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ISSN 2238-5436
ARTIGO
Intersecções entre Ciência da Informação, Paleontologia e
Museologia: uma análise da bibliograa publicada
Intersections between Information Science, Paleontology
and Museology: an analysis of the published bibliography
Lucas George Wendt1
Fabiano Couto Corrêa da Silva2
Caterina Marta Groposo Pavão3
DOI 10.26512/museologia.v12i23.50658
1 Mestrando em Ciência da Informação no PPGCIN/UFRGS. Bacharel em Jornalismo (Univates/2018).
Bacharel em Biblioteconomia (UCS/2021). E-mail: lucas.george.wendt@gmail.com.
2 Doutor em Información y Documentación pela Universitat de Barcelona. Mestre em Ciência da Infor-
mação pela UFSC. Bacharel em Biblioteconomia pela UFRGS. Professor Adjunto na UFRGS (FABICO),
com vínculo permanente junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação (PGCIN), e
colaborador no mestrado e doutorado do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da
UFSC. E-mail: fabianocc@gmail.com
3 Doutora e mestre em Comunicação e Informação pelo Programa de Pós-graduação em Comunicação
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Bacharel em Biblioteconomia pela UFRGS.
Professor Adjunto na FABICO/UFRGS e professor permanente junto ao Programa de Pós-Graduação em
Ciência da Informação (PGCIN/UFRGS). E-mail: fabianocc@gmail.com
Resumo
Este artigo apresenta uma revisão bibliográ-
ca sobre as aproximações interdisciplina-
res entre Ciência da Informação, Paleonto-
logia e Museologia. A pesquisa foi realizada
através de uma revisão da literatura exis-
tente sobre o assunto, buscando identicar
tendências, lacunas e conhecimento sobre
como essas áreas de estudo se relacionam
e podem se beneciar mutuamente. Os
conceitos de “dado”, “documento”, “fóssil”
e "reprodutibilidade cientíca" na interface
entre estes três campos do saber foram to-
mados como prisma de análise para a iden-
ticação das tendências e lacunas de pesqui-
sa. Os resultados mostraram que a Ciência
da Informação tem o potencial de melhorar
a gestão e preservação de fósseis e dados
paleontológicos, a Paleontologia pode se
beneciar de técnicas de análise estatística
e aprendizado de máquina, e a Museologia
pode utilizar tecnologias digitais para am-
pliar preservação de acervos paleontológi-
cos. Conclui-se que a interdisciplinaridade
entre essas áreas pode levar a descobertas
inovadoras e uma melhor compreensão da
história da vida na Terra.
Palavras-chave
Ciência da Informação; Paleontologia; Muse-
ologia; fósseis; aproximações interdisciplina-
res.
Abstract
This article presents a bibliographic review
on the interdisciplinary approaches betwe-
en Information Science, Paleontology and
Museology/Museum Studies. The research
was performed through a systematic review
of the existing literature on the subjects,
aiming to identify trends, gaps and existing
knowledge about how these areas of study
are related and can benet each other. The
concepts of "data", "document", "fossil" and
"scientic reproducibility" in the interface
between these three elds of knowledge
were taken as a prism of analysis to iden-
tify research trends and gaps. The results
showed that Information Science has the
potential to improve the management and
preservation of fossils and paleontological
data, Paleontology can benet from statisti-
cal analysis techniques and machine learning,
and Museology/Museum Studies can use di-
gital technologies to enhance preservation
of paleontological collections. We conclude
that the interdisciplinarity between these
areas can lead to innovative discoveries and
a better understanding of the history of life
on Earth.
Keywords
Information Science; Paleontology; Museolo-
gy; fossils; interdisciplinary approaches.
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Intersecções entre Ciência da Informação, Paleontologia e Museologia:
uma análise da bibliograa publicada
MUSEOLOGIA & INTERDISCIPLINARIDADE Vol. 13, nº25, Jan./Jun. 2024
Introdução
A Ciência da Informação enquanto domínio cientíco pode ser carac-
terizada pela interdisciplinaridade e pelo seu caráter teórico e aplicado, ou seja,
por meio de suas diferentes subáreas e de seu corpo de conhecimento ela
pode se aproximar de outros campos cientícos e eventualmente auxiliá-los em
demandas que se relacionem com o seu objeto: a informação. Quando relacio-
nada com estudos que situam a informação enquanto insumo e produto para o
desenvolvimento da ciência, trata-se de estudos de Comunicação Cientíca. Um
dos campos de estudo que despontam nas pesquisas em Ciência da Informa-
ção são aqueles relacionados à Ciência Aberta (Open Science) e à reprodutibi-
lidade cientíca, fenômenos relativamente recentes e movimentos que ganham
aderência em pesquisas em diversos campos do saber, uma vez que autores
defendem os benefícios de prática alinhadas à abertura da ciência em múltiplos
domínios cientícos.
A abertura da ciência é um movimento que preconiza a transparência, a
colaboração e a acessibilidade na pesquisa cientíca. Ele busca aumentar a inclu-
são e a diversidade na comunidade cientíca, bem como tornar a ciência mais
acessível e compreensível para o público em geral. Vários autores defendem os
benefícios de práticas alinhadas à abertura da ciência. Por exemplo, o autor Mi-
chael Nielsen (2011), em seu livro Reinventing discovery: the new era of networked
science4, argumenta que a abertura da ciência permite que mais pessoas contri-
buam para a pesquisa e que as descobertas cientícas sejam compartilhadas e
utilizadas de maneira mais ecaz. Ele defende a colaboração aberta como um
meio para aumentar a inclusão e a eciência na pesquisa.
A ciência é um processo complexo, que depende da colaboração, trans-
parência e conabilidade para garantir que as descobertas cientícas sejam pre-
cisas e úteis para a sociedade. A abertura da ciência é um movimento que
busca promover esses valores. Uma das formas de aumentar a conabilidade na
pesquisa cientíca é por meio da transparência no processo de coleta e análise
de dados. Isso inclui compartilhar dados brutos, metodologias e códigos utiliza-
dos na pesquisa, permitindo que outros pesquisadores possam replicar e validar
as descobertas. Além disso, a transparência também pode ser promovida com
a publicação de artigos cientícos abertos, permitindo que todos possam ter
acesso às descobertas.
Outra forma de aumentar a conabilidade é por meio da colaboração
aberta. A colaboração aberta permite que pesquisadores de diferentes áreas
e instituições trabalhem juntos, compartilhando dados, ideias e, dessa forma,
conhecimento. Isso pode levar a uma melhor compreensão dos problemas cien-
tícos, além de aumentar a capacidade de replicar e validar descobertas. A aber-
tura também pode aumentar a transparência no processo de nanciamento da
pesquisa. Quando os detalhes do nanciamento da pesquisa são transparentes,
é possível identicar e evitar conitos de interesses. Isso aumenta a conança
no resultado da pesquisa. Além disso, a abertura da ciência pode aumentar a in-
clusão na comunidade cientíca, permitindo que mais pessoas contribuam para
a pesquisa.
Este estudo tem como objetivo mapear e discutir a produção cientíca
em Ciência da Informação e em Museologia relacionada à Paleontologia e aos
fósseis enquanto objetos-documentos que contém dados, aproximando-os dos
4 Em tradução livre, Reinventando a descoberta: a nova era da ciência em rede.
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conceitos de ciência aberta e reprodutibilidade cientíca. A Museologia é um
campo do saber que se preocupa com os conceitos de “objeto”, “documento”,
dentre muitos outros, e, também, “valor de informação” de elementos que te-
nham passado pelo processo de musealização. A Paleontologia, por outro lado,
infere sobre as dinâmicas da vida ao longo da existência da Terra, tendo como
objeto material o documento em que se constitui o fóssil, sua unidade básica
de dados cientícos para produção epistêmica, elemento que, à luz do conheci-
mento e dos paradigmas atuais em Paleontologia, guarda informações sobre o
passado da vida e da Terra. Ao longo do tempo, os fósseis foram interpretados
de diferentes maneiras.
Neste contexto, a Paleontologia, como campo de saber, empresta da
Museologia o suporte para a sua produção do conhecimento, tendo em vista
que a instituição “museu” age sobre os fósseis e fornece as condições para que
o conhecimento cientíco paleontológico seja gerado, com dados (presentes no
objeto fóssil) à disposição para ser testado pelos pares. Se tem aí o elemento da
reprodutibilidade cientíca, um dos pilares do fazer cientíco, assunto familiar à
Ciência da Informação, e um dos objetos de atenção das pesquisas em Ciência
Aberta. A reprodutibilidade cientíca permite que os dados de pesquisa sejam
reproduzidos e testados em novos contextos, garantindo, dentre outros ele-
mentos, a conabilidade e a transparência do novo conhecimento gerado. Há
algumas nuances entre uso, reúso e reprodutibilidade. A reprodutibilidade das
pesquisas está relacionada à denição de reúso de dados, pois é por meio do
acesso aos dados de uma pesquisa que é possível reproduzi-la. O reúso permite
que a ciência evolua a partir de experimentos anteriores, poupando recursos
(tempo, dinheiro, pessoas).
Esta breve exposição permite relacionar a Ciência da Informação e a
Comunicação Cientíca com a Ciência Aberta e os dados cientícos; a repro-
dutibilidade cientíca com a Museologia e os papel dos museus neste processo;
e todos estes os elementos com a prática da ciência em Paleontologia. O levan-
tamento bibliográco para identicação da literatura publicada em Português
sobre os temas de interesse para o estudo foi realizado na Base de Dados
Referencial de Artigos de Periódicos em Ciência da Informação (Brapci), e na
Biblioteca Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD). Todos os documentos
recuperados na primeira fase da pesquisa (Brapci e BDTD) foram lidos inte-
gralmente. De maneira adicional, também foi realizada uma pesquisa no Google
Acadêmico. Logo que vericou-se uma baixa prevalência de estudos em Ciência
da Informação que tiveram a Paleontologia como objeto, a busca foi alargada,
visando incluir a “Museologia”, onde o foco de estudos tendo como objeto a
Paleontologia demonstrou-se ser maior.
Este estudo parte de três premissas. Premissa 1: a Ciência da Informação
tem o potencial de melhorar a gestão e preservação de fósseis e dados paleon-
tológicos, por meio de técnicas de indexação, classicação e armazenamento de
dados. Portanto, inferiu-se previamente a existência de produção que relacio-
nasse esses elementos. Premissa 2: a Paleontologia pode beneciar-se da Ciência
da Informação ao utilizar técnicas de análise estatística e aprendizado de máqui-
na para analisar grandes quantidades de dados fósseis. Premissa 3: a Museologia
pode se beneciar da combinação da Ciência da Informação e Paleontologia ao
utilizar, por exemplo, tecnologias digitais para a preservação de acervos paleon-
tológicos.
Nesta estrutura, as premissas 1, 2 e 3 servem como evidências para
apoiar a conclusão de que a interdisciplinaridade entre esses campos de estudo
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pode oferecer benefícios signicativos para as três áreas no que se relaciona
com os processos adjacentes à manipulação dos dados gerados em pesquisas
cientícas. O objetivo desta estrutura é mostrar que a combinação dessas áreas
de estudo pode trazer inovações e novos conhecimentos para cada uma delas.
Nesta direção, este estudo tem como objetivo mapear e discutir a produção
cientíca em Ciência da Informação e em Museologia relacionada à Paleontolo-
gia e aos fósseis como objetos-documentos que contém dados, aproximando-os
dos conceitos de ciência aberta e reprodutibilidade cientíca. A pesquisa partiu
das seguintes perguntas: como a Ciência da Informação e, consequentemente, a
Museologia, entendem os materiais fósseis? Quais as possíveis relações dos fós-
seis com os conceitos de “dado cientíco” e de “documento” identicadas na li-
teratura cientíca? Há estudos publicados relacionando fósseis, museus, Ciência
da Informação, Paleontologia e Museologia com a reprodutibilidade cientíca?
Como essas áreas podem se beneciar mutuamente?
Os objetivos especícos são: a) identicar a existência de pesquisas em
Ciência da Informação e em Museologia que entendam os fósseis como docu-
mento que contém dados cientícos; b) localizar estudos que abordem fósseis,
museus, Ciência da Informação, Paleontologia e Museologia, bem como a repro-
dutibilidade cientíca; c) aproximar a Paleontologia da Ciência da Informação
por meio de uma pesquisa de caráter bibliográco e exploratório e da discussão
de trabalhos realizados nesta interface; d) demonstrar a necessidade de estudos
sobre a área da Paleontologia como campo de interesse no âmbito da CI.
Na próxima seção serão abordadas as bases teóricas que esta pesquisa
desenvolve e relaciona para estabelecer uma compreensão sobre os fenômenos
pesquisados. Discute-se nesta seção sobre Ciência da Informação, Paleontologia,
Museologia, Ciência Aberta, Reprodutibilidade Cientíca, Comunicação Cientí-
ca, “Dados”, “Documentos” e “Fósseis”.
Ciência da Informação
A Ciência da Informação é um campo cientíco que tem por objeto um
complexo fenômeno: a informação. Diculdades conceituais acerca do objeto
são familiares a todos aqueles que buscam uma denição unívoca do principal
elemento presente nas pesquisas em CI. É comum estabelecer que a Ciência
da Informação é um campo do saber interdisciplinar que estuda a produção,
disseminação, uso e preservação da informação. Ela se concentra em compre-
ender como a informação é produzida, organizada, disseminada e utilizada em
diferentes contextos e comunidades. A CI é uma disciplina emergente, que se
relaciona com outras disciplinas como Biblioteconomia, Arquivologia, Comuni-
cação, Informática e Sociologia.
Autores discutem o conceito de informação a partir de diferentes pers-
pectivas. Para Targino (2000), por exemplo, informação é tudo aquilo que infor-
ma ou que dá forma a algo. Já Gleick (2013), ao longo da obra “A informação:
uma história, uma teoria, uma enxurrada”, propõe que a informação pode ser
compreendida em termos químicos, biológicos, físicos, elétricos, quânticos, ana-
lógicos, digitais, materiais e imateriais, entre outros.
A CI, a área acadêmico-teórica que dá conta de estudar a informação,
também tem fundamentos complexos de traçar - em parte devido à comple-
xidade própria de seu objeto. No entanto, é bem estabelecido na literatura do
campo que esta é uma ciência que começa a constituir efetivamente a partir da
urgência do contexto bélico-militar do m da primeira metade do século XX,
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momento em que a 2ª Guerra Mundial mobiliza as potências econômicas da
época para a disputa, conforme aponta Araújo (2018), e volumes consideravel-
mente maiores de informação passam a circular.
De acordo com a International Federation for Information and Documenta-
tion (FID, não paginado), “A Ciência da Informação é a disciplina que trata da na-
tureza, da origem, da coleta, da classicação, da conservação, da recuperação, da
distribuição e do uso da informação.” Dessa forma, é possível estabelecer que
a Ciência da Informação é um campo de estudos amplo e que abrange vários
temas, incluindo: organização e gestão de informação; tecnologias da informação
e comunicação; pesquisa e recuperação da informação; análise de conteúdo e
mineração de dados; ética e políticas da informação; usabilidade e acessibilidade;
e preservação e conservação da informação. É nesta linha que argumenta Lan-
caster (1991). Autores que contribuíram para o desenvolvimento conceitual
da Ciência da Informação incluem Paul Otlet, Shiyali Ramamrita Ranganathan,
Suzanne Briet e Margaret Elizabeth Egan.
Um relativo consenso sobre o objeto atual da CI aparece em Michael
Buckland, que observa três estados diferentes para a informação: a informação
como coisa; a informação como processo; e a informação como conhecimento
(Buckland, 1991). Em primeiro lugar, a informação é vista como um objeto; em
segundo lugar, como um ato informativo; e em terceiro lugar, como algo que
reduz a incerteza sobre um determinado assunto. Nesse terceiro estado, ca
evidente que a informação está inextricavelmente ligada ao conhecimento.
Em Capurro (2003) são descritas características gerais para cada um dos
paradigmas da Ciência da Informação expostos e amplamente reconhecidos
pela comunidade cientíca da área. O paradigma físico é aquele relacionado à
informação e sua materialidade, discutido até aqui. No entanto, existem outros
dois paradigmas que se concentram em aspectos diferentes. O paradigma cog-
nitivo está relacionado ao impacto da informação nos indivíduos, incluindo suas
necessidades e demandas individuais em busca de informação, bem como sua
produção individual e uso da informação. Já o paradigma social, que é mais re-
cente, enfatiza o uso e impacto da informação em grupos e comunidades sociais,
destacando o caráter coletivo da informação.
A Ciência da Informação compartilha elementos – suas práticas técnico-
-prossionais e escopo teórico – com diversas disciplinas diferentes com as
quais mantém relações institucionais ora mais próximas, ora mais distantes. Em
especial, com a Biblioteconomia, com a Bibliograa e com a Documentação. A
essas três áreas são creditados os impulsos iniciais que culminaram no desen-
volvimento da CI enquanto uma ciência nova e pós-moderna.
Além delas, as mais recentes áreas de Organização do Conhecimento
e Recuperação da Informação, subcampos hoje vinculados indubitavelmente à
CI, também ajudaram a compor o campo. A Arquivologia não é comumente
associada aos fundamentos da CI, mas, atualmente, é uma das áreas que mantêm
estreita relação com esta ciência. No Brasil, a Museologia, a despeito de não
estar integrada essencialmente à Ciência da Informação, coexistindo como cam-
po autônomo, também compartilha pressupostos com ela e, no escopo deste
estudo, estas relações serão investigadas.
Atualmente, a humanidade produz grandes volumes de informação ana-
lógica e digital, sendo que a ciência, enquanto campo de prática social, é uma das
principais beneciárias da informação e de sua difusão. Para Meadows (1999)
a informação é o insumo fundamental da ciência. A Comunicação Cientíca é
uma das principais áreas às quais se dedica a Ciência da Informação atualmente
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pois, conforme Targino (2000, p. 5), “não há ciência sem comunicação. Não há
comunicação sem informação”. Esta assertiva evidencia a relação indissociável
entre informação, comunicação e ciência.
Junto à Comunicação Cientíca, os Estudos Métricos da Informação
(EMI) surgem preocupados em estabelecer quanticações para a informação
que é produzida e circula, especialmente, nos campos cientícos. A pesquisa
em comunicação da informação na ciência, segundo Targino (2000), começa na
década de 1940, quando a efervescência da produção de informação cientíca
passa a representar desaos para a recuperação da informação. Pouco antes é
quando surgem cientistas de disciplinas como Química e Física especializados
em disponibilizar informação em ciência a seus pares, num momento em que os
estoques de informação cientíca crescente passaram a representar um desao
a ser enfrentado por pesquisadores.
Araújo (2018) ainda cita pesquisas no subcampo da Comunicação Cien-
tíca contemporânea, além dos EMI, nas áreas de políticas de ciência e tecnologia;
questões que relacionam a ciência a aspectos culturais, econômicas e tecnoló-
gicas das nações; estudos sobre os impactos das tecnologias digitais no uxo da
informação cientíca; e-science; reúso do conhecimento cientíco; e movimen-
tos em torno do acesso livre ao conhecimento cientíco e tecnológico. Repro-
dutibilidade cientíca é uma das perspectivas contemporâneas de pesquisa em
Comunicação Cientíca. Ciência reproduzível é o princípio segundo o qual os
resultados de uma pesquisa cientíca devem ser passíveis de serem reproduzidos
por outros pesquisadores, utilizando os mesmos métodos e dados.
Conforme denições do National Science Board dos Estados Unidos e de
autores como Nosek, Spies e Motyl (2012), e Baker (2016), ela é considerada
um princípio fundamental da ciência, pois permite que outros pesquisadores
veriquem e validem os resultados, aumentando a conança nas descobertas
cientícas. Pode ser afetada por vários fatores, como a falta de transparência
na coleta e análise de dados, a falta de acesso a dados e métodos, ou o uso de
métodos inadequados. Isso pode levar a resultados que não são reprodutíveis
e, portanto, não conáveis. Para aumentar a reprodutibilidade cientíca, é fun-
damental que os pesquisadores sejam transparentes sobre suas metodologias e
dados, compartilhando-os publicamente. Além disso, é importante que os pes-
quisadores sigam as boas práticas cientícas, como a randomização, o controle
de variáveis, e o planejamento de estudos de forma adequada.
Sendo assim, dentre os campos que se abrem para a atuação da Ciência
da Informação e da Comunicação Cientíca estão aqueles relacionados com a
Ciência Aberta e com a reprodutibilidade da ciência, como pontua Araújo (2018)
em sua classicação. Para Albagli (2015: 9), o movimento pela ciência aberta deve
ser contextualizado em meio aos movimentos sociais que surgem devido às mu-
danças nas condições de produção, circulação e cultura da informação e do co-
nhecimento, e que vem afetando os arcabouços epistemológicos e institucionais
existentes. Ainda conforme Albagli, a Ciência Aberta existe em constante tensão
entre “a produção colaborativa, interativa e compartilhada da informação, do co-
nhecimento e da cultura. E, por outro, mecanismos de captura e privatização
desse conhecimento que é coletiva e socialmente produzido”(2015: 13).
Entende-se que a Ciência Aberta pode agir como propulsora do de-
senvolvimento dos campos cientícos ao serem adotadas estratégias que pri-
vilegiem o compartilhamento da informação cientíca e sua circulação livre.
Intrínseco ao conceito de Ciência Aberta estão elementos como a transparên-
cia e a acessibilidade, já amplamente discutidos por meio de pautas como a da
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implementação dos princípios FAIR (Findable, Accessible, Interoperable, Reusable,
em inglês) e que determinam que os insumos e produtos da ciência devam ser
disponíveis, acessíveis, interoperáveis e reusáveis.
Neste quadro, dados acessíveis e reusáveis assumem particular impor-
tância pois é por meio deles que, de um lado, podem ser estimuladas práticas
de maior compartilhamento dos resultados cientícos, estendendo esse pro-
duto intelectual para além dos limites da academia e, em outra instância, pode
se estimular práticas de reúso de dados cientícos já coletados e gerados – a
reprodutibilidade cientíca. A abertura dos dados de pesquisa resulta em uma
ciência menos opaca e mais disponível ao escrutínio público. A necessidade
de reprodução dos dados de pesquisas cientícas como parte do processo de
avaliação por pares já é bem estabelecida na comunidade cientíca das mais
diferentes áreas. Inclusive esse processo integra o fazer cientíco há séculos. A
possibilidade de replicar estudos anteriormente realizados, além de estimular a
transparência cientíca, também gera economias, visto que dados já gerados e
coletados disponíveis para reprodução não demandam que investimentos para
geração de resultados similares sejam repetidos.
No caso da Paleontologia a reprodutibilidade pode ser entendida de
duas maneiras. Na primeira, como a possibilidade que se oferece à avaliação
do mesmo material fóssil que originou a interpretação publicada em determi-
nado estudo. Em segundo caso, como a disponibilização de versões digitais dos
dados – modelos tridimensionais (3D), especialmente – mas também planilhas,
compilações de dados e imagens. Enm, tudo o que possa ser útil para a correta
avaliação do que foi publicado. No que se refere ao primeiro caso, a atuação da
Museologia é bastante relevante.
Museologia
A Museologia é um campo cientíco que estuda a produção, gestão, con-
servação e divulgação do patrimônio museológico. Isso inclui desde a curadoria
de exposições até a conservação de objetos e a pesquisa sobre museus e patri-
mônio. É uma área interdisciplinar que se relaciona com outras disciplinas como
História, Antropologia, Arqueologia, Arte, entre outras, mas, também com a
Ciência da Informação e com todas aquelas ciências que, no passado, zeram
parte da História Natural – Geologia e Zoologia particularmente. Essas são as
duas ciências cujas práticas estão nos fundamentos da Paleontologia, ciência de
caráter moderno, portanto, mais recente.
Karp e Lavine (1991), Pearce (1992) e Phillips (2018) são autores que
discutem conceitos sobre a Museologia, seu objeto e o seu fazer cientíco. A
Museologia tem como objetivo principal garantir a preservação e acessibilidade
do patrimônio cultural, histórico e cientíco, por meio de sua coleta, estudo,
conservação e exposição. Nestes domínios, encontra similaridade com a Biblio-
teconomia e a com a Arquivologia, áreas integradas à Ciência da Informação.
Além disso, a Museologia busca desenvolver metodologias e estratégias para a
gestão e preservação do patrimônio museológico, bem como desenvolver pro-
gramas educativos e culturais para diferentes públicos. A Museologia moderna
se desenvolveu na Europa no século XX, e desde então tem se expandido para
diferentes áreas e países. Autores importantes nessa área incluem: Paul Philip-
pot, Bernard Laumonier, Ivan Karp, Susan Pearce, entre outros.
A Museologia é um campo cientíco que partilha pressupostos com
a Ciência da Informação, conforme aponta Ribeiro (2016). Para esta autora,
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diferentes pesquisadores não são unânimes em relação ao grau de aproxima-
ção entre os dois campos do saber. Apesar disso, é certo que os conceitos de
“informação”, “dado”, e de “documento” desempenham papel importante no
campo cientíco da Museologia e nos museus, assim como para a Ciência da
Informação.
Barreto e Lubisco (2022: 196) explicam que “ao longo do tempo, com o
surgimento dos centros culturais ou centros de memória, as instituições classi-
cadas como ‘casas de patrimônio, perfaz uma intersecção entre museus, biblio-
tecas e arquivos”. Estes autores ainda estabelecem que uma “relação comum en-
tre as bibliotecas e museus era a reunião de coleções com vistas à preservação.
O objetivo era a preservação de exemplares voltada aos estudos, à aquisição de
conhecimento”(Idem), ou seja, tinham relação com a informação que perpassa
esse processo de aquisição de conhecimento.
Conforme Ribeiro (2016:124), os teóricos do campo da Museologia
consideram fundamental a distinção entre a Museologia e a instituição “museu”.
Estudos em Museologia têm deslocado o foco do local “museu” para o “fato
museal”, ou seja, aquilo que pode se transformar em objeto de interesse para o
museu e os grupos sociais com os quais ele se relaciona. Assim como as biblio-
tecas, museus têm diferentes tipologias e, dentre essas, estão aquelas que atuam
em maior proximidade com instituições de ciência e tecnologia, por exemplo,
os museus e as coleções universitárias. Os museus situados nesta perspectiva de
atuação geralmente se relacionam com coleções cientícas geradas a partir de
objetos musealizados, ou seja, tornados itens de museu, pois motivam interesse
cientíco. Dentre eles, estão os fósseis.
Barreto e Lubisco (2022) descrevem que, “por se tratar de um objeto,
o fóssil é abrigado em museus” (p.198). Segundo os autores, neste processo é
quando os fósseis têm a si atribuído o valor de documento, pois passam a exer-
cer outras funções, com outros signicados, em especial a partir do olhar da
Paleontologia. Nesta direção, é correto armar que os museus desempenham
um papel importante para a Paleontologia. Numa perspectiva histórica, tão logo
começaram a se constituir enquanto espaços de salvaguarda e tratamento de
coleções, os museus passaram a receber materiais fósseis, processo que se
desenvolveu em conjunto com o desenvolvimento da Paleontologia enquanto
campo cientíco.
Paleontologia e os fósseis
A Paleontologia é o estudo da vida fóssil e de seus indícios no registro
fossilizado, abrangendo aspectos biológicos e geológicos (Vidal; Candeiro, 2015).
Para Siciliano, “a relação da Paleontologia com a geologia e com a biologia é an-
tiga, podendo ser explicada pela história do seu nascimento como campo cientí-
co. Esses três campos cientícos são oriundos da História Natural” (2018: 18).
Enquanto campo cientíco, assim como todas as outras áreas da ciência, como
apontado por Targino (2000), a Paleontologia é dependente da informação, sua
produção e circulação, para avançar em relação à compreensão de seu objeto.
São os registros da informação gerada a partir dos dados cientícos paleontoló-
gicos e sua movimentação no campo que possibilitam que esses novos saberes
produzidos em processos de geração de conhecimento sejam transmitidos por
meio da comunicação.
A Paleontologia compreende diferentes subáreas, dentre as quais po-
dem ser citadas a paleobotânica (cujo objeto de estudo são fósseis de plantas,
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algas e fungos; a micropaleontologia (que se dedica a estudar os microfósseis); a
paleoclimatologia (clima); a paleoecologia (relações entre seres vivos extintos);
e a tafonomia (que se dedica a compreender o processo de fossilização); entre
outros. O primeiro registro de descoberta de um fóssil publicado segundo os
preceitos da ciência moderna, conforme Sarjeant (1997), é de um osso fóssil
encontrado por Sir Thomas Penyston (1591-1644) e divulgado na obra Natural
History of Oxfordshire (1677), do naturalista inglês Robert Plot (1640-1696). O
interesse humano por fósseis, no entanto, é muito mais antigo e sabe-se que
populações humanas se relacionam com estes objetos pelo menos desde o Pa-
leolítico (entre 2 milhões de anos e 10 mil anos atrás), conforme Faria (2005).
Além disso, segundo este mesmo autor, os signicados atribuídos aos
fósseis foram progressivamente mudando ao longo do tempo. Faria (2005) indi-
ca que fósseis são interpretados com diferentes signicados por seres humanos
desde a Pré-História Humana, passando pela Antiguidade, pela Idade Média e
pela Idade Moderna, quando começa-se a instaurar uma compreensão de fato
cientíca para este tipo de objeto, a despeito dos signicados místicos e míticos
que lhes foram atribuídos ao longo da maior parte do tempo. Com a inaugura-
ção de estudos sistemáticos de anatomia e estratigraa comparada, como os de
Jean Léopold Nicolas Frédéric, conhecido como Georges Cuvier (1769–1832),
um grande estimulador deste tipo de abordagem, os estudos em torno dos
fósseis passaram a ser progressivamente mais organizados e acurados. É con-
ferido à Cuvier o pioneirismo em pesquisas sistemáticas realizadas sobre os
fósseis. “Os séculos XVIII e XIX foram muito importantes para a Paleontologia
e sua consolidação como ciência. Nesse período, os estudos em Paleontologia
aumentaram, despertando cada vez mais o interesse dos naturalistas e também
do público leigo”, descreve Siciliano (2018: 22).
De acordo com Davis (1997), para estudar o passado, a Paleontologia se
debruça, em especial, sobre os fósseis, que representam exceções circunstan-
ciais no processo natural de decomposição da matéria orgânica e que, quando
analisados, conseguem oferecer informações sobre determinado indivíduo em
especíco e indícios contextuais sobre condições alheias ao espécime, ou seja,
seu ambiente pretérito Além dos fósseis em si, outros traços indicativos de
vida biológica também são úteis à essa ciência. Fósseis são elementos raros e o
entendimento que se tem no campo da Paleontologia é o de que cada fóssil é
único por essência. Fósseis podem ser de dois tipos: os somatofósseis - restos
de elementos fossilizados; ou icnofósseis - marcas ou resquícios de elementos
fossilizados.
Na América Latina, os fósseis eram conhecidos das populações pré-
-coloniais e compunham lendas e mitos sobre animais fantásticos. Após os
processos colonizadores, os fósseis localizados nesta parte do mundo foram
ostensivamente coletados e estudados pelos naturalistas dos países coloniza-
dores fora dos seus locais de origem. Com as independências das colônias, logo
surgem estudos realizados nos países recém-inaugurados, como o México e
Brasil, por pesquisadores locais e estrangeiros radicados (Siciliano, 2018; Cis-
neros et al., 2022). De acordo com Siciliano (2018), a Paleontologia no Brasil,
nos primórdios, seguiu movimentos similares. O dinamarquês Peter Wilhelm
Lund (1801-1880) e o estadunidense Orville Adalbert Derby (1851-1915) são
os dois primeiros nomes de destaque nas áreas da Paleontologia e Geologia a
produzirem pesquisas no país.
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Intersecções entre Ciência da Informação, Paleontologia e Museologia:
uma análise da bibliograa publicada
MUSEOLOGIA & INTERDISCIPLINARIDADE Vol. 13, nº25, Jan./Jun. 2024
Fósseis: documentos que contém dados cientícos
A revolução tecnológica dos últimos anos trouxe uma série de avanços
para a Paleontologia, permitindo aos cientistas coletar, armazenar e analisar da-
dos de maneira mais precisa e eciente do que nunca antes. Grandes progressos
em Paleontologia são realizados atualmente a partir de análises performadas
com quantidades de dados impensáveis aos precursores das pesquisas na área.
Essa ampla variedade de dados é possível graças ao crescimento do campo
cientíco, mas também à sistematização dos procedimentos de pesquisa e, es-
pecialmente, ao implemento da tecnologia.
Apenas para se ter uma ideia da grande quantidade de informação dis-
ponível para pesquisas em Paleontologia, uma base de dados, a Paleobiology Da-
tabase, contempla mais de 466 mil táxons atualmente. Táxons, em Biologia, são
indivíduos que, de acordo com suas características, podem ser agrupados para
formar uma unidade, por exemplo, uma espécie ou um gênero.
Um estudo publicado por Mora et al. (2011) estimou que o número
atual de espécies vivas é de cerca de 8,7 milhões, das quais apenas 1,2 milhão
é conhecida pela ciência. Considerando que as evidências descritas da vida na
Terra têm pelo menos 3.77 bilhões de anos (Cavalazzi et al., 2021; Dodd et al.,
2017), ou seja, a evolução tem atuando sobre a vida por todo esse período, o nú-
mero de táxons, a quantidade de espécies e, consequentemente, a quantidade
de informações relativas ao passado da vida que o registro fóssil guarda é inco-
mensurável. Uma das principais maneiras pela qual os dados têm revolucionado
a paleontologia é através do uso de técnicas de escaneamento 3D e impressão
3D, de acordo com o Medeiros et al. (2007). O escaneamento permite a gera-
ção de modelos tridimensionais constituídos por pontos digitais que possam
ser manipulados online e a impressão gera objetos materiais, dependendo das
proporções do fóssil reproduzido. Isso permite aos cientistas criar modelos
virtuais precisos dos fósseis, que podem ser estudados e compartilhados com
facilidade. Isso também permite aos cientistas estudar fósseis sem danicá-los, o
que é especialmente importante para fósseis raros ou valiosos.
Outra maneira pela qual os dados têm revolucionado a paleontologia
é através do uso de técnicas de análise estatística e aprendizado de máquina.
Isso permite aos cientistas analisar grandes quantidades de dados de fósseis
de maneira automatizada, o que é particularmente útil para estudar tendências
evolutivas e relações logenéticas (relações de evolução entre espécies fósseis
e atuais). Além disso, a tecnologia de sensoriamento remoto, como drones e
satélites, tem permitido aos paleontólogos mapear áreas remotas e inacessíveis,
o que tem ampliado o acesso a novos sítios fósseis e aumentado a compreen-
são da distribuição espacial dos fósseis ao longo do tempo. Técnicas como essa
determinam com precisão as descobertas e evitam com locais ricos em infor-
mação sejam perdidos, como o sítio perdido por sete décadas e recentemente
redescoberto no Sul do Brasil por Ferraz et al. (2021).
Também, a paleontologia molecular, no campo da micropaleontologia,
tem se tornado cada vez mais importante, como é possível obter informações
genéticas ou de estruturas diminutas dos organismos extintos, o que permi-
te uma melhor compreensão das relações evolutivas e seus mecanismos, bem
como da composição de tecidos. Um caso interessante é o do estudo de Au-
reliano et al. (2021), que identicou parasitas no sangue e osteomielite aguda
– uma doença óssea – em um dinossauro saurópode da Formação Adamantina
do Cretáceo Superior, da Bacia de Bauru, no (atual) Sudeste do Brasil.
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Lucas George Wendt
Fabiano Couto Corrêa da Silva
Caterina Marta Groposo Pavão
ISSN 2238-5436
De forma ampla, a tecnologia e os dados têm revolucionado a paleon-
tologia, permitindo aos cientistas coletar, armazenar e analisar informações de
maneira mais precisa e eciente do que nunca antes. Isso tem levado a avanços
signicativos na compreensão das dinâmicas da evolução e da história da vida na
Terra. O volume de informações paleontológicas disponíveis, além das coleções
de museus, pode ser encontrado em bases de dados taxonômicos online, como
é o caso da internacionalmente reconhecida Paleobiology Database e do Sistema
Lund, uma iniciativa brasileira que, até onde foi possível levantar informações,
está disponível online mas não mais operando. Ambientes virtuais como os
citados são especícos para dados paleontológicos e buscam ser referência no
compartilhamento de informações entre os pesquisadores dessa área. Além
destas iniciativas, dados paleontológicos podem estar disponíveis em ferramen-
tas de uso mais amplo nas Ciências da Vida, como o Specify Software, a Catalogue
of Life, a ZooBank e a Encyclopedia of Life.
Ghilardi, Soler e Langer (2012) descrevem algumas aplicações dos ban-
cos de dados paleontológicos, entre elas as de que as bases beneciam pes-
quisas que têm como objetivo correlacionar volumes maiores de informações.
Segundo Ghilardi, Soler e Langer (2012: 207), a necessidade de elaboração de
um banco de dados paleontológico único decorre de diversos fatores, tais como
conhecer o perl das coleções individualmente e em conjunto, proporcionar a
eciente troca de informações sobre espécimes, orientar novas coletas e ex-
plorações de sítios paleontológicos, apontar perspectivas de estudos dentro do
potencial de cada instituição, garantir rapidez e dinamismo na troca de informa-
ções entre as instituições, proteger a segurança dos dados, e permitir análises
mais completas da paleodiversidade.
Estes pesquisadores ainda descrevem algumas diculdades relacionadas
à falta de padronização no registro dos dados relativos aos fósseis em coleções
espalhadas pelo Brasil, em estudo publicado sobre o Sistema Lund, bem como a
comum ausência de espécimes descritos nas referidas coleções e a diculdade
de integração entre as coleções museológicas nas que guardam os fósseis. Todos
esses problemas podem ser superados com a ampliação dos repositórios de
dados digitais nesta área, também uma forma de intercambiar as informações
cientícas presentes nas coleções sob tutelas dos museus.
Procedimentos metodológicos
Este artigo tem como objetivo analisar os estudos publicados no campo
cientíco da Ciência da Informação (CI) e, por extensão, também no campo
da Museologia sobre os fósseis e a Paleontologia, procurando observar, espe-
cialmente, pesquisas que abordem os conceitos de “dado” e de “documento”
nestes domínios cientícos. Não foi estabelecido recorte temporal. Foi rea-
lizada uma revisão bibliográca para identicação da literatura publicada em
Português sobre os entrecruzamentos destes temas, utilizando como fonte de
pesquisa a Base de Dados Referencial de Artigos de Periódicos em Ciência da
Informação (Brapci), a Biblioteca Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) e o
Google Acadêmico. Estes três mecanismos permitem a busca de diferentes tipo-
logias de documentos, bem como diferentes abrangências, com ênfase especial
dada nesta pesquisa aos artigos cientícos publicados em periódicos, trabalhos
apresentados em eventos e dissertações e teses apresentadas para obtenção de
títulos acadêmicos.
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Intersecções entre Ciência da Informação, Paleontologia e Museologia:
uma análise da bibliograa publicada
MUSEOLOGIA & INTERDISCIPLINARIDADE Vol. 13, nº25, Jan./Jun. 2024
Inicialmente a intenção era realizar um estudo bibliométrico, procuran-
do estabelecer alguns indicadores relacionados à produção dos documentos
abordando “dados”, “fósseis”, “documentos”, “Ciência da Informação” e “Pale-
ontologia”, em uma abordagem quali-quantitativa dos documentos recuperados.
Logo, no entanto, vericou-se poucos estudos em Ciência da Informação que ti-
veram a Paleontologia e os fósseis como objeto de pesquisa, conforme apontam
os resultados da busca na Brapci e na BDTD, bases que se constituíam os focos
originais do estudo. Todos os documentos recuperados nestas bases foram li-
dos integralmente. Alargou-se a pesquisa, então, para a inclusão da interface de
pesquisa com a “Museologia”, por experiências empíricas que permitiram esta-
belecer que este campo do saber dialoga em maior proximidade com a Paleon-
tologia. Na Museologia estudos relacionados à Paleontologia e fósseis são mais
frequentes. Neste campo do saber, bastante familiarizado com o conceito de
“documento”, especialmente, os estudos encontrados discutem a situação dos
fósseis como “documentos” antes, durante e após o processo de musealização.
Para tentar encontrar novos resultados e qualicar mais esta investi-
gação, foram performadas as mesmas buscas no Google Acadêmico que, neste
caso, apontou um número muito superior de resultados, mas a imensa maioria
sem atinência à especicidade da estratégia de busca e, consequentemente, aos
objetivos deste estudo. Os resultados encontrados foram, então, analisados e
discutidos à luz da literatura cientíca proveniente dos campos da CI, espe-
cialmente de estudos sobre Ciência Aberta e reprodutibilidade cientíca, mas
também Museologia e, eventualmente, Paleontologia. As estratégias de busca
utilizadas em cada base estão descritas no Quadro 1, disposto aqui sem a in-
tenção de estabelecer comparação entre os resultados encontrados. Além das
estratégias descritas - aquelas que se mostraram como as mais profícuas - foram
realizadas outras que, pela abertura e abrangência dos resultados, não foram
consideradas nesta pesquisa. Estratégias que incluíam o substantivo “fóssil” e
buscas compostas foram testadas, também sem resultados. No caso da busca
por “paleontologia” no Google Acadêmico e na BDTD, estratégia relevante no
caso da Brapci, vericou-se a irrelevância dos resultados, de forma que eles não
foram incluídos nesta pesquisa.
Bases Museologia AND
Paleontologia
Paleontologia
AND mus*
“Ciência da
Informação” AND
Paleontologia
biblio* AND
paleon*
Paleontologia
BDTD 4 6 2 320 -
Brapci 1 1 0 3 4
Google Acadêmico 6640 21800 1010 17800 -
Apresentação e análise dos resultados
Uma vez que os resultados das buscas por referências não se mostraram
profícuos, nesta seção eles apenas serão apresentados para informar ao leitor,
dando uma ideia daquilo que se discutiu até então na intersecção entre os te-
mas investigados neste estudo.
A busca na BDTD por “museologia AND paleontologia” resultou em
quatro dissertações: “O papel da curadoria no gerenciamento de coleções mu-
seológicas de paleontologia no Brasil”, de autoria de Lilian Alves da Cruz, de-
Quadro 1
Fonte: os autores (2023).
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Lucas George Wendt
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fendida em 2019; “Iconograa paleontológica em narrativas de exposições de
História Natural”, de autoria de Felipe Alves Elias, defendida em 2015; “O tempo
geológico nas narrativas de museus de história natural: uma análise comparati-
va”, de autoria de Rebeca Ribeiro Bombonato, defendida em 2016; e “Os “dinos-
sauros” como marcas patêmicas: a relação museu/escola na comunidade rural
de Peirópolis, município de Uberaba/MG”, de autoria de Carmen Lucia Ferreira,
também defendida em 2016.
Já a busca na mesma base por “paleontologia AND mus*” adicionou à
esta pesquisa os resultados: “O acervo paleoictiológico do Aptiano-Albiano da
Formação Santana (Bacia do Araripe), existente nas coleções do Museu de Pale-
ontologia e Estratigraa Paulo Milton Barbosa Landim, DGA-IGCE UNESP Rio
Claro”, de autoria de Cibele Gasparelo Voltani, defendida em 2011; “Turismo e
interpretação do patrimônio paleontológico: um estudo em museus de história
natural com considerações para o Museu da Terra e da Vida, em Mafra - SC”;
de autoria de Eliane de Fatima Vila Lobus Strapasson, defendida em 2017; “As
exposições e seus públicos: a paleontologia no Museo de La Plata (Provincia de
Buenos Aires, Argentina)”, de autoria de Sandra Elena Murriello, defendida em
2006; “Museus de paleontologia no Brasil e a paleontologia nos museus bra-
sileiros”, de autoria de Paulo César Manzig, defendida em 2015; e “Narrativas
paleontológicas nos museus paulistas: uma análise comparativa”, de autoria de
Bianca Bonicio Crociari, defendida em 2020.
A pesquisa por ““ciência da informação” AND paleontologia” na BDTD
retornou dois resultados, ambos artigos cientícos: “Paleontologia brasileira:
uma análise sob o ponto de vista da maturidade”, de autoria de Mell Longuinho
André Siciliano, defendida em 2018; e “Preservação digital de acervos paleonto-
lógicos: os achados fósseis do poço azul na Chapada Diamantina/BA – uma con-
tribuição ao desenvolvimento econômico, social e cultural de Nova Redenção/
BA”, de autoria de Nivaldo de Souza Barreto, defendida em 2021.
A busca na BDTD por “biblio* AND paleon*” retornou 320 resultados,
dentre os quais os apresentados acima e muitos outros relacionados exclusiva-
mente ao campo cientíco da Paleontologia.
Na Brapci, o resultado para as buscas “museologia AND paleontologia”
e “paleontologia AND mus*” foi apenas o artigo “Museologia e paleontologia”,
de autoria de Marcus Granato e Joana David Caprário de Lima, publicado na
revista Tendências da Pesquisa Brasileira em Ciência da Informação em 2017.
A estratégia de busca ““ciência da informação” AND paleontologia” na
Brapci não apontou resultados. Por outro lado, “biblio* AND paleon*”, trouxe
três resultados: o artigo de Marcus Granato e Joana David Caprário de Lima de
2017; um artigo “A maturidade de um campo cientíco: uma proposta metodo-
lógica a partir da Paleontologia brasileira”, de Mell Longuinho André Siciliano e
Jacqueline Leta, publicado em 2020 na revista Informação & Sociedade: Estudos;
e o artigo “A Bibliograa do xisto”, publicado por múltiplos autores em 1981 na
revista Ciência da Informação.
A busca por “paleontologia” na Brapci apontou para os artigos de Mar-
cus Granato e Joana David Caprário de Lima, e de Mell Longuinho André Sicilia-
no e Jacqueline Leta.
As buscas no Google Acadêmico apresentam resultados adicionais na
casa dos milhares. As primeiras páginas de resultados foram analisadas em de-
talhe, sendo que se vericou que os resultados recuperados eram, muitos deles,
repetidos e sobrepostos em relação àqueles encontrados na Brapci e na BDTD
e sem relevância para o contexto deste estudo já a partir da segunda página.
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Intersecções entre Ciência da Informação, Paleontologia e Museologia:
uma análise da bibliograa publicada
MUSEOLOGIA & INTERDISCIPLINARIDADE Vol. 13, nº25, Jan./Jun. 2024
Percebe-se que os poucos resultados obtidos passeiam por outras áreas
de intersecção entre Paleontologia e Museologia e, eventualmente, Ciência da
Informação, como é o caso do material publicado por Siciliano.
A presença de resultados na Brapci, BDTD e no Google Acadêmico, no
entanto, não indica que estes estudos encontrados tenham relevância para com
os propósitos desta pesquisa, que procurou encontrar estudos envolvendo ele-
mentos/conceitos como “dados”, “documentos”, “reprodutibilidade cientíca”
em Ciência da Informação, Paleontologia e Museologia.
No caso dos estudos publicados voltados à área da Museologia, nenhum
trata diretamente os fósseis como recursos informativos em essência, mas sim,
enquanto objetos museológicos que guardam dados e, quando interpretados,
informações. Também chama a atenção o aparente fato de que as discussões
em torno de objetos digitais oriundos do escaneamento dos fósseis ainda não
foram realizadas em Museologia.
A análise dos resultados da pesquisa bibliográca e da revisão da litera-
tura publicada permite estabelecer que o entendimento de que fósseis contém
dados cientícos é disseminado entre os pesquisadores da área da Paleontolo-
gia. Por sua vez, a compreensão de que fósseis são documentos é também bem
estabelecida na área da Museologia, a despeito da possibilidade de novas abertu-
ras de discussão e trabalho possíveis para Museologia, relacionadas aos objetos
digitais provindos do manejo dos fósseis e da criação e integração de banco de
dados para facilitar o acesso às diferentes coleções.
Como a Ciência da Informação pode se inserir neste debate? Acredita-
-se que, além de outras possibilidades, como a realização de mapeamentos so-
bre a própria constituição do campo cientíco da Paleontologia e suas caracte-
rísticas, uma possibilidade que se abre à Ciência da Informação é, justamente, a
da investigação da conexão entre os fósseis, objetos-documentos aos quais se
atribui informação, aos estudos sobre práticas de reprodutibilidade cientíca
neste campo do saber – especialmente aqueles apoiados pelo trabalho desen-
volvido em museus.
O desenvolvimento de bancos de dados e repositórios digitais com
informações sobre fósseis, em por exemplo, estruturas de apoio aos museus,
museólogos e paleontólogos é uma possibilidade. A criação de padrões de me-
tadados especícos para este tipo de objeto também podem ser citadas como
relevantes. As iniciativas existentes de bancos de dados em Paleontologia e que
sejam de maior abrangência são praticamente todas desenvolvidas por pesqui-
sadores paleontólogos.
A partir da leitura da bibliograa levantada sobre a produção cientíca
em Ciência da Informação e em Museologia relacionada à Paleontologia e aos
fósseis, identicaram-se poucos estudos que tratam dos fósseis como objetos-
-documentos que contém dados e suas múltiplas possibilidades. No entanto,
cumpre-se ressaltar que, enquanto objetos musealizados, é consolidado na Mu-
seologia o valor documental e informativo dos fósseis, conforme apresenta a
literatura da área. No que se relaciona com a Ciência da Informação, entretanto,
a literatura cientíca consultada publicada em Português ainda não relacionou
os conceitos de ciência aberta e reprodutibilidade cientíca aos objetos fósseis
e à área da Paleontologia, bem como não se apropriou desta discussão.
Percebe-se uma baixa produção em Ciência da Informação relacionada
ao campo cientíco da Paleontologia, em primeira instância, e nenhum estudo
que trate especialmente, dos fósseis como objetos-documentos que contém
dados e dos seu papel nas questões de reprodutibilidade cientíca por meio, por
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exemplo, da criação/ suporte à criação de bancos de dados característicos para
este domínio. Dessa forma, é possível apregoar que pouco se discutiu sobre os
conceitos de ciência aberta e reprodutibilidade cientíca neste campo do saber
a partir do olhar de prossionais da informação.
A Museologia, como visto, já trata os fósseis como objetos informativos.
Como objeto-base da pesquisa em Paleontologia é dos fósseis que os pesqui-
sadores deste campo do saber extraem as informações para a produção do
conhecimento, neste âmbito é natural que os paleontólogos encarem os fósseis
como essencialmente informativos.
Defende-se que a Ciência da Informação, ao se aproximar mais da Mu-
seologia, já familiarizada com os fósseis enquanto objeto de interesse, pode
estabelecer conexões e somar seus escopos teóricos ao tratamento desses ele-
mentos informativos. Isso, especialmente a partir de áreas e práticas emergen-
tes, com as da Ciência Aberta e da reprodutibilidade cientíca, congurando-se
até numa nova agenda de pesquisa. Paul Otlet (1868-1944), ainda 1934, em seu
“Tratado sobre documentação”, trazia uma denição ampla sobre o documento,
conceito este que se encaixa perfeitamente aos fósseis.
Os museus desempenham um papel importante para a Paleontologia e
suas dinâmicas. Em geral é nos museus que se acondicionam os objetos fósseis
que permitem à ciência da Paleontologia o seu desenvolvimento. Os fósseis pas-
sam por um trabalho de curadoria e documentação para serem armazenados
nos museus, o que permite que, em paralelo ao trabalho cientíco gerador de
informações que os paleontólogos atribuem ao material, informações comple-
mentares sejam agregadas pelos museólogos.
Como documentos de uma realidade pretérita, como bens patrimoniais
nacionais, como fonte de dados e recursos cientícos, como entidades únicas
que, em si, não podem ser reproduzidas sob nenhuma outra circunstância, os
fósseis provam seu valor em diferentes esferas e demandam tratamento para
que preservem a riqueza de informações que lhe é atribuída. Além de tratamen-
to, demandam que seu valor seja compartilhado.
Nesta direção, a existência das coleções de museus, que salvaguardam
este tipo de recurso informacional é elementar para a Paleontologia e para o
desenvolvimento da própria ciência paleontológica.
Uma das práticas consolidadas do campo cientíco da Paleontologia, e
para a qual as coleções musealizadas contribuem é, justamente, a reprodutibili-
dade cientíca. No contexto das pesquisas em Paleontologia, também é impor-
tante destacar que o contato com o objeto fóssil original que motivou determi-
nado estudo, o holótipo, ainda se faz importante, a despeito de técnicas novas de
transposição de recursos como modelos 3D de fósseis para o ambiente digital.
Desse modo, a reprodução cientíca pode ser considerada um princípio
fundamental para garantir a conabilidade e validade dos resultados obtidos em
pesquisas cientícas. No campo da paleontologia, a reprodução dos resultados
é particularmente importante, pois os fósseis são uma fonte única e irrepetível
de dados sobre a história da vida na Terra.
A reprodução cientíca permite que outros pesquisadores veriquem
e validem os resultados obtidos por meio de experimentos ou estudos, ga-
rantindo a conabilidade dos dados e a validade das conclusões. Além disso, a
reprodução cientíca também é importante para garantir a precisão e a cona-
bilidade das técnicas utilizadas na paleontologia, como a datação radiométrica, a
reconstrução de animais extintos e a análise estatística de dados fósseis.
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Intersecções entre Ciência da Informação, Paleontologia e Museologia:
uma análise da bibliograa publicada
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Toda publicação cientíca na área da Paleontologia conserva junto de si o
número de tombo em alguma coleção dos fósseis aos quais faz referência. O com-
partilhamento dos dados de determinada pesquisa em si é algo que precisa ser
estimulado, mas a pura existência do compartilhamento do identicador único
dos objetos em alguma coleção pode ser entendida como uma maneira explícita
de garantir que os dados cientícos que possam ser atribuídos a determinado
fóssil também possam ser consultados, analisados e atribuídos por outros pesqui-
sadores por meio da disponibilização daquele material para novas pesquisas.
Garantir que os fósseis sejam encontrados, estejam acessíveis e possam
ser reutilizados oferece transparência ao processo cientíco, economia de cus-
tos e, também, estimula que materiais fósseis sejam contestados ou reinterpre-
tados. Esse processo garante benefícios múltiplos à prática paleontológica e seu
desenvolvimento enquanto campo cientíco.
Em relação à Ciência da Informação, Museologia e a Paleontologia é
clara uma relação que se estabelece por meio de conceitos como “informação”,
“dado” e “documento”, mas, também, por meio de campos o da Ciência Aberta,
da Comunicação Cientíca e da reprodutibilidade cientíca, uma vez que todas
estas áreas e conceitos se relacionam e possuem imbricamentos que podem ser
mais aprofundados.
Considerações Finais
A interdisciplinaridade entre Ciência da Informação, Paleontologia e Mu-
seologia pode levar a descobertas inovadoras e a uma melhor compreensão
da história da vida na Terra. Em relação aos objetivos estabelecidos para esta
pesquisa, de fato a), de “identicar a existência de pesquisas em Museologia que
entendam os fósseis como documento que contém dados cientícos”, espe-
cialmente a partir da pesquisa em coleções cientícas. Não foram encontrados
estudos neste sentido em Ciência da Informação.
Em relação ao objetivo b), de “localizar estudos que abordem fósseis,
museus, Ciência da Informação, Paleontologia e Museologia, bem como a re-
produtibilidade cientíca”, é possível encontrar estudos publicados que sondam
essa temática de forma indireta, uma vez que os estudos sobre as coleções
cientícas em museus podem ser entendidos desta forma, mas de forma direta,
não foram encontradas pesquisas que abordem, em Ciência da Informação e
em Museologia, a reprodutibilidade cientíca de forma direta.
Sobre os objetivos c e d), respectivamente, o de “aproximar a Paleonto-
logia da Ciência da Informação por meio de uma pesquisa de caráter bibliográ-
co e exploratório e da discussão de trabalhos realizados nesta interface”, e o
de “demonstrar a necessidade de estudos sobre a área da Paleontologia como
campo de interesse no âmbito da CI”, conclui-se que, a partir dessa pesquisa,
esses laços foram estreitados mas que o desenvolvimento de mais pesquisas no
espectro destes temas trará mais contribuições ao desenvolvimento da Ciência
da Informação, da Museologia e da Paleontologia.
Como conclusões, demonstra-se que a literatura cientíca, especialmen-
te aquela oriunda da Museologia, considera que fósseis podem ser interpretados
como “documentos” que contém “dados”. Para a Paleontologia este é um co-
nhecimento bem estabelecido. Destaca-se que esta proposta de estudo nasceu
com um objetivo e que, a escassez de estudos relacionados à Paleontologia e
Ciência da Informação em interface estabeleceu uma nova orientação para a
abordagem.
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É necessário investigar em maior detalhe as práticas de ciência de re-
produtibilidade cientíca realizadas em Paleontologia e a relação dessas ações
com os museus, bem como seu respectivo papel neste processo e pontes pos-
síveis com a Ciência da Informação por meio, por exemplo, da criação, apoio e
sustentação de bancos de dados que mobilizem informações paleontológicas e
conhecimentos teórico-práticos da Ciência da Informação e da Museologia em
torno de um objetivo comum: o de ampliar o conhecimento sobre a vida do
passado a partir das informações contidas nos documentos fósseis.
Além disso, aconselha-se a realização de outros estudos que estabele-
çam ligações entre Paleontologia e Ciência da Informação, área que, com seus
atributos, pode contribuir para o desenvolvimento e maior reconhecimento da
Paleontologia enquanto campo cientíco. Por meio deste estudo foi estabeleci-
da uma abordagem reunindo todos estes temas, com a perspectiva de se seguir
investigando as relações subjacentes a todos estes campos cientícos e suas
interfaces.
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