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Abstract and Figures

Este relatório traz uma definição sobre o que é o Golfo da Guiné, o porquê dessa região ser relevante e uma breve apresentação do panorama sobre a sua situação de insegurança. Posteriormente, busca-se demonstrar a importância do Golfo para o Brasil, assim como apresentar a arquitetura de segurança já existente na região. Por fim, os principais desafios para mitigar essas ameaças são explicitados, entre eles, destacam-se as múltiplas iniciativas existentes, o conflito de interesses entre as partes envolvidas, as assimetrias de capacidades, entre outros. Na última seção, são feitas recomendações de como o Brasil pode contribuir para a segurança da região, sendo a principal delas, a criação de uma força marítima para o Golfo da Guiné.
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Escola de Guerra Naval
Projeto Ordens Regionais de Segurança Marítima
Grupo de Estudos sobre Ordens Marítimas (GEOM)
2022-2023
Report
O Golfo da Guiné e o
Brasil: o elo a partir do
Atlântico Sul Luiza Bizzo Affonso
Marcelo M. Valença
Sumário Executivo
O Atlântico é uma das áreas prioritárias de atuação brasileira, dada a sua
relevância econômica, política, social e cultural. Mais de 95% do comércio
internacional brasileiro é realizado pela via marítima, 95% do petróleo,
80% do gás natural e 45% do pescado produzido no país estão localizados
no Atlântico Sul, assim como a maior parte da população se concentra no
litoral. Além de destacar a importância do Atlântico Sul para o Brasil, este
relatório pretende informar sobre a importância da costa ocidental
africana, argumentando a necessidade de um maior engajamento na
região, em especial no Golfo da Guiné. O maior envolvimento no Golfo da
Guiné faz parte da estratégia de política externa brasileira pela busca de
maior inserção internacional, assim como de reafirmação da sua soberania.
Nesse sentido, a atuação mais proeminente da Marinha brasileira no Golfo
da Guiné mostra-se como instrumento de alcance dos objetivos de política
externa e da política de defesa nacional. Este relatório traz uma definição
sobre o que é o Golfo da Guiné, o porquê dessa região ser relevante e uma
breve apresentação do panorama sobre a sua situação de insegurança.
Posteriormente, busca-se demonstrar a importância do Golfo para o Brasil,
assim como apresentar a arquitetura de segurança existente na região.
Por fim, os principais desafios para mitigar essas ameaças são explicitados,
entre eles, destacam-se as múltiplas iniciativas existentes, o conflito de
interesses entre as partes envolvidas, as assimetrias de capacidades, entre
outros. Na última seção, são feitas recomendações de como o Brasil pode
contribuir para a segurança da região, sendo a principal delas, a criação de
uma força marítima para o Golfo da Guiné.
INTRODUÇÃO O QUE É O GOLFO
DA GUINÉ
A ARQUITETURA DE
SEGURANÇA DO
GOLFO DA GUINÉ E
O BRASIL
AS PRINCIPAIS
FONTES DE
INSEGURANÇA NO
GOLFO DA GUINÉ
01
06
02
07
04
09
Índice
PRINCIPAIS DESAFIOS
10 12 13
RECOMENDAÇÕES CONSIDERAÇÕES
FINAIS
REFERÊNCIAS
APÊNDICE
15
O ATLÂNTICO SUL
COMO ELO ENTRE O
BRASIL E O GOLFO
DA GUINÉ
Introdução
O Golfo da Guiné tem chamado atenção da comunidade internacional não
apenas por conta de seus recursos energéticos e naturais, mas também por
ser uma das regiões que mais apresenta desafios à segurança internacional.
Nesse sentido, este relatório tem os objetivos de criar consciência sobre a
importância do Atlântico Sul, e consequentemente da África Ocidental, além
de informar sobre a situação de insegurança no Golfo da Guiné (“GG”) e seus
possíveis desdobramentos para o Atlântico Sul e, em especial, para o Brasil.
Ainda, são apresentadas possibilidades de cooperação entre o Brasil e os
países lindeiros ao Golfo da Guiné, bem como são recomendadas práticas
para isso.
Dessa forma, propõe-se pensar a região do Golfo da Guiné desde o Brasil,
visando maximizar os ganhos do estreitamento dessa cooperação. Ao final,
serão exemplificados alguns pontos a partir dos quais pode-se promover a
segurança na região.
01
O ATLÂNTICO SUL COMO ELO ENTRE O
BRASIL E O GOLFO DA GUINÉ
02
A importância do Atlântico Sul remonta à História, por ser uma região de grandes
transições entre Europa, América Latina e África. Atualmente tem-se uma retomada da
sua relevância econômica e geopolítica, uma vez que as plataformas continentais
brasileira e africana possuem inúmeros recursos naturais, além de compartilharem laços
históricos, culturais e sociais.
O Brasil possui a maior plataforma marítima e o maior litoral entre os demais Estados
banhados pelo Atlântico, sendo mais de 95% do seu comércio internacional realizado por
meio marítimo. Da mesma forma, a maior parte das suas reservas de petróleo e gás
natural estão no Atlântico Sul - 95% do petróleo e 80% do gás natural - assim como a
grande maioria da sua população se concentra nos Estados federais brasileiros banhados
pelo mar [X].
Mapa 2: Entorno Geopolítico Estratégico do Brasil [XII]
Soma-se a isso o fato do Atlântico Sul ser uma das principais rotas de transporte e
comunicação entre os continentes americano e africano, além da globalização e o maior
fluxo de pessoas, de informações e das redes transnacionais fazerem com que as
ameaças se encontrem mais no escopo marítimo do que terrestre.
Fonte: DE LIMA, Maria Regina Soares, et al. 2017.
Cabe destacar que a importância
estratégica do Atlântico Sul e dos Estados
da costa ocidental africana está explicitada
nos principais documentos de defesa
nacionais do Brasil, como na Política
Nacional de Defesa (“PND”), na Estratégia
Nacional de Defesa (“END”) e no Livro
Branco de Defesa Nacional (“LBDN”).
Ademais, o Plano Estratégico da Marinha
(PEM 2040) afirma a necessidade de
“maior participação e cooperação do Brasil
no Atlântico Sul(...) como instrumento de
política externa para fortalecer a dissuasão
estratégica” [XI].
03
Figura 1: Linhas de Comunicação Marítimas [XIV]
Fonte: Ship Maps 2021
Ainda, todas as Linhas de Comunicação Marítimas (“LCM”) que ligam o Brasil com o
restante do mundo passam pelo Atlântico e, embora não seja o objetivo inicial, grupos
piratas que atuam no Golfo da Guiné possuem habilidades operacionais para realizar
ataques em todo o Oceano Atlântico. Logo, a pirataria e outras ameaças na região,
além de envolverem nosso entorno estratégico, são ameaças potenciais ao Brasil
[XIII].
O estreitamento da cooperação do Brasil com os países que são banhados pelo
Atlântico Sul, mais notadamente com aqueles localizados no Golfo da Guiné, se
apresenta como uma vantagem para os mesmos por, inicialmente, trazer uma relação
de maior igualdade e menos hierarquizada, diferentemente das relações dos países
africanos com os seus parceiros tradicionais.
Ainda, o Brasil possui importantes laços históricos, culturais e linguísticos com os
Estados da região, o que pode ser exemplificado pelo fato de mais da metade da
população brasileira ter origem africana. Vale destacar a atuação de empresas
brasileiras no continente, como a Empraba, no aprimoramento tecnológico e no
aumento da produção agrícola, em países como Gana, Mali e Nigéria. Ainda, o Serviço
Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) possui centros de formação profissional
em Angola, Guiné Bissau, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe.
No campo da defesa, o Brasil tem relações de cooperação com algumas nações
africanas, principalmente no que tange à formação de militares africanos, como por
exemplo com a Marinha da Namíbia desde os anos 1990. A ideia de investir em
parcerias e cooperações, com destaque para a formação de militares, por se relacionar
com o campo ideacional, deixa o Brasil em posição de vantagem, para além da retórica
anti-imperialista. Como será apontado na próxima seção, há muitos projetos buscando
a resolução da insegurança na região, mas pouca coordenação entre eles, o que cria
uma janela de oportunidades para maior engajamento do Estado brasileiro na região.
O que é o Golfo da Guiné
04
O Golfo da Guiné é conhecido atualmente por ser a zona marítima mais perigosa do mundo.
A região, localizada na Costa Ocidental Africana e banhada pelo Atlântico Sul, é alvo de
interesses internacionais desde o século XVIII, quando era uma das principais rotas para o
tráfico de pessoas escravizadas e para o comércio de produtos europeus. Nas últimas
décadas, a região se destaca pelas grandes reservas de hidrocarbonetos, uma vez que
abrange os principais Estados produtores de petróleo do continente, como Angola, Nigéria
e Guiné-Equatorial [I] .
Não existe consenso acerca da definição de quais Estados compõem o Golfo da Guiné. O
fato de a região possuir riquezas minerais, deter recursos marinhos vivos e não-vivos,
assim como possuir importantes linhas marítimas de comunicação explicam o porquê da
definição de quais Estados pertencerem à sub-região ser estratégica e mudar de acordo
com os interesses e atores envolvidos [II] .
Para a Organização das
Nações Unidas (“ONU”), o
espaço marítimo do Golfo da
Guiné é composto por nove
países costeiros Costa do
Marfim, Gana, Togo, Benim,
Nigéria, Camarões, Guiné
Equatorial, Gabão, São Tomé e
Príncipe. Outros Estados, como
Angola, República Democrática
do Congo, Cabo Verde e
Senegal apenas para citar
alguns são considerados
também como partes
interessadas na região [III] .
Mapa 1: Golfo da Guiné [IV]
Fonte: Stable Seas: Gulf of Guinea. 2020
05
A importância internacional do GG se deve, além de ser uma área rica em recursos
naturais, como petróleo e gás, pelo fato de ser uma das principais rotas de tráfego entre a
África e a América do Sul. Vale destacar que o GG é um importante hub logístico, onde
estão situados importantes portos do continente africano, assim como é uma das
principais áreas de exportação de petróleo para o mundo [V].
Sobre sua relevância energética, destaca-se que os recursos naturais da região, como o
petróleo, possuem uma produção menos custosa, quando comparada ao Golfo Pérsico,
uma vez que a maior parte das suas reservas estão localizadas offshore, além de possuir
uma qualidade superior, dado o baixo teor de enxofre. A posição mais próxima dos
principais países consumidoras dos recursos energéticos, como os Estados Unidos e a
Europa Ocidental também se apresenta como uma vantagem. Outro fator de atração para
as empresas petrolíferas multinacionais são as políticas fiscais dos Estados pertencentes
ao Golfo da Guiné, favoráveis à atração de investimentos externos [VI].
Embora seja rica em recursos naturais, a região é marcada por grandes problemas
socioeconômicos, altos índices de corrupção, gestão dos recursos, pobreza e
desemprego. Um dos seus Estados mais importantes, a Nigéria, é considerado um dos
Estados mais frágeis do mundo, assim como Guiné Bissau, Camarões, Congo e República
Democrática do Congo, de modo que se tornam ainda mais vulneráveis no que diz respeito
ao controle de suas autoridades e ao combate às atividades ilícitas nos seus espaços [VII].
Os graves problemas de insegurança na região podem ser explicados, em grande medida,
por esses problemas estruturais.
As Principais Fontes de Insegurança no Golfo da
Guiné
As principais fontes de insegurança no GG
são a pirataria marítima, o roubo armado, a
degradação ambiental, o tráfico de drogas e a
pesca ilegal, não declarada e não
regulamentada (INN). Soma-se a isso o fato
da região ainda enfrentar altos índices de
desemprego, instabilidades políticas, altas
taxas de corrupção, disputas fronteiriças,
problemas migratórios e ambientais.
Em relação à pesca INN, os países costeiros
por possuírem alto grau de dependência das
atividades de pesca, sofrem com grandes
perdas financeiras, impactando diretamente
nas economias nacionais, bem como nos
meios de subsistência das suas populações,
colocando em risco a segurança alimentar
dos seus povos e o meio ambiente.
No que tange ao narcotráfico, a África
Ocidental apresenta-se como uma das
principais rotas de passagens do tráfego de
drogas com origem na América do Sul e
destino à Europa, devido à precária
fiscalização.
Sobre os ataques ligados à pirataria marítima
e ao roubo armado, observa-se que a
motivação inicial era o roubo de carga,
principalmente petróleo e outros derivados,
para revenda no mercado ilegal. Contudo, a
queda nos valores do petróleo entre 2015 e
2018 levou à mudança de práticas dos grupos
criminosos, que passam a focar nos
sequestros das tripulações das suas
embarcações. Embora a pirataria do Golfo da
Guiné tenha sofrido um declínio de 58% em
2021, com 34 incidentes reportados quando
comparado aos 81 em 2020, e da mesma
forma tenha havido um decréscimo do
número de pessoas raptadas - de 130 em
2020 para 57 em 2021 -, o Golfo da Guiné foi
responsável por todos os raptos a nível
mundial [VIII].
A insegurança internacional no GG traz
importantes impactos mundiais, como pode
ser ilustrado pelo quadro abaixo [IX]:
O Golfo da Guiné
em números
Estatais
Regionais
Internacionais
Nigéria
Comunidade Econômica dos
Estados da África Ocidental
(“CEDEAO”).
G7 + Amigos do Golfo da
Guiné (“G7++FOGG")
Camarões
Comunidade Econômica dos
Estados da África Central
(“ECCAS”).
Estratégia da UE e
Presença Maritima
Coodenada (CMP) para o
GG.
Angola
União Africana (“UA”).
Atuação de potências
extrarregionais: Estados
Unidos, a França, a China
e o Brasil
Outros
Comissão do Golfo da Guiné
(“GGC”).
Arquitetura de Yaoundé
A ARQUITETURA DE SEGURANÇA DO GOLFO
DA GUINÉ E O BRASIL
Além dos esforços de atores Estatais para combater as ameaças existentes, com
destaque para Nigéria e Camarões que adquiriram novos meios navais e passaram a
realizar patrulhas marítimas conjuntas, como a Operação Pulo Shield e a Operação
Prosperity, observa-se também a participação de múltiplos atores no GG na configuração
da arquitetura de segurança da região.
No âmbito regional, destaca-se a arquitetura de Yaoundé, criada em 2013 a partir da
reunião dos líderes da Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental
("CEDEAO"), da Comunidade Econômica dos Estados da África Central ("ECCAS") e da
Comissão do Golfo da Guiné ("GGC"). A Arquitetura de Yaoundé abrange o Centro de
Coordenação Inter-regional ("ICC"), a estrutura de coordenação e troca de informações
que liga o Centro Regional de Segurança Marítima para a África Central ("CRESMAC") e o
Centro Regional de Segurança Marítima para a África Ocidental ("CRESMAO").
ATORES QUE COMPÕEM A ARQUITETURA DE SEGURANÇA DO GG
Embora haja muitas iniciativas, observa-se pouca articulação entre elas: “verifica-se
fragmentação no uso de recursos escassos (militares e orçamentários), competição pelo
agenda-setting da região e reflexo em rivalidades geopolíticas” [XV].
Em relação ao Brasil, nota-se que o país, principalmente a partir dos anos 2000,
intensificou sua cooperação com os Estados do continente africano, principalmente por
meio de parcerias técnicas, assim como também nas áreas de defesa e estratégia, ainda
em que menor grau.
Além de fazer parte do grupo G7++FOGG como membro efetivo, o Brasil participa desde
2011 de exercícios militares combinados, como o Obangame Express, que envolve
treinamentos em interdição de embarcações e compartilhamento de informações, e os
Exercícios FELINO – de assistência humanitária e operações de paz – da Comunidade dos
Países de Língua Portuguesa (“CPLP”) [XVI] . Ainda, entre agosto e outubro de 2021, foi
realizada a Operação Guinex-I, que são exercícios conjuntos e de adestramento mútuo,
para aumentar as capacidades em segurança marítima do Brasil e dos países do GG.
Outro exemplo de cooperação naval é a participação de um oficial da Marinha brasileira
no Centro inter-regional de coordenação entre os países do GG, podendo observar e
participar das atividades desenvolvidas no âmbito da Arquitetura de Yaoundé [XVII] .
08
PRINCIPAIS DESAFIOS
Com base no que foi apresentado, os principais desafios para a criação de
uma governança de segurança no Golfo da Guiné são apontados abaixo:
09
E o que pode ser feito? Na próxima seção serão exemplificadas ações que
podem ser tomadas visando mitigar os problemas da região e buscando
superar esses desafios. As possibilidades de inserção do Brasil também
serão destacadas.
RECOMENDAÇÕES
Com base na Literatura existente [XVIII], apontamos os seguintes instrumentos como
meios de fortalecer a governança em segurança marítima da região:
Realização de conferências frequentes para discutir as
práticas e experiências entre as Forças Navais e demais
atores, e aumentar a participação em treinamentos e
exercícios navais combinados.
Acredita-se que a troca de experiências entre os atores engajados na região do GG,
assim como a realização frequente de conferências que envolvam os demais
setores da sociedade, para além das Forças Armadas, como a academia, os
tomadores de decisão e a opinião pública, contribui para a criação da consciência
situacional marítima da área e permite a consolidação de uma arquitetura de
segurança. A partir dessa arquitetura, podem ser executados projetos e parcerias
comuns, mecanismos de consulta mútua, aumentando a coordenação entre as
práticas existentes, tornando-as mais eficientes, e criando até mesmo outras ações,
que não seriam possíveis de serem executadas de maneira unilateral.
1
10
Acordos focados na lógica de complementariedade
2
Algumas dessas iniciativas estão em andamento, como o sistema YARIS,
plataforma de compartilhamento de informações no âmbito da Arquitetura de
Yaoundé financiado pela União Europeia e pelo Governo da Dinamarca. A troca de
informações e acordos que seguem a lógica da complementariedade contribuem
para a coordenação e maximizam as ações no combate das ameaças da região, bem
como ajudam a consolidar a arquitetura de segurança na região.
O Brasil, por meio do seu Sistema de Informações sobre o Tráfego Marítimo
(“SISTRAM”), que possui acordos internacionais com as Marinhas de Angola e
Camarões, também poderia contribuir para esse projeto. A transferência de
equipamentos, a exemplo das aeronaves Tucano e Super Tucano, com boa aceitação
internacional, também pode ser pensado em termos navais, de modo a incrementar a
Base Industrial de Defesa (“BID”).
Criação de estruturas legais por parte dos Estados do
GG que implemente os arranjos internacionais focados
no combate dessas ameaças
3
Um estreitamento da cooperação em segurança marítima na região deve respeitar a
soberania dos Estados. Para que ela seja bem-sucedida, os Estados que fazem parte
dessa arquitetura de segurança devem criar estruturas legais que implementem e
defendam os acordos internacionais. A criação de leis e o aumento no combate a
grupos piratas, feitos de maneira unilateral pela Nigéria, por exemplo, levou a um
aumento considerável de incidentes nos demais Estados do GG. A criação de um
Estado de Direito semelhante para processar, punir e julgar os piratas pelos Estados
da região poderá levar a resultados significativos.
Criação de uma força marítima que coordene esses
esforços e tenha um mandado de atuação internacional,
com apoio dos Estados da região.
4
A criação de uma força marítima permanente permitiria o estabelecimento de um
mecanismo contínuo e regular que favorecesse as trocas de informações, o
monitoramento do tráfego e a realização de treinamentos conjuntos de civis e militares,
para além das iniciativas descoordenadas e ad hoc existentes.
Nesse sentido, o Brasil poderia ser um dos líderes dessas iniciativas, tanto por seu
histórico de cooperação e sua experiência, na condução da Força Tarefa Marítima
(“FTM-UNIFIL”) no Líbano, por exemplo, quanto por ser um país do Sul Global [XIX].
Ademais, o Brasil, com seu histórico de atuação em operações de paz e assistência
humanitária mais horizontal e menos hierarquizada, diferentemente das potências
tradicionais, possibilita maior aceitação e apoio no seu envolvimento por parte dos
Estados assistidos [XX].
No entanto, é válido pontuar que o aumento da militarização na região só será eficaz no
longo-prazo se for acompanhado por uma série de esforços que foquem nos problemas
socioeconômicos dos Estados do GG.
.
11
CONSIDERAÇÕES FINAIS
12
Muitos são os desafios para o estabelecimento de uma governança em
segurança no Golfo da Guiné. A falta de vontade política, a ausência de
coordenação entre as diversas iniciativas, os interesses conflitantes das
partes atuantes na região são apenas alguns dos entraves para a
consolidação dessa arquitetura de segurança.
O Brasil pode se beneficiar dessa situação, por meio da convergência dos
próprios interesses nacionais com os esforços para a cooperação
internacional. Acredita-se que um maior engajamento nacional na região
pode contribuir para uma maior projeção internacional do país, uma vez que
a política de defesa e a política externa devem caminhar juntas.
Embora faça parte do interesse brasileiro aumentar sua presença
operacional regular na África Ocidental, a falta de recursos e as oscilações
políticas são grandes barreiras para o estreitamento dessa cooperação.
Ainda, deve-se buscar a formulação de políticas de longo-prazo, com maiores
lastros institucionais, que não fiquem à mercê das mudanças governamentais
e das instabilidades dos desejos políticos.
Mais do que buscar uma cooperação sul atlântica, se fazem necessárias a
construção e a sustentação de uma governança em segurança marítima.
Governança essa que envolva arranjos diplomáticos, legais e o
desenvolvimento de uma infraestrutura física [XXI].
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Brazil’s involvement in the United Nations Interim Force in Lebanon (UNIFIL) since 2011 has allowed for a direct participation as part of international peace and security efforts in the Middle East, strengthening the country’s credentials as it presents itself as a ‘peace provider’. Informed by academic contributions on issues of responsibility and recognition, the article discusses Brazil’s engagement with particular reference to UNIFIL’s Maritime Task Force, and the implications of such participation for its broader foreign and defence policy agenda.
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