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Música Hodie | ISSN: 2317-6776 DOI: 10.5216/mh.v23.78735
Música Hodie. 2024, v.24, e.78735
A música e os corpos que (não) importam:
reações na música popular a massacres
perpetrados pelo estado
Music and the bodies that (do not) matter: popular
music reactions to state massacres
Letícia Porto Ribeiro
Universidade Federal do Acre (Ufac), Rio Branco, Acre, Brasil
letcello@yahoo.com.br
Marcello Messina
Southern Federal University (SFEDU), Rússia
messina@sfedu.ru
Resumo: Neste artigo, buscamos analisar a reação da música enga-
jada a massacres perpetrados pelo Estado e as maneiras pelas quais
a indignação popular e a criação musical dialogam na rememoração
desses massacres. Tentaremos evidenciar o envolvimento entre os
compositores e suas respectivas realidades sociais e políticas, as-
sim como buscar as formas com as quais a música pôde estabele-
cer uma interação dentro de seu contexto social. Para isso, o artigo
aborda três massacres: o Massacre de Puerto Montt, no Chile; o do
Carandiru e o de Eldorado dos Carajás, no Brasil, representados pe-
las canções Preguntas por Puerto Montt, de Victor Jara, Diário de um
Detento, do grupo de rap Racionais MC’s e Eldorado dos Carajás, do
grupo de rap Manos da Baixada de Grosso Calibre.
Palavras-chave: canção engajada; massacres estatais; racialização.
Abstract: In this article, we seek to analyze the reaction of
politically engaged music to massacres perpetrated by the State
and how popular indignation and musical creation interact with
the remembrance of these massacres. We will try to highlight
the involvement between the composers and their respective
social and political realities, as well as look at how music could
establish an interaction within its social context. For this, the
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article discusses three massacres: the Massacre of Puerto Montt,
in Chile, the Massacre of Carandiru, and the Massacre of Eldorado
dos Carajás, in Brazil, represented by the songs Preguntas por
Puerto Montt, by Victor Jara, Diário de um Detento, by rap group
Racionais MC’s and Eldorado dos Carajás, by rap group Manos da
Baixada de Grosso Calibre
Keywords: engaged song; state massacres; racialization
Submetido em: 12 de março de 2024
Aceito em: 11 de abril de 2024
Publicado em: setembro de 2024
Música Hodie. 2024, v.24, e.78735
A música e os corpos que (não) importam: reações na música popular...
Letícia Porto Ribeiro . Marcello Messina
1. Introdução
Neste artigo, buscamos analisar a reação da música engajada
a massacres perpetrados pelo Estado e as maneiras pelas quais a
indignação popular e a criação musical dialogam na rememoração
desses massacres. Tentaremos evidenciar o envolvimento entre
os compositores e suas respectivas realidades sociais e políticas,
assim como buscar as formas com as quais a música pôde estabe-
lecer uma interação dentro de seu contexto social. Para isso, o ar-
tigo aborda três massacres: o Massacre de Puerto Montt, no Chile,
o Massacre do Carandiru e o Massacre de Eldorado dos Carajás,
no Brasil, representados pelas canções Preguntas por Puerto Montt,
do cantautor1 Victor Jara, Diário de um Detento, do grupo de rap
Racionais MC’s e Eldorado dos Carajás (também veiculada com o
nome Sem justiça não existe paz), do grupo de rap Manos da Baixada
de Grosso Calibre (MBGC).
A expressão “corpos que importam” foi emprestada de Judith
Butler (1993), e aqui se refere a corpos comumente esquecidos/
invisíveis ou mesmo repudiados na sociedade: negros, pobres,
sem-teto, sem-terra, presos, racializados. Denise Ferreira da Silva
(2014) fala do “arcabouço da racialidade” (Silva, 2014, p. 70) como
base da ação do Estado em suas intervenções em comunidades
“periféricas”. A racialidade é descrita como “o arcabouço ontoepis-
temológico constituído pelos conceitos do racial e do cultural e de
seus signicantes”, ou seja, “aqueles que produzem pessoas e en-
tidades (ético-jurídicas) não compreendidas pela universalidade”
(Silva, 2014, p. 70). A partir dessa universalidade, como fonte de
razão e autodeterminação de matriz europeia, se estabelece uma
necessitas que legitima e autoriza o uso da violência sobre sujeitos
racializados:
Meu mapeamento da racialidade revela como esse arca-
bouço político-simbólico que recongura um efeito-poder
da necessitas (formalização) produz os “outros em relação
1 Interpretamos aqui “cantautor” como aquele que compõe e interpreta sua própria música, tendo esta, geralmente, conteúdo
social e/ou político.
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à Europa” em situação de afetabilidade, sujeitos que não
atuam na moralidade objetiva. Nele, os outros em relação
à Europa habitam sozinhos os domínios da necessitas, com-
pletamente sujeitados ao poder limitador/regulador que
produz e determina as partes e movimentos dos seus cor-
pos, assim respondendo pela qualidade inferior de suas
mentes, o que é signicado nos modos de existência que
se desenvolvem em seus territórios (Silva, 2014, p. 91-92).
Nesses casos, a necessitas é usada como justicativa para a
decisão de matar algumas pessoas com o pretexto da autopre-
servação do Estado. Nos três casos, a busca das autoridades em
justicarem seus atos culpando as vítimas causou o aumento da
indignação popular.
Para Marcos Napolitano (2001, p. 29), a arte engajada se de-
ne “a partir do empenho do artista em prol de uma causa ampla,
coletiva e ancorada em ‘imperativo moral e ético’ que acaba de-
sembocando na política, mas não parte dela”, ou seja, busca re-
presentar a vontade e as lutas de um coletivo social, constituído de
ideias e valores comuns. Dessa forma, as canções aqui abordadas
se enquadram em um perl de denúncia coletiva, já que criticam
a forma em que o Estado – ou as autoridades que o representam
– enfrenta determinadas questões justicando o uso da violência
contra determinados grupos sociais.
As três canções nomearam os sujeitos considerados como res-
ponsáveis pela violência, e tiveram grande repercussão, ecoando
até os dias atuais: em quase todas as páginas eletrônicas pesqui-
sadas sobre o Massacre de Puerto Montt havia referências à can-
ção de Victor Jara, enquanto o rap Diário de um Detento alavancou
a carreira do grupo Racionais MC’s e marcou época, como arma
Marcelo Rubens Paiva (2001), despertando a consciência e a in-
dignação de milhares de jovens às condições e tratamento dados
a pessoas que não haviam ainda sido condenadas pela justiça2.
Por m, Eldorado dos Carajás fez parte do CD “Um canto pela paz”,
2 PARA PM, réus do Carandiru não cometeram falhas. Carta Capital, 10 abr. 2014. Disponível em: https://www.cartacapital.com.
br/politica/para-pm-reus-do-carandiru-nao-cometeram-faltas-1750/. Acesso em: 22 abr. 2024.
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do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra, sendo que a música
no YouTube conta com cerca de 1400 visualizações3 em um link, e
1200 em outro4.
Outro aspecto de fundamental importância para a análise des-
tas canções, é o papel delas no contexto da formação e da preser-
vação da memória histórica sobre os eventos, que funcione como
criador de “comunidades mnemônicas” (Cappelletto, 2003, p. 243)
e que estabeleça uma dimensão pública e compartilhada da lem-
brança desses massacres. Neste contexto, a função da canção po-
pular — com os seus múltiplos gêneros — é fundamental em vários
sentidos. Em primeiro lugar, o cantautor, ou rapper, assume o papel
ritual de contador de histórias, de “narrador” benjaminiano,5 cuja
tarefa é utilizar tanto a própria experiência pessoal, quanto as in-
formações à sua disposição, para “dar conselhos” (Benjamin, 1987,
p. 200) e transmitir “sabedoria” (Benjamin, 1987, p. 200) para uma
comunidade. Ao longo desse trabalho, veremos que todos os três
artistas/grupos analisados têm certo grau de pertença, envolvimen-
to ou proximidade (tanto em termos espaciais quanto temporais)
à comunidade que sofreu o massacre — o exemplo mais evidente
sendo representado pelo rapper Mano Brown dos Racionais MC’s,
que visitou a Casa de Detenção do Carandiru e encontrou lá um
sobrevivente do massacre, Jocenir Prado, com o qual co-autorou a
canção Diário de um detento. Em segundo lugar, o cantautor/rapper/
narrador é o agente de uma transformação das memórias pessoais
em relatos históricos (Bloch, 1995; Cappelletto, 2003). Um terceiro
elemento, conforme os estudos de Cappelletto (2003), tem a ver
com a descrição visual dos massacres, que facilita essa transição da
dimensão pessoal àquela coletiva, e que com certeza é um aspecto
fundamental das três canções analisadas aqui.
3 ELDORADO dos Carajás. MBGC. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=c4U7iopS0RM. Acesso em: 10 maio 2024.
4SEM JUSTIÇA não existe paz. MBGC. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=eACRhof51YQ. Acesso em: 10 maio
2024.
5 Ver Benjamin (1987). Sobre o cantautor como narrador, ou contador de histórias, ver também Sobol (2008).
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2. Victor Jara e o Massacre de Puerto Montt
Luiz Alberto Moniz Bandeira (2008) arma que as cidades chi-
lenas, no começo da década de 1960, passavam por um período de
intenso crescimento devido ao êxodo rural. Na cidade de Puerto
Montt, esse movimento foi intensicado devido ao terremoto de
1960 e à seca de 1968, que ocasionou tomadas de terrenos para
alocar os sem-teto e os camponeses. As famílias se instalaram às
margens das cidades, formando as poblaciones callampas. A ques-
tão social se agravou porque o governo de Eduardo Frei (1964-
1970) não obteve sucesso em resolver a questão do desemprego.
Durante a década de 1960, também se popularizou o movi-
mento da Nueva Canción Chilena, que aliava o resgate do folclo-
re ao protesto político e social, como arma Schmiedecke (2015),
abordando questões como a Reforma Agrária e a situação dos tra-
balhadores, instigando a população para a luta por um país mais
igualitário. Nesse contexto, foi criada a población de Pampa Irigoin,
na cidade de Puerto Montt: ocupada em 4 de março de 1969 por
cerca de 90 famílias, assessoradas pelo deputado socialista Luis
Espinoza. Na manhã de 9 de março, por ordens do Ministro do
Interior Edmundo Pérez Zujovic, aproximadamente 200 carabine-
ros atacaram a población, apesar da garantia dada no dia anterior
de que estivessem tranquilos e que tudo seria solucionado:
El día anterior, el sábado 8 de marzo, el mismo mayor Rolando
Rodríguez, acudió dos veces a conversar con los habitantes
de la toma. En la segunda oportunidad lo hizo acompañado
por el regidor y recién electo diputado socialista Luis Espinoza
Villalobos. Entre ambos les anunciaron que al día siguiente
los empadronarían y les pidieron que estuvieran tranquilos,
asegurándoles que el problema de la toma se solucionaría
(Salvo, 2019).
As casas foram incendiadas, dezenas de pessoas foram feridas
e 10 pessoas foram mortas (constando entre elas um bebê que
faleceu asxiado devido às bombas de gás lacrimogêneo), como
lembra a matéria de Manuel Salvo (2019).
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Os funerais ocorreram dois dias depois do ataque, em meio
a um clima de indignação popular que cresceu devido à versão
do governo de que os ocupantes teriam atacado primeiro os po-
liciais com pedras, e diversos protestos foram organizados. A
canção de Víctor Jara, Preguntas por Puerto Montt, foi composta
alguns dias depois do massacre e alcançou grande popularidade:
ela “ressoava na multidão quando ele a interpretava nos protes-
tos” (Román, 2014, p. 305).
Na música, que é composta somente de duas estrofes e re-
frão, a introdução melódica ao violão é seguida por um acompa-
nhamento dedilhado para a primeira estrofe, enquanto no refrão
toma lugar uma batida mais agressiva.
Na primeira estrofe, Jara denuncia o ataque-surpresa feito
pelos carabineiros contra os habitantes em sua luta legítima pelo
direito à terra. Enquanto as estrofes são mais faladas que canta-
das, no refrão Jara vai gradualmente subindo a altura do canto.
Quem deve responder pelas mortes imperdoáveis, arma o pró-
prio Jara, é o ministro Pérez Zujovic – e, neste ponto da música,
a voz de Jara adquire um tom diferente que, aliado à interpreta-
ção falada que marca as estrofes, pode ser interpretado como
uma pergunta direta ao ministro. Tatit (1995, p. 131) arma que
“a canção popular é produzida na intersecção da música com a
língua natural. Valendo-se de leis musicais para sua estabilização
sonora, a canção não pode, de outra parte, prescindir do modo
de produção da linguagem oral”, sendo que estudar a canção é
estudar o entremeio entre a linguagem natural e articial. Para
Tatit (1995), a linguagem musical seria uma forma de perenizar
a entoação oral por meio das alturas, ritmos, melodias e outros
aspectos dessa linguagem:
Mantendo aspectos do modo de produção oral, com seus
efeitos de naturalidade e presenticação enunciativa, e
assimilando, simultaneamente, as formas de conserva-
ção sonora da linguagem musical, a canção desempenha
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um papel cultural privilegiado na medida em que promo-
ve continuamente a perenização do instante enunciativo
(Tatit, 1995, p. 134).
Tatit (1995) ainda se refere aos estilos de cantar, que podem
ser mais entoados melodicamente ou mais falados. Essa diferen-
ça, certamente, também tem ligação com a expressão que o can-
tor deseja transmitir com sua interpretação e Preguntas por Puerto
Montt é um exemplo de uma interpretação que seria mais falada
do que melodicamente entoada, expondo, mesmo, um desao ao
autor do massacre, e que contrasta com a amplitude dos interva-
los melódicos utilizados quando Jara canta o refrão.
Muy bien, voy a preguntar/ Por ti, por ti, por aquel/ Por ti
que quedaste solo/ Y el que murió sin saber// Murió sin
saber porqué/ Le acribillaban el pecho/ Luchando por el
derecho/ Y un suelo para vivir// ¡Ay! Qué ser más infeliz/
El que mandó disparar/ Sabiendo como evitar/ Una
matanza tan vil/ Puerto Montt, oh, Puerto Montt/ Puerto
Montt, oh, Puerto Montt// Usted debe responder/ Señor
Pérez Zujovic/ Porqué al pueblo indefenso/ Contestaron
con fusil// Señor Pérez su conciencia/ La enterró en un
ataúd/ Y no limpiarán sus manos/ Toda la lluvia del sur6
(Preguntas, 1969).
Figura 1 – notas e ritmos repetidos em registro médio que marcam a
intepretação mais falada de Jara nas estrofes
Fonte 1: Acevedo, 2016, p. 155.
A canção de Jara é citada no livro de Bandeira (2008), A fórmula
para o caos, que trata da ascensão do governo da Unidad Popular
no Chile até o golpe militar. Em outras palavras, trata-se de uma
6 JARA, Victor. Preguntas por Puerto Montt. Disponível em: https://www.letras.com/victor-jara/671604/. Acesso em: 10 maio 2024.
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canção que alcançou uma relevância signicativa no contexto polí-
tico e cultural que levou à eleição de Salvador Allende a presidente
do país em 1970.
A imagem abaixo, veiculada pelo jornal Punto Final em 1969,
mostra o velório das vítimas do massacre.
Figura 2 – Velório das vítimas do massacre de Puerto Montt, 1969
Fonte: Punto Final, 1969.
3. Racionais MC’s e o Massacre do Carandiru
O Massacre da Casa de Detenção de São Paulo, conhecida como
Carandiru, ainda é viva na memória de grande parte dos brasileiros,
isso porque, além de relativamente recente (1992), até hoje ques-
tões relativas ao julgamento e condenação dos envolvidos são ex-
postas na mídia. Em 2022, vários sites de notícias lembraram o mas-
sacre, como o G17, o Brasil de Fato8, o UOL9, o Núcleo de Estudos
7 VEIGA, Edison. Massacre do Carandiru: 30 anos da maior chacina numa prisão brasileira. G1. Política. 02 de out. 2022.
Disponível em: https://g1.globo.com/politica/noticia/2022/10/02/massacre-do-carandiru-30-anos-da-maior-chacina-numa-
prisao-brasileira.ghtml. Acesso em: 15 nov. 2022.
8 NATAL, Ariadne; ALVAREZ, Marcos César; JESUS, Maria Gorete de. Carandiru: 30 anos do massacre que ainda não acabou.
Brasil de Fato. Opinião. 30 de set. de 2022. Disponível em: https://www.brasildefato.com.br/2022/09/30/carandiru-30-anos-do-
massacre-que-ainda-nao-acabou. Acesso em: 14 maio 2024.
9 SAKAMOTO, Leonardo. Com Fleury, morre outra chance de fazer justiça pelo Massacre do Carandiru. UOL. 15 de nov. de 2022.
Disponível em: https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2022/11/15/com-eury-morre-outra-chance-de-fazer-
justica-pelo-massacre-do-carandiru.htm. Acesso em: 15 maio 2022.
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de Violência da USP (NEV)10, e o site Consultor Jurídico, que aborda,
exatamente, o fato de haver condenados mas não punidos11.
No dia 2 de outubro de 1992, dois detentos do Pavilhão Nove
da Casa de Detenção iniciaram uma discussão que deu início a um
motim. A Polícia Militar foi chamada e invadiu o local, causando a
morte de 111 presos, dos quais 84 ainda não haviam sido conde-
nados. É importante citar a declaração de Oswaldo Negrini Neto
(2001), perito que escreveu o laudo do massacre, que desmente
armações da imprensa que buscava deteriorar a imagem dos
presos, de forma a “justicar” as mortes:
Espalhou-se aos quatro cantos, na época – e até hoje mui-
tos ainda acreditam – que os presos do Pavilhão Nove
eram perigosíssimos [...]. Esta versão ganhou as ruas,
grande parte da população a adotou e alçaram os policiais
a heróis. A verdade é bem outra: no Pavilhão Nove, na épo-
ca, só entravam presos de primeira condenação – ou seja,
primários –, por qualquer crime: furto simples, roubo, trá-
co, estelionato, tentativa de homicídio, pensão alimentí-
cia, homicídio e outros – que não tinham direito a prisão
especial. […] só quem esteve lá dentro e viu as pilhas de
cadáveres no saguão do Primeiro Pavimento e a cachoeira
de sangue nas escadas, pode entender o terror que repre-
senta uma cena como essa, que desperta sentimentos que
nem o mais perfeito escritor ou diretor de cinema é capaz
de transmitir (Negrini Neto, 2001).
Um sobrevivente armou que os detentos não resistiram à en-
trada dos policiais, com transcrito pela reportagem de Elaine Cruz
(2016): “Houve mesmo o massacre. A alegação era de que havia
pessoas [detentos] armadas, que algum de nós estariam armados
lá dentro. Mas não tinha ninguém com armas. [...] os que foram
mortos, todos [estavam] despidos”. O relato coincide com a versão
10 28 ANOS do Massacre do Carandiru. Núcleo de Estudos da violência. NEV. Notícias, Prisão, Punição. 03 out. 2020. https://
nev.prp.usp.br/noticias/28-anos-do-massacre-do-carandiru/. Acesso em: 15 maio 2024.
11 VITAL, Danilo. Massacre do Carandiru completa 30 anos com penas de PMs em discussão. Consultor Jurídico. 02 out. 2022.
Disponível em: https://www.conjur.com.br/2022-out-02/massacre-carandiru-completa-30-anos-denicao-criminal/. Acesso em:
15 maio 2024.
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do médico Drauzio Varella, que trabalhou no Carandiru, e para
quem a “violência da ação não deu chance para a defesa” (Varella,
1999 apud Crema e Ferrari, 2018, p. 94), e com o texto do perito
Negrini (2012): “A perícia comprovou que nas paredes de várias
celas existiam vestígios de tiros a partir da soleira da porta, rajadas
de metralhadora dirigidas para o chão, como se apontassem para
presos ajoelhados ou acuados”.
Armas pesadas, como fuzis, foram usadas na ação policial,
como arma o jornalista Edison Veiga (2022): “Evidências poste-
riores conrmaram que presos foram fuzilados com armas como
fuzis AR-15 e submetralhadoras HK e Beretta. Não raras vezes,
aquele dia é lembrado como o ápice da falência do sistema pri-
sional brasileiro”. Após o massacre, arma o jornalista, o sistema
prisional brasileiro foi repensado.
Cinco anos depois do massacre, o grupo Racionais MC’s lançou
a música e o videoclipe Diário de um Detento, na qual se constrói
uma narrativa a respeito da vida dos prisioneiros e dos momen-
tos do massacre. Como mencionado acima, os autores da canção,
Jocenir e Mano Brown, se conheceram no Carandiru enquanto
Jocenir cumpria pena, e Mano Brown compôs a música baseando-
-se em suas experiências e nos relatos de sobreviventes, de acor-
do com a reportagem de Fernando Oliva (1998): “Brown tinha ido
ao Carandiru participar de um jogo de futebol quando o deten-
to [Jocenir] lhe entregou a letra [de Diário de um detento], depois
acrescida de outras histórias que o rapper recolheu de cartas en-
viadas por presos”.
O grupo Racionais MC’s é um dos mais importantes do cenário
do rap brasileiro, e contribuiu para que o gênero se disseminasse
no Brasil, como uma forma de dar voz às classes menos favoreci-
das e periféricas.
É consenso que, no caso brasileiro, o grupo Racionais
MC’s foi aquele que mais inuiu na constituição da tra-
dição do rap nacional, cujo traço marcante é o grito-de-
núncia do conjunto de espoliações que negros e pobres
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sofrem cotidianamente nas cidades. Considerado por
muitos a voz dos periféricos do Brasil, o Racionais al-
cançou todas as regiões do país e, numa forma estética
apurada, criticou a violência que permeia a sociedade
brasileira (Loureiro, 2016, p. 237).
Diário de um detento aborda tanto as questões relativas às con-
dições dos presos na Casa de Detenção e ao seu cotidiano quanto
os momentos do massacre de 1992. A narrativa do rap, que não
possui refrão e tem uma batida constante, interrompida somente
por algumas intervenções instrumentais, se inicia um dia antes do
massacre: o compositor conta como são as pessoas e a vida na
casa de detenção. As notas agudas tocadas no piano, as primeiras
ouvidas na canção após a introdução do diário do detento, e as úl-
timas a silenciarem marcam a tensão da música e do detento, que
se mantém até o nal do rap.
A letra, antes de narrar o massacre, conta a rotina dos pre-
sos, seus valores, a quantidade de detentos (“9 pavilhões, 7 mil
homens, que custam 300 reais por mês cada”), suas relações, suas
esperanças (“Eu quero mudar, eu quero sair”), o fato de terem to-
dos uma história que os levou até ali:
Cada detento uma mãe, uma crença, cada crime uma sen-
tença. Cada sentença um motivo, uma história de lágrima,
sangue, vidas inglórias, abandono, miséria, ódio, sofrimen-
to, desprezo, desilusão, ação do tempo. Misture bem essa
química, pronto, eis um novo detento (Diário [...], 1997).
Além de a gura materna ser lembrada nesses versos, é lem-
brada, também, nos conitos entre os presos e no momento da
chacina: “Ratatatá, preciso evitar que um safado faça a minha mãe
chorar; e Fleury foi almoçar, que se foda a minha mãe” (Diário [...],
1997). A mulher é normalmente a gura que visita os presos, prin-
cipalmente mães, irmãs, lhas e esposas12 – sendo elas e demais
12 DIOGO, Darcianne. Conheça a dura rotina de mulheres, mães e lhas que têm parentes presos. Correio Brasiliense,
29 set. 2019. Cidades. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/cidades/2019/09/29/interna_
cidadesdf,792226/conheca-a-dura-rotina-de-mulheres-maes-e-lhas-que-tem-parentes-pres.shtml. Acesso em: 13 nov. 2022.
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A música e os corpos que (não) importam: reações na música popular...
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familiares tratados muitas vezes pela sociedade como criminosos:
“não só os encarcerados ou egressos sofrem preconceito ou são es-
tigmatizados: a sociedade estende aos familiares a discriminação
dirigida ao preso e, dessa forma, todos compartilham o descrédito
social” (Junqueira, Souza, Lima, 2015, p. 77). Certamente há, tam-
bém, a preocupação com a mãe e em não causar mais dores a ela
após a prisão. Mas, devido a questões de complexidade e extensão,
a relação preso com a mãe deve ser explorada em outro artigo.
A música lembra uma das características dos presos: “Uma
maioria de moleque primário”. De acordo com Crema e Ferrari
(2018), o Pavilhão 9 era onde cavam os réus primários: “os que não
tinham antecedentes criminais e não possuíam nenhum registro de
passagem pelo sistema prisional” (Crema; Ferrari, 2018, p. 93).
Os trechos “Sangue jorra como água”, “Fleury e sua gangue vão
nadar em uma piscina de sangue” evocam a cachoeira de sangue
que descia as escadas descrita pelo perito: O perito Osvaldo Negrini
Neto, responsável por examinar o Pavilhão 9 após o Massacre do
Carandiru, em 1992, disse no Tribunal Criminal da Barra Funda,
em São Paulo, que “sangue escorria pelas escadas”13, assim como
a piscina de sangue vista em fotos da casa de detenção, como tam-
bém armam que os presos estavam desarmados (“sem padre,
sem repórter / sem arma, sem socorro”). Algumas descrições de
Negrini Neto, transcritas em reportagem de 199714, mostram um
cenário aterrorizante:
“No térreo, o perito registrou barricadas, focos de incên-
dio no chão e objetos queimados. ‘Nesse pavimento, eu
falei para o meu fotógrafo que tudo aquilo era importante
registrar, mas, pelo visto, o importante mesmo estava no
andar de cima. Apontei a escada para ele, que pôde obser-
var sangue escorrendo, como se fosse uma cascata’, disse
o perito. ‘Quando chegamos, numa sala de uns 30 m2, ha-
13 ALESSI, Gil; RAMALHOSO, Wellington. ‘Sangue escorria pela escada’, diz primeira testemunha do Carandiru. UOL, São Paulo,
17 fev. 2014. Cotidiano. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2014/02/17/sangue-escorria-
pela-escada-do-pavilhao-diz-1-testemunha-do-carandiru.htm. Acesso em: 22 abr. 2024.
14 LOZANO, André. Perito acredita em massacre planejado. Folha de S. Paulo, 28 set. 1997. Cotidiano. Disponível em: https://
www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/280909.htm. Acesso em: 15 maio 2024.
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via 90 corpos empilhados. Não tinha onde pôr o pé. Por
respeito, o perito não pisa em cadáver, mas estava difícil’”
(Lozano, 1997).
Assim como Jara, Mano Brown e Jocenir denunciam direta-
mente quem consideram as pessoas responsáveis pelo massacre:
“Fleury e sua gangue”. Luiz Antonio Fleury Filho era Governador do
Estado de São Paulo na época. Quando o motim ocorreu, ele não
deu a ordem se deveria ou não haver a invasão pela PM (“Depende
do sim ou não de um só homem / que prefere ser neutro pelo
telefone / […] Fleury foi almoçar”) (Diário [...], 1997). É possível in-
terpretar que, num momento crucial, o responsável buscou se
desvencilhar de uma decisão ou se dedicou a outras atividades
que considerava mais importantes, deixando subentendido que
as vidas das pessoas que estavam lá não importavam. Os rappers
também deixam claro que têm a consciência de que o que ocorreu
foi um genocídio: “era a brecha que o sistema queria / avisa o IML,
chegou o grande dia / […] Adolf Hitler sorri no inferno” (Diário [...],
1997). E evidenciam o pouco valor dado à vida no país, principal-
mente quando se trata de sujeitos racializados e marginalizados:
“minha vida não tem tanto valor quanto seu celular, seu computa-
dor”, “o ser humano é descartável no Brasil, como modess usado
ou bombril”, e a respeito das cadeias no Brasil, que servem para
guardar “o que o sistema não quis / esconde o que a novela não
diz” (Diário [...], 1997).
A música ganhou no prêmio promovido pela MTV Brasil em
1998 as categorias de “Melhor Clipe de Rap” e “Clipe do Ano”15.
Além disso, cou em 52° lugar das 100 melhores músicas brasilei-
ras pela Rolling Stone16 e 2° lugar na lista de “Melhor clipe brasilei-
ro de todos os tempos” promovida pela Folha de S. Paulo17. Temos
a consciência que essas listas não são “cienticamente” conáveis,
mas acreditamos que servem sim como um termômetro da po-
15 FORTINO, Leandro; DECIA, Patrícia. MTV Video Music Brasil premia o óbvio. Folha de S. Paulo, 15 de ago. 1998. Disponível em:
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq15089828.htm. Acesso em: 14 maio 2024.
16 POTUMATI, Mateus. Diário de um detento. Rolling Stone, n. 23, 18 dez. 2009. São Paulo. Disponível em https://rollingstone.
uol.com.br/edicao/noticia-4023/. Acesso em: 07 maio 2024.
17 BARCINSKY, André. Memória afetiva, e não originalidade, norteou votos. Folha de S. Paulo, 12 dez. 2012. Disponível em:
http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/1199857-analise-memoria-afetiva-e-nao-originalidade-norteou-votos.shtml. Acesso
em: 28 maio 2017.
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pularidade, importância e signicância da música para a memória
coletiva e evocação da lembrança do Massacre do Carandiru.
Em um documentário lançado em 2022, Mano Brown revela
se sentir incomodado com o álbum “Sobrevivendo no inferno” e,
em particular, com a canção Diário de um detento. Em um primeiro
momento, ele diz que não queria escrever a canção:
Veja bem, é uma música que eu não queria fazer. Os caras
lá do pavilhão 9 que pediram pra mim. “Já passou”. “Mas
ninguém falou”. Falei: “Não, já falou”. “Mas você tem que
falar”. Uns amigos meus estavam presos e tinha muita
gente assistindo esse desenrole no campo do Pavilhão 8.
Teve outro rapaz que foi apresentado pra mim na deten-
ção, que era mais velho do que eu. Jocenir. Ele fez um lan-
ce político escrito, falando sobre o massacre. [...] Eu li e
falei: ‘porra, louco’” (Racionais, 2022, 57’54”).
O que parece evidente, a nosso ver, é que houve uma for-
ma de “cooptação” de Mano Brown pela comunidade de presos
do Carandiru, os quais estavam profundamente engajados numa
“luta persistente contra o esquecimento”18 (Cappelletto, 2003, p.
246), e que obviamente viam no cantante dos Racionais MC’s uma
pessoa capaz de conferir uma dimensão maior, nacional e de mas-
sa, à memória do massacre.
Além disso, é evidente a reticência de Brown em aceitar esse
compromisso tão demandante e desaador. Mano Brown explica
que a canção “estourou” e os Racionais se tornaram conhecidos não
só no Brasil, mas também no mundo, com o álbum “Sobrevivendo
no Inferno”. No entanto, quando Brown percebeu a violência que
se desenrolava em alguns de seus shows, isso o incomodou, com
mortos nas portas dos shows e brigas:
Aí que eu percebi que aquele disco estava virando um dis-
co de exorcismo. Quando eu cantava aquelas músicas nos
shows, repetia aquelas palavras, tudo de novo sempre,
todo mundo junto, o clima era o pior possível. Eu não gos-
18 “Relentless struggle against forgetting” (Cappelleto, 2003, p. 246).
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tava, cantava as músicas com má vontade. Já não sentia
aquela paixão pelo baile, entendeu? A gente veio de um
povo espiritualista, meu. Aquelas músicas falavam de pis-
cina de sangue. Pessoal ouvia isso aí toda hora dentro de
casa. [...] Tinha que mudar, mano, eu acredito na força das
palavras, na repetição. [...] O disco que mais afastou a gen-
te da favela foi o Sobrevivendo no Inferno. O povo da facul-
dade que amou aquilo (Racionais, 2022, 1º 05’01”).
Esse relato de Brown é bem complexo e rico de possíveis sig-
nicados. Por um lado, existem óbvias referências místicas ao
“povo espiritualista” que talvez possam dialogar também com a
identidade religiosa do rapper, entre evangelismo pentecostal e
candomblé (Brown apud Silva, 2012), o que também explicaria a
relevância da repetição como evocação e a noção de incômodo
que a performance repetida desse rap lhe proporciona. Por ou-
tro lado, mantendo-nos no campo mais secular — embora ainda
profundamente ritual e transcendente — da memória coletiva, é
importante lembrar que, nas já mencionadas “comunidades mne-
mônicas” unidas através da memória de massacres, a repetida
reminiscência dos mortos é uma atividade crucial. O trabalho de
campo de Francesca Cappelletto (2003) nos ajuda mais uma vez
nesse sentido:
As sessões narrativas são simultaneamente um processo
de socialização e uma prática de memória, uma espécie de
técnica mnemónica de grupo que envolve elementos da re-
petição tradicional. Por exemplo, a ‘história’ serve de enqua-
dramento para a rememoração das genealogias, uma vez
que os ‘nossos mortos’ (as vítimas do massacre) ocupam um
lugar central na história familiar (Cappelletto, 2003, p. 24)19.
Em outras palavras, nessas sessões narrativas, mas também,
no caso especíco, nas performances de Diário de um detento nos
shows, existe uma evocação insistente dos mortos, que é quase
19 “The narrative sessions are both a socializing process and a memory practice, a sort of group mnemonic technique that
involves elements of traditional repetition. For example, the ‘story’ is used as the framework for the recollection of genealogies,
since ‘our dead’ (the victims of the massacre) occupy a central place in the family history” (Cappelleto, 2003, p. 24).
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um desenterro simbólico (dali o “exorcismo” ao qual se refere
Brown), e que é fundamental para a preservação da memória da
comunidade e para a luta contra o esquecimento. Evidentemente,
isso deve ter incomodado o Mano Brown bastante: como visto
acima, a ele e aos Racionais MC’s foi dado um papel – aquele de
preservadores e espalhadores da memória do massacre de 1992
– que cou oneroso demais para eles, não eram já os Racionais
MC’s cantando e falando, mas a comunidade usando-os como um
megafone da própria memória, e isso deve ter se tornado progres-
sivamente insustentável para os músicos.
Enm, entre as possíveis interpretações da menção de Brown
ao “povo da faculdade”, podemos dizer que talvez haja uma re-
ferência à Universidade Estadual de Campinas, que tornou
“Sobrevivendo no Inferno” obra obrigatória no seu vestibular,
como informado em reportagem de Luanda Julião (2018).
A importância de Diário de um detento reside, também, em
manter vivo o protesto e a memória, porquanto ainda há demons-
trações de ódio de pessoas que acreditam que os presos “mere-
cessem” o massacre, como é possível perceber em redes sociais
em postagens que armam que “111 foi pouco”:
Figura 3 – Postagens no Twitter armando que 111 mortes no Carandiru “foi pouco”
Fonte: Twitter, 2022.
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4. MBGC e Eldorado dos Carajás
O Massacre de Eldorado dos Carajás aconteceu em 17 de abril
de 1996, quando forças da Polícia Militar do Pará abriram fogo
contra trabalhadores que buscavam a desapropriação de terras
de uma fazenda para ns de reforma agrária, causando a morte de
19 pessoas e deixando dezenas de feridos por balas. A ação da po-
lícia é lembrada ainda hoje pela mídia como “uma das ações mais
violentas praticadas pelo Estado brasileiro” (Stopasolas, 2022).
Mais de três mil famílias estavam alocadas na fazenda
Macaxeira. O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
lhes tinha garantido que a fazenda era considerada improdutiva e
seria desapropriada para a reforma agrária. No entanto, a jornalis-
ta Catarina Barbosa (2021) conta que:
O cenário mudou quando um laudo considerou a proprie-
dade como produtiva, beneciando o latifundiário que se
dizia dono da fazenda. Em protesto, mais de 1,5 mil cam-
poneses começaram uma marcha pela rodovia BR-155
com destino a Belém. Os trabalhadores questionavam a
veracidade do laudo e tentavam pressionar as autoridades
públicas (Barbosa, 2021).
A marcha, conta Eric Nepomuceno (Guilhotina, 2021), deveria
chegar até Belém do Pará e era formada por adultos e crianças,
mas o governador ordenou que a marcha fosse interrompida. Os
trabalhadores foram cercados pela Polícia Militar do Pará, que,
após os manifestantes terem atirado paus, pedras e foices, reagiu
com tiros de metralhadora20. Uma testemunha arma que foram
cercados de um lado e de outro da estrada, e que pediu para os
policiais pararem de atirar, ouvindo como resposta do policial que
queria que “morresse e fosse para o inferno”21 (Barbosa, 2021).
20 MASSACRE em Eldorado dos Carajás. Memória Globo, 28 out. 2021. Disponível em: https://memoriaglobo.globo.com/jornalismo/
coberturas/massacre-em-eldorado-dos-carajas/noticia/massacre-em-eldorado-dos-carajas.ghtml. Acesso em: 22 abr. 2024.
21 GUILHOTINA: Le Monde Diplomatique Brasil. #112: Os 25 anos do Massacre de Eldorado dos Carajás, com Eric Nepomuceno.
[Locução de]: Bianca Pyl; Luís Brasilino. Entrevistado: Eric Nepomuceno. São Paulo: Central 3, 15 abr. 2021. Disponível em: https://
www.central3.com.br/112-os-25-anos-do-massacre-de-eldorado-dos-carajas-com-eric-nepomuceno/. Acesso em: 22 abr. 2024.
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O grupo paraense de rap Manos da Baixada de Grosso Calibre
escreveu o rap Eldorado dos Carajás, que conta a história do mas-
sacre. A música tem a duração de oito minutos, e relata a luta dos
trabalhadores sem-terra, o descaso das autoridades e o desenrolar
da tragédia. À semelhança de Diário de um detento, a música inicia
em forma de diário, com o ano e o local. Logo no começo, já de-
nuncia o esquecimento da região Norte, e, em especial, do lugar
onde ocorreu a matança, “lá onde só Deus sabe o que acontece”
(Eldorado dos Carajás, 2002). Esse esquecimento, no qual direitos
são ignorados e a violência contra pequenos agricultores, extrativis-
tas, indígenas e ativistas, entre outros, é comum e pode ser obser-
vado nas regiões rurais, e especialmente na Amazônia (Sousa, 2021;
Vasconcellos, 2019). Um caso bem recente, que ganhou relevância
na mídia internacional,22 além da mobilização geral de inteiros seg-
mentos da sociedade brasileira, foi o assassinato de Dom Phillips e
Bruno Ferreira, que levou à prisão preventiva à acusação de homi-
cídio “por motivos fúteis” de três sujeitos envolvidos em pesca ilegal
em terras indígenas, deixando uma série de dúvidas em aberto so-
bre a possível atuação de uma organização criminosa em relação ao
duplo homicídio (Pedrosa Neto, 2022; Caso [...], 2022) 23.
Assim como na canção de Victor Jara, em Eldorado dos Carajás,
a luta pela terra é legitimada: “bloqueiam a rodovia, reivindicam à
sua maneira a desapropriação da fazenda Macaxeira” (Eldorado
dos Carajás, 2002), bem como o absurdo da concentração da terra
no Brasil: “40 mil hectares de um só dono, de uma terra entregue
ao abandono” (Eldorado dos Carajás, 2002). A questão das ter-
ras abandonadas/improdutivas é motivo até hoje de embates no
Brasil. Apesar de a Constituição garantir que propriedades de ter-
ras que não cumprirem seu valor social serão objeto de reforma
agrária (Brasil, 2016), o que se percebe é a violação desses direitos,
como no caso do Massacre dos Carajás. A desapropriação obstina-
da e totalmente injusticada de terras indesejadas é um capricho,
porque não tem nenhum tipo de fundamento econômico para
22 Destaca-se, em particular, a cobertura que o caso recebeu no jornal britânico The Guardian, que, para além dos múltiplos
dedicados ao desaparecimento (antes) e ao assassinato (depois) de Phillips e Ferreira, publicou um cronograma dedicado às
várias notícias sobre os dois (Malone; Blight; De Hoog, 2022).
23 Para uma narrativa muito detalhada do contexto dos eventos, ver McCoy (2022).
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além do puro e simples ódio (racial, étnico, de classe, etc.) contra
as pessoas despossessadas (Messina; Souza, 2019). É importante
apontar que, em todos os casos, havia o direito de as pessoas esta-
rem naqueles locais e a garantia das autoridades de que estariam
seguras, havendo, no entanto, ação violenta por parte da polícia.
O descaso do governo é denunciado na canção, com citação à
demora do Incra e à insensibilidade frente à espera dos trabalha-
dores, a racialização concretizada em um “profundo desprezo pela
vida humana” (Eldorado dos Carajás, 2002). Como nas duas can-
ções anteriores, os nomes de alguns algozes são falados: Coronel
Mário Pantoja, e Almir Gabriel, governador do Pará no período24.
O grupo MBGC também nomeia algumas das vítimas – Lourival,
Robson, Oziel – o que faz com que a percepção de testemunha do
eu-lírico seja reforçada. O caráter de execução é especialmente
delineado na morte de Oziel, pois o relato é de que foi algemado e
executado com três tiros. Eric Nepomuceno (Guilhotina, 2021) cor-
robora a informação contida no rap do MBGC de que há indícios
de que a matança tenha sido premeditada (“Planejam o que nin-
guém imagina”) (Eldorado dos Carajás, 2002), pois muitos tiros fo-
ram à queima-roupa e, dos mortos, 8 ou 9 eram lideranças, o que
propicia a ideia de que os alvos eram escolhidos. Novamente, a
ideia de que haja a possibilidade de uma ação premeditada, e que
essa opção foi prontamente e precipitadamente descartada pelas
autoridades, aproxima o Massacre dos Carajás ao já mencionado
assassinato de Phillips e Ferreira em Atalaia do Norte.
A imagem do sangue jorrando também é evocada nesse rap,
como em Diário de um detento, em uma trilha que soa ao fundo
do refrão: “o sangue jorra e ferve” (Eldorado dos Carajás, 2002),
cuja imagem e interpretação contrastam com o início cantado do
refrão, feito por vozes femininas com a letra “Sem justiça não
existe paz, não existe paz” (Eldorado dos Carajás, 2002) (respon-
dido pela voz do rapper, que canta “Eldorado dos Carajás”). Tanto
aqui, quanto na canção dos Racionais MC’s, quanto, em medida
24 CORONEL Pantoja, condenado pelo Massacre de Eldorado dos Carajás, morre em Belém. G1 Pará, Belém, 12 de nov. 2022.
Disponível em: https://g1.globo.com/pa/para/noticia/2020/11/12/coronel-pantoja-condenado-pelo-massacre-de-eldorado-dos-
carajas-morre-em-belem.ghtml. Acesso em: 12 nov. 2022.
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menor, na canção de Victor Jara (1969), que fala do peito crivado
de balas (“le acribillaban el pecho”), a descrição visual dos episó-
dios e das cenas mais violentas do massacre joga um papel fun-
damental na manutenção da memória. No seu trabalho de campo
em dois vilarejos na Toscana, Cappelletto (2003) observou como
a descrição detalhadas de eventos, com o uso de imagens vivas
e detalhadas, serve para dar à comunidade a impressão de esta-
rem “testemunhando e re-testemunhando” (Cappelletto, 2003, p.
248) os massacres e os assassinatos, e isso se aplica também às
situações nas quais nem o narrador e nem o público assistiram
pessoalmente aos episódios.
Cappelletto (2003) continua sugerindo que esse uso de des-
crições visuais vívidas e cruentas permite a passagem de uma
dimensão pessoal da memória a uma dimensão coletiva, com-
partilhada, ao ponto que, para alguns membros da comunidade,
torna-se difícil distinguir os eventos experienciados pessoalmente
daqueles ouvidos de outras pessoas (Cappelletto, 2003, p. 249). O
trauma deixa a dimensão pessoal e torna-se assim trauma cole-
tivo, e as canções assumem uma função crucial nessa transição.
Reiteradamente, isso explica mais uma vez a insistência, já men-
cionada acima, dos detentos do Pavilhão 9 do Carandiru na tenta-
tiva de convencer Mano Brown a falar do massacre na sua música.
Voltando ao rap Eldorado de Carajás, outros massacres da
história recente brasileira são lembrados na canção – Candelária,
Carandiru, Vigário Geral e Corumbiara, e a desesperança que
aparece no nal de Diário de um Detento também é exposta aqui,
com a denúncia do esquecimento e impunidade após a grande
repercussão inicial.
5. Considerações Finais
Como arma Denise Ferreira da Silva (2014), é intrigante como
“os direitos humanos e civis de certos seres humanos desapare-
cem tão imediatamente na decisão de Estado de colocar em ação
suas forças de autopreservação nos territórios que ele na realida-
de deveria proteger” (Silva, 2014, p. 83-84).
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Nos casos estudados, o Estado colocou suas forças em ação
não somente por meio da coerção e violência, mas sim extermi-
nando vidas que não tinham meios de defesa. Nos três casos, os
camponeses sem-terra e os detentos foram tratados como corpos
que não importavam, racializados por serem pobres, por lutarem
por seus direitos ou por serem presos pobres-e-pretos (ou pobres-
-e-não-brancos), periféricos, de forma que suas vidas não teriam o
mesmo valor que as outras vidas humanas e que a violência contra
eles fosse naturalizada.
Os massacres ocorreram principalmente em situações nas
quais essas pessoas buscavam lutar por seus direitos, insistindo no
seu direito à dignidade, ao acesso à terra para moradia e/ou sub-
sistência. Em nossa opinião, o fato de ocorrerem nessas ocasiões
é signicativo para observar a forma como as autoridades viam e
veem as lutas sociais, e como é implícito o desejo de que as massas
sejam passivas e não demandem de forma mais incisiva por seus di-
reitos – nesses casos, são tratados como desordeiros, como aqueles
que “atrapalham”. No entanto, houve forte reação popular, e, nos
três casos analisados, as músicas se tornaram parte ativa dessa in-
dignação e dos protestos que aconteceram. Elas constituíram, em si
mesmas, protestos, evocando e chamando para a ação novas mani-
festações populares, além de se constituírem como partes das me-
mórias coletivas das sociedades. Por esses motivos, consideramos
apropriado unir esses três massacres e essas três canções em um
mesmo artigo, apesar de, obviamente, não serem os únicos massa-
cres e as únicas canções que a eles reagiram.
A esse propósito, salientamos que a criação e manutenção de
uma memória coletiva sobre os massacres, de uma luta contra o es-
quecimento e/ou a banalização dos eventos, parece constituir uma
prioridade para as três obras, que se tornam instrumentos para
a relembrança da comunidade, também a custo de transcender –
como no caso de Diário de um detento – as intenções dos artistas.
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DIÁRIO de um detento. Intérprete: Racionais MC’S. Compositores:
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Documentário
RACIONAIS: Das Ruas de São Paulo para o Mundo. Direção:
Juliana Vicente. Produção: Juliana Vicente, Eliane Dias. Intérpretes:
Edi Rock, Ice Blue, DJ KL Jay, Mano Brown. Roteiro: Juliana Vicente.
São Paulo: Preta Portê Filmes, 2022. (116 min), son. color.
Créditos das imagens
PUNTO FINAL. La Matanza de Puerto Montt: 25/04/1969.
Disponível em: https://punto-nal.org/PDFs/1969/PF_077_doc.pdf.
Acesso em: 11 nov. 2022.
TWITTER. Disponível em: https://twitter.com/search?q=%-
23111foipouco&src=recent_search_click. Acesso em: 24 nov. 2022.
Publisher
Universidade Federal de Goiás. Escola de Música e Artes
Cênicas. Programa de Pós-graduação em Música. Publicação no
Portal de Periódicos UFG.
As ideias expressadas neste artigo são de responsabilidade de
seus autores, não representando, necessariamente, a opinião dos
editores ou da universidade.