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EDUCAÇÃO, GÊNERO, ADOLESCÊNCIA: representações da maternidade nas aventuras de super-heroínas cinematográficas

Authors:

Abstract

O artigo apresenta uma leitura pedagógica dos modelos de gênero veiculados, com particular atenção à representação da maternidade, uma questão necessária e urgente para poder estimular meninos e meninas a construção de um olhar crítico, assim como para o acesso à informação. Propõe uma análise da representação da maternidade presente nas aventuras das super-heroínas dos quadrinhos e do cinema nos últimos dez anos, partindo do pressuposto de que essas personagens, graças ao seu sucesso internacional imediato, entraram no imaginário coletivo, transmitindo imagens muito difundidas sobre os papéis de gênero. Em particular, as super-heroínas, além de transmitirem um conjunto de modelos de gênero complexos, a ligados aos estereótipos tradicionais ou não tradicionais, estão a transmitir ao público em geral algumas mensagens latentes e menos visíveis, mas muito incisivas, sobre a maternidade, este último constitui um elemento crucial na construção da identidade de género, nos seus aspectos simbólicos, culturais e sociais.
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OLHARES
Revista OLHARES, v. 12, n. 1 – Guarulhos, 2024 – ISSN 2317-7853
EDUCAÇÃO, GÊNERO, ADOLESCÊNCIA:
representações da maternidade nas aventuras
de super-heroínas cinematográcas
EDUCACIÓN, GÉNERO, ADOLESCENCIA:
representaciones de la maternidad en las aventuras de
super heroínas cinematográcas
EDUCATION, GENDER, ADOLESCENCE:
representations of motherhood in the adventures of
cinematographic superheroines
Gabriella Seveso
Università degli studi di Milano-Bicocca
gabriella.seveso@unimib.it
Resumo: O artigo apresenta uma leitura pedagógica dos modelos de gênero veiculados, com particular
atenção à representação da maternidade, uma questão necessária e urgente para poder estimular meninos
e meninas a construção de um olhar crítico, assim como para o acesso à informação. Propõe uma análise da
representação da maternidade presente nas aventuras das super-heroínas dos quadrinhos e do cinema nos
últimos dez anos, partindo do pressuposto de que essas personagens, graças ao seu sucesso internacional
imediato, entraram no imaginário coletivo, transmitindo imagens muito difundidas sobre os papéis de gênero.
Em particular, as super-heroínas, além de transmitirem um conjunto de modelos de gênero complexos, a
ligados aos estereótipos tradicionais ou não tradicionais, estão a transmitir ao público em geral algumas
mensagens latentes e menos visíveis, mas muito incisivas, sobre a maternidade, este último constitui um
elemento crucial na construção da identidade de género, nos seus aspectos simbólicos, culturais e sociais.
Palavras-chave: educação de gênero e cinema, maternidade, super-heroínas
Resumen: El artículo presenta una lectura pedagógica de los modelos de género transmitidos, con especial
atención a la representación de la maternidad, cuestión necesaria y urgente para incentivar a niños y niñas
a construir una mirada crítica y el acceso a la información. Propone un análisis de la representación de la
maternidad presente en las aventuras de las superheroínas en el cómic y en el cine de los últimos diez años,
conscientes de que estos personajes, gracias a su inmediato éxito internacional, entraron en el imaginario
colectivo, transmitiendo imágenes generalizadas sobre los roles. de género. En particular, las superheroínas,
además de transmitir un conjunto de modelos de género complejos, vinculados a estereotipos tradicionales o
no tradicionales, están transmitiendo al público en general algunos mensajes latentes y menos visibles, pero
muy incisivos, sobre la maternidad; este último constituye un paso crucial. elemento en la construcción de la
identidad de género, en sus aspectos simbólicos, culturales y sociales.
Palabras clave: educación de género y cine, maternidad, superheroínas
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Abstract: The article presents a pedagogical reading of the gender models conveyed, with particular attention
to the representation of motherhood, a necessary and urgent issue to encourage boys and girls to build a
critical outlook, as well as access to information. It proposes an analysis of the representation of motherhood
present in the adventures of superheroines in comics and cinema over the last ten years, based on the
assumption that these characters, thanks to their immediate international success, entered the collective
imagination, transmitting widespread images about gender roles. In particular, superheroines, in addition to
transmitting a set of complex gender models, linked to traditional or non-traditional stereotypes, are transmitting
to the general public some latent and less visible, but very incisive, messages about motherhood, the latter
constitutes a crucial element in the construction of gender identity, in its symbolic, cultural and social aspects.
Keywords: gender and cinema education, motherhood, superheroines.
Introdução
Existem numerosos estudos que sublinham o papel signicativo desempenhado pe-
los livros infantis na transmissão das expectativas de gênero, juntamente com as múltiplas
mensagens de guras educativas (Collins, 2011; Gauntlett, 2008). Ao longo dos últimos cin-
quenta anos, os meios de comunicação social ampliaram signicativamente a sua difusão
e incisividade na vida dos adolescentes e diversicaram as suas tipologias, revelando, in-
felizmente, muitas vezes uma representação do feminino ainda parcialmente ancorada em
estereótipos tradicionais e construída segundo um olhar masculino. (Aubrey; Frisby, 2011).
Estudos revelam como estas característica, particularmente em alguns meios de co-
municação, são concordantes em sublinhar como o corpo feminino nos meios de comu-
nicação social, ainda é representado com características altamente hipersexualizadas, e
muitas vezes reduzido a um mero objeto sexual e estético, descrito de maneira supercial,
com evidentes riscos de estereotipagem e simplicação da realidade (Dakanalis, Di Mattei,
Prunas, Riva, Sarno, Volpato, Zanetti, 2012; Paek, Nelson, Vilela, 2010).
Neste sentido, Altamura (2017) denuncia a persistência de um olhar midiático que comprime
a personalidade das mulheres e apaga a sua individualidade, reduzindo-as a simples portadoras
de cargas eróticas e ativando um profundo processo de desumanização de seus corpos (Baker,
2005; Gronchi, 2019). Em muitos casos, as personagens femininas mediáticas são valorizadas
apenas com base na sua carga erótica e carecem de agência e de tomada de decisão, propondo
uma representação estereotipada que provoca um impacto muito penetrante no mundo da moda
jovem, nos objetos e, em geral, nas diversas áreas do mercados (Furnham; Paltzer, 2010).
Desse modo, nesta contribuição estaremos tratando de super-heroínas, gostaríamos
de propor algumas reexões concisas sobre o mundo dos quadrinhos, dentro do qual nas-
ceram esses personagens (Mazzanti, Neonato, Sarasini, 2019), e sobre o da transposição
cinematográca que tem recentemente ampliou sua popularidade e impacto, apresentan-
do-os a um público em escala global.
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O mundo dos quadrinhos e do cinema conheceu uma evolução turbulenta, rápida,
mas certamente contraditória e fragmentada ao longo dos últimos cinquenta anos. É pre-
ciso antes de tudo lembrar que atualmente existem mulheres desenhistas que conquis-
taram o universo das histórias em quadrinhos, em parte inserindo sua própria atividade
na esteira das aventuras de personagens já conhecidas, em parte por propor novos per-
sonagens aos leitores1. Uma transformação semelhante afetou o mundo da produção
cinematográca, que, pelo menos em parte, assistiu a um aumento do número de mulhe-
res produtoras, embora permanecesse um universo não isento de dinâmicas patriarcais,
recentemente denunciadas. Essa evolução diz respeito não só à produção, mas também
à diversão, uma vez que as leitoras são cada vez mais meninas e, muitos produtos, como
algumas mangas, são explicitamente dirigidos a elas, assim como o público do cinema é
muitas vezes feminino.
Não é a intenção aqui analisar aqui todos os fenômenos extremamente amplos e
complexos que têm atravessado o mundo dos quadrinhos e das adaptações cinematográ-
cas; mas nos limitarmos a considerar o contexto americano, tradicionalmente propunha
aventuras de super-heróis, nas quais as personagens femininas eram quantitativamente
pouco presentes e representadas no quadro do estereótipo de gênero mais habitual, como
companheira provocante ou das mulher a salvar, mulheres que geralmente eram dotada
de corpos extremamente sedutores e sensuais, mas sem caracterização e profundidade
psicológica e existencial.
Nas últimas décadas, esta representação sofreu denitivamente transformações no-
táveis, com aumento quantitativo de personagens femininas e com diversicação de papéis
e características (Seveso, 2019). Em particular, surgiram mulheres que desempenham pa-
péis de super-heroínas, por vezes dotadas de poderes sobre-humanos, ousadas e deci-
didas, tornadas por histórias mais fascinantes e complexas: são, portanto, modelos que
exibem a capacidade de agir e de decidir, em alguns casos até para implementar ações
violentas para atingir seus objetivos, mostrando em parte caracterizações tradicionalmen-
te masculinas e incorporando, de certa forma, modelos emancipatórios (Bartoletti, 2012).
Sarasini (2019) lembra, a esse respeito, que os personagens agora incorporam múltiplas
guras polissêmicas, não mais reproduzindo modelos, mas superando-os, manipulando-os,
reajustando-os.
1 Em alguns casos, a conquista do mundo das histórias em quadrinhos por artistas femininas ocorreu sob
a égide de uma verdadeira luta emancipatória, que levou a que histórias revolucionárias fossem propostas
ao público: não é possível analisar aqui casos individuais, basta mencionar por exemplo, o trabalho da car-
tunista, roteirista e ilustradora iraniana Marjane Satrapi, que colocou o tema do papel feminino nas socie-
dades de origem no centro de suas histórias.
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Na realidade, para além das características que desvinculam as heroínas de estere-
ótipos habitualmente consolidados, existem também elementos que as remetem para uma
visão muito tradicional: em particular, em muitos casos, a sua representação física respon-
de visivelmente ao estereótipo da mulher sexualmente atraente e sedutora, com caracterís-
ticas eróticas exageradas e roupas provocantes. Sobre estas representações contraditórias
e de difícil interpretação, Mikula (2003), analisando uma precursora das super heroínas da
Marvel, a famosa Lara Kroft (protagonista de histórias em quadrinhos, lmes e videojogos),
nota como é impossível estabelecer se tal heroína pode ser caracterizada como um ícone
feminista ou como uma fantasia sexista (Mikula, 2003), dada a agência signicativa, mas
também à sua hipersexualização física (Schembri, 2002). Na esteira dos quadrinhos, as
narrativas cinematográcas mais recentes tendem a propor modelos e núcleos semânticos
em parte atribuíveis a arquétipos e estereótipos muito tradicionais, em parte a transforma-
ções desses mesmos estereótipos de gênero, não totalmente difundidos e compartilhados
na sociedade (Collins, 2011; Grossi; Ruspini , 2007; Ward, Grower, 2020): estas narrativas
oferecem, portanto, uma mistura de modelos muito complexos que criam implicitamente
experiências educativas informais apreciadas e utilizadas pelos adolescentes de forma in-
dependente e, em muitos casos, passivamente, sem sensibilidade crítica.
Portanto, é urgente questionar-nos, com olhar pedagógico atento e perspicaz, sobre
quais reações e percepções podem ser despertadas nos adolescentes por essas represen-
tações (Brambilla, Rizzo, Seveso, 2021). A assunção de novos papéis ativos e emancipados,
por parte das super-heroínas atraente para meninas (Sandri, 2015) pode ajudar a repensar
a representação dos corpos hipersexualizados e, consequentemente, como identidades ob-
jeticadas para o olhar masculino, cria mensagens distônicas e potencialmente contraprodu-
centes para sujeitos que estão passando por uma fase muito importante de sua experiência
educacional (Downs, Smith, 2010). Como nos lembra Altamura (2017), é urgente e neces-
sário educar o olhar, ensinando os jovens a captar mensagens e imagens propostas pelos
meios de comunicação, a partir da construção da capacidade crítica e autônoma de análise
(Robasto, 2009).
Algumas considerações pedagógicas sobre a dimensão da maternidade
Dado que esta contribuição visa analisar algumas representações da maternidade
nas aventuras das super-heroínas, parecem-nos adequadas algumas breves considera-
ções parciais sobre o tema da maternidade, sem qualquer pretensão de abordá-lo em pro-
fundidade, mas exclusivamente para efeitos de análise das personagens apresentadas.
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Uma premissa necessária exige que lembremos que a maternidade biológica e sua
representação simbólica ainda constitui um acontecimento misterioso e indescritível que
ocorre ou pode ocorrer na vida das mulheres, entrelaçando signicados e representações
ligadas a diferentes contextos culturais. D’Amelia (2019) sublinha, a este respeito, como do
ponto de vista da reconstrução histórica ainda é muito difícil chegar a uma denição unívo-
ca e consensual de maternidade. Do ponto de vista das representações ao nível da iden-
tidade coletiva, sublinhamos como a maternidade é objeto de tramas míticas, de imagens,
de núcleos semânticos muito arraigados e complexos que muitas vezes a descrevem como
um acontecimento e fenômeno perturbador (Marinopoulos, 2006): isto realça a diculdade
da cultura patriarcal na aceitação de uma condição concebida como insondável e perigo-
samente incontrolável. As ambivalências e ansiedades que permeiam as representações
tradicionais, talvez pareçam permanecer implícitas na cultura atual de muitos países oci-
dentais, uma cultura que apresenta a relação entre mães e lhos com imagens, permeada
por estereótipos e referências extremamente contraditórias.
Atualmente, há várias décadas, em muitos países ocidentais, a maternidade já não
constitui o único destino viável para as mulheres, e tornou-se objeto de reexões propostas
a partir de múltiplas perspectivas. Certamente, nestes países, um momento culminante ocor-
reu durante as décadas de 1960 e 1970, quando, por um lado, os movimentos de mulheres
reivindicaram o direito feminino à realização prossional e denunciaram situações de desvan-
tagem e exploração na família e na sociedade, por outro. Por outro lado, estabeleceram-se
estudos e pesquisas que analisaram a condição feminina, a dinâmica familiar, a parentalidade
e outros temas relacionados, produzindo uma quantidade notável e qualicada de dados e
considerações que têm estimulado debates e novas consciências (Mapelli, Seveso, 2006).
A este período seguiu-se uma fase muito mais complexa, na década de 1990, tanto do
ponto de vista das reexões como do ponto de vista das transformações sociais e culturais nos
países ocidentais. D’Amelia sublinha, a respeito do que pudemos assistir nestes anos a um
debate aceso sobre o tema da maternidade, onde a posição de “recusa do ser mulher ligado
ao ser mãe” já estava ultrapassada (2019, p.81), a maternidade aparece, no entanto, como um
problema complexo, que entrelaça a dimensão da realização e das escolhas individuais com as
sociais e políticas; traz também reexões dos movimentos de mulheres de países não ociden-
tais ou de mulheres afro-americanas, que trouxeram à luz questões novas e complexas.
A década de noventa também apresentou fenômenos contraditórios e de difícil leitu-
ra, incluindo, por exemplo, o surgimento contundente de um desejo de maternidade mes-
mo para além dos limites e obstáculos biológicos, enfrentado com a difusão de técnicas
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de procriação assistida, que inevitavelmente provoca a erupção de novas representações,
debates, dilacerações pessoais e coletivas (Löwy, 2009; Thompson, 2005). A entrada no
século XXI levou, nos países ocidentais, à exasperação de problemas e dicotomias que
surgiram na cena cultural e social nas décadas anteriores, em correlação com a armação
de modelos econômicos neoliberais que apenas aparentemente garantiram às mulheres
uma entrada no mundo do trabalho e colocaram a tónica na realização prossional sem
permitir uma verdadeira conciliação com a maternidade (Casalini, 2008). A investigação
mais recente sublinha como, no mundo do trabalho, muitos contextos promovem a imagem
favorável ao gênero, mas na realidade não apoiam as mulheres na maternidade, colocan-
do-as em condições de enorme diculdade no equilíbrio entre vida prossional e pessoal
(Bianchi, Fabbri, Romano, 2018).
Em muitos países ocidentais, os objetivos de aumento do emprego feminino foram
prosseguidos num período de redução da protecção do emprego e do bem-estar público,
em nome de políticas neoliberais que favoreceram a difusão da desregulamentação dos
contratos de trabalho em nome da exibilidade, acompanhada por o fraco investimento dos
gastos sociais em medidas de apoio à maternidade (Campanella, Monticelli, Quattrocchi,
2018). Os resultados destas políticas são a presença numerosa de mulheres jovens em
funções contratuais temporárias, descontínuas ou mal protegidas; o aumento da idade das
mães primíparas, provocado pelo contínuo adiamento da maternidade para evitar a expul-
são do mercado de trabalho; a redução do número de lhos por casal, ligada aos problemas
de conciliação do tempo de trabalho e de cuidados (Sarti, Bellavitis, 2018). Estes fenôme-
nos mostram como as jovens têm tido que lidar com as elevadas expectativas do mundo
produtivo, face à falta ou extrema escassez de medidas de apoio à maternidade. Desta
forma, os custos humanos e as repercussões nas trajetórias biográcas das mulheres em
nome da saída do tradicionalismo e de uma interpretação algo perversa ou paradoxal da
emancipação feminina proposta pelo mundo e pelas políticas de trabalho, e por vezes par-
cialmente partilhada por alguns linhas do feminismo (Fraser, 2016).
A sociedade contemporânea parece, portanto, nestes contextos, ter apagado a rele-
vância social da maternidade e do papel materno, uma vez que o nascimento e o cresci-
mento de um lho passam a ser percebidos e representados como uma experiência indi-
vidual, fruto da concretização dos desejos do casal parental ou apenas da própria mulher.
A relação entre mãe e lhos, por outro lado, acaba por ser percebida e implicitamente
representada como um obstáculo e um problema para a sociedade: as mães são, de fato,
obrigadas a dedicar-se ao trabalho, culpando-as caso a relação com os lhos se revele
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difícil impedimento aos ritmos e necessidades de produção e não apoiá-los no enfrenta-
mento de uma experiência tão intensa e emocionalmente complexa: este último aspecto é
um fato, entre outras coisas, recentemente iluminado por pesquisas sobre práticas de parto
(Falcicchio, 2010), que revelam pouca sensibilidade e aceitação da experiência e vivências
das mulheres, ou dos primeiros meses de vida após o nascimento, que em muitos casos
revelam a solidão das novas mães. Em nome da produção decidiu-se esquecer a repro-
dução, aprisionando as jovens em ritmos de vida insustentáveis e degradando a relação
de cuidado entre mães e lhos (Fraser, 2023). Mesmo os temas da maternidade simbólica,
e outros temas sobre o feminino, entendidos como possíveis paradigmas para repensar
as relações sociais, por um lado, têm sido nos últimos anos ainda mais explorados pelas
pesquisas e, por outro lado, aparecem, na cultura popular e nas representações coletivas
generalizadas, como um dispositivo retórico útil para cobrir as distorções de uma sociedade
neoliberal (Simone, 2012).
Neste contexto tão contraditório e difícil para as jovens mulheres, parece inevitável
uma reexão pedagógica que analise quais os modelos e representações que os meios
de comunicação propõem aos adolescentes, que atravessam uma fase de crescimento
rica em recursos e extremamente delicada e que se encontram expostos a esses mode-
los muitas vezes sem possibilidade de comparação com guras adultas (Lorenzini, 2019);
igualmente essencial é o planeamento e implementação de atividades educativas que nas
instituições promovam a consciência do olhar e a capacidade de pensar sobre si mesmo no
presente e no futuro com autonomia em comparação com as mensagens fascinantes mas
contraditórias propostas pelos meios de comunicação.
Maternidade e super heroínas: reexões e questões pedagógicas
Partindo dessas premissas, parece interessante uma reexão sobre a representação
da maternidade (entendida como maternidade biológica ou de sua representação simbó-
lica, assim como relação entre mães e lhos) nas transposições cinematográcas das su-
per-heroínas nascidas nos quadrinhos. Não é possível propor aqui uma análise exaustiva
de todos os personagens presentes: optamos, portanto, por focar a atenção nas super-he-
roínas da Marvel por múltiplos motivos. Estas são guras muito conhecidas em numerosos
países ocidentais e não ocidentais; ostentam décadas de história às riscas e sobretudo têm
sido protagonistas ou co-protagonistas de recentes adaptações cinematográcas de enor-
me sucesso internacional, que consequentemente provocaram uma ampla comercialização
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de objetos e roupas inspiradas nas suas aventuras (Brambilla, Rizzo, Seveso, 2021). Por
último, mas não menos importante, importa sublinhar que, nos últimos lmes exibidos no
cinema ou nos canais de televisão paga, as tramas em que estas heroínas estão envolvidas
abordam de forma complexa e recorrente o tema da maternidade, seja ela biológica ou de
sua representação simbólica.
Retratando brevemente alguns elementos fundamentais de sua evolução, vale lem-
brar que as super-heroínas aparecem nos quadrinhos da Marvel desde a década de 1960,
inicialmente como coadjuvantes, às vezes co-protagonistas, depois cada vez mais presen-
tes e, em alguns casos, protagonistas de seus próprios livros ilustrados: à medida que suas
aventuras se fragmentaram, diversicaram e se desenrolaram ao longo das décadas, algu-
mas das suas características sofreram alterações signicativas ao longo do tempo, inuen-
ciadas também por mudanças sociais e culturais. Certamente é possível identicar nestes
desenvolvimentos os traços das transformações no papel das mulheres, das reivindicações
dos movimentos feministas, da composição multicultural cada vez maior da sociedade, mas
também das necessidades de expansão do mercado e da crescente difusão armação de
um modelo neoliberal. A relação entre os utilizadores e o produto proposto tem sido arti-
culada e transformada de forma complexa e não facilmente redutível a leituras unívocas,
provavelmente seguindo um processo de condicionamento do público pelos modelos pro-
postos, mas também de posterior adaptação dos modelos às multifacetadas necessidades
e visões contraditórias do público, que se transformaram em verdadeiros prossumidores.
Parece igualmente complexo interpretar e avaliar o impacto e a inuência exercidos pelas
diferentes características dos personagens apresentados num público de adolescentes que
atravessam a difícil redenição de si mesmos que os levará a ingressar na vida adulta.
Com muito sucesso de público, as personagens femininas propuseram, de fato, inter-
ceptar novas necessidades de autonomia, escolha, agência de mulheres e adolescentes,
propondo guras de protagonistas muitas vezes ativas, inquietas, em busca de uma rede-
nição de si mesmas: nesse sentido, podem responder a questões profundas de sujeitos em
crescimento, correndo o risco, porém, em alguns casos, de mercantilização das próprias
necessidades (Brambilla, Rizzo, Seveso, 2021). Além disso, a análise da corporeidade que
estas personagens enfrentam é complexa, para além do aspecto estético: de fato, nos
lmes mais recentes, aparecem sicamente desprovidas de limites e pontos fracos, apro-
ximando-se, senão sobrepondo-se, do modelo masculino: esta é uma evolução que, no
entanto, não parece estar ligado a impulsos emancipatórios, mas antes parece recordar um
ideal apoiado pelo clima socioeconómico e cultural neoliberal, um ideal fundado na perfor-
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matividade e na eciência, na recusa de qualquer vulnerabilidade, na marginalização e na
condenação de qualquer fragilidade.
Um passo signicativo também do ponto de vista de uma análise pedagógica é cons-
tituído pelo momento de transposição das aventuras das super-heroínas da Marvel para
o cinema, ocorrido a partir de 2008, ano de fundação do MCU, o gigante internacional da
franquia de mídia. Esta transposição conduziu a alterações de alguns traços ou de alguns
acontecimentos das personagens, censuras e revisões, em parte causadas pelas diferen-
tes características dos dois meios de comunicação, em parte evidentemente ligadas às
evoluções culturais em curso e causadas pela composição de uma mesma comissão artís-
tica envolvida na produção.
A partir de 2008, portanto, as super-heroínas da Marvel ganharam espaço cada vez
maior dentro dos lmes que possuem salas de animação, em alguns casos como co-prota-
gonistas dentro de eventos corais, em outros casos mais recentes como verdadeiros prota-
gonistas de lmes de sucesso. Em geral, estes personagens incorporam traços inovadores
e inéditos, envolvem-se em aventuras turbulentas, vêem-se forçados a enfrentar dilemas
éticos dramáticos ou a tomar decisões ou posições que não estão de acordo com os seus
colegas, muitas vezes à custa de consequências trágicas. Embora sejam numericamente
inferiores aos protagonistas masculinos, oferecem modelos, em particular aos adolescen-
tes, com agência e julgamento independente, embora não estejam isentos de enviar men-
sagens contraditórias com evidentes implicações educativas, em particular relacionadas
com a dimensão da corporeidade.
No que diz respeito ao tema da maternidade, parece signicativo que ele apareça de
forma cada vez mais frequente, mas também mais complexa, nas mais recentes aventuras
cinematográcas de super-heroínas. Limitamo-nos, aqui, a apresentar algumas considera-
ções provisórias a partir da análise destes lmes.
Em 2015, o MCU traz para o cinema a história de Vespa/Janet, que, nas nos quadri-
nhos, teve papel signicativo nos acontecimentos do grupo dos Vingadores: a heroína dos
quadrinhos é na verdade a única mulher entre os integrantes do grupo fundador e prota-
gonista de aventuras muito complexas desde a década de 1960. Como todas as super-he-
roínas da Marvel, ela possui uma sicalidade que é portadora de poderes sobre-humanos
causados por eventos traumáticos e incontroláveis: no caso de Vespa/Janet, seu corpo
pode ser encolhido ou dilatado desproporcionalmente, permitindo-lhe assumir dimensões
úteis para inigir danos fatais, golpes nos adversários ou para alcançar objetivos perigosos
ou inatingíveis. Nos quadrinhos, Vespa/Janet é a esposa do brilhante e indisciplinado in-
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ventor Hank Pym, e permanece emocionalmente ligada a ele, apesar de seus excessos e
subsequentes instabilidades psíquicas. Verdadeira líder do grupo dos Vingadores, muitas
ela vezes desempenha o papel de agregadora e pacicadora de conitos, mostra-se de-
cisiva em inúmeras situações de risco, expressa personalidade e tomada de decisões for-
tes. A passagem desta personagem das história em quadrinhos para o cinema conduziu a
mudanças substanciais e signicativas, bem como a uma notável remodelação do tema da
maternidade. Nos dois lmes Homem-Formiga (2015) e Homem-Formiga e a Vespa (2018),
Vespa/Janet desempenha um papel secundário, pois, devido à explosão de um dispositivo
nuclear, ca prisioneira da dimensão quântica, uma realidade paralela insondável, dentro
do qual o tempo tem uma duração totalmente incomparável à vida terrena: ela é lembrada
com pesar e dor por seu marido Hank Pym, um cientista brilhante e bem-sucedido (sem os
desequilíbrios psíquicos presentes no personagem dos quadrinhos) e por sua lha, Vespa/
Hope ; no primeiro lme, Vespa/Janet aparece apenas em alguns quadros que retratam
momentos felizes do passado.
Em Homem-Formiga e a Vespa, a personagem aparece apenas na parte nal da tra-
ma: após trinta anos de permanência na dimensão paralela, ela é milagrosamente alcança-
da pelo marido e libertada de forma a poder se reencontrar com sua lha amada. A escolha
dos roteiristas e produtores, portanto, foi “dividir” a personagem dos quadrinhos em duas
guras, mãe e lha, e comprimir o papel da personagem feminina original, connando-a ao
segundo plano graças ao artifício da permanência em realidade quântica. A maternidade
de Vespa/Janet é um vínculo à “distância”, ou melhor, de ausência e construído a partir da
memória nostálgica e afetiva de sua lha Vespa/Hope, que replica algumas características
de sua mãe (destreza, habilidade ginástica, habilidades cientícas renadas e em particular
os biológicos e físicos), sem poder compartilhar com ela experiências e vivências, exceto
na primeira infância, período anterior ao seu desaparecimento na realidade paralela. É uma
representação que pode oferecer às meninas uma mensagem muito complexa do ponto
de vista educativo: por um lado, um modelo emancipado de mãe e lha, ligado a traços
de tomada de decisão e de pertencimento à investigação cientíca, por outro, uma rela-
ção materno procurado, sonhado, lembrado, mas não presente, quase para indicar uma
inconciliabilidade entre maternidade e emancipação ou maternidade e compromisso social
e prossional. No entanto, a dimensão da maternidade simbólica é menos contraditória:
Vespa/Janet não só abraça novamente a sua lha natural e encoraja-a a continuar activa e
autónoma, como também dá energia, arriscando a sua própria sobrevivência, para salvar
Phasma, a jovem antagonista feminina, com recuperação total diferente de um persona-
11Revista OLHARES, v. 12, n. 1 – Guarulhos, 2024 – ISSN 2317-7853
gem e tema presente nos quadrinhos. Surge, portanto, uma maternidade biológica quase
impossível de ser vivida e uma relação mãe-lha baseada na ausência, ao lado de uma
maternidade simbólica positiva e redentora.
Uma mensagem igualmente complexa está presente no lme apresentado ao grande
público logo depois, Capitã Marvel, cujos acontecimentos dentro dos quadrinhos são bas-
tante complexos. O Capitão Marvel, aliás, nos quadrinhos é inicialmente um militar aliení-
gena, que veio à Terra para espionar seus habitantes e depois se arrependeu e passou a
defender os terráqueos: um personagem masculino que apareceu nos EUA em 1967 e na
Itália em 1971. A história em quadrinhos, porém, ao longo dos anos, oferece aos leitores ou-
tras Capitãs Marvel, com identidades diferentes: em um dos casos, a Capitã Marvel é Mo-
nica Rambeau, sargento da Guarda Costeira, que é capaz de se transformar em qualquer
forma de energia e entra para fazer parte de uma unidade antiterrorismo; outros Capitães
Marvel da série de quadrinhos são Phyla-Vell (bissexual), Genis-Vell e NohVarr (masculi-
no), Carol Denvers (feminino). As histórias desses personagens são muito complexas e
contraditórias.
Em 2019 o MCU decide transpor as aventuras da Capitã Marvel para o cinema, fa-
zendo uma escolha signicativa: à protagonista uma identidade feminina, sobrepondo
alguns traços biográcos de Monica Rambeau e Carol Danvers dos quadrinhos, e apresen-
ta-a como possuidora de força sobre-humana causada pelas transformações de partículas
do corpo, bem como a capacidade de mudar de dimensão e se mover em velocidade so-
brenatural. Ela é a primeira super-heroína a ter um lme inteiramente dedicado a ela, além
de aparecer em outros lmes de conjunto no mesmo período; ela também é a primeira a
apresentar uma sicalidade não muito desequilibrada na hipersexualização e na sedução
exasperada: Carol/Capitã Marvel, na verdade, usa um agasalho justo que não revela suas
curvas de forma provocante ou roupas casuais que não são particularmente atraente. Cer-
tamente a escolha por uma Capitã Marvel feminina atende às necessidades de um público
cada vez mais formado por meninas e aos pedidos de representação de uma mulher eman-
cipada e com agência que emergem da cultura atual. Dentro do lme é possível perceber
algumas referências ao tema da maternidade, sejam elas biológicas ou simbólicas. A amiga
que Carol reencontra depois de muitos anos na Terra é uma mulher envolvida em missões
aeroespaciais que mora com a lha de oito anos: a gura paterna está ausente, neste caso,
e a díade mãe-lha é uma oportunidade de mostrar um vínculo fundacional e central, com
ênfase na relação entre as gerações femininas. Uma integrante do grupo de alienígenas,
porém, propõe a mesma relação, mas de forma mais tradicional: é uma mãe dedicada ao
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cuidado, que cria a lha sozinha, enquanto o pai está ausente para brigar. A Capitã Marvel/
Carol, aliás, relembra com nostalgia uma gura mentora feminina, que inicialmente de-
sempenha uma função de encorajamento e conforto, mas que depois se revela ambígua;
nalmente, não está claro se Carol pode se tornar mãe biologicamente, dadas as caracte-
rísticas mutantes de seu corpo.
Também acompanhando o notável sucesso deste lme, em 2020 foi oferecido ao pú-
blico um lme inteiramente dedicado a outra famosa super-heroína, Viúva Negra/Natasha
Romanova: a escolha está ligada não apenas à vontade dos diretores artísticos do MCU,
mas também com a decisão da atriz que, nos lmes anteriores do ciclo dos Vingadores,
havia interpretado a personagem, alcançando tal fama e encontrando tal favorecimento pú-
blico a ponto de desempenhar um papel signicativo na imposição de um enredo totalmente
reservado à reconstrução da biograa da super-heroína. Com este lme a tela se enche de
personagens femininas, além da protagonista, com identidades e biograas complexas e
com uma profundidade psicológica surpreendente em relação ao passado; a trama também
propõe uma pluralidade de relações femininas, deixando os personagens masculinos em
segundo plano e relegando-os a papéis quase cômicos. Natasha Romanova/Viúva Negra,
nos lmes anteriores da série Vingadores, tinha assumido um papel cada vez menos
secundário e mais decisivo, mostrando em alguns casos capacidades de julgamento autó-
nomo que a levaram a opor-se à liderança masculina.
Neste último lme, a super-heroína retoma alguns traços presentes tanto nos quadri-
nhos quanto nos lmes anteriores: destreza, força e audácia, capacidade de escapar dos
condicionamentos psicológicos e psíquicos, o uso casual de armas e equipamentos tecno-
lógicos; ela também é dotada de uma sicalidade jogada na carga erótica, embora de forma
menos evidente em comparação aos lmes anteriores da série Vingadores, assim como
suas roupas aparecem um pouco menos marcadamente sensuais e provocantes. O lme
retrata os acontecimentos da vida de Natasha Romanova/Viúva Negra, apenas vagamente
mencionados em lmes anteriores, propondo uma biograa heróica inteiramente construída
em torno da negação da maternidade biológica. A Viúva Negra, aliás, assim como as de-
mais Viúvas Negras que aparecem como coadjuvantes na trama, foi sequestrada pela KGB
e treinada desde cedo nas artes marciais e no uso de armas, mas também foi submetida
à esterilização forçada, com um A operação é descrita detalhadamente em uma cena cen-
tral do lme. A criação de numerosas Viúvas Negras responde ao projeto exclusivamente
masculino de formar mulheres sem úteros e ovários, psicologicamente condicionadas de
tal forma a serem reduzidas quase a existências mecânicas e treinadas com violência para
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enfrentar friamente qualquer perigo. Natasha libertou-se laboriosamente deste condiciona-
mento, levando uma vida autônoma e é signicativo que o enredo do lme gire em torno
da missão que a protagonista escolhe prosseguir, nomeadamente a libertação das outras
jovens Viúvas Negras: uma espécie, portanto, de rebelião contra um poder masculino que
manipulou as mentes e os corpos das meninas, reduzindo-as a recipientes vazios, des-
providos de capacidades geradoras e a sujeitos totalmente heterónimos, desprovidos de
consciência.
A descrição meticulosa e sangrenta da remoção cirúrgica de órgãos femininos, ação
que responde a um projeto masculino especíco, parece recordar, por um lado, a presença
nos meios de comunicação atuais de corpos femininos cada vez mais dissecados e objeti-
cados (Aubrey, Frisby, 2011 ; Baker , 2005; Haris, Upreti, Kurtaran, Ginter, Lafond, Azimi,
2023; Ponterotto, 2016), por outro lado parece lembrar aquele conito e competitividade
entre homens e mulheres em relação à geração que Silvia Vegetti Finzi (1997) denunciada
como um traço inconsciente mas muito incisivo da cultura ocidental e talvez também de ou-
tras culturas. A perda da possibilidade de serem mães biológicas é evocada e descrita pelas
protagonistas e coadjuvantes com sarcasmo e raiva, aspecto que não estava presente nos
lmes anteriores, como uma espécie de denúncia de expropriação e violência por parte de
um poder masculino e como uma espécie de declaração da importância da possibilidade de
geração de identidade feminina. A missão de libertação é possível graças ao arrependimen-
to e cumplicidade de outras personagens (em particular Melina, mãe adotiva de Natasha,
também ex-Viúva Negra, e Yelena, irmã adotiva) e envolverá a tomada de consciência das
jovens Viúvas Negras sobre a sua própria história e sobre a própria condição e a possibi-
lidade de uma vontade autônoma, embora não possibilite a recuperação das próprias fun-
ções geradoras. O lme apresenta assim ao público uma pluralidade de relações femininas
muito multifacetadas e positivas: em particular, a interessante entre Natasha e a sua mãe
adotiva, primeiro cúmplice contra a sua vontade do antagonista do mal, depois arrependi-
da e livre, que desempenha um papel fundamental e surpreendente para os propósitos da
libertação das Viúvas Negras, propondo uma imagem de maternidade adotiva e simbólica
que é carismática, fascinante e jogada no afeto e na cumplicidade, com traços por vezes
até irônicos e autodepreciativos.
Ao mesmo tempo, a relação de irmandade, em particular entre a protagonista e sua
irmã adotiva, Yelena, também assume, na trama, uma profundidade cada vez mais profunda
e complexa, primeiro aparecendo não isenta de ocasiões de conito e desconança, para de-
pois alcançar uma aliança incondicional. O tema da maternidade biológica ressurge diversas
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vezes no lme: por um lado, como o desejo profundo de Yelena e Natasha de terem lhos
e como motivo de raiva e vingança que sustenta a ação das duas; de outro, como o desejo
de Natasha de reconstruir a identidade de sua mãe biológica, morta justamente por tentar
salvar a lha do sequestro. Nesta série de referências muito explícitas à maternidade, parece
emergir a importância da relação entre mães e lhas, mas não é claro se a maternidade é
representada como incompatível com uma existência ativa, dinâmica e aventureira, e com a
sensualidade e eciência física. Certamente, o lme confere às personagens e aos temas do
feminino e do maternal uma centralidade marcante, questionando profundamente o público.
Em 2022, o MCU deu sequência a este lme com mais um lme que transpõe as
aventuras de uma super-heroína para a tela grande, Wakanda Forever. Neste último caso,
a escolha de fazer de Shuri, princesa do reino de Wakanda, a protagonista distorce com-
pletamente os acontecimentos e personagens dos quadrinhos e provavelmente responde
principalmente a uma convicção ditada pela trágica morte do ator que desempenhou o
papel em os lmes anteriores como protagonista, bem como, talvez, o desejo de seguir a
tendência atual de dar maior destaque às personagens femininas (Casella, 2010). Após a
morte prematura de Chadwick Boseman, ator muito carismático e muito querido pelo públi-
co internacional, aliás, a produtora se viu tendo que repensar os personagens e o enredo da
sequência de Pantera Negra, lme de grande sucesso em 2018 e vencedor de dois Oscar,
também considerado pela crítica uma obra extremamente original e incisiva na estrutura e
na mensagem transmitida. Em Wakanda Forever, o supertecnológico Reino de Wakanda,
no coração do continente africano, lamenta a morte de seu rei (anteriormente interpretado
pelo saudoso ator) e o poder é assumido temporariamente por sua mãe, Ramonda, perso-
nagem que interpretou um papel muito secundário na prequela. Na continuação dos acon-
tecimentos, muito complexos e em parte narrados de forma esquemática e fragmentária, o
poder real é posteriormente assumido por Shuri, irmã do falecido rei, após a morte de sua
mãe. Shuri, uma super-heroína que já no lme de 2018 era retratada como uma cientista
brilhante, dedicada à busca de armas e descobertas tecnológicas cada vez mais sostica-
das, passa a incorporar o poder da Pantera, tornando-se quase invencível e derrotando em
um duelo sangrento seu rival maligno, Namor, governante do reino de Talocan.
O tema da maternidade está presente em algumas passagens e núcleos narrativos
dos lmes: a relação entre a rainha-mãe e a protagonista é profunda e positiva, embora
interrompida pela morte violenta da mãe, que, no entanto, parece ser uma personagem ca-
rismática e dotada de decisão -fazer e vigor. No nal do lme, Shuri descobre com grande
surpresa que seu falecido irmão teve um lho com a namorada, Nakia, mantido escondido
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em um país distante: neste último caso, a maternidade biológica é um acontecimento secre-
to que, uma vez revelado, relata o narrativa rumo a um futuro provável em que o herdeiro
masculino governará, relegando Shuri novamente a um papel secundário. O lme, avaliado
pela crítica como fragmentário e com temas incompletos e não resolvidos, parece trans-
mitir mensagens complexas e contraditórias sobre o feminino e o maternal: a sicalidade
da protagonista é apenas parcialmente contraditória, surpreendente e em alguns aspectos
inovadora, caracterizada pela baixa carga erótica, mas também marcada por traços desem-
penhados na exibição de performances sobre-humanas, que atingem dimensões hiperbóli-
cas, como nas cenas nais, em que o corpo da protagonista, perfurado de um lado a outro,
sai ileso e forticado e lhe permite inigir golpes fatais golpes no oponente. Porém, é um
corpo que não apresenta poder generativo; a maternidade biológica é provocada pela per-
sonagem secundária, Nakia, que vive essa experiência ao se afastar do reino de Wakanda,
e que cria o lho em segredo, renunciando à prossão e isolando-se de sua comunidade e
de relações signicativas: uma representação bastante ambígua no que diz respeito à ma-
ternidade, quase como que para lembrar ao público a inconciliabilidade entre a maternidade
e a vida activa e até mesmo a expulsão da maternidade da comunidade.
Algumas conclusões parciais e provisórias: educar o olhar
Propomos aqui uma análise sintética e ainda provisória da representação da mater-
nidade nas aventuras cinematográcas das super-heroínas. Em Itália, há cinquenta anos,
a escritora Elena Gianini Belotti recordou quantos objetivos, como a conciliação trabalho-
-família ou a igualdade de remuneração, permaneceram inatingíveis até que as estruturas
psicológicas das próprias meninas e mulheres mudassem:
São estas estruturas psicológicas que levam a mulher a experimentar cada tentativa
de entrar no mundo produtivo com um sentimento de culpa, a sentir-se um fracasso
como mulher se aderir a ele e a sentir-se um fracasso como indivíduo se, em vez
disso, optar por realizar-se como mulher (Belotti, 1973, p. 9).
No que diz respeito à maternidade, Gianini Belotti sublinhou tanto a persistência de
uma retórica do amor materno como as pesadas mensagens veiculadas pelos meios de
comunicação que, na década de setenta, continuaram a apresentar a maternidade como
um destino feminino eletivo ou como uma experiência inconciliável no que diz respeito a
uma realização prossional: o autor relatou que, segundo pesquisas norte-americanas, a
gura mais frequente na literatura infantil era a mãe na cozinha, sublinhando a incisividade
de imagens tão difundidas.
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Como delineamos brevemente nesta nossa contribuição, inúmeras mudanças ocorre-
ram nestes cinquenta anos no que diz respeito à participação das mulheres no mundo do
trabalho, que não foi apoiada por políticas adequadas que favorecessem/incentivassem e
ainda promovam a conciliação: estes fenômenos causaram em meninas e mulheres, per-
cepções e representações contraditórias e muitas vezes culpabilizantes do seu papel na
família e na sociedade.
Da mesma forma, foram numerosas e complexas as transformações sofridas pelos
meios de comunicação voltados para crianças e adolescentes, meios que não podem mais
ser reduzidos apenas à literatura infantil, mas cujo escopo se expandiu para incluir mídias
sociais, TV e pagamento, quadrinhos, videogames, web , e assim por diante, e cuja difusão
e incisividade aumentaram exponencialmente.
Como delineamos nesta nossa contribuição, inúmeras mudanças ocorreram nestes
cinquenta anos no que diz respeito à participação das mulheres no mundo do trabalho,
que não foi apoiada por políticas adequadas que favorecessem/incentivassem e ainda pro-
movam a conciliação: estes fenômenos causaram e meninas e mulheres, percepções e
representações contraditórias e muitas vezes culpabilizantes do seu papel na família e na
sociedade.
Nesta contribuição optamos por propor algumas considerações sobre a representa-
ção da maternidade nas aventuras das super-heroínas dos lmes recentes, que transmitem
mensagens muito signicativas ao público adolescente e em particular às meninas. Nesse
sentido, destacamos como as super-heroínas apresentam ao público modelos de identi-
cação feminina emancipados por algumas características, desempenhando uma função de
problematização de estereótipos tradicionais, mas em paralelo com elementos contraditó-
rios.
Por um lado, apresentam-se como envolvidos na investigação cientíca ou extrema-
mente especialistas na utilização de tecnologias, encarnações de uma síntese signicativa
de criatividade e sensibilidade cientíca: parecem, portanto, revelar-se modelos inovado-
res, talvez incisivos para contrariar o afastamento de Disciplinas STEM por parte de meni-
nas, um dos objetivos de formação atualmente perseguidos pelas intervenções de forma-
ção e orientação (Biemmi, 2019; Seveso, 2021). Por outro lado, são personagens dotadas
de notável agência, tomada de decisão, planejamento, com características emancipadas,
a ponto de assumirem traços tradicionalmente masculinos, mas muitas vezes apresentam
uma sicalidade jogada na carga erótica e na sensualidade, acabando por propor corpos
construídos em deferência ao olhar masculino e aos ideais irreais de beleza: esse fenô-
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meno corre o risco de ter repercussões importantes para os adolescentes que vivenciam
a relação com sua corporeidade real e com sua imagem corporal de forma complexa e por
vezes conitante e se vêem lidando com processos midiáticos que eles tornam as mulheres
objetos de desejo, mas não sujeitos capazes de se expressar e agir (Grabe, Hide, Lindberg,
2007)2.
Mais especicamente no que diz respeito à representação da maternidade, os lmes
mais recentes que propõem as aventuras de super-heroínas parecem revelar mensagens
muito complexas. Por um lado, nos dois últimos lmes analisados, emerge claramente uma
maternidade simbólica como fonte de energia e autoridade, e a notável importância atribuí-
da às genealogias femininas. Por outro lado, a maternidade biológica é representada como
impossível e sobretudo inconciliável com o destino de autorrealização da mulher: uma es-
colha que coloca as super-heroínas num quadro de adaptação a modelos de eciência,
poder e invencibilidade de que são os seus pais os portadores. colegas do sexo masculino
e que evita a possibilidade de incorporar positivamente a realização da generatividade no
perl de uma nova feminilidade.
A tarefa de reexão pedagógica face a estes modelos tão contraditórios parece, por-
tanto, inevitável e urgente: a pedagogia e a educação são fortemente chamadas a promo-
ver um olhar crítico e consciente, nas meninas e jovens mulheres, em relação a modelos
tão difundidos, e a encorajá-as a procura da própria identidade, livre de expectativas sociais
que são, em muitos casos, contraditórias e irreais.
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2 Contradição semelhante é revelada por pesquisas recentes a respeito de personagens femininas pre-
sentes em desenhos animados voltados para pré-escolares. Uma contradição surpreendente é revelada em
estudos recentes sobre personagens femininas em personagens de animação voltados para crianças na
primeira infância, pessoas com traços comportamentais inovadores e emancipados, mas com característi-
cas estéticas tradicionais (Ciofalo, Lenozi, Quercia, 2021).
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Recebido em: 16/03/2024
Aceito em: 25/03/2024
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Article
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The problem of gender bias is highly prevalent and well known. In this paper, we have analysed the portrayal of gender roles in English movies, a medium that effectively influences society in shaping people’s beliefs and opinions. First, we gathered scripts of films from different genres and derived sentiments and emotions using natural language processing techniques. Afterwards, we converted the scripts into embeddings, i.e., a way of representing text in the form of vectors. With a thorough investigation, we found specific patterns in male and female characters’ personality traits in movies that align with societal stereotypes. Furthermore, we used mathematical and machine learning techniques and found some biases wherein men are shown to be more dominant and envious than women, whereas women have more joyful roles in movies. In our work, we introduce, to the best of our knowledge, a novel technique to convert dialogues into an array of emotions by combining it with Plutchik’s wheel of emotions. Our study aims to encourage reflections on gender equality in the domain of film and facilitate other researchers in analysing movies automatically instead of using manual approaches.
Chapter
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The chapter analyzes the theme of the under-representation of girls within the training paths in STEM disciplines and of boys in training paths related to humanities and the field of care. The reflection highlights the possibilities for pedagogy to propose paths of guidance and self-knowledge that are not merely a reversal of stereotypes but that allow each/ a to know their own resources Il capitolo analizza il tema della sottorappresentazione delle ragazze all'interno dei percorsi formativi in discipline STEM e dei ragazzi in percorsi formativi connessi con le humanities e con l'ambito della cura. La riflessione mette in luce le possibilità per la pedagogia di proporre percorsi di orientamento e di conoscenza di sè che non siano meramente un rovesciamento degli stereotipi ma che permettano a ciascuno/a di conoscere le proprie risosre
Article
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Even if gender representation though media evolved overtime, the risks of stereotyping, simplification and reduction of complexity still remain. In this paper we chose to focus on the analysis on the female representation in cartoons. The hypothesis which guided the realization of a pilot research conducted on five series (Peppa Pig, Pj Masks, Masha and Bear, Paw Patrol, Bing), concerns the presence (or persistence) of forms of male gaze within products intended for an audience of preschoolers.
Article
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The predominant perception of intimate partner violence (IPV) as constituting physical violence can still dominate, particularly in research and media reports, despite research documenting multiple forms of IPV including sexual violence occurring between intimate partners and various forms of psychological and emotional abuse. One frequently hidden or “invisible” form of abuse perpetrated within intimate partner relationships is economic abuse, also referred to as financial abuse in much of the literature. While the links between gendered economic insecurity and economic abuse are emerging, there remains a lack of consistency about definitions within the United States and globally, as there is no agreed upon index with which to measure economic abuse. As such, the purpose of this article is to review and analyze the global literature focused on either economic or financial abuse to determine how it is defined and what measures are used to capture its prevalence and impact. The 46 peer-reviewed articles that met all inclusion criteria for analysis came from a range of countries across six continents. Our review found that there is growing clarity and consistency of terminologies being used in these articles and found some consistency in the use of validated measures. Since this research is in its “infancy,” we need to have stronger collaborative efforts to use similar measures and terminology. Part of that collaborative effort is to consider how language and cultural differences may play a part in our understanding of economic abuse.
Conference Paper
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Il paper che qui presentiamo intende illustrare i risultati di una serie di attività realizzate presso il Dipartimento di Scienze della formazione, scienze umane e della comunicazione interculturale dell’Università degli Studi di Siena negli anni accademici compresi tra il 2013 e il 2016. Nel quadro della realizzazione di un profondo processo riorganizzativo del Dipartimento stesso - che ha visto il rilancio di alcune attività strategiche tra cui internazionalizzazione, didattica, orientamento, terza missione - si è prestato particolare attenzione, da un lato, al ripensamento delle principali funzioni svolte dalla componente docente e, dall’altro, alla considerazione degli studenti/delle studentesse come attori sociali intenzionali, chiamati a prendere parte in modo più incisivo alla progettazione e realizzazione dei propri percorsi di apprendimento.
Book
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Atti del convegno "Saperi di genere. Prospettive intedisciplinari su formazione, università, lavoro, politiche e movimenti sociali" - http://events.unitn.it/saperidigenere2017
Article
This review summarizes recent findings (2000–2020) concerning media's contributions to the development of gender stereotypes in children and adolescents. Content analyses document that there continues to be an underrepresentation of women and a misrepresentation of femininity and masculinity in mainstream media, although some positive changes are noted. Concerning the strength of media's impact, findings from three meta-analyses indicate a small but consistent association between frequent television viewing and expressing more stereotypic beliefs about gender. Concerning the nature of these effects, analyses indicate significant connections between young people's screen media use and their general gender role attitudes; their beliefs about the importance of appearance for girls and women; their stereotyping of toys, activities, and occupations; and their support for traditional sexual roles. We offer several approaches for moving this field forward, including incorporating additional theories (e.g., stereotype threat), focusing more on boys and ethnic minority youth, and centering developmental milestones. Expected final online publication date for the Annual Review of Developmental Psychology, Volume 2 is December 15, 2020. Please see http://www.annualreviews.org/page/journal/pubdates for revised estimates.
Book
Every society throughout history has defined what counts as work and what doesn�t. And more often than not, those lines of demarcation are inextricable from considerations of gender. What Is Work? offers a multi-disciplinary approach to understanding labor within the highly gendered realm of household economies. Drawing from scholarship on gender history, economic sociology, family history, civil law, and feminist economics, these essays explore the changing and often contested boundaries between what was and is considered work in different Euro-American contexts over several centuries, with an eye to the ambiguities and biases that have shaped mainstream conceptions of work across all social sectors. © 2018 Raffaella Sarti, Anna Bellavitis, Manuela Martini. All Rights reserved.