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PSICOLOGIA E “SAÚDE MENTAL” DE POVOS INDÍGENAS: revisão sistemática dos anos de 2014 a 2020

Authors:

Abstract

O presente artigo busca dar continuidade às revisões sistemáticas já realizadas anteriormente no Brasil sobre o tema Psicologia, Saúde Mental e Povos Indígenas. Buscou-se levantar e analisar os artigos publicados por psicólogos (ou na área da psicologia) sobre saúde mental indígena durante o período de 2014 até junho de 2020. Foram selecionados 36 artigos, classificados em seis categorias, a saber: Conceituais/Teóricos (4); Violência (7); Saúde Indígena (11); Ensino (8); Prática e Saberes Tradicionais (3); Políticas Públicas (3). Apesar dos altos índices de suicídio indígena no país e do uso abusivo de álcool, apenas 4 artigos trouxeram discussões diretas sobre “saúde mental indígena”, utilizando ou o próprio termo “saúde mental” e/ou o termo “bem-viver”.
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Revisão: O Autor
DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)
CATALOGAÇÃO NA FONTE
Bibliotecária responsável: Luzenira Alves dos Santos CRB9/1506
E84
Ética e política contracolonial / Flávia Cristina Silveira Lemos, Dolores Galindo, Pedro
Paulo Gastalho de Bicalho, Aluísio Ferreira de Lima, João Paulo Pereira Barros, Silvio José
Benelli, Manoel Ribeiro de Moraes Júnior, Fernanda Teixeira de Barros Neta (organizadores) –
Curitiba : CRV, 2024.
856 p.
Bibliografi a
ISBN Digital 978-65-251-5765-8
ISBN Físico 978-65-251-5769-6
DOI 10.24824/978652515769.6
1. Psicologia 2. Ética – Política 3. Contracolonialidade 4. Antropologia I. Lemos, Flávia
Cristina Silveira, org. II. Galindo, Dolores, org. III. Bicalho, Pedro Paulo Gastalho de, org. IV.
Lima, Aluísio Ferreira de, org. V. Barros, João Paulo Pereira, org. VI. Benelli, Silvio José, org.
VII. Moraes Júnior, Manoel Ribeiro de, org. VIII. Barros Neta, Fernanda Teixeira de, org. IX.
Título X. Série.
CDU 159 CDD 150
Índice para catálogo sistemático
1. Psicologia - 150
2024
Foi feito o depósito legal conf. Lei nº 10.994 de 14/12/2004
Proibida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização da Editora CRV
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PESQUISA EM CIÊNCIAS
HUMANAS E SOCIAIS:
trabalho e mudanças na tríplice fronteira da Amazônia sul ocidental ...........379
Enock da Silva Pessoa
HOMESCHOOLING:
apontamentos críticos sobre essa proposta na realidade brasileira .............397
Maria Emília Ferreira Machado
Luiza Oliveira Bretas Santos
Celso Francisco Tondin
QUARTAS TRANSEXUAIS:
atendimento de saúde prisional a mulheres transexuais na penitenciária
feminina do DF ............................................................................................. 411
Aline Xavier
Valeska Zanello
Isabela Rocha Peixoto
Fábio William Fernandes
Lenilton Martins
MASCULINIDADES NA AMAZÔNIA:
pensamentos a partir de uma perspectiva decolonial. .................................. 431
Rodrigo Cleber Leão de Oliveira
Eric Campos Alvarenga
A COLONIALIDADE SOBRE OS CORPOS ..............................................451
Lucas de Almeida Modesto¹
Michelle Conceição Guimarães Silva²
PSICOLOGIA E “SAÚDE MENTAL” DE POVOS INDÍGENAS:
revisão sistemática dos anos de 2014 a 2020 ..............................................465
Jaqueline Calafate
Valeska Zanello
POR UMA DECOLONIALIDADE LADINA INDÍGENA-AMÉFRICANA
EXERCITANDO A DESOBEDIÊNCIA EPISTÊMICA A PARTIR DO
RESTO DO RESTO DO MUNDO ............................................................... 481
Lwdmila Constant Pacheco
João Paulo Pereira Barros
PRÁXIS POLÍTICA SOCIOAMBIENTAL: conceitos e ações
psicossociais para adiar o fi m do mundo ......................................................493
Leandro Amorim Rosa
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PSICOLOGIA E “SAÚDE MENTAL” DE
POVOS INDÍGENAS:
revisão sistemática dos anos de 2014 a 2020
Jaqueline Calafate
Valeska Zanello
O Brasil é um país marcado pela diversidade étnica e cultural: dentre outros
agrupamentos, temos, ao todo, atualmente, mais de 300 etnias de povos originários
(Fundação Nacional do Índio, 2020) habitando total ou parcialmente em territórios
considerados (por nós) como brasileiros. A situação dessas comunidades é diversa:
desde agrupamentos que resistem em aldeamentos a comunidades ressurgidas, depois
de grave extermínio promovido pelos brancos (Instituto Socioambiental, s.d.).
O processo de formação do Estado brasileiro, com suas políticas de interiori-
zação, amplamente incentivadas desde o governo de Getúlio Vargas e, sobretudo,
durante a Ditadura Militar (Davis, 1978), trouxe consequências devastadoras para
a maior parte dessas comunidades, tais como a desterritorialização, doenças “de
branco”, fabricação do empobrecimento, perda de identidade cultural, morte dos mais
velhos, etc. Muitos desses fatores tiveram e têm tido desdobramentos naquilo que
nós brancos denominamos como “saúde mental” (Zanello; Batista, 2017), tais como
o uso de álcool e aumento do número de suicídios nas aldeias.
A questão da saúde mental indígena no Brasil passou a ser considerada efetiva-
mente uma questão de saúde pública somente a partir de 2007, com a publicação da
Portaria nº 2.759 (2007), a qual estabelece as diretrizes gerais desta política e criou
o Comitê Gestor da Política de Atenção Integral à Saúde Mental das Populações
Indígenas (PNASPI). A partir de 2010, com a criação da Secretaria Especial de Saúde
Indígena (SESAI) vinculada ao Ministério da Saúde (MS), houve uma ampliação
do número de equipes multidisciplinares de saúde indígena e, nela, o profi ssional de
psicologia também foi contemplado.
Internacionalmente, a área da psicologia tem trazido contribuições para as discus-
sões do campo da saúde mental indígena. No entanto, dentro desse cenário é preciso
debater as limitações que se relacionam com temas como tradução de signifi cados,
confi guração cultural dos sintomas em saúde mental e especifi cidades culturais de cada
grupo étnico, acerca do que é denominado como sofrimento psíquico e suas expressões.
Estes estudos têm sido realizados amplamente em países como Canadá, França, Portu-
gal, Estados Unidos, Itália e Reino Unido, com base na contribuição da psiquiatria por
meio de trabalhos sobre transculturalidade e etnopsiquiatria (Lechner, 2009).
No que tange ao tema da tradução de signifi cados, Martínez-Hernáez (2000)
abordou a participação da cultura e de seus sentidos/signifi cados partilhados social-
mente na confi guração dos sintomas. Segundo ele, os sintomas são formas expressivas
que refl etem os mundos locais de sentido (Martínez-Hernáez, 2000). Nichter (1981)
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denominou isso de “idiomas de afl ição”, existentes em todas as sociedades, com suas
especifi cidades. Segundo ele, “idiomas de afl ição (sofrimento/mal-estar) são meios
social e culturalmente ressonantes de experienciar e expressar afl ição/mal-estar em
mundos locais” (Nichter, 2010, p. 405). Ou seja, trata-se de respostas plausíveis,
adaptativas, ou tentativas de resolver uma situação de sofrimento/adoecimento em
uma direção culturalmente signifi cante.
As classifi cações utilizadas no mundo ocidental, tais como o Manual Diag-
nóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM) e o Classifi cação Estatística
Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID), seriam
assim a descrição de idiomas de afl ição culturalmente partilhados nesse universo,
não podendo ser transladados diretamente para outros mundos e vivências culturais
diferentes, tais como os diversos grupos étnicos em nosso país.
No Brasil, a discussão sobre saúde mental em grupos étnicos indígenas ainda
é incipiente, tal como apontado nas publicações sobre revisão de literatura a esse
respeito (Vitale; Grubits, 2009; Ferraz; Domingues, 2016; Batista; Zanello, 2016).
Vitale e Grubits (2009), por exemplo, levantaram toda bibliografi a sobre o tema, nos
últimos vinte anos anteriores à publicação. As autoras observaram que as questões
culturais e identitárias estão no centro do interesse da Psicologia ao abordar a questão
indígena. Nesse sentido, consideram que demarcar a diferença por meio do estudo
das identidades é essencial para trazer novos aportes teóricos sobre o tema.
Já o estudo de Batista e Zanello (2016) apresentou um resultado pífi o de produções
acadêmicas nesta área, no período de 1999 a 2012. Dos 5510 artigos levantados, restaram
apenas 14 sobre o tema, mesmo se tratando de uma revisão de literatura que abrangeu
toda a área pluridisciplinar de saúde mental em contextos indígenas, e com uma datação
de busca bem mais ampla do que o levantamento feito por Ferraz e Domingues (2016),
que se restringiu ao ano de 2013. Esta última pesquisa buscou evidenciar artigos produ-
zidos somente pela área da psicologia brasileira sobre o tema da saúde mental indígena.
Em todos os estudos brasileiros identifi cados nesses levantamentos, além de ser
pequeno o número de artigos encontrados, muitos poucos problematizaram a tradução
cultural, a diversidade de idiomas de afl ição/sofrimento, ou questionaram a validade
cultural do uso dos nossos manuais de classifi cação de sofrimento mental, tais como
o DSM ou o CID. Ou seja, apesar da urgência das demandas dos povos originários
no que tange ao sofrimento e à saúde mental (tais como aumento do número de
suicídios, alcoolismo, impactos das violências sofridas por parte da cultura branca,
dentre outras), sua invisibilidade, em suas especifi cidades, fez- evidente, perante a
produção epistemológica e a práxis da psicologia nacional. O presente artigo busca,
de certa forma, dar continuidade às revisões sistemáticas já realizadas anteriormente.
Nesse sentido, buscou-se levantar e analisar os artigos publicados por psicólogos
sobre saúde mental indígena durante o período de 2014 até junho de 2020.
1. Método
Foi realizada uma revisão sistemática de literatura, a qual possibilita que se
responda a uma questão específi ca, através da adoção de uma rigorosa metodologia,
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identifi cando, selecionando e avaliando criticamente os resultados (ROTHER,
2007). O levantamento bibliográfi co foi realizado através das plataformas virtuais:
Scientifi c Electronic Library Online (SciELO) e Biblioteca Virtual em Saúde
Psicologia Brasil (BVS-Psi).
A pesquisa se dividiu em 2 fases de buscas, que ocorreram entre os meses
de fevereiro/2020 a junho/2020. A primeira fase se deu na plataforma SciELO e a
segunda, na BVS-Psi. Em ambas as fases, foram utilizadas as fórmulas (Psic* OR
Saúde mental) AND (índio OR indígena) e (Psic* OR Saúde mental) AND (índios
OR indígenas). Além disso, elegeu-se o fi ltro para data de publicação (2014-2020).
É importante notar que, em relação às demais plataformas utilizadas neste estudo, a
mudança relativa ao descritor “saúde mental” na BVS-Psi, veio de um automatismo
próprio da plataforma. Quando colocada a fórmula (psic$ OR saúde mental AND índio
OR indígena), por exemplo, o conector AND é automaticamente colocado no meio
do descritor, virando “saúde AND mental”. Outro aspecto importante foi o uso do
cifrão ($). Caso fosse colocado o asterisco (*) depois do descritor “psic”, na tentativa
de ampliar o alcance do descritor, a busca não era reconhecida e o resultado era nulo.
Os critérios de exclusão utilizados foram os seguintes: a) eliminação de artigos
que não se referiam a discussões acerca da psicologia no contexto indígena, pois
apenas tangenciavam ou questões da psicologia ou de populações indígenas, sem
vínculo entre os dois; b) eliminação de artigos que não tratavam de populações
indígenas brasileiras; c) exclusão de artigos repetidos (manteve-se apenas sua pri-
meira aparição na busca); d) por m, artigos que tratavam de “índio” como elemento
químico (In) foram excluídos.
Foram utilizadas nas duas fases 8 combinações de descritores que resultaram em
148 artigos na Scielo, sobrando apenas 24 após a aplicação dos critérios de exclusão.
Na segunda fase, na BVS psi, encontrou-se 364 artigos, dos quais, após a aplicação
dos critérios, resultaram em 12 artigos. A exclusão nesta plataforma foi maior devido,
dentre outras razões, à duplicidade com os artigos previamente selecionados da Scielo.
Ao todo, somados os trabalhos resultantes das duas fases da pesquisa, obtive-
mos 36 produções, as quais abordam, seja como foco, seja como fundo, o tema da
saúde mental indígena. Esse modelo de classifi cação teve como parâmetro o trabalho
realizado por Damasceno e Zanello (2018). Levando em consideração a exiguidade
de artigos, ele visa ter a maior abrangência possível sobre o tema, considerando
tanto os artigos que o colocaram como foco de seus estudos, quanto aqueles que o
abordaram de forma secundária.
Foram lidos na íntegra os 36 artigos levantados. Destes, apenas 4 tinham como
foco o tema saúde mental indígena. Os artigos foram analisados nos seguintes que-
sitos: tema, ano de publicação, objetivo, método, referencial teórico na psicologia,
principais resultados e conclusões, assim como recomendações para a prática dos
psicólogos que trabalham com povos indígenas; Estado/região onde a pesquisa foi
realizada; se era uma produção generalista ou com etnia(s) específi ca(s). Foi ainda
destacada a utilização dos seguintes conceitos interpretativos: uso da categoria “saúde
mental” ou “bem viver”, uso do termo “índio” ou “indígena”, uso de critérios do
DSM e, também, se havia algum tipo de problematização em relação aos mesmos.
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2. Resultados e Discussão
Em relação à distribuição dos 36 artigos encontrados entre os anos de 2014 e
2020, foi constatada uma maior incidência no ano de 2017 e 2019. Os artigos tiveram
a seguinte distribuição: 5 em 2014; 4 em 2015; 7 em 2016; 9 em 2017; 3 em 2018;
7 em 2019; e 1 até junho de 2020.
Compreende-se que o interesse no tema remete a pelo menos 3 marcos impor-
tantes no campo de intersecção entre psicologia e povos indígenas. Primeiramente,
a implementação da SESAI, em 2010, vinculada ao Ministério da Saúde, criada no
governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ampliada no governo da presi-
denta Dilma Vana Rousseff . Criação resultante de uma reivindicação histórica dos
movimentos indígenas, a SESAI se constituiu, para o campo acadêmico, como um
catalisador do debate a respeito da saúde ofertada a esses povos.
Além disso, em 2007, a XII Plenária do Conselho Regional de Psicologia de São
Paulo-SP (CRP-SP) aprovou a criação do Grupo de Trabalho (GT) Psicologia e Povos
Indígenas pelo CRP-SP. Esse GT se destacou, dentre outras razões, pela publicação
do livro “Povos indígenas e psicologia: a procura de bem viver”, em 2016, o qual
pode ser considerado um marco responsável por signifi cativo aumento de pesquisas
a partir deste ano (BERNI, 2017). Por fi m, em 2014 foi criado o Núcleo de Produção
do Conhecimento em Psicologia e Povos Indígenas na União Latino-Americana das
Entidades da Psicologia (ULAPSI), cuja primeira reunião ocorreu no IV Congresso
da ULAPSI, em abril de 2012 (BERNI, 2017).
Pela distribuição dos anos dos artigos, 2019 foi o ano com maior número de
publicações. Foi nesse ano também que ocorreu a publicação das Referências Técnicas
para atuação de psicólogas(os) com povos tradicionais, pelo Centro de Referência
Técnica em Psicologia e Políticas Públicas (CREPOP), vinculado ao Conselho Federal
de Psicologia. Esse aumento de publicações aponta para um crescimento da área,
provavelmente decorrente da expansão, tanto das políticas públicas da saúde indígena
ocorridas nas duas últimas décadas, includentes aos psicólogos, quanto à politização
desse tema dentro dos Conselhos Profi ssionais de Psicologia, Regionais e Federal.
Em relação à distribuição dos artigos de acordo com a região onde a pesquisa
foi realizada, obtivemos os seguintes resultados: a maioria das pesquisas foi realizada
na Região Norte com 9 artigos, sendo 3 no Pará, 2 em Roraima, 2 no Amazonas e
1 no Tocantins e Amapá. Logo após o Centro-Oeste com concentração de 8 artigos
com a maior parte em Mato Grosso do Sul (4), depois em Goiás (2), seguido de Mato
Grosso (1) e Distrito Federal (1). Na região Sudeste, foram 6 artigos, São Paulo e
Minas Gerais com 3 artigos cada. Em seguida Nordeste, com 2 em Alagoas, 1 em
Sergipe, Bahia e Pernambuco, respectivamente. No Sul, Santa Catarina e Rio Grande
do Sul somam dois trabalhos.
Dos 36 trabalhos, 4 não informaram de que grupo étnico se tratava a pesquisa
ou discussão teórica e, portanto, não é possível identifi car a região e 2 embora citem
o grupo não apontam de onde são. Dos 30 artigos que possibilitaram a identifi cação
da região, 3 abordam as etnias e regiões de forma generalista.
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Os trabalhos classifi cados como generalistas trataram os grupos étnicos pes-
quisados de forma uniforme e homogênea, sinalizando a difi culdade dos autores em
compreender esses povos a partir de suas próprias denominações étnicas e especifi ci-
dades. Dentre as etnias mais pesquisadas estão os Guarani que, somados os subgrupos,
compõem um total de 12,1% dos trabalhos, dividindo-se em Guarani-Kaiowá (11%),
Guarani (0,3%) e Guarani-Mbya (0,8%). Destacam-se também as pesquisas reali-
zadas sobre o povo Kaingang (8%) e Tikuna (0,5%). Os demais somam 0,3% cada.
Vinte e quatro artigos utilizaram a categoria “índio” e “indígena”, mas somente
4 problematizaram o uso desses termos. Cardoso e Coimbra (2019), ao fazerem uso
dessas palavras, utiliza aspas para sinalizar o problema oriundo da universalização
da fi gura do indígena e esclarece que “a exigência de um perfi l de ‘índio’ traduz
uma imagem cristalizada do século XVI” (p. 190). Batista e Zanello (2016), por seu
turno, discutem a ideia de que o uso da palavra no singular induz a uma imagem de
coletividade homogênea. E Viana e Maheirie (2017) sublinham que o uso do termo
“índio” refl ete um povo genérico, numa perspectiva estereotipada, evolucionista
e etnocêntrica, retratando-o como fi guras do passado e, com isso, promovendo “a
reprodução de discursos que os colocam como fi guras quase que folclóricas: ora
como selvagens, ora como mansos” (p. 227).
Em relação ao sexo dos participantes da pesquisa, foram analisados os 15 tra-
balhos empíricos, sendo que 12 especifi caram o sexo dos participantes. A maioria
(9) trabalhou com ambos os sexos (masculino e feminino).
Na característica faixa etária, considerando apenas os trabalhos empíricos (15),
três não informam a faixa etária dos envolvidos na pesquisa. A maior parte das pes-
quisas se deu com participantes classifi cados como jovens e adultos (6), seguida de
4 trabalhos de faixas mistas; 1 com idosos e 1 sobre crianças indígenas.
O interesse pela faixa etária dos participantes das pesquisas se deve ao fato de
que é muito difícil acessar anciões e crianças nas aldeias, visto que os mais velhos
não costumam compartilhar com os não-indígenas seus conhecimentos e saberes
em função da desconfi ança resultante de muitas apropriações culturais realizadas
pelos brancos. Já as crianças não costumam falar a língua do “branco”, uma vez
que a primeira língua ensinada na maior parte das comunidades aldeadas é a nativa.
Há, ainda, a difi culdade em classifi car a faixa etária destas populações, já que nós,
enquanto sociedade envolvente, possuímos categorias distintas de desenvolvimento
para diferentes fases da vida, como é o caso do conceito de infância e adolescência,
também recente em nossa sociedade e relacionada, cada vez mais, à preparação para
entrada no mercado de trabalho, característica de sociedades capitalistas (Ariès, 1978).
Em muitas sociedades indígenas, a vida adulta começa bem mais cedo do que
na maior parte do mundo não indígena e a expectativa de vida, tal como apontado
por Marques et al. (2015), é, em média, de 45 anos. Como exemplo, os autores citam
o caso do povo Guarani-Mbyá, entre os quais, não há um só índio com mais de 50
anos (IBGE, 2012). Isso se deve ao alto índice de mortalidade dos grupos indíge-
nas, quando comparado às demais populações, com maior incidência até 14 anos,
sobressaindo a fase de 0 a 4 anos, e de forma mais pronunciada para o sexo feminino
(Campos et al., 2017).
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Em relação ao número de artigos que problematizaram o conceito de “saúde
mental”, apenas 14 o zeram. De uma forma geral, discutem a necessidade de con-
textualizar os fenômenos tidos como temas em saúde mental a partir do ponto de
vista da etnia abordada, como é o caso do suicídio Guarani Kaiowá, no trabalho
de Staliano, Mondardo e Lopes (2019). Esses autores trazem ainda a importância
de problematizar a diversidade e a tradução cultural, uma vez que as etnias podem
divergir naquilo que denominam problema ou sofrimento, ou seja, deve-se qualifi car
seu próprio idioma de afl ição/sofrimento e mal-estar (Nichter, 1981).
Quanto aos temas dos artigos, foram elencadas seis categorias, a saber: Concei-
tuais/Teóricos (4); Violência (7); Saúde Indígena (11); Ensino (8); Prática e Saberes
Tradicionais (3); Políticas Públicas (3).
Dos 36 artigos selecionados, somente 4 trazem discussões diretas sobre “saúde
mental indígena”, utilizando ou o próprio termo “saúde mental” e/ou o termo “bem-vi-
ver”: Batista; Zanello, 2016; Souza et al., 2018; Souza; Oliveira; Teodoro, 2019; Sta-
liano; Mondardo; Lopes, 2019. Eles foram classifi cados na categoria: saúde indígena.
Os demais artigos (32) trazem essa discussão como fundo presente no desdobramento
de temas tais como ensino, políticas públicas, práticas e saberes tradicionais, saúde
indígena, violências e conceituais/teóricos.
A categoria intitulada “Ensino” reuniu trabalhos que trataram do acesso de indí-
genas às universidades (Ressurreição; Sampaio, 2017; Angelin; Zoltowski; Teixeira,
2017; Guarnieri; Melo-Silva, 2017), da formação de professores indígenas (Ferreira;
Souza, 2016), da educação escolar indígena (Delmondez; Pulino, 2014) e um tra-
balho sobre desenvolvimento infantil. Destaca-se este último trabalho, por se tratar
de uma pesquisa de campo sobre “teoria da mente”, com trinta crianças Asurini. No
entanto, não há qualquer problematização acerca da utilização deste termo (mente) e/
ou mesmo desta teoria, embora os autores concordem que a maior parte dos estudos
a esse respeito foi realizada somente em sociedades não indígenas.
Destaca-se ainda, nessa categoria, que a maioria dos trabalhos (5), dedicaram-se
a pensar o acesso da população indígena às universidades, mostrando que a entrada
de alunos indígenas nos cursos de graduação de todo país tem mobilizado não só
os saberes hegemônicos como os interesses de pesquisadores. As discussões sobre
saúde mental indígena apareceram nessa categoria, sobretudo, no que diz respeito
aos efeitos das mudanças exigidas aos jovens indígenas ao ingressarem no ensino
superior, as quais resultam numa ruptura signifi cativa, que irá mobilizar tensões
intersubjetivas e ressignifi car discursos, atitudes, crenças e perspectivas de vida.
Nesse sentido, a universidade constitui-se como um espaço mediador do equilíbrio
e da saúde mental desses estudantes, que vivem um difícil processo de transição, no
qual acessam não apenas o espaço universitário –com tudo o que ele representa– mas,
sobretudo, novos propósitos de vida.
Na categoria “Violência”, foram elencados sete artigos divididos em três sub-
temas que circunscreveram diferentes formas de violência às quais são submetidos
os povos indígenas: institucional (Scisleski; Bernardes, 2014; Lemos et al., 2016);
da ditadura militar (Gonçalves, 2017; Sant’Anna; Castro; Jacó-Vilela, 2018; Batista;
Baptista; Nardin, 2019) e racial (Mendes, 2017).
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Quanto aos artigos que tratam de violência institucional, ambos discutem políti-
cas públicas e o papel do Estado. O trabalho de Scisleski e Bernardes (2014) buscou
refl etir sobre o conceito de subjetividade a partir da relação entre verdade, sujeito,
política e ética, por meio de Foucault e Agambem. A discussão proposta pelos autores
tem como recorte analítico uma carta dos índios Guarani-Kaiowá do Mato Grosso
do Sul/Brasil endereçada ao Governo e à Justiça, publicada em 2012, que é uma
resposta à retirada da terra onde habitavam por determinação da justiça. Os autores
discutem o que há por detrás deste posicionamento político, o qual reafi rma o desejo
de morrer mediante a ter que viver uma vida colonizada. A carta, portanto, captura
uma potência de vida de uma existência que só pode ser política, uma vez que insiste
em uma vida que resiste em querer ser de outra forma.
A discussão proposta por Lemos et al. (2016) também utiliza Foucault para
discutir os dispositivos de poder –especialmente o biopoder– exercido pelo poder
público na Amazônia paraense que opera no sentido de deixar morrer os povos
ribeirinhos, indígenas e defensores dos direitos humanos.
Já os trabalhos que fi caram dentro da subcategoria intitulada “ditadura militar”
trazem discussões resultantes dos dados, relatos e informações divulgadas por meio
do relatório fi nal do eixo indígena da Comissão Nacional da Verdade (CNV). Essa
comissão identifi cou documentos –denominados de Relatório Figueiredo– nos quais
foram descritas as dezenas de crimes praticados pelo Serviço de Proteção aos Índios
e os casos de violação dos direitos humanos desses povos.
Tanto os trabalhos que discutem a ditadura militar quanto os que discutem vio-
lência institucional abordam o papel da ausência de políticas públicas e a perpetuação
das violências por parte do Estado. Aqui as discussões sobre a saúde mental indígena
se deram, sobretudo, no apontamento dos efeitos emocionais e existenciais da perda
de território (diferentemente de ter um pedaço de terra) e da violência etnocida sofrida
por esses povos no contexto da ditadura e as marcas deixadas no bem viver
1
e na
relação entre brancos e indígenas.
O trabalho de Mendes (2017) discute colonialismo, violência e racismo prati-
cado aos povos indígenas, abordando os processos históricos que escravizaram os
povos indígenas e que seguem perpetuando violência e dominação. Para isso, o autor
faz uma leitura histórica do Brasil colonizado e os efeitos na exploração dos povos
originários, utilizando-se um tipo de psicanálise xada num determinado contexto e
período histórico para realizar uma alegoria entre o Estado como a fi gura exposta à
lei do pai primevo em contraposição à fi gura do pai simbólico/ideal.
O autor tece a ideia de uma herança na qual o pai que falta é buscado pelas
massas em representantes governamentais que seguem praticando a herança arcaica
de dominação e opressão, porém não aprofunda a forma como a perpetuação dessa
1 O uso do termo se tornou mais frequente após ter se convertido em direito constitucional para os povos bolivianos
(termo de origem Kuechwa “Sumak Kawsay”) e equatorianos (Plano Nacional Para El Buen Vivir de 2009 a 2013).
Considerado como uma ruptura do modelo neoliberal de desenvolvimento que, por meio de um novo pacto social
propõe uma relação de outra ordem cosmológica com a natureza. De forma que a mesma seja compreendida
como parte integrativa de nossa existência ontológica, sendo a terra detentora de uma subjetividade maternal
que nutre todos os seres e lhes dando o direito de existir e viver com sua plena alteridade (SUESS, 2010).
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472
herança afeta especifi camente os povos indígenas. Encerra o texto ampliando o debate
a todo tipo de opressão oriunda de governos autoritários na América Latina.
Na categoria “Políticas Públicas” foram incluídos os trabalhos que discutiram
o movimento indígena, ambos (Dutra; Mayorga, 2019; Grubits, 2014) sobre o movi-
mento de mulheres indígenas.
O artigo de Dutra e Mayorga (2019) trata das mulheres indígenas como sujeitos
políticos e propõe aproximações possíveis entre as pautas dessas mulheres com as
pautas feministas, a partir de uma intersecção que a autora irá chamar de feminismo
pós-colonial. Os autores realizaram entrevistas com mulheres indígenas que ocupam
posição de liderança dentro do movimento indígena.
Já o trabalho de Grubits (2014) é resultante de um projeto iniciado em 2010 com
mulheres das comunidades indígenas Guarani/Kaiowá, Kadiwéu e Terena, de Mato
Grosso do Sul, o qual buscou refl etir se a proposta formulada pela Política Nacional
para as Mulheres (PNM), de 2003, contemplou mulheres indígenas. Neste artigo a
autora procurou dar ênfase às mudanças vivenciadas pelas mulheres dessas etnias,
as quais as levaram a redefi nir estruturas e organizações sociais em suas comunida-
des. Como exemplo, podemos citar o caso das mulheres Guarani/Kaiowá que têm
estimulado os fi lhos a buscarem a universidade.
Além disso, a autora destaca que as mulheres, ao saírem da aldeia para estudar,
se esforçam por manter o vínculo com a comunidade, diferentemente dos homens.
Para a autora, a questão de gênero opera aqui estruturando a vida social desses povos.
Outro exemplo citado são as mulheres Kadiwéu, que têm participado de forma mais
ativa tanto em políticas nacionais quanto em organismos internacionais. No entanto,
a autora aponta que não se deve ler as diferenças entre homens e mulheres, nessas
comunidades, a partir de um modelo ocidental de hierarquia e opressão.
Na categoria “práticas e saberes tradicionais” foram elencados 3 artigos. Des-
ses, dois discutem etnografi as sobre ritos e rituais (Travassos; Ceccarelli, 2016), um
território (Farias; Hennigen, 2019) e um sobre sociedade (Cardoso; Coimbra, 2019).
O trabalho de Travassos e Ceccarelli (2016) faz uso da psicanálise utilizando-
-se de palavras como édipo, castração e adolescência como rito de passagem, para
discutir a puberdade em sociedades indígenas Kaxuyana e Tembé. Neste trabalho,
o tema da saúde mental é tratado ao abordar o sofrimento decorrente da passagem
do jovem para a vida adulta em indígenas Tembé e Kaxuyana. Os autores falam dos
ritos de passagem como práticas que organizam a vida psíquica destas comunidades.
Já os trabalhos de Cardoso e Coimbra (2019) e Farias e Hennigen (2019) são
artigos resultados de pesquisa realizada no mestrado. O primeiro propõe uma análise
das epistemologias ribeirinhas, negras e indígenas, e busca problematizar as práticas
de cuidado de psicólogos junto a estas populações convocando a categoria a conhecer
e defender os diversos entendimentos sobre bem-viver, saúde e adoecimento para
essas populações. O segundo abordou a retomada de território do povo Mbya-Guarani
no Yvrupá (Maquiné-RS), com o objetivo de analisar os processos de subjetivação e
produção de estratégias de luta e resistência desse povo. Para isso, procedeu à análise
de diário de campo, fotos e demais registros produzidos por indígenas, postados em
redes sociais. Destaca-se neste trabalho a tentativa de buscar aproximações conceituais
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ÉTICA E POLÍTICA CONTRACOLONIAL 473
a partir da Psicologia –mais especifi camente a Psicologia Social– para pensar a pro-
dução de subjetividade deste povo indígena. A saúde mental aparece aqui na relação
entre território como um espaço socio cosmológico e ancestral para a efetuação do
modo de vida –o tekó– Mbya-Guarani.
A categoria “saúde indígena” contemplou 11 artigos: um sobre diálogo inter-
cultural, 5 sobre atuação profi ssional e formação; um sobre suicídio; dois sobre uso
de álcool e outras drogas; um sobre saúde mental geral e, enfi m, um sobre mulheres
indígenas. Dos 11 artigos, 8 abordaram as políticas executadas pela SESAI.
O artigo sobre diálogo intercultural (Gewehr et al., 2017) trata-se de uma pes-
quisa teórica, que faz um breve histórico das práticas de cura tradicionais e propõe
uma discussão sobre seu uso na atualidade como forma de promoção do bem-viver
em contraponto às práticas curativas da biomedicina.
Já o tema “atuação profi ssional e formação” englobou 5 artigos que discutem
não só o preparo destes profi ssionais, por meio de programas de extensão que visa
colocá-los em contato com essas populações, como também, as possibilidades de
intervenção e promoção do cuidado com que a psicologia pode atuar junto a estes
grupos. Guimarães et al. (2019) abordam as práticas da Rede de Atenção à Pessoa
Indígena do Departamento de Psicologia Experimental do Instituto de Psicologia da
Universidade de São Paulo, entre 2015 e 2017, para discutir seu impacto na formação
dos alunos de psicologia. Cuervo, Radke e Radke (2015) se referem ao programa
de formação acadêmico intitulado PET-Saúde/Redes que discutiu a atenção à saúde
dos povos indígenas presentes no município de Porto Alegre.
O trabalho de Landgraf, Imazu e Rosado (2019) trata-se de um relato de expe-
riência sobre as atividades de Educação Permanente na saúde indígena. Os resultados
demonstraram um desconhecimento a respeito deste tema por parte dos trabalhadores
em saúde, que veem a questão indígena como um privilégio e não um direito. Barcelos
et al. (2015) apresentaram a experiência de acadêmicos de medicina junto ao povo
Akwẽ-Xerente por meio do PET- Saúde Indígena. As discussões buscaram enfatizar
a perspectiva desses estudantes acerca do trabalho desenvolvido por profi ssionais
do Programa Mais Médicos nas aldeias desta etnia.
Garcia Jr, Rivorêdo e Flumian (2016) também abordam uma experiência de
apoio institucional junto ao Distrito Sanitário Especial Indígena Interior Sul. Os auto-
res discutem a relação entre educação permanente, saúde e controle social indígena.
O tema “suicídio” teve apenas um artigo (Staliano; Mondardo; Lopes, 2019).
Nele, os autores discutem o território como saúde, tendo como objetivo a análise
sobre onde e como ocorrem os suicídios de Guarani e Kaiowá na contemporaneidade.
“Uso de álcool e outras drogas” teve dois artigos, ambos escritos pelo mesmo
grupo de autores, os quais discutem de uma forma geral o uso abusivo de bebidas
alcoólicas como um grave problema de saúde pública em indígenas brasileiros. No
primeiro (Souza et al., 2018), foi realizada uma pesquisa que buscou avaliar a fre-
quência do uso e os prejuízos do álcool nessas comunidades. Na segunda pesquisa
(Souza; Oliveira; Teodoro, 2019), buscou-se verifi car quais são os instrumentos
nacionais e internacionais que têm utilizados na avaliação do uso de álcool em popu-
lações indígenas. Dos 30 estudos levantados, foram identifi cados 20 instrumentos de
avaliação para o uso de álcool em indígenas.
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Em “saúde mental indígena (geral)” foi elencado somente um artigo (Batista;
Zanello, 2016). O qual se refere a uma revisão sistemática de literatura entre os anos de
1999 e 2012. Das 5510 produções levantadas, somente 14 trataram do tema saúde men-
tal em contexto indígena. Os artigos que trataram deste tema mostraram como o uso de
categorias ocidentais como saúde mental, critérios diagnósticos (DSM) e generalizações
acerca da pluralidade dos povos ameríndios, ainda é um grave problema, exigindo de
profi ssionais e pesquisadores um olhar atento e crítico a esse respeito. Para as autoras,
mesmo que o interesse pelo assunto tenha crescido, ainda são poucos os pesquisadores
ou profi ssionais da área da psicologia que estejam engajados com este tema.
Por fi m, em mulheres indígenas, Gomes e Grubits (2015), pautaram a saúde
da mulher indígena do Centro-Oeste brasileiro, utilizando-se de dados do Inquérito
Nacional feito pela Fundação Osvaldo Cruz (FIOCRUZ). As autoras concluíram que
a forma como as indígenas vivem, sugerem uma vida pouco saudável, uma vez que
foi observada a falta de cuidados com saúde básica, como é o caso da ausência de
água potável e saneamento em boa parte das comunidades. Em relação à alimentação,
as indígenas consumiam muitos carboidratos e produtos industrializados, resultando
em sobrepeso e casos de desnutrição. A autora analisou ainda aspectos da formação
identitária destes povos e concluiu que é pautada na dependência da ajuda estatal.
Para as autoras, isso resulta em uma identidade mais infantilizada e insegura.
Conforme apontamos anteriormente, somente 4 artigos trataram a saúde mental
indígena como foco do trabalho (Batista; Zanello, 2016; Staliano; Mondardo; Lopes,
2019; Souza; Oliveira; Teodoro, 2019; Souza et al., 2018): os artigos com os temas
suicídio, “saúde mental” indígena (geral) e uso de álcool e outras drogas. Foram os
únicos também que criticaram ou problematizaram explicitamente o uso de termos
relacionados ao DSM e à saúde mental.
Apesar disso, dos 36 artigos levantados, 9 (Gewehr et al., 2017; Severo; Freire;
Braga, 2016; Batista; Zanello, 2016; Ferraz; Domingues, 2016; Souza; Oliveira;
Teodoro, 2019; Souza et al., 2018; Gonçalves, 2017; Marques et al., 2015; Cardoso;
Coimbra, 2019) fazem uso de critérios psiquiátricos (de forma mais implícita, citando
transtornos) ou de diagnóstico.
Dezesseis trabalhos propuseram a substituição do termo “saúde mental” pelo
uso do termo “bem viver”. Para Alcântara e Sampaio (2017), o termo remete a outro
modelo de desenvolvimento, cosmologia, ontologia e atitude de vida. Nos últimos
anos, seu uso tem sido mencionado como sinônimo de uma vida saudável e susten-
tável, abrindo as fronteiras para uma aproximação inter-epistêmica fora dos limites
dos modelos biomédicos da saúde mental.
Hidalgo Capitán (2012) defende ainda que o termo possui três correntes: a pri-
meira seria a indigenista e/ou pachamamista, a segunda trata-se da corrente socialista
e estadista e a última é a pós-desenvolvimentista/ecologista. A escolha ou substituição
do uso desses termos “saúde mental” e “bem viver” nas pesquisas aqui levantadas,
estão relacionadas à ênfase no protagonismo –tanto em elementos práticos, quanto
mágicos espirituais– dado aos povos indígenas, à relevância que a gestão emprega
ao bem viver nas políticas estatais e, também, à inclusão de uma alternativa à ideia
de desenvolvimento proposta pelas sociedades envolventes/implicantes.
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A substituição sinaliza uma tentativa de recuperar conhecimentos e saberes
tradicionais, possibilitando novos paradigmas sobre saúde, doença e vida em detri-
mento de compreensões individualistas que nos impedem de acessar as práticas de
enfrentamento ao “sofrimento psíquico” (e suas múltiplas possibilidades de lingua-
gens/expressão), presentes na realidade dessas pessoas.
3. Considerações Finais
O objetivo do presente artigo foi realizar uma revisão sistemática da literatura
psicológica sobre saúde mental em contextos indígenas, nas principais plataformas
científi cas brasileiras, entre os anos de 2014 e 2020. Ainda que a quantidade de arti-
gos tenha aumentado bastante nos últimos 6 anos, pode-se dizer que as produções
de psicólogas(os) brasileiros a esse respeito continuam escassas, sobretudo tendo
como foco específi co o tema da saúde mental ou do bem viver indígena. Destaca-se
ainda a necessidade de qualifi car melhor as epistemologias utilizadas nas discussões
propostas, pois poucos foram os artigos que problematizaram os conceitos de “saúde
mental” e “índio”, ou o uso de manuais classifi catórios ocidentais de saúde mental.
Além disso, percebeu-se uma difi culdade de os pesquisadores colocarem autores
específi cos da psicologia para dialogar com outras áreas tradicionais de produção
de conhecimento a respeito da “saúde mental” ou do bem viver, como é o caso da
antropologia. Como exemplo, podemos citar boa parte dos trabalhos que trataram
da cosmovisão ou cosmologia, ritos, práticas e saberes tradicionais indígenas ainda
utilizando a psicanálise de forma universalista para ler práticas e fenômenos dos
povos ameríndios. Ou seja, tanto usando a psiquiatria, quanto a psicanálise, muitos
estudos poderiam ser classifi cados como práticas ainda colonialistas.
É necessário lembrar que a Psicologia favoreceu ao longo de toda sua história
o projeto civilizatório etnocêntrico, que propunha uma leitura de sujeito universal
–branco, europeu, racional e ocidental– e dessa forma, impôs ao diferente seu único
lugar possível –o de sujeito dominado (FERNANDES, 2017). Desconstruir esse
modelo é, talvez, uma das tarefas mais importante da Psicologia, uma vez que serviu
perfeitamente e, por muito tempo, a este sistema homogeneizador de subjetividades
e, portanto, a um projeto colonizador. A compreensão dos diferentes povos em suas
especifi cidades/alteridades, e levando em consideração suas próprias categorias, é
um tema, portanto, que deve ser levado em consideração para a discussão da área e
na realização de futuros trabalhos no campo.
Por fi m, faz-se necessário apontar os limites de um estudo como este, no qual
pode ocorrer que artigos sobre o tema não apareçam nas plataformas pesquisadas,
pelo fato de terem sido publicados em revistas não indexadas. Outro fator limitante
se deve à escolha dos descritores, podendo não contemplar outros que porventura
tenham sido escolhidos por certos autores. Além disso, não foram contemplados neste
levantamento as dissertações e teses, livros, capítulos de livro e anais de congressos,
material que mereceria uma análise à parte.
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... Despite the severity and complexity of the phenomenon of indigenous suicide, Brazilian scientific production on the subject in the areas of health and anthropology is still scarce (Souza & Ferreira, 2014;Souza et al., 2020), mainly with regard to studies that focus on prevention strategies, attention, and care for this disease. Little research on this subject has also been carried out in the field of psychology (Calafate & Zanello, 2021). Such scarcity of knowledge has promoted numerous difficulties in the creation and implementation of social and health policies to cope with such a complex phenomenon, which requires scientific accumulation and caution in its approach. ...
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The quilombola communities are a tension and struggle point in constant reordering. Historically, they have been neglected by the State in their constitutional rights to land ownership, as well as health and education. Located primarily in the rural lands of the country, they are affected by the issues related to low socioeconomic development and poverty, as well as racism in different ways. The negative reverberations in this scenario to the subjective process, the mortality profile, and alcohol addictions are clear. When it comes to mental health, the extent of problems associated with the use of alcohol and common mental health issues has been neglected. In this sense, it is intended to discuss the rise of these problems in the everyday life of rural quilombola community, to point the problems in their psychosocial suffering and its wider place in the biopolitical and necropolitical project taking place currently which has race as a key element.KeywordsMental healthPsychosocial sufferingBiopoliticsRacismBlack population
... Despite the severity and complexity of the phenomenon of indigenous suicide, Brazilian scientific production on the subject in the areas of health and anthropology is still scarce (Souza & Ferreira, 2014;Souza et al., 2020), mainly with regard to studies that focus on prevention strategies, attention, and care for this disease. Little research on this subject has also been carried out in the field of psychology (Calafate & Zanello, 2021). Such scarcity of knowledge has promoted numerous difficulties in the creation and implementation of social and health policies to cope with such a complex phenomenon, which requires scientific accumulation and caution in its approach. ...
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The aim of this chapter is to analyze the social support of women living in a context of rural poverty. Poverty, as a multidimensional and psychosocial phenomenon, includes subjective aspects and ways of access to social support networks and socio-community bonds. The methodology integrated the facilitation of 5 thematic workshops and 7 individual interviews, with the participation of 25 women living in the rural area of the city of Pentecoste (Ceará, Brazil). The results indicate that the joint deprivations and the transgenerational experience of poverty contribute to its perpetuation. Family, neighborhood relationships, and God were mentioned as important sources of social support, as well as the Bolsa Família Program. The presence of a female figure in the family and in the neighborhood is also relevant, because these are women helping other women. A more effective presence of the State and of men in the composition of social support networks is an important aspect.KeywordsPovertySocial supportWomenRural
... Despite the severity and complexity of the phenomenon of indigenous suicide, Brazilian scientific production on the subject in the areas of health and anthropology is still scarce (Souza & Ferreira, 2014;Souza et al., 2020), mainly with regard to studies that focus on prevention strategies, attention, and care for this disease. Little research on this subject has also been carried out in the field of psychology (Calafate & Zanello, 2021). Such scarcity of knowledge has promoted numerous difficulties in the creation and implementation of social and health policies to cope with such a complex phenomenon, which requires scientific accumulation and caution in its approach. ...
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Since 2010, the Inỹ population, from Bananal Island/MT/TO, has faced an increase in suicide cases, presenting one of the highest incidences of this disease among Brazilian indigenous peoples. In order to analyze this wave of suicides, this chapter examines the explanatory models of the indigenous peoples themselves on suicide and seeks to put into dialogue the areas of psychology and anthropology. For this, epidemiological data from 2002 to 2015 and 2019 from the Ministry of Health and the ethnographic material from the professional experience of one of the researchers were used. It was identified that the main native and anthropological explanations about suicide were the spell and the disarrangements of desire, manifested in conjugal and generational conflicts. We highlight the important contributions of psychology in the investigation of the logic of functioning and (dis)ruling of desire in the processes of interethnic friction and its consequences on the subject and his community.KeywordsPsychologyIndigenous healthSuicide Inỹ
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Resumo O território para os povos originários é fundamental para a saúde e reelaboração cultural de seus modos de ser, na relação entre natureza, cultura e relações de poder/resistência. O direito a viver ou morrer se liga à territorialidade na luta pela terra. O objetivo deste trabalho consistiu em analisar onde e como ocorrem os suicídios de Guarani e Kaiowá na contemporaneidade. Realizou-se uma pesquisa qualitativa de análise documental de reportagens veiculadas em jornais de maior circulação no estado de Mato Grosso do Sul. A busca foi realizada em 23 jornais, mas apenas 12 deles apresentaram notícias com a temática a partir da combinação dos descritores: Suicídio, Guarani, Kaiowá, Índio e Indígena. Constituiu-se uma amostra com 100 reportagens que informaram 105 ocorrências de suicídio no período entre 2002 a 2018. Os dados revelam que a violência é frequente nas reservas indígenas em que os Guarani e Kaiowá foram confinados no sul do estado. Os casos se concentram em aldeias dos municípios de Dourados e Amambai, a maioria entre jovens adultos com idade entre 12 e 22 anos, do sexo masculino. A eminente maioria (95%) cometeu suicídio pela prática do enforcamento (jejuvy). As causas para o suicídio variam desde explicações orientadas pela cosmologia, o feitiço, formas culturais de morrer, desterritorialização de seus tekoha e a inserção econômica marginal. Considerando os dados alarmantes, sugere-se a criação e implementação do CAPS indígena, com o envolvimento de atores institucionais, como a Sesai e a Secretaria Municipal de Saúde, além de lideranças religiosas, Ñhanderu e Nhandecy.
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Resumo A partir de uma aproximação posicionada com determinados movimentos indígenas e com mulheres lideranças indígenas no Brasil tratamos sobre a possibilidade da emergência, no cenário macropolítico do país, do sujeito político mulheres indígenas e sobre as possíveis aproximações de suas pautas com as pautas feministas, em especial, o feminismo pós-colonial. Propomos reflexões sobre as intersecções entre raça/etnia e gênero, dialogando com discursos de diferentes lideranças indígenas que ocupam posição de protagonismo no movimento indígena e ocupam espaços políticos estratégicos como a própria Academia. Atentar-se para estas múltiplas narrativas se torna importante pois estas provocam tensionamentos múltiplos que envolvem não só campos de disputa política por direitos e visibilidade, mas também campos teóricos da antropologia e do feminismo.
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Resumo Neste artigo trazemos algumas discussões apresentadas na dissertação “Retomada Mbya-Guarani no Yvyrupá: produção de subjetividade, agenciamentos e criação de estratégias de luta”, que teve como objetivo pesquisar processos de subjetivação, produção de composições e estratégias de enfrentamento/resistência em meio ao movimento dos indígenas Myba-Guarani de retomada de área em Maquiné-RS, Brasil. Entendeu-se que, para tanto, o método da cartografia se mostrava interessante, pois propicia traçar os percursos dos atores sociais no terreno da experiência. A partir de análise de materiais como diários de campo, fotos produzidas por indígenas e postadas em um grupo de WhatsApp que agregava apoiadores, audiovisuais de divulgação veiculados na internet, abordamos aqui, um dos pontos desenvolvidos na dissertação: o espaço sociocosmológico Mbya que se atualizou naquela região – a tekoá Ka’aguy Porã – entendendo-o como espaço ancestral (retomado na Retomada) para a efetuação do modo de vida – o tekó – Mbya-Guarani. Buscamos traçar aproximações, articulações e torções conceituais para pensar a produção de subjetividade deste povo indígena. Ao final, tecemos considerações sobre o que entendemos ser potentes aberturas e contribuições para a Psicologia Social, assim como para as ciências sociais e para a pesquisa com povos indígenas.
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Resumo O uso abusivo de bebidas alcoólicas é um grave problema de saúde pública em indígenas brasileiros. O objetivo deste estudo foi desenvolver uma entrevista de avaliação que entendesse a frequência do uso e os prejuízos do álcool nessas comunidades, e utilizá-la em uma avaliação inicial. Tal entrevista de avaliação foi desenvolvido a partir de uma revisão sistemática de instrumentos já utilizados nacional e internacionalmente. No estudo piloto, seis lideranças indígenas foram avaliadas por entrevistas individuais, que foram submetidas à análise de conteúdo e categorização das respostas. Dos indígenas avaliados, todos relataram ter consumido bebida alcoólica, três apresentaram comportamentos de beber muito e dois reconheceram a necessidade de buscar tratamento para seu consumo de bebida. Os resultados encontrados demonstram ser possível avançar na avaliação do uso de álcool em indígenas no Brasil. O aperfeiçoamento da avaliação desenvolvida possibilitará a elaboração de projetos de intervenção adequados para o enfrentamento do abuso de álcool nas comunidades indígenas. A Psicologia, de forma técnica e ética, deve estar presente nessa problemática, cara às necessidades biopsicossociais dessas populações.
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Resumo O artigo analisa os registros disciplinares em relação aos povos indígenas, conforme descritos no Relatório Figueiredo, considerando o controle étnico-social exercido durante o período da ditadura militar no Brasil. Nesse sentido, sua possibilidade decorre do trabalho do eixo indígena da Comissão Nacional da Verdade que identificou um conjunto de documentos, dados como desaparecidos desde a década de sessenta. Tais documentos, denominados Relatório Figueiredo, tratam da apuração realizada por uma Comissão de Inquérito sobre as denúncias dos crimes praticados pelo próprio Serviço de Proteção aos Índios contra a população indígena. A opção teórico-metodológica tem como base a genealogia de Foucault, assim como seus postulados acerca de práticas disciplinares. Utilizando-se do Relatório como fonte documental, o artigo identifica as práticas disciplinares utilizadas contra os índios no período da ditadura de 1964 a 1985, evidenciando como o corpo do índio foi atingido pelo poder, enquanto estratégia de controle.
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A presença indígena nos espaços acadêmicos tem crescido nos últimos anos, especialmente por conta das politicas de ação afirmativa. A entrada neste universo - espaços historicamente brancos e elitizados - tem produzido fissuras no olhar estereotipado construído sobre povos indígenas e, ao mesmo tempo, tem visibilizado os preconceitos e racismos de nossa sociedade. Neste cenário, a formação superior tem sido reivindicada, cada dia mais, como instrumento de luta necessário para o fortalecimento dos movimentos indígenas. Este texto discute aspectos gerais da presença indígena nas universidades brasileiras, bem como a potência na reinvenção identitária e no fortalecimento de coletivos, marcando a universidade como um novo território de fronteira e de luta que afeta e é afetada pelos povos indígenas. Palavras chave: povos indígenas –– políticas de ação afirmativa – identidade – psicologia e povos indígenas.
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Resumo Este artigo tem como propósito explicitar o papel da experiência universitária na reconfiguração do Self a partir das dimensões analisadas no desenvolvimento psicossocial, apontando contribuições da Psicologia Cultural. Extraído de uma pesquisa de abordagem qualitativa, apresenta um recorte empírico de uma entrevista episódica realizada com um estudante indígena universitário. Os resultados do estudo apontam que a experiência universitária é significada como espaço-tempo propício para transições, no qual as tensões entre os conhecimentos locais e científicos, os reconhecimentos entre os pares e o espaço dialógico intercultural são os aspectos mais destacados pelos estudantes, que os transformam em recursos simbólicos, promotores da reconfiguração do Self no contexto acadêmico. As conclusões confirmam que as dimensões do Self em contextos educativos são formadas e reativadas durante fases críticas da vida, momentos de mudanças, como o ingresso dos jovens na universidade, e de reposicionamentos identitários e socioculturais, que parecem típicos das transições juvenis.
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O presente artigo procura apresentar um quadro geral, delinear o "estado da arte das produções científicas na área de Psicologia relacionadas à temática indígena em geral realizando, uma busca por produções essencialmente acadêmicas em quatro tipos de bancos de dados: Portal Capes onde acessamos o Banco de Teses (BT); a Biblioteca Digital de Teses e Dissertações (BDTD) que se encontram entre as principais bases gerais e multidisciplinares de produção científica; a Biblioteca Virtual em Saúde - Psicologia (BVS-Psi), mais especificamente no Index Psi, além de consulta aos acervos eletrônicos de bibliotecas de 30 Instituições de Ensino Superior brasileiras; todas realizadas em novembro de 2009. A análise descritiva realizada do corpus construído nos possibilita uma visão preliminar sobre as principais características da produção em Psicologia ao abordar a temática indígena. Palavras-chave: psicologia; temática indígena; produções científicas.
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The present work deals with a critical and detailed account of an experience in the development of technologies and institutional support devices, seen as a practice in indigenous health, with the Special Indigenous Sanitary Districts of the Southern Interior, in the scope of a collaboration between the National Humanization Policy and the Special Secretary for Indigenous Health, in the state of Santa Catarina, with a priority focus on the relationship between Permanent Education and Health and Social Control. In line with the proposal, it was decided to develop a cartography of both the technologies and devices used and the analysis of the actions themselves. The practice of institutional support has proven to be beneficial for the development of autonomy and positive relations among the instances of the Unified Health System with regard to Social Control in Indigenous Health. It was also verified in the process the proximity between the notions of Differentiated Attention and Extended Clinic, as devices to develop attention to these populations, despite their proposal in different instances of the Unified Health System. depend on the complex organization that is the Unified Health System, are at the mercy of the institution's choice in ethical, political and, therefore, aesthetic, to be effective and have continuity to contribute to the development of SUS as a whole.