discurso dema-
gogo, ideológico e racista. A saber: sobre Mussolini “Como a maioria dos ditadores, Musso-
lini alimentou a ideia de que era um homem do povo” (p. 20), “O fascismo como ideologia
permanecia vago, mas Mussolini percebeu o formato que tornaria: ele seria líder, aquele en-
viado pelo destino para reavivar a sorte da nação [...] passou, então, a se portar como ator” (f.
22), “Os devotos enganavam Mussolini tanto quanto ele os enganava. Mas Mussolini mentia
sobretudo para si mesmo” (f. 50), “o culto também foi colorido com superstição e magia. Em
um país profundamente religioso, as pessoas projetavam em Mussolini uma devoção e uma
adoração características da fé cristã” (f. 52); sobre Hitler “[...] usando uma linguagem simples,
que pessoas comuns podiam entender. Conforme se empolgava, começava a atacar os judeus,
a criticar o Kaiser, esbravejando contra os exploradores da guerra, falando cada vez mais
rápido, com gestos dramáticos e dedo ocasionalmente em riste. Ele sabia como transmitir
mensagens para os ouvintes dando voz ao ódio e à esperança deles” (f. 61).
13 de 35
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
Há terreno especialmente fértil para o surgimento de líderes populistas,
demagogos e extremistas quando se tem a presença das diculdades econô-
micas e sociais de não alcance aos direitos básicos, bem como desrespeito
a esses direitos. Insere-se aqui o que Vieira (2007) trata como “invisibilida-
de, demonização e imunidade”.8
Tem-se, no Brasil, uma população em extrema pobreza, cujo sentimento
é de ser invisível para o Estado (Vieira, 2007). Nesse passo, as expectativas
sociais não cumpridas9 geram revolta e tornam-se terrenos férteis para o apa-
recimento e crescimento de demagogos, outsiders, cujo discurso perlha-se
com o discurso de ódio. Para seguir, faz-se necessário descrever e conceituar,
mesmo que minimamente, o discurso de ódio.
1. Característica e conceito dos discursos de ódio
Ao mesmo tempo que social, o ser humano assume-se como ser linguístico,
isto é, que necessita da linguagem para existir e, nesse passo, tem-se a possi-
bilidade de a linguagem ferir, machucar, inclusive podendo produzir efeitos
físicos que incapacitam temporariamente a vítima (Butler, 2021; Matsuda
et al., 1993; Lawrence III, 1993). O extremismo religioso, cultural, polí-
tico, expressado principalmente pelo discurso de ódio, tem inegavelmente
8 Diz o autor: O argumento central proposto aqui é que a exclusão social e econômica,
oriunda de níveis extremos e persistentes de desigualdade, causa a invisibilidade daqueles
submetidos à pobreza extrema, a demonização daqueles que desaam o sistema e a imunidade
dos privilegiados, minando a imparcialidade da lei. Em síntese, a desigualdade profunda e
duradoura gera erosão da integridade do Direito. A lei e os direitos sob essas circunstâncias
podem, com frequência, ser vistos como farsa (Vieira, 2007, p. 42).
9 Luís Roberto Barroso diz: “Na antevéspera da convocação da constituinte de 1988, era
possível identicar um dos fatores crônicos do fracasso na realização do Estado de Direito
no país: a falta de seriedade em relação à lei fundamental, a indiferença para com a distância
entre o texto e a realidade, entre o ser e o dever-ser previsto na norma [...] além das comple-
xidades e sutilezas inerente à concretização de qualquer ordem jurídica, havia no país uma
patologia persistente, representada pela insinceridade constitucional. A Constituição, nesse
contexto, tornava-se misticação, instrumento de dominação ideológica, repleta de promessas
que não são honradas. Nela se buscava, não o caminho, mas o desvio; não a verdade, mas o
disfarce (Barroso, 2015, p. 27). Importa também apresentar o discurso do Ministro do Supre-
mo Tribunal Federal que, em vídeo, faz referência aos 32 anos da Constituição Federal nos
seguintes termos: “As promessas constitucionais ainda não foram cumpridas. Nós promete-
mos, na Constituição, uma sociedade justa solidária, com erradicação da pobreza, proteção do
meio ambiente. E estamos assistindo um elevado grau de miserabilidade, estamos assistindo
ainda agressões ao meio ambiente” (Fux, 2020).
Ferreira dos Santos / Ávila e Silva Sampaio Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o dis curso de ódio...
14 de 35
o condão de causar sofrimento humano.10 Improta consignar que as feridas
abertas pelas palavras odiosas por vezes deixam cicatrizes maiores do que
as agressões físicas.
Nesse ponto, caracterizar e conceituar o discurso de ódio torna-se ques-
tão complexa e cogente, assim como avaliar se além de causar cicatrizes
e dores nas pessoas, podem esses discursos levarem à derrocada da demo-
cracia. Sobre o ponto, Judith Butler ensina:
De fato, parece que não existe uma linguagem especíca para o domínio
da injúria linguística, que é, por assim dizer, forçado a extrair seu vocabulá-
rio dos ferimentos físicos. Nesse sentido, parece que a conexão metafórica
entre a vulnerabilidade física e a linguística é essencial para a descrição da vul-
nerabilidade linguística em si. Por outro lado, o fato de parecer não existir
uma descrição ‘adequada’ à injúria linguística torna ainda mais difícil identi-
car a especicidade da vulnerabilidade linguística em relação à vulnerabilidade
física e em oposição a ela. (Butler, 2021, p. 16)
A autora trabalha um paralelo entre a vulnerabilidade física e a linguísti-
ca e, com relação a essa, expressa a diculdade em conceituá-la, o que força
a extração de seu conceito pela conexão metafórica entre a dor física e a fala-
da. Deve-se, por conseguinte, utilizar de “metáforas físicas” para “descrever
a injúria linguística” (Butler, 2021, p. 17).
Tem-se que traçar critérios ontologicamente acessíveis e viáveis,
mas não estáveis, em razão das diversidades linguísticas, para conceituar
o chamado discurso de ódio que importante juridicamente ou se, todo o dis-
curso de ódio importa judicialmente. A tarefa é hercúlea e necessita ao legis-
lador e aplicador do direito uma atuação íntegra e coerente (Dworkin, 2014),
a permitir o accountability das decisões judiciais (Freitas Filho, 2007).
A doutrina de Yéssica Esquivel Alonso aponta como característica
do discurso de ódio a deliberada intenção de provocar uma ofensa à digni-
dade de um grupo de pessoas, por meio de “expressões dolorosas”, racistas,
xenofóbicas, discriminatórias, machistas, homofóbicas, cujo objetivo é pro-
vocar uma espécie de “dor linguística” a um setor populacional determina-
10 Jugl et al. (2021) sustentam que: Political, religious, and other forms of extremism are a
global threat endangering democratic structures and causing much human suffering as well as
high nancial costs. Em tradução livre: Formas de extremismo político, religioso e outras são
uma ameaça global que põe em perigo as estruturas democráticas e causa muito sofrimento
humano, bem como altos custos nanceiros.
15 de 35
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
do, apresentando-se como parte supercial de um conito mais importante
que envolve questões relacionadas à religião, política ou étnica (2016).
Trata-se de conceito cunhado não só pela literatura jurídica, mas tam-
bém retirado de estudos sociais e políticos, que possui elementos essenciais,
como: o fomento ao ódio ou à humilhação; o uso do discurso para incitação
da violência, intimidação, hostilidade ou discriminação; e motivos relativos
à raça, cor, idioma, religião, crenças, nacionalidade, origem ética e ascen-
dência (Lozano, 2017).
Ao analisar as doutrinas precedentes, pode-se conceituar o discurso
de ódio em conformidade com os seguintes elementos: 1) exteriorização
do pensamento por meio de linguagem (em sentido amplo, falada, escrita,
desenhada, etc.); 2) essa exteriorização deve ser dirigida contra uma pessoa
ou classe/grupo de pessoas; 3) a mensagem transmitida deve possuir o poten-
cial de causar importante/grave dor emocional nessa pessoa ou classe/grupo
de pessoas e; 4) o discurso deve ter conteúdo essencialmente inútil, isto é,
sem qualquer interesse público que o justique.
Ainda, elemento característico do discurso de ódio, mas não essencial,
é que esse discurso tenha palavras de combate e possa causar ameaça à paz
pública e aqui a vítima pode não ser uma pessoa, mas sim alguma instituição.
Nesse particular, a dor emocional deixa de ser elemento necessário e cede
espaço ao risco à paz pública.
No direito comparado, Daniel Sarmento traz precedentes sobre o tra-
tamento da questão em países como Austrália, Canadá, Rússia, Dinamar-
ca, França, Alemanha, Índia, Argentina, Uruguai, Holanda, África do Sul,
Sri Lanka, Inglaterra, Estados Unidos, de modo que, em seu estudo, priori-
za a análise norte-americana. O autor argumenta que, apesar de a liberdade
de expressão ter sido incorporada à Constituição em decorrência da 1ª Emen-
da, apenas pós 1ª Guerra Mundial esse direito contou com efetiva proteção
do judiciário norte-americano e, a partir desse momento, representa o mais
valorizado direito fundamental norte-americano (Sarmento, 2006, p. 58).
Importante destacar que, diferente da experiência brasileira, na qual a li-
berdade de expressão é positivada desde a promulgação da Constituição,
o que, em grande medida, decorreu do passado autoritário que se desejava
expurgar, a Constituição norte-americana passou a prever, expressamente,
a liberdade de expressão após a 1ª Emenda e, a partir de então, tem na liber-
dade de expressão um valor jurídico de fundamental e progressiva importân-
cia, inclusive aparentando ser absoluta (Sarmento, 2006).11
11 Diz Daniel Sarmento que: “apesar dos termos peremptórios do texto constitucional,
Ferreira dos Santos / Ávila e Silva Sampaio Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o dis curso de ódio...
16 de 35
Continua Daniel Sarmento (2006), armando que os Estados Unidos
“possuem um sistema de proteção à liberdade de expressão extremamente
complexo”, de modo que há “campos” não alcançados pela proteção cons-
titucional da liberdade de expressão, sendo que o “primeiro caso importante
envolvendo a questão do hate speech foi Beauharnais vs Illinois”, em que
se discutiu a condenação criminal de um homem que distribuía panetos
conclamando homens brancos a se unirem contra os negros e evitarem a mis-
cigenação racial. Ainda, o réu acusava indistintamente os afrodescendentes
de serem autores de estupros, roubos e outros crimes. A Suprema Corte man-
teve a condenação anteriormente proferida, considerando constitucional a lei
e validando a ideia do group libel, isto é, da difamação coletiva (Sarmento,
2006, p. 60).
No caso levado à julgamento pela Suprema Corte, contrapôs-se o direito
à liberdade de expressão à ofensa racista às questões raciais, compreendidas
no ataque à miscigenação racial, bem como no fato de imputar, abstratamen-
te, aos afrodescendentes a autoria de crimes como estupros, roubos, entre
outros. No caso, prevaleceu a proteção contra a difamação coletiva, de modo
que a liberdade de expressão foi tolhida.
Ocorre que a complexidade da questão fez com que a Suprema Corte
americana, no caso Brandemburg vs. Ohio (1969), decidisse de modo a pres-
tigiar a liberdade de expressão, de ideia, mesmo que houvesse ofensas contra
negros e judeus. Há outros casos polêmicos que fornecem uma conclusão
incompleta e ainda oscilante, mas cuja síntese pode ser descrita no sentido
de que as restrições ao hate speech que envolvam limitações ao discurso
político fundadas no ponto de vista do manifestante são, via de regra, in-
constitucionais. Dessa forma a difusão de posições racistas mais radicais
e hediondas não poderia ser proibida nem penalizada, ou seja, “[...] As con-
cepções defendidas por Hitler ou pela Ku Klux Klan têm de rceber a mesma
proteção do Poder Público do que as manifestações em favor dos direitos
humanos e da igualdade”. A exceção estaria restrita às manifestações que pu-
dessem provocar “imediata ração violenta” (Brandemburg vs. Ohio, 1969).
A síntese apresentada acima traz a tentativa de sistematizar a ideia
no sentido de que as restrições ao hate speech são válidas quando a expres-
poucos na história norte-americana defenderam o caráter absoluto da 1ª Emenda. Nunca se
questionou, por exemplo, que a liberdade de expressão não protege aqueles que gritam falsa-
mente “fogo” num cinema lotado, como registrou Oliver Wendell Holmes. Pelo contrário, des-
de sempre se aceitou a necessidade de estabelecer algumas limitações excepcionais ao exer-
cício deste direito sem as quais a vida social tornar-se-ia inviável” (Sarmento, 2006, p. 59).
17 de 35
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
são utilizar as fighting words, isto é, palavras de combate que possam amea-
çar a ordem e a paz pública12. Gard também busca sistematizar a questão,
nos seguintes termos:
Since Chaplinsky v. New Hampshire, the United States Supreme Court has re-
lied exclusively on the governmental interest in preventing breaches of peace
to justify the continued constitutionality of the fighting words doctrine.
The Court has held that under this doctrine offensive language can be censored
only if it (1) constitutes a personally abusive epithet; (2) addressed in a face-
to-face manner; (3) to a specic individual; and (4) uttered under such circum-
stances that the words have a direct tendency to cause an immediate violent
response by the ordinary, reasonable recipient. Only in the rare case in which
these four elements coalesce may the government proscribe expression without
violating the rst amendment. (1980, p. 580)13
Conforme conclusão acima, inclinação da Suprema Corte Estadunidense
em proteger a liberdade de expressão, de modo que sua limitação se legiti-
ma somente em situações excepcionais, nas quais estariam presentes quatro
elementos, quais sejam: uma qualicação pessoalmente abusiva; essa quali-
cação seja proferida pessoalmente; para um indivíduo especíco e; em cir-
cunstâncias que as palavras possam causar uma resposta violenta e imediata
do destinatário.
O autor termina seu estudo criticando a posição da Suprema Corte,
de modo que sua atuação acaba sendo realizada de forma seletiva e discrimi-
12 Para uma análise mais aprofundada, ver os casos: Terminiello v. Chicago (1949), no
qual a Suprema Corte estreitou o conceito de palavras de combate a palavras que produzem
um perigo claro e imediato, mas as que convidam à disputa e até mesmo causam inquietação
são protegidas. Também, Texas v. Johnson (1989), no qual a Suprema Corte redeniu o es-
copo da doutrina sobre as palavras de combate para como sendo “um insulto pessoal direto
ou um convite para troca de socos”, tendo o Tribunal considerado lícita a queima da bandeira
dos Estados Unidos.
13 Tradução livre: Desde Chaplinsky v. New Hampshire, a Suprema Corte dos Estados
Unidos Tribunal tem conado exclusivamente no interesse governamental em prevenir vio-
lações da paz para justicar a manutenção da constitucionalidade da doutrina das palavras de
combate. A Corte tem sustentado que sob esta doutrina linguagem ofensiva pode ser censu-
rada apenas se (1) constituir um epíteto pessoalmente abusivo; (2) abordadas de forma face
a face; (3) para um indivíduo especíco; e (4) pronunciado em tais circunstâncias que as
palavras têm uma tendência direta de causar uma resposta violenta imediata pelo destinatário
comum e razoável. Apenas no raro caso em que esses quatro elementos se fundem, pode o
governo proibir a expressão sem violar a primeira emenda.
Ferreira dos Santos / Ávila e Silva Sampaio Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o dis curso de ódio...
18 de 35
natória, para punir violações triviais de uma regra de fundamental interesse
constitucional e termina: “When considered in light of the predominant so-
cietal interest in free and uninhibited expression, even candid and unpleasant
expression, the ghting words doctrine cannot withstand rst amendment
scrutiny” (Gard, 1981, p. 581).14
Ainda em se tratando de corte internacional, Gisela María Pérez Puentes
analisou a dialética entre a liberdade de expressão e os direitos de personali-
dade na experiência espanhola, momento em que apontou para a fundamen-
talidade do direito à informação em uma sociedade democrática. O achado
de sua pesquisa foi no sentido de o Tribunal Constitucional Espanhol so-
lucionar o conito entre os direitos fundamentais por meio da ponderação,
utilizando, para tanto, três fases. Na primeira, o Tribunal Constitucional di-
ferencia a liberdade de expressão pura e simples da atividade informativa,
de modo que a primeira se exterioriza pela emissão de opinião e a segunda
pela narração de fatos com objetivo de informar (Puentes, 2015).
A diferença é importante na medida em que a liberdade de informar,
isto é, atividade informativa, possui um valor superior, especialmente por-
que “trata sobre hechos noticiables que tengan trascendencia pública y sean
veraces, la libertad de expresión hace referencia a la libre difusión de ideas,
pensamientos u opiniones” (Fuentes, 2015, p. 216).
Na segunda fase, o Tribunal Constitucional verica se houve ofensa
aos limites do respeito e da tolerância para com outros direitos fundamentais,
se houve intromissões legítimas ou ilegítimas na esfera dos direitos de perso-
nalidade, utilizando-se dos seguintes critérios de vericação: se a informação
crítica tem relevância pública ao invés de simplesmente satisfazer a curiosi-
dade; se a informação é verdadeira, “entendida como una diligencia razona-
ble por parte del informador para contrastar la noticia de acuerdo con pautas
profesionales ajustándose a las circunstancias del caso” (Fuentes, 2015, p.
218) e; se a notícia ultrapassou o m informativo a congurar injúria ou se
foi necessária (Fuentes, 2015).
Na última e terceira fase o Tribunal Constitucional verica se a comuni-
cação realizada ofende a honra, a intimidade ou a imagem da pessoa afetada,
bem como se há interesse público na disseminação da informação, oportuni-
14 Tradução livre: Quando considerada à luz do predominante interesse social na expres-
são livre e desinibida, mesmo sincera e expressão desagradável, a doutrina das palavras de
combate não pode resistir exame da primeira emenda.
19 de 35
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
dade em que se valora qual direito de personalidade foi ofendido e se é caso
de reparação de danos (Fuentes, 2015).
Ao apontar o discurso de ódio como prenúncio da intolerância nas so-
ciedades e causa de corrosão democrática, o que impõe a realização de res-
postas políticas, sociais e jurídicas, sendo essas últimas inuenciadas pelo
paradoxo de Karl Popper, Germán Lozano analisou a jurisprudência do Tri-
bunal Europeu de Direitos Humanos como fonte de linhas mestras para apli-
cação do mencionado paradoxo e apontou certa inconsistência na resposta
fornecida pelo tribunal, que não exigiu a ocorrência de dano ou perigo real,
bastando um perigo remoto ou especulativo (Teruel Lozano, 2017).
É notável a diferença de posicionamento da Suprema Corte america-
na, reconhecidamente mais liberale da Corte Espanhola e Tribunal Europeu
de Direitos Humanos, que, diferentemente da americana, não exigem perigo
real de dano.
No Brasil, também em termos de Corte Constitucional, tem-se por para-
digmático o julgamento da Argüição de descumprimento de preceito funda-
mental (ADPF 130), de relatoria do então Ministro Ayres Britto, cujo tema
foi a compatibilidade ou não da Lei n. 5.250 de 09 de fevereiro de 1967,
com a Constituição Federal de 1988, onde a liberdade de expressão pos-
sui assento de direito fundamental. A despeito da complexidade da matéria,
o que forneceria ensejo a um estudo especíco, em rigorosa síntese, tem-se
que a Corte Constitucional Brasileira declarou não recepcionada pela Cons-
tituição Federal a combatida lei.
Analisou-se a questão relacionada à “plenitude da liberdade de imprensa
como reforço ou sobretutela das liberdades de manifestação do pensamen-
to, de informação e de expressão artística, cientíca, intelectual e comuni-
cacional”, oportunidade em que se decidiu que o artigo 220 da Constituição
Federal veda qualquer restrição concreta à manifestação do pensamento, ex-
pressão ou à informação, sendo a liberdade de imprensa um patrimônio ima-
terial (ADPF 130, 2009).
Conforme julgamento acima, o Supremo Tribunal Federal reconheceu
a impossibilidade de qualquer restrição concreta à manifestação do pensa-
mento, seja qual for a veículo de comunicação social utilizado, sem que isso
implique diretamente na inexistência de consequências civis, penais e admi-
nistrativas, inclusive podendo ensejar direito de resposta15. A decisão ganha
15 Para um estudo sobre o direito de resposta ver Correia (2022).
Ferreira dos Santos / Ávila e Silva Sampaio Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o dis curso de ódio...
20 de 35
maior importância em especial em decorrência da atual e cada vez maior uti-
lização das mídias sociais e veículos de transmissão de mensagens.
Ainda, é de se destacar a quebra de paradigma vivenciada no Brasil
de 1988, que passou de um regime ditatorial e cuja censura era marca regis-
trada, para um Estado Democrático de Direito com todas as características
já mencionadas neste trabalho. Nesse passo, a Corte Constitucional eviden-
ciou que a Constituição Federal veicula “o mais democrático e civilizado
regime da livre e plena circulação das ideias e opiniões”, de modo que a li-
berdade de imprensa, leia-se também de expressão, é patrimônio “imaterial”.
O julgamento segue com o fundamento de que o pensamento crítico
é inerente à informação plena e dedigna, razão pela qual o conteúdo social-
mente útil da obra compensa eventuais excessos (ADPF 130, 2009). Há tu-
tela ao pensamento crítico que, se excessivo, deve ser compensado por seu
“conteúdo essencialmente útil”. Aqui há profunda carga axiológica. Pode
haver excessos na linguagem, notadamente em razão das suas caracterís-
ticas já apontadas. Contudo, deve-se contrapor o conteúdo essencialmente
útil do veiculado e o excesso ou ofensa eventualmente cometidos. A crítica,
mesmo que contundente, é livre em um Estado Democrático de Direito. In-
daga-se se essa crítica legitima o discurso de ódio.
Outro precedente, também do Supremo Tribunal Federal, é paradigmá-
tico e rearmou a liberdade de expressão, de forma a consignar que a livre
circulação de ideias em um Estado democrático é fundamental, motivo pelo
qual a proibição de divulgação de conteúdos deve ser apenas em casos ex-
cepcionalíssimos, quando houver: (a) prática ilícita; (b) incitação à violência
ou discriminação e; (c) propagação de discurso de ódio (Rcl, 38782, 2021).
Ainda, no emblemático caso Ellwanger, o Supremo Tribunal Federal enten-
deu que a liberdade de expressão “não pode abrigar, em sua abrangência,
manifestações de conteúdo imoral que implicam ilicitude penal” (Habeas
Corpus 82424, 2004).
Em tempos mais recentes, e agora voltada diretamente ao tema discurso
de ódio, a Suprema Corte voltou a debater a liberdade de expressão, oportu-
nidade em que consignou que a liberdade de expressão deve ser consagrada
em conformidade com o binômio liberdade e responsabilidade, razão pela
qual seu exercício não é escudo para a prática de atividades ilícitas, não po-
dendo ser confundida com impunidade para agressão (Petição 10391 AgR,
2022).
Convém abordar que, a despeito da ausência de conceituação rigorosa
do que se tem por discurso de ódio, na ponderação realizada, a liberdade
21 de 35
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
de expressão foi tolhida. Nos julgamentos apresentados pôde-se vericar
que a liberdade de expressão cedeu espaço quando estiveram presentes a prá-
tica de ilícito, a incitação à violência ou discriminação, o discurso de ódio,
a existência de uma imoralidade que repercuta no campo do ilícito penal,
de modo a não se confundir liberdade de expressão como a impunidade para
agressão.
Outro exemplo de fundamental importância é de experiência alemã,
quando o Tribunal Constitucional alemão entende que a negação do holo-
causto não é compatível com a liberdade de expressão (Sarlet, 2020). De-
cisão que foi mantida no Tribunal Europeu de Direitos Humanos (Negar
Holocausto não é liberdade [...], 2019).
Verica-se que principalmente nos casos alemão e brasileiro, a liberdade
de expressão cedeu espaço e foi cerceada. Isso seria um retrocesso democrá-
tico? A democracia possui elementos para defender-se? Eis o que se buscará
tratar no item seguinte.
IV. O paradoxo da democracia: a legitimidade
democrática aos limites à liberdade de expressão
As abordagens até agora demonstraram a seriedade e a necessidade de se
tratar as questões relacionadas aos discursos de ódio em contraposição ao di-
reito fundamental da liberdade de expressão. Verificou-se dissenso inclusi-
ve no cenário norte-americano, cuja democracia se mostra mais longínqua.
Extrai-se do exposto até aqui, uma estreita ligação da democracia com os
direitos e liberdade fundamentais, dentre eles as liberdades de pensamento
e expressão humana, nelas compreendias a linguística, artística, cultural, es-
piritual, religiosa, entre outras. Em contraposição aos estados autoritários
e totalitários, cujas liberdades são tolhidas e punidas, a democracia vanglo-
ria-se por ser liberal, onde tudo o que a lei não proíbe é permitido e, a depen-
der do que a lei proíba, essa limitação deve ser considerada antidemocrática
e corrigida pelas Cortes Constitucionais.
Desse cenário surgem paradoxos que, segundo Karl Popper podem
ser assim representados pelo fato de que a liberdade, no sentido de uma to-
tal ausência de restrição, forçosamente ocasiona a uma restrição, na medi-
da em que fornece “aos brutamontes a liberdade de escravizar os mansos”.
Esse cenário faz surgir o paradoxo da tolerância, no qual a tolerância ili-
mitada conduz ao desaparecimento da tolerância, isto é, “Se entendermos
Ferreira dos Santos / Ávila e Silva Sampaio Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o dis curso de ódio...
22 de 35
uma tolerância ilimitada mesmo aos que são intolerantes, se não estivermos
preparados para defender uma sociedade tolerante do assalto dos intoleran-
tes, então os tolerantes serão destruídos e, com eles, a tolerância” (Popper,
2013, p. 388).
Percebe-se que o paradoxo narrado pelo lósofo se faz presente na me-
dida em que uma liberdade sem controles fornece a possiblidade de escra-
vidão do mais fraco pelo mais forte, ao passo que uma tolerância ilimitada
fornece ensejo para o desaparecimento da tolerância por força dos intoleran-
tes. Nesse sentido, há necessidade de regramentos e limites.
No caso sob estudo, está-se diante de um regime que tem nas liberdades
individuais uma pedra angular e, arraigado em seu fundamento, vê-se sob o
ponto —contraditório ou não— de tolerar ou não a veiculação de discursos
de ódio.
Importa tratar os pontos. De um lado há a democracia, cuja liberdade
de expressão é fundamental e lhe traz diferença notável quando compara-
da com regimes autoritários ou totalitários. De outra, há o discurso de ódio,
conceituado aqui como aquele que possui o condão de ferir, física ou psiqui-
camente, inigindo dor física ou psíquica.
Nesse passo, surgem as indagações: permite-se a emissão de um discur-
so odioso na democracia? Todo e qualquer discurso de ódio deve se permi-
tido ou tolhido? Quando ele importa? Ainda em termos linguísticos, sociais
e psicológicos, é fato que um discurso pode ser substancialmente ofensivo
para uma pessoa e não o ser para outra. Há seres humanos hipersensíveis.
Nessa hipótese, haveria de ter resposta democraticamente aceita ou é um dos
preços que se deve pagar em termos de democracia?
O tema é complexo, intrigante e merece uma análise vertical. Contu-
do, em razão do corte metodológico necessário no presente estudo, a análi-
se se limitará ao discurso político. Reformula-se as indagações acima para:
no jogo democrático, nas discussões e disputas políticas, valem discursos
odiosos? Vale atacar adversários? Pode haver incitação odiosa em termos ra-
ciais, religiosos e, em última análise, com ataque a própria democracia? É -
cito a um candidato atacar o sistema? Importa acrescentar ao debate o fato
de a Constituição Federal prever a imunidade parlamentar no Brasil.16
16 Há previsão expressa da imunidade parlamentar na Constituição Federal, em seu artigo
53 cuja redação é a seguinte: Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e pe-
nalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.
23 de 35
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
Ao tratar dos riscos de retrocesso democrático Aziz Huq e Tom Ginsburg,
apresentam uma série de elementos ou indícios de hostilidade aos chama-
dos predicados institucionais da democracia (eleições competitivas; direitos
de expressão e associação política), notadamente em vista de que há que-
bras de regimes democráticos de forma velada e lenta. Dentre os mencio-
nados elementos, está presente o discurso de ódio, a saber: “The resurgence
of hate speech targeting dissenting voices and minorities, or proposals to sin-
gle out such people for coercive or intrusive government action, also con-
tract the public sphere (and are objectionable on their own terms)” (Huq &
Ginsburg, 2018, p. 164)17.
A história mostra as consequências de discursos odiosos, da demagogia
desmedida e dos ataques às minorias, não por outro motivo o livro de Ste-
ven Levitsky e Daniel Ziblatt alcançou tantos leitores. Some-se a isso o fato
de que uma geração que não lutou pelos direitos conquistados não sabe o va-
lor que eles possuem, de modo a não lutar pela manutenção desses direitos
(Ihering, 2020). Acrescente-se também as promessas não cumpridas pela de-
mocracia, a crise representativa que se apresenta, principalmente no Brasil.
A receita está formada. O risco democrático existe e é potencializado
quando altos players do jogo político passam a ter voz, seguidores e ganha-
rem corpo. Nesse ponto, volta-se a pergunta: para não se aproximar aos re-
gimes autoritários e totalitários, deve a democracia tolerar os intolerantes?
Karl Lowenstein, ao analisar os riscos para a democracia aborda as questões
relacionadas à depressão econômica, desilusão nacional e insatisfação polí-
tica e trabalha o conceito de democracia militante (Loewenstein, 1935) para
evitar a característica suicida da democracia (Rijpkema, 2018).
Em completo trabalho, no qual aborda o aumento do autoritarismo
no mudo, as mazelas ocasionadas pela vulnerabilidade da democracia no en-
tre guerras, com ascensão do nazismo e fascismo na Europa, contratados
com o direito fundamental da liberdade de expressão, o paradoxo ocasionado
pela tolerância democrática e a possibilidade de autodestruição democráti-
ca, João Gabriel Madeira Pontes explora a democracia militante em temos
de crise e apresenta um debate sobre como as democracias devem respon-
der às ameaças autoritárias sugerindo um ponto de equilíbrio, devendo a to-
17 Tradução livre: “O ressurgimento do discurso de ódio visando vozes dissidentes e mi-
norias, ou propostas para denunciar essas pessoas por ação governamental coerciva ou intru-
siva, também coapta a esfera pública (e é censurável em seus próprios termos)”.
Ferreira dos Santos / Ávila e Silva Sampaio Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o dis curso de ódio...
24 de 35
lerância sofrer limitações se contrapostas com as irracionalidade e paixões
das massas (Pontes, 2020).
Oscar Vilhena Vieira e Ademar Borges tratam da democracia mili-
tante e a quadratura do círculo, oportunidade em que defendem respostas
aos abusos sistemáticos contra a democracia, de forma que, com obediência
aos princípios e regras constitucionais, em especial ao devido processo le-
gal, há que se ter a capacidade de analisar a gravidade das ameaças autori-
tárias e, assim, calibrar os mecanismos de autodefesa da democracia (Vieira
e Borges, 2023).
Verica-se uma necessidade de defesa da democracia, a qual não pode
ser um pacto suicida, de modo a tolerar os intolerantes. Na receita do lóso-
fo Karl Popper:
Não sugiro com esta formulação [paradoxo da tolerância] que, por exemplo, de-
vamos reprimir sempre a expressão de losoas intolerantes; enquanto puder-
mos contrariá-las com argumentos racionais e controlá-las por meio de opinião
pública, a repressão seria certamente muito pouco indicada. Mas deveríamos
reservar-nos o direito de as reprimir, se necessário pela força, pois pode facil-
mente suceder que não estejam dispostas a confrontar-nos no terreno da discus-
são racional, mas comecem por rejeitar qualquer espécie de discussão; podem
proibir os seus seguidores de ouvirem qualquer argumentação racional, porque
a consideram enganadora, e ensiná-los a responder aos argumentos com os pu-
nhos ou as pistolas. Devíamos, por conseguinte, em nome da tolerância, armar
o direito a não tolerar os intolerantes. (Popper, 2012, p. 389)
Há limites críticos e éticos. O lósofo nos propõe que a liberdade de ex-
pressão deve ser ampla sempre em que houver discussões, no caso políti-
cas, no campo das ideias. Mas as discussões devem ser coerentes, críticas,
mesmo que o interlocutor com elas não concorde ou não goste. Existe espa-
ço para críticas mesmo que ostensiva. Por outro lado, inexiste campo para
o ódio, para formulações que não aceitem contraposição e extrapolem o cam-
po das ideias aceitáveis moralmente e que propaguem a violência.
Nesse passo, a democracia militante ou a democracia combativa,18
nos moldes doutrinados acima apresentados, legitima a intolerância aos in-
18 No texto os autores abordam os acontecimentos de 08 de janeiro de 2023 (invasão,
principalmente, ao Supremo Tribunal Federal) e abordam as respostas que a democracia bra-
sileira forneceu contra os intolerantes – se assim podem ser adjetivas as pessoas que atacaram
25 de 35
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
tolerantes, de modo que discursos de ódio, notadamente quando proferidos
por altos players do cenário político, utilizam do expediente para minar o sis-
tema democrático, disseminando ódio.
Oportuno, antes de concluir o presente trabalho, apresentar algumas
ponderações relacionadas à imunidade parlamentar prevista na Constituição
Federal Brasileira. Importa rememorar que a Constituição Federal de 1988
representou uma quebra de um regime autoritário, no qual parlamentares fo-
ram cassados por atos arbitrários e autoritários, sem qualquer direito ao exer-
cício do devido processo legal. Nesse passo, o constituinte originário viu-se
obrigado a garantir que os parlamentares pudessem exercer seus mandatos
livre de pressões e medos. Assim, a imunidade parlamentar restou tipicada
na Lei Fundamental.
As pressões e ameaças existentes do Brasil ditatorial não mais se fazem
presentes. Não que se defenda um judiciário ou Suprema Corte iluminista,19
mas o fenômeno jurídico não pode ignorar o fenômeno social, bem como
contexto social. Dessa forma, o Supremo Tribunal Federal em mais de uma
oportunidade reconheceu que a imunidade parlamentar não é absoluta.20
os poderes da república. Sob o olhar da democracia combativa, dizem que há necessidade
de respostas aos “atos de violência ou de ameaça voltados à destruição do governo legitima-
mente constituído” e “Essa leitura mostra-se compatível com a necessidade de proteção penal
antecipada contra atos autoritários”, concluindo da seguinte maneira: “A adequada aplicação
dos delitos que tutelam o regime democrático, interpretados à luz dos parâmetros da democra-
cia combativa, certamente produzirá mais uma indispensável contribuição do Poder Judiciário
brasileiro na superação da violência e da ameaça como métodos de constrangimento das
instituições democráticas”.
19 Barroso (2015) diz: “O problema central do acoplamento estrutural entre o sistema
político e o sistema jurídico reside no alto risco de que cada um deles deixe de operar com
base em seus próprios elementos (o Judiciário com a legalidade e a Política com a agregação
de interesses e tomada de decisões coletivas) e passe a atuar com uma lógica diversa da sua
e, consequentemente, incompreensível para as autorreferências do sistema. Essa corrupção
de códigos resulta num Judiciário que decide com base em critérios exclusivamente políticos
(politização da magistratura como a somatória dos três erros aqui referidos: parcialidade,
ilegalidade e protagonismo de substituição de papéis) e de uma política judicializada ou que
incorpora o ritmo, a lógica e a prática da decisão judiciária em detrimento da decisão política.
A tecnocracia pode reduzir a política a um exercício de formalismo judicial [...]” e conclui: o
“O juiz constitucional não está autorizado a impor as suas próprias convicções. Pautado pelo
material jurídico relevante (normas, conceitos, precedentes), pelos princípios constitucionais
e pelos valores civilizatórios, cabe-lhe interpretar o sentimento social, o espírito de seu tem-
po e o sentido da história. Com a dose certa de prudência e de ousadia”. No mesmo sentido
Barroso (2018).
20 A Leitura da Ação Originária de número leva a conclusão no sentido de que há possi-
Ferreira dos Santos / Ávila e Silva Sampaio Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o dis curso de ódio...
26 de 35
V. Conclusões
A questão objeto do estudo é complexa. Uma solução apriorística se mostra,
hoje, inalcançável. A solução legislativa se mostra intricada e cheia de per-
calços,21 além do fato de que a linguagem é polissêmica o que, em razão
da sensibilidade e completude do tema, há que se ter um cuidado legiferante
muito maior. Ao contrário de um interlocutor, não se pode inquirir ao legis-
lador o que desejou dizer com o texto (Waldron, 2003).22
A democracia possui e deve possuir valores fundamentais. Dentre eles
a liberdade de expressão, compreendida em todas as suas acepções, isto é, li-
berdade de consciência, credo, religião, entre outros. Contudo, a exterioriza-
ção do pensamento, notadamente quando seriamente ferir terceiros, minorias
ou conspirar com o sistema, deve ser obstada. A democracia não tolera lesões
ou ameaça de lesões a direitos.23 Repita-se que, ao se ler lesão, entenda-se
a dor física ou emocional.
bilidade de “Afastamento da imunidade apenas “quando claramente ausente vínculo entre o
conteúdo do ato praticado e a função pública parlamentar exercida” (Ação Ordinária 2002,
2018).
21 Verica-se atualmente (dia 02 de maio de 2023) uma “guerra” parlamentar e midiática
com relação ao projeto de lei das fake news, que trata, também, do discurso de ódio. Sequer
a votação foi realizada em vista da pressão que os parlamentares sofreram e do risco de re-
jeição do projeto, de modo que o texto foi encaminhado para as Comissões de Comunicação;
Finanças e Tributação e Constituição e Justiça e de Cidadania (Projeto de Lei n. 2630, 2020).
Não se está fazendo nenhum juízo valorativo do projeto. Objetiva-se somente demonstrar
que os temas são complexos e ainda não atingiram a maturação suciente para uma votação
parlamentar. O texto foi objeto, no senado, foi objeto de 152 Emendas (informação disponí-
vel em: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/141944) e na Câmara
objeto de 85 emendas.
22 Jeremy Waldron (2003) ensina: “No caso de um indivíduo que fala, quando as suas
palavras não são claras, perguntamos a ele o que quis dizer ou podemos consultar o que sabe-
mos dos pensamentos ou das idéias associadas à sua elocução original [...] E se a legislatura
fosse um único individuo natural, poderíamos fazer exatamente a mesma coisa. Confronta-
dos com uma decretação ambígua, chamaríamos o soberano de lado e perguntaríamos o que
quis dizer [...]. Nada disso faz sentido, porém, ou, pelo menos, nada disso faz muito sentido
evidente no caso de uma legislatura que não é um único indivíduo natural, uma legislatura
que, antes, compreende centenas de membros, com opiniões e estados mentais radialmente
diversos [...]”.
23 Há um compromisso constitucional com o acesso efetivo à justiça. Não basta mais que
seja garantido ao cidadão apenas a formulação do pedido junto ao Poder Judiciário. Faz-se
necessária uma resposta célere, efetiva e concreta. Isso foi objeto de abordagem no capítulo
27 de 35
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
Não se trata de tutelar os hipersensíveis. A liberdade de expressão, re-
pita-se, é valor fundamental. Contudo, conforme célebre doutrina de Alexy
(2008), não há direito fundamental absoluto. Devem ser respeitados o núcleo
duro ou essencial de cada direito fundamental,24 mas em razão da vagueza
e abstração que lhes são características, deve-se atuar com coerência e inte-
gridade, interpretando o ordenamento jurídico de modo harmônico e sistê-
mico, como um romance em cadeia.25
A democracia não pode car inerte às ofensas que lhe são postas, no-
tadamente em tempos de crise e discursos odiosos, que levam a violência
emocional ou física não podem ser legitimados com base na liberdade de ex-
pressão, notadamente no cenário político.
Tolerar os intolerantes não pode ser visto como democrático, assim
como não tolerar intolerantes não é antidemocrático. A democracia não acei-
2 do livro Limites da Coisa Julgada na reparação de danos a direitos individuais homogêneos
(Santos, 2019).
24 Gilmar Mendes sustenta: Da análise dos direitos individuais pode-se extrair a conclusão
direta de que direito, liberdades, poderes e garantias são passíveis de limitações ou restrição. É
preciso não perder de vista, porém, que tais restrições são limitadas. Cogita-se aqui dos cha-
mados limites imanentes ou ‘limites dos limites’ (Schranken-schranken), que balizam a ação
do legislador quando restringe direitos individuais. Esses limites, que decorrem da própria
Constituição, referem-se tanto à necessidade de proteção de um núcleo essencial do direito
fundamental quanto à clareza, determinação, generalidade e proporcionalidade das restrições
impostas” (Mendes, 2012, p. 56) Atente-se aqui que o texto trata das limitações legislativas,
as quais são, a todo efeito, aplicáveis ao Poder Judiciário.
25 Sobre integridade, coerência e a necessidade de um romance em cadeia Ronald
Dworkin diz: Uma comunidade de princípios, que vê a integridade como parte fundamental
de sua política, apresenta uma melhor defesa da legitimidade política do que os outros mode-
los. Assimila obrigações políticas à categoria geral das obrigações associativas e defendê-las
dessa maneira. Essa defesa é possível em tal comunidade porque um compromisso geral
com a integridade expressa o interesse de cada um por tudo que é sucientemente especial,
pessoal, abrangente e igualitário para fundamentar as obrigações comunitárias segundo as
normas de obrigação comunitária que aceitamos em outros contextos. [...] A integridade é a
chave para a melhor interpretação construtiva de nossas práticas jurídicas distintas e, particu-
larmente, do modo como nossos juízes decidem os casos difíceis nos tribunais. [...] Para nós, a
integridade é uma virtude ao lado da justiça, da equidade e do devido processo legal, mas isso
não signica que, em algumas das duas formas assinaladas, a integridade seja necessariamen-
te, ou sempre, superior às outras virtudes”. [...] “O juiz que aceitar a integridade pensará que
o direito que esta dene estabelece os direitos genuínos que os litigantes têm a uma decisão
dele. [...] como se o Estado tivesse uma única voz. [...] O princípio de integridade na decisão
judicia, portanto, não tem necessariamente a última palavra sobre de que modo usar o poder
de coerção do Estado. Mas tem a primeira palavra, e normalmente não há nada a acrescentar
àquilo que diz” (Dworkin, 2014, p. 260).
Ferreira dos Santos / Ávila e Silva Sampaio Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o dis curso de ódio...
28 de 35
ta o vale tudo linguístico. No mais das vezes, os discursos de ódio con-
fundem-se com a intolerância, seja religiosa, social, racista ou, no caso
abordado, política. Não se trata de fornecer uma carta branca à censura. Lon-
ge disso. A vericação do discurso de ódio, insidioso e intolerante não
de ser feito in abstrato. É necessário que seu controle seja feito casuistica-
mente, com critérios de validade e vericabilidade. De modo coerente e ín-
tegro. Há que se pensar e decidir com base no que chamam de sistema S2.26
Não se nega que a disseminação da informação, atualmente, é veloz
e seus efeitos podem ser irremediáveis. Contudo, há preços as serem pagos
na vida democrática. Compete ao operador do direito acreditar nas institui-
ções. No acesso efetivo à tutela jurisdicional, de modo célere, responsável,
íntegro e coerente. Existem juízes e bons juízes. Eles devem ser o paradigma.
A evolução social traz um aumento na responsabilidade das pessoas.
Isso deve ser incutido nos novos operadores do direito, que estão saindo
dos bancos escolares e se tornarão juízes, desembargadores e ministros.
Ao Poder Judiciário compete, ao menos hoje que não se tem uma receita
pronta – muito devido à complexidade do tema –, a tarefa de guardar a cons-
tituição e remediar o discurso de ódio. Isso é democrático. Não se pode mais
ter a democracia como um regime suicida.
Atualmente, verica-se um enfrentamento principalmente por parte
do Poder Judiciário brasileiro no que tange aos extremismos políticos e pro-
teção à democracia. Exemplos podem ser fornecidos, como as respostas pro-
feridas pela Suprema Corte com relação aos atos ocorridos em 08 de janeiro
de 2023, em que poderes da república brasileira foram atacados por extre-
mistas ou mesmo o combate a desinformação, exteriorizado pela resolução
23.735, de 27 de fevereiro de 2024, do Tribunal Superior Eleitoral, que tra-
ta dos atos ilícitos eleitorais e elenca a consumação de abuso de poder pelo
uso da internet visando promover desinformação em massa (2024). Outros
exemplos estão em tramitação no Congresso Nacional, como, por exemplo,
o já citado Projeto de Lei de n. 2630/20, denominado PL das Fake News
(2020).
Há parâmetros constitucionais para que os intolerantes não sejam tole-
rados e a estabilidade social e democrática seja mantida, os quais necessi-
26 Daniel Kahneman (2012), ao ganhar o prêmio Nobel de economia, propôs uma teoria
segundo a qual o ser humano possui duas formas de pensar, representadas pelo sistema que
denomina S1, sujeito a vieses e heurísticas cognitivas, que pode facilmente enganar e ser
enganado e o S2, reexivo, lento, que requer atenção, esforço, autocontrole.
29 de 35
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
tam de complementação legislativa que deve xar critérios para avaliação
de discursos ofensivos politicamente às democracias, sem que haja limita-
ção inconstitucional à liberdade de expressão. O Projeto de Lei 2630/20,
por exemplo, traz procedimentos de moderação de conteúdo, imposição
de autorregulação regulada e a criação de um conselho de transparência
e responsabilidade na internet, a serem exercidos por diferentes atores liga-
dos ao poder público e à iniciativa privada.
Não é objetivo deste estudo trazer uma lege ferenda ou analisar o tex-
to em tramitação legislativa. A mensagem que se pretende passar é que
o grande árbitro desse controle deve ser o Poder Judiciário, e a vedação
da liberdade de expressão deve ser exercida a posteriori, em conformidade
com pressupostos positivados principalmente nas constituições e nos trata-
dos internacionais.
Para os ns deste estudo, é incumbência do Poder Judiciário, com funda-
mento principalmente na Constituição Federal brasileira, analisar se, no ce-
nário político, o discurso tem relevância social ou econômica, o que o torna
legítimo democrática e juridicamente.
Por outro lado, se o discurso representa a exteriorização do pensamento
direcionado contra uma pessoa, classe ou grupo de pessoas, com potencial
de causar-lhes dor emocional, com conteúdo essencialmente inútil, isto é,
sem qualquer interesse público que o justique, não há espaço para sua tole-
rância, e ao Poder Judiciário incumbe, em última análise, a tutela da ordem
jurídica e a limitação da liberdade de expressão.
VI. Bibliograa
Abreu, D. A. (2022, outubro 28). Como funciona a metodologia Jurí-
dica. IDP. https://direito.idp.edu.br/idp-learning/pesquisa-juridica/
metodologia-pesquisa-juridica/
Ação Ordinária 2002 (2018). Supremo Tribunal Federal do Brasil. Rela-
tor(a): Gilmar Mendes, Segunda Turma, julgado em 02 fev. 2016 (pro-
cesso eletrônico). DJe-036, divulg. 25 fev. 2016, public. 26 fev. 2016.
https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur340265/false
Alexy, R. (2008). Teoria dos direitos fundamentais (V. A. Silva, Trad.). Ma-
lheiros Editores.
Alexy, R. (2014). Teoria discursiva do direito. Organização e tradução de
Alexandre Travessoni Gomes Tribisonno. Forense Universitária.
Ferreira dos Santos / Ávila e Silva Sampaio Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o dis curso de ódio...
30 de 35
Arguição de descumprimento de preceito fundamental - ADPF 130. (2009).
Supremo Tribunal Federal do Brasil. Relator(a): Carlos Britto, Tribu-
nal Pleno, julgado em 30/04/2009. DJe-208, Divulg. 05 nov. 2009, Pu-
blic. 06 nov. 2009, Ement. vol-02381-01. https://jurisprudencia.stf.jus.
br/pages/search/sjur169063/false
Aristóteles [384-322 a.C]. (2017). A política. Nova Fronteira.
Baptista, E. A., Hauber, G. & Orlandini, M. (2022). Despolitização e popu-
lismo. As estratégias discursivas de Trump e Bolsonaro. Media & Jorna-
lismo, 22(40), 115-119. https://doi.org/10.14195/2183-5462_40_5
Barreto Júnior, W. (2021). Bolsonaro e seus seguidores: 1.560 frases. Gera-
ção Editorial.
Barroso, L. R. (2015). A razão sem voto: o Supremo Tribunal Federal e o
governo da maioria. Revista Brasileira de Políticas Públicas, 5(espe-
cial), 23-50.
Barroso, L. R. (2018). Contramajoritário, Representativo
e Iluminista: Os papeis dos tribunais constitucionais nas democra-
cias contemporâneas. Rev. Direito Práx., 9(4), 2171-2228. https://doi.
org/10.1590/2179-8966/2017/30806
Bobbio, N. (2019). O futuro da democracia. Uma defesa às regras do jogo
(16a. ed.), Editora Paz&Terra.
Borges, A. & Cruz, A. (2023, 24 janeiro). Direito penal e a democracia com-
bativa. Estadão. https://www.estadao.com.br/opiniao/espaco-aberto/
direito-penal-e-democracia-combativa/
Brandenburg v. Ohio, 395 U.S. 444 (1969, february 27). Supreme Court Ca-
ses. First Amendment Library. https://www.there.org/supreme-court/
brandenburg-v-ohio
Butler, J. (2021). Discurso de ódio. Uma política do performativo (R. F. Vis-
cardi, Trad.). Editora Unesp.
Calcaneo Monts, M. A. (2021). Internet, redes sociales y libertad de expresión.
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucio-
nal, 1(44), 37–54. https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2021.44.16157
Callejón, F. B. (2022). La constitución del algoritmo. Etudios n. 9, Saragoza,
Serie Universidad, v. 1, Fundación Manuel Giménez Abad, 2022.
Canotilho, J. J. (2003). Direito constitucional e teoria da constituição (7a.
ed.). Almedina.
Cintra, A. C. A., Grinover, A. P. & Dinamarco, C. R. (2004). Teoria Geral do
Processo (22a. ed.). Malheiros.
31 de 35
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. (1988). Presidência
da República. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/cons-
tituicao.htm
Cornell Law School. LII – Legal Information Institute. (2021). Fight words.
https://www.law.cornell.edu/wex/ghting_words
Correia, A. (2022). Direito de resposta: tradição jurídica, conformação legal
e natureza autônoma. Revista Brasileira de Estudos Constitucionais –
RBEC, 16(50), 71-93, jul./dez.
Dahl, R. A. (2016). Sobre a democracia. Editora Universidade de Brasília.
Dallari, D. A. (2003). Elementos de teoria geral do Estado (24a. ed.).
Saraiva.
Decreto 678, de 06 de novembro de 1992. (1992). Promulga a Convenção
Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica),
de 22 de novembro de 1969. Presidência da República Federativa do
Brasil. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/anexo/
and678-92.pdf
Dikötter, F. (2022). Como ser um ditador. O culto à personalidade no século
XX (P. Diniz, Trad.). Editora Intrínseca.
Dworkin, R. (2014). O império do direito (3a. ed., J. L. Camargo, Trad.).
Martins Fontes.
Esquivel Alonso, Y. (2016). El discurso del odio en la jurisprudencia
del Tribunal Europeo de Derechos Humanos. Cuestiones Constitucio-
nales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, 1(35). https://doi.
org/10.22201/iij.24484881e.2016.35.10491
Faria, A. M. T., Silva, M. G. & Jorge, V. L. (2022). Eleições e extremismo
no Brasil: análise dos programas de governo de Haddad e Bolsonaro.
RBCS – Revista Brasileira de Ciências Sociais, 37(110), e3711008. ht-
tps://doi.org/10.1590/3711008/2022
Fernandes, B. G. (2014). Curso de Direito Constitucional (6a. ed.). Editora
Jus Podivm.
Freitas Filho, R. (2007). Estudos Jurídicos Críticos (CLS) e coerência
das decisões. Revista de Informação Legislativa, 44(175), 41-65. https://
www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/140237
Freitas Filho, R. (2009). Intervenção judicial nos contratos e aplicação dos
princípios e das cláusulas gerais: o caso do leasing. SAFE.
Freud, S. (2005). A Civilização e os seus descontentamentos. Editora Euro-
pa-América Ltda.
Ferreira dos Santos / Ávila e Silva Sampaio Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o dis curso de ódio...
32 de 35
Fuks, M., & Marques, P. (2020, 23 outubro). Afeto ou ideologia: medindo
a polarização política no Brasil? In P. H. Marques & M. Fuks (coord.),
XII Encontro da ABCP – Anais eletrônicos. Universidade Federal
da Paraíba, João Pessoa. https://www.abcp2020.sinteseeventos.com.br/
simposio/view?ID_SIMPOSIO=1
Fuks, M. & Marques, P. (2022). Polarização e contexto: medindo e expli-
cando a polarização política no Brasil. Opinião Pública, 28(3), 560-593.
https://doi.org/10.1590/1807-01912022283560
Fux, L. (2020). Nos 32 anos da Constituição, Fux diz que promessas do texto
‘ainda não foram cumpridas’. G1. (Discurso em vídeo). https://g1.glo-
bo.com/politica/noticia/2020/10/05/nos-32-anos-da-constituicao-fux-di-
z-que-promessas-do-texto-ainda-nao-foram-cumpridas.ghtml
Gard, S. W. (1980). Fighting Words as Free Speech. Washington Universi-
ty Law Review, 58(3), 531-581. https://openscholarship.wustl.edu/cgi/
viewcontent.cgi?article=2423&context=law_lawreview
Gaspari, E. (2014). O Sacerdote e o Feiticeiro. A ditadura derrotada (2a.
ed.). Intrínseca.
Habeas corpus - HC 82424. (2004). Supremo Tribunal Federal do Brasil.
Relator(a): Moreira Alves, Relator(a) p/ Acórdão: Maurício Corrêa, Tri-
bunal Pleno, julgado em 17/09/2003. DJ 19 mar.2004 PP-00024, Ement
vol-02144-03 PP-00524.
Habermas, J. (2003). Direito e democracia: entre facticidade e validade (2a.
ed. Vol. 1; F. B. Siebeneichler, Trad.). Tempo Brasileiro.
Hume, D. (2004). Investigações sobre o entendimento humano e sobre os
princípios da moral. Editora Unesp.
Huq, A. & Ginsburg, T. (2018). How to Lose a Constitutional Democracy.
65 UCLA Law Review, 78, 80-169. https://www.uclalawreview.org/wp-
-content/uploads/2019/09/Huq-Ginsburg-65-1.pdf
Ihering, R. (2020 / 1818-1892). A luta pelo direito (E. Bini, Trad.). Edipro.
Jellinek, G. (2000). Teoría general del Estado (F. Los Rios, Trad.). Fondo
de Cultura Económica.
Jugl, I., Lösel, F., Bendera, D., y King, S. (2021). Psychosocial Prevention
Programs Against Radicalization and Extremism: A Meta-Analysis
of Outcome Evaluations. The European Journal of Psychology Applied
to Legal Context, 13(1), 37-46. https://scielo.isciii.es/pdf/ejpalc/v13n1/
1889-1861-ejpalc-13-1-0037.pdf
Kahneman, D. (2012). Rápido e devagar: duas formas de pensar. Objetiva.
Laplanche, J. (2001). Vocabulário da psicanálise (4a. ed., P. Tamen Trad.).
Editora Martins Fontes.
33 de 35
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
Lawrence III, C. (1990). If he Hollers Let Him Go: Regulating Racist Spee-
ch on Campus. Duke Law Journal, 39(3), 431-483. https://scholarship.
law.duke.edu/dlj/vol39/iss3/2
Levitsky, S. & Ziblatt, D. (2018). Como as democracias morrem (R. Aguiar,
Trad.). Zahar.
Loewenstein, Karl. (1935). Autocracy versus Democracy in Europe. Ameri-
can Political Science Review, 29(5), 755-784.
Teruel Lozano, G. M. El discurso del odio como límite a la libertad de ex-
presión en el marco del Convenio Europeo. ReDCE. Año 14. Núm. 27.
Enero-Junio/2017. 81-106. https://www.ugr.es/~redce/REDCE27/PDFs/
ReDCE_27.pdf
Matsuda, M. J., Lawrence III, C. R., Delgado, R., & Crenshaw, K. W. (orgs.).
(1993). Words that Wound: Critical Race Theory, Assaultive Speech, and
the Frist Amendment. Westview Press.
Mendes, G. F. & Branco, P. G. G. (2018). Curso de Direito Constitucional
(13a. ed.). Saraiva Educação.
Mendes, G. F. (2012). Direitos fundamentais e controle de constitucionali-
dade: estudos de direito constitucional (4a. ed.). Saraiva.
Negar Holocausto não é liberdade de expressão, decide corte (2019).
Deutsche Welle. https://www.dw.com/pt-br/negar-holocausto-n%-
C3%A3o-%C3%A9-liberdade-de-express%C3%A3o-decide-corte-eu-
ropeia/a-50697201
Oreste, R. (1947). Istituzioni di diritto pubblico. Editora A. Giuffrè.
Petição 10391 AgR / DF (2022). Supremo Tribunal Federal do Brasil. Rela-
tor(a): Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, julgado em 14 nov. 2022
(Processo Eletrônico). DJe-s/n, divulg. 13 fev. 2023, public. 14 fev. 2023.
Pérez Fuentes, G. M. (2015). Dialéctica entre la libertad de expresión y los
derechos de la personalidad en la experiencia española. Cuestiones
Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, 1(33).
https://doi.org/10.1016/j.rmdc.2016.03.021
Pinheiro, B. O., Bahia, C. J., & Santos, L. F. (2022). Súmu-
las e precedentes vinculantes. Possibilidade paradoxal
de exclusão social decorrente de sua aplicação supercial. Revista Ju-
rídica Luso-Brasileira, 8(4), 673-712. https://www.cidp.pt/publicacao/
revista-juridica-lusobrasileira-ano-8-2022-n-4/279
Pontes, J. G. M. (2020). Democracia militante em tempos de crise. Lu-
men Juris.
Ferreira dos Santos / Ávila e Silva Sampaio Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o dis curso de ódio...
34 de 35
Popper, K. (2012). A Sociedade Aberta e os seus Inimigos: o sortilégio de
Platão (Vol. 1, M. F. Costa, Trad.). Edições 70.
Popper, Karl. (2013) A sociedade aberta e os seus inimigos: Hegel e Marx
(Vol. 2, M. F. Costa, Trad.). Edições 70.
Projeto de Lei n. 2630 (2020). Lei das Fake News. Senado Fede-
ral (Sen. A. Vieira). https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/
chadetramitacao?idProposicao=2256735
Rcl n. 38782. (2021). Supremo Tribunal Federal do Brasil. Relator(a): Gil-
mar Mendes, Segunda Turma, julgado em 03 nov. 2020. Processo Ele-
trônico DJe-034, divulg. 23 fev. 2021, public. 24 fev. 2021.
Resolução n. 23.735, (2024). Dispõe sobre os ilícitos eleitorais. Tribunal
Superior de Eleitoral. https://www.tse.jus.br/legislacao/compilada/
res/2024/resolucao-no-23-735-de-27-de-fevereiro-de-2024.
Rijpkema, B. (2018). Militant Democracy: The limits of Democratic Tole-
rance. Routledge.
Rodrigues, H. W., y Grubba, L. S. (2023). Pesquisa Juídica Aplicada.
Habitus.
Sandoval Vargas, G., y Zárate Castillo, A. (2022). Sánchez Muñoz, Óscar,
La regulación de las campañas electorales en la era digital. Desinforma-
ción y microsegmentación en las redes sociales con nes electorales,
Madrid, Universidad de Valladolid-Centro de Estudios Políticos y Cons-
titucionales, 2020, 347 pp. Cuestiones Constitucionales. Revista Mexica-
na de Derecho Constitucional, 1(45), 537-547. https://doi.org/10.22201/
iij.24484881e.2021.45.16677
Santos, L. F. F. (2019). Limites da coisa julgada na reparação de danos a
direitos individuais homogêneos. Lumen Juris.
Sarlet, I. W. (2020). O Tribunal Constitucional da Alemanha e o discurso
de ódio na internet. Conjur. https://www.conjur.com.br/2020-jul-20/di-
reitos-fundamentais-tribunal-constitucional-alemanha-discurso-odio-in-
ternet
Sarmento, D. (2006). Liberdade de expressão e o problema do “Hate Spee-
ch”. RDE - Revista de Direito do Estado, 4, 53-106. https://professor.
pucgoias.edu.br/SiteDocente/admin/arquivosUpload/4888/material/a-
-liberdade-de-expressao-e-o-problema-do-hate-speech-daniel-sarmen-
to.pdf
Schumpeter, J. A. (1961). Capitalismo, Socialismo e Democracia (R. Jung-
mann, Trad.). Fondo de Cultura Económica.
35 de 35
Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana de Derecho Constitucional, vol. 26, núm. 52, 2025, e19196
e-ISSN: 2448-4881
DOI: https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Reconocimiento-NoComercial 4.0 Internacional
Silva, J. A. (1988). O Estado Democrático de Direito. Revista de Direito
Administrativo, (173), 15-34, jul/set. https://periodicos.fgv.br/rda/article/
download/45920/44126/91434
Silva, J. A. (2017). Curso de Direito Constitucional Positivo (40a. ed.).
Malheiros.
Streck, L. L., y Morais, J. L. B. (2013). Estado Democrático de Direito. In J.
Canotilho & J. J. Gomes (Eds), Comentários à Constituição do Brasil.
Saraiva/Almedina.
Terminiello v. Chicago (1949). Supreme Court (argued Feb. 1, 1949, decided
May 16, 1949). https://www.law.cornell.edu/supremecourt/text/337/1
Texas, Petitioner v. Gregory Lee Johnson (1989). Supreme Court (argued
mar. 21, 1989, Decided June 21, 1989). https://www.law.cornell.edu/
supremecourt/text/491/397
Vieira, O. V., & Borges, A. (2023, 16 fevereiro). Democracia militante
e a quadratura do círculo. Jota. https://www.jota.info/opiniao-e-analise/
artigos/democracia-militante-e-a-quadratura-do-circulo-16022023
Vieira, O. V. (2007). A desigualdade e a subversão do Estado de Direito. SUR
– Revista Internacional de Direitos Humanos, (6), ano 04.
Waldron, J. (2003). A dignidade da legislação (L. C. Borges, Trad.). Martins
Fontes.
Cómo citar
Sistema IIJ
Ferreira dos Santos, Luiz Felipe, y Ávila e Silva Sampaio, Marília de,
“Democracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o discurso
de ódio no cenário político”, Cuestiones Constitucionales. Revista Mexi-
cana de Derecho Constitucional, México, vol. 26, núm. 52, enero-junio
de 2025, e19196. https://doi.org/10.22201/iij.24484881e.2025.52.19196
APA
Ferreira dos Santos, L. F., y Ávila e Silva Sampaio, M. (2025). Demo-
cracia e seus inimigos: a liberdade de expressão e o discurso de ódio
no cenário político. Cuestiones Constitucionales. Revista Mexicana
de Derecho Constitucional, 26(52), e19196. https://doi.org/10.22201/
iij.24484881e.2025.52.19196
ResearchGate has not been able to resolve any citations for this publication.
Article
Full-text available
RESUMO: O presente artigo analisa as eleições presidenciais de 2018 no Brasil por meio da utilização da metodologia desenvolvida pelo Comparative Manifesto Project (CMP-Marpor), conciliando abordagens teóricas e empíricas sobre extremismo. O estudo indaga sobre quais conteúdos indicam que a eleição de 2018 foi polarizada e podem ser considerados marcadores de posicionamentos políticos extremistas. Na análise qualitativa dos programas de governo dos candidatos Fernando Haddad (PT) e Jair Bolsonaro (PSL) que disputaram o segundo turno, adotamos a definição de polarização para verificar se: há dissenso entre os candidatos quanto à interpretação dos problemas brasileiros; as perspectivas dos candidatos são inconciliáveis; e se algum dos candidatos questiona o sistema político e as regras do jogo. Ao final, demonstramos que Bolsonaro foi um candidato de extrema-direita, enquanto Haddad foi um candidato de esquerda, porém não um extremista. Sendo assim, concluímos que a eleição de 2018 é um exemplo de extremismo, que em contexto de sucesso eleitoral, abre espaço para tendências que reforçam assimetrias na cena política nacional.
Article
Full-text available
Este artigo analisa se estão em curso, no Brasil, a polarização afetiva e (ou) a polarização ideológica, quais são as suas características e se elas estão dispersas ou concentradas em determinados grupos na sociedade brasileira. A pesquisa utiliza dados do Eseb (2002-2018) e do Lapop (2010-2019). Os resultados indicam que: 1) há um aumento da polarização, mas ela é predominantemente afetiva e mais intensa em relação aos candidatos; 2) embora já se observe alguns indícios em 2014, a polarização afetiva é bem mais visível em 2018; 3) no que diz respeito à ideologia, há uma polarização assimétrica, com o crescimento e a radicalização da direita. Diante dessas evidências, conclui-se que as características específicas da polarização brasileira estão relacionadas a aspectos do contexto político do país, tanto os de longa duração (como a reduzida base social dos partidos) quanto os mais recentes (como a reorganização da direita e a moderação do PT). Em comum com outros países, observa-se a concentração da polarização em indivíduos politicamente engajados. Palavras-chave: polarização afetiva; polarização ideológica; contexto; Brasil Introdução Nos Estados Unidos, país de origem da maioria dos estudos sobre polarização política, há consenso de que as elites políticas estão, cada vez mais, ideologicamente polarizadas (Poole; Rosenthal, 2001). Em relação ao público em geral, as conclusões têm sido bem menos consensuais. Há uma divisão entre os autores que negam a existência de uma polarização (Fiorina; Abrams; Pope, 2006; Fiorina; Abrams, 2008), os que afirmam que está em curso uma polarização ideológica (Abramowitz; Saunders, 2008; Abramowitz, 2010) e aqueles que apontam, fundamentalmente, a existência da polarização afetiva (Iyengar; Sood; Lelkes, 2012; Mason, 2018). Apesar das conclusões dissonantes, sabe-se bem mais sobre a polarização entre os eleitores estadunidenses atualmente do que se sabia há vinte anos.
Article
Full-text available
El texto expone y explica las implicaciones que para la libertad de expresión tiene el surgimiento de la regulación proveniente de las empresas de redes sociales. Lo que adquiere relevancia ante la implosión del Internet y su concentración en algunas redes sociales, que en esa medida controlan la libertad de expresión en línea de sus millones de usuarios alrededor del mundo. La regulación de la libertad de expresión en el siglo XXI es un triángulo, donde los sujetos están sometidos a la normatividad estatal propia del siglo XX y a las reglas de las empresas de redes sociales. Es un cambio en los cimientos de la libertad de expresión, que requiere de una amplia reflexión sobre su significado, alcances y los ajustes jurídicos requeridos, donde cobra importancia la propuesta de aplicar el derecho internacional de los derechos humanos a la regulación empresarial de la libertad de expresión en Internet.
Article
Full-text available
Politically, religiously, and otherwise motivated radicalization and violent extremism is a topic of high priority in many countries. Therefore, beyond intelligence and police measures, there is a strong increase of psychosocial prevention programs in this field. However, little is known about their effectiveness. We aimed to fill this research gap by conducting a systematic international review and meta-analysis of outcome evaluations. We screened about 14,000 reports on the topic of extremism prevention, but in spite of broad criteria of eligibility, we only found nine more or less well-controlled outcome evaluations from seven countries. Six programs addressed religious/ethnic extremism, one targeted nationalist/separatist extremism, and one different types of extremism. Most evaluations had a quasi-experimental pre-post design, only one contained a randomized controlled trial (RCT). Overall, programs had a significant mean positive effect on behavioral and psychosocial outcomes related to extremism (d = 0.50, SE = 0.12). Regarding the specific effects of the programs on psychosocial aspects such as for example extremist attitudes alone, we found similar results (d = 0.56, SE = 0.11). We found stronger effects for programs with target groups from mixed ethnic backgrounds and approaches addressing both at-risk individuals and participants from the general population. Despite these promising results, the low internal validity of most evaluations and small number of eligible studies limit generalization. More high-quality evaluations are clearly needed. These would help to allocate resources in an evidence-oriented manner and provide a better understanding of the mechanisms of successfully preventing radicalization and violent extremism.
Article
Full-text available
The primary purpose of this Article is to examine the roles of constitutional courts in contemporary democracies. It aims to demonstrate that such courts perform, in addition to the counter-majoritarian role traditionally recognized in constitutional theory, two other roles: representative and, occasionally, enlightened. In the construction of the argument, the essay analyzes the phenomena of the judicialization of politics and judicial activism, as well as the issue of the difficult demarcation of the border between law and politics in the complex and plural societies of today. Although it presents several examples of the constitutional experience of the United States, the Article’s conclusions are generalizable, looking at the roles of constitutional courts from the perspective of a global constitutionalism whose categories have become common practice in the democracies of the world.
Article
Full-text available
In general terms hate speech encompass all those expressions considered dangerous for the stability of democratic systems. Among them we can find hatred offenses based on social class, gender, skin color, sexual orientation or ethnicity. The legal protection of these expressions continues to generate interesting discussions among several constitutional and supranational courts. It is for that reason that our article seeks to explain some of the main legal criteria that ECHR has adopted about this topic.
Article
1. Democracia e Estado de Direito. 2. Estado liberal de Direito. 3. Estadosocial de Direito. 4. O Estado democrático. 5. Caracterização do Estadodemocrático de Direito. 6. A lei no Estado democrático de Direito. Z Osprincipios do Estado democrático de Direito. 8. Tarefa fundamental doEstado democrático de Direito.