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Homem et al. O efeito da idade relativa na seleção brasileira. Rev Bras Futebol 2022; v. 15, n. 5, 40 – 52.
Rev Bras Futebol 2022; v. 15 , n. 5, 40 – 52.
O EFEITO DA IDADE RELATIVA NA SELEÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL EM DIFERENTES
COMPETIÇÕES: 103 ANOS DE COMPETIÇÕES OFICIAIS
THE RELATIVE AGE EFFECT ON THE BRAZILIAN NATIONAL SOCCER TEAM IN DIFFERENT
COMPETITIONS: 103 YEARS OF OFFICIAL COMPETITIONS
Michel Machado Homem
Bacharel em Educação Física – Universidade Federal de Juiz de Fora
Francisco Zacaron Werneck
Professor Doutor Universidade Federal de Ouro Preto
Vinicius Alves Xavier
Bacharel em Educação Física – Universidade Federal de Juiz de Fora
Thadeu Luiz Almeida Rodrigues
Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física da Universidade do Coimbra
Felipe Fernandes da Silva
Faculdade de Ciências do Desporto da Universidade do Porto
Marcelo de Oliveira Matta
Professor Doutor da Universidade Federal de Juiz de Fora
Dilson Borges Ribeiro Junior
Professor Doutor da Universidade Federal de Juiz de Fora
Endereço de correspondência:
Michel Machado Homem
Rua Sarandira, 377, complemento 201 – Santa Luzia – Juiz de Fora – Minas Gerais – Brasil
(32) 98449-2144
michelmachadoh@gmail.com
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Homem et al. O efeito da idade relativa na seleção brasileira. Rev Bras Futebol 2022; v. 15, n. 5, 40 – 52.
O EFEITO DA IDADE RELATIVA NA SELEÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL EM DIFERENTES
COMPETIÇÕES: 103 ANOS DE COMPETIÇÕES OFICIAIS
RESUMO
Introdução: Há pouca atenção da comunidade científica para estudos que avaliem o perfil e que
relacionem o Efeito da Idade Relativa (EIR) ao desempenho coletivo das seleções brasileiras de
futebol de base e profissional ao longo de toda a sua história.
Objetivo: Avaliar o perfil do EIR nas seleções de base e profissional durante 103 anos de competições
oficiais e observar a associação desse fenômeno com a classificação final das equipes.
Metodologia: Para análise dos dados, os atletas foram divididos por quartis de nascimento e
também por semestres. As informações dos atletas foram retiradas dos sites da FIFA, CBF e O GOL.
Para investigar o EIR nas categorias avaliadas, utilizou-se o teste Qui-Quadrado (X²) para os quartis,
sendo calculada a OddsRatio (OR) com intervalo de confiança (IC) a 95%.
Resultados: Um total de 2.765 atletas que representaram as seleções brasileiras foi avaliado, e os
que disputaram os mundiais (p=0,61) não apresentaram EIR. Já os que disputaram Copa das
Confederações (p=0,02), Olimpíadas (p=0,02), Copa América (p=0,00), juntamente com os Mundiais e
Sul-americanos Sub-20 e Sub-17 (p=0,00), apresentaram EIR.Verificou-se que apenas nos Jogos
Olímpicos houve associação entre ser campeão e ter nascido no primeiro semestre.
Conclusão: O EIR está presente ao longo do tempo nos atletas selecionados para representar as
seleções brasileiras em diferentes competições e categorias, com exceção dos participantes das
Copas do Mundo. Não há associação entre nascer nos primeiros meses do ano e ter sido campeão
para os atletas que representaram as seleções brasileiras em diferentes competições e categorias ao
longo do tempo.
Palavras-chave: Futebol;Efeito da Idade Relativa;Seleção brasileira;Desempenho coletivo.
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Homem et al. O efeito da idade relativa na seleção brasileira. Rev Bras Futebol 2022; v. 15, n. 5, 40 – 52.
THE RELATIVE AGE EFFECT ON BRAZILIAN NATIONAL SOCCER TEAM IN DIFFERENT COMPETITIONS:
103 YEARS OF OFFICIAL COMPETITIONS
ABSTRACT
Introduction: There is a few attention of scientific community in studies that evaluate the profile and
relate the Relative Age Effect (RAE) to the collective performance of Brazilian youth and professional
soccer teams throughout its history.
Objective: Evaluate the profile of RAE in the youth and professional teams during 103 years of official
competitions and to relate this phenomenon to the final classification of the teams.
Methodology: For data analysis, the athletes were divided by birth quartiles and also by semesters.
The athletes' information was taken from the FIFA, CBF and O GOL websites. To investigate the RAE
in the evaluated categories, the Chi-Square test (X²) was used for the quartiles, and Odds Ratio (OR)
was calculated with a 95% confidence interval (CI).
Results: A total of 2765 athletes who represented the Brazilian teams were evaluated and those who
competed in the World Cups (p=0.61) did not present RAE. On the other hand, those who competed
in the Confederations Cup (p=0.02), Olympics (p=0.02), Americas Cup (p=0.00), along with the World
Cups and South American Sub20 and Sub17 (p=0.00) presented RAE. In the observation that being
the non-being of the 1st semester interferes with being champion, the athletes of the Olympic games
(X²=5.0-p=0.025) had a great effect.
Conclusion: The EIR is at the same time in the selected athletes to represent long selections of
national teams in different countries and categories, with the participants of the World Cups. There
is no start between the first months of the year and being champion for athletes representing teams
in different categories over time.
Keywords: Soccer. Relative Age Effect. Brazilian National Team. Team Performance.
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1. INTRODUÇÃO
Ao longo dos anos o futebol foi ganhando espaço na cultura brasileira, e essa trajetória
conferiu à modalidade a maior popularidade enquanto esporte no território nacional. Com isso, o
Brasil ficou conhecido como “país do futebol”1. Essa popularidade faz com que o país seja uma das
maiores potências do mundo na modalidade, sendo também um grande revelador de talentos2.Os
resultados obtidos ao longo do tempo pela seleção nacional comprovam essa premissa: é a maior
campeã em Copas do Mundo (cinco vezes) e Copa das Confederações (quatro vezes)3.
Além dos resultados esportivos, o futebol brasileiro se destaca na venda e transferência de
atletas, o que tem acontecido com os jogadores cada vez mais novos, principalmente para o exterior.
Com isso, a busca por novos talentos no território nacional é incessante. Atualmente, a tomada de
decisão de treinadores e equipes no processo de seleção e desenvolvimento de talentos privilegia os
atletas mais velhos que apresentam precocidade nos aspectos biológicos4.
Esse fenômeno é conhecido como Efeito da Idade Relativa (EIR) e refere-se às diferenças de
níveis de rendimento entre jovens atletas agrupados por idade, em queos mais velhos (nascidos nos
primeiros meses do ano) apresentam maiores vantagens em termos de desenvolvimento em relação
aos mais novos, por serem, geralmente, maiores, mais fortes e com mais coordenação, aumentando
assim a probabilidade de terem melhor desempenho5-8.
Alguns estudos mostraram que o EIR está presente no futebol brasileiro9-11 . Após os anos
1960 esse fenômeno veio aumentando progressivamente, quando a preparação física passou a ser
adotada nos clubes de futebol do País12.
Ao associarmos o EIR com o resultado competitivo de equipes de futebol, encontramos
alguns achados interessantes, como em Pereira et al.26, os quais afirmam haver incidência do
fenômeno na Copa das Confederações de 2005 unicamente na seleção brasileira, que conquistou o
título da competição. Resultados semelhantes apareceram no estudo de Yagüe et al30, que
confirmaram a presença do EIR nas equipes com melhor desempenho das 10 melhores ligas de
futebol masculino da UEFA (União das Associações Europeias de Futebol). Nas categorias de base
também há registros da incidência do EIR na classificação final da Primeira Liga Alemã Sub-1715.
Como apresentado anteriormente, é possível observar uma quantidade elevada de estudos a
respeito do EIR no futebol e que associam esse fenômeno a algumas competições oficiais da
modalidade. Entretanto, nenhum estudo até o momento analisou o EIR atrelado ao desempenho da
seleção brasileira de futebol em seu histórico de competições oficiais e em diferentes
categorias.Assim, o objetivo deste estudo é descrever o perfil do EIR na seleção brasileira de futebol
em competições oficiais de diferentes categorias ao longo de 103 anose observar a associação do EIR
com o resultado final da competição.
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Homem et al. O efeito da idade relativa na seleção brasileira. Rev Bras Futebol 2022; v. 15, n. 5, 40 – 52.
2. METODOLOGIA
O presente estudo adotou uma abordagem de levantamento histórico, tomando como base
as informações dos atletas (data de nascimento, competição disputada e classificação), as quais
foram retiradas do site da CBF (Confederação Brasileira de Futebol) (https://www.cbf.com.br), da
FIFA (https://www.fifa.com) e do O GOL (https://www.ogol.com.br). O uso de dados públicos
disponíveis na internet tem sido descrito em outros estudos sem a necessidade de aprovação de
pesquisa por comitê de ética16,17.A utilização de informações de acesso público é autorizada sem a
necessidade de avaliação de Comitê de Ética e Pesquisa (CEP), a partir da Resolução nº 510, de 7 de
abril de 2016, do Ministério da Saúde.
2.1. AMOSTRA
A amostra constituiu-se de 2.765 atletas de futebol do sexo masculino que representaram a
seleção brasileira nas seguintes competições: Copa do Mundo FIFA, Copa das Confederações FIFA,
Jogos Olímpicos, Copa América, Mundial Sub-20 FIFA, Mundial Sub-17 FIFA, Campeonato Sul-
americano Sub-20 e Campeonato Sul-americano Sub-17 entre os anos de 1916 e 2019. Foram então
quatro competições de nível internacional na categoria adulta e quatro competições de nível
internacional em categorias de formação. Os respectivos anos de competição estão representados na
tabela 1.
Tabela 1 - Características das competições observadas.
Competição
Anos
No de edições
Total de atletas
Copa do Mundo
1930 até 2018
21
465
Copa das Confederações
1997 a 2013
7
157
Jogos Olímpicos
1952 a 2016
13
234
Copa América
1916 a 2019
35
667
Mundial Sub-20
1977 a 2015
18
339
Mundial Sub-17
1985 a 2019
17
333
Sul-americano Sub-20
1983 a 2019
10
204
Sul-americano Sub-17
1988 a 2019
14
261
Fonte: os autores.
2.2. ANÁLISE DOS DADOS
Para analisar os dados, os jogadores foram categorizados em quartis, de acordo com o mês
de nascimento de cada um.O primeiro quartil (Q1) foi composto pelos atletas nascidos entre 1º de
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janeiro e 31 de março; o segundo quartil (Q2), pelos atletas nascidos entre 1º de abril e 30 de junho;
o terceiro quartil (Q3), pelos atletas nascidos entre 1º de julho e 30 de setembro; e o quarto quartil
(Q4), pelos atletas nascidos entre 1º de outubro e 31 dezembro, além de serem organizados por
semestre de nascimento:primeiro semestre (S1), atletas nascidos entre 1º de janeiro e 30 de junho; e
segundo semestre (S2), atletas nascidos entre 1º de julho e 31 de dezembro7,17. Foi adotada a
distribuição equitativa entre os quartis e os semestres.
Na análise do EIR por resultado final da competição considerou-se o resultado coletivo das
equipes nas respectivas competições observadas, seja em relação à fase da competição alcançada
(final, semifinal, quartas de final, oitavas de final, fase de classificação) e se foi campeã ou não.
A análise estatística foi feita de forma descritiva para caracterização da amostra, por meio da
média ± desvio-padrão (variáveis quantitativas). Para distribuição dos quartis e semestres de
nascimento, foi realizada a análise descritiva da frequência e porcentagens para as variáveis
qualitativas. Para investigar o EIR nas categorias avaliadas, utilizou-se o teste Qui-Quadrado (X2)para
os quartis, sendo calculada a Odds Ratio (OR) com intervalo de confiança (IC) a 95%. A ORcomparou a
distribuição dos três primeiros quartis de nascimento (Q1, Q2 e Q3) com o último quartil (Q4),
conforme as recomendações de Cobley et al.8. Para verificar a associação do EIR (semestre) com
oresultado coletivo, foi realizada uma análise bivariada a partir de tabela de referência cruzada, com
o teste Qui-quadrado de Pearson (X2), sendo calculada a Odds Ratio (OR) com intervalo de confiança
(IC) a 95% entre os semestres. Em seguida foi calculado o tamanho do efeito para o teste Qui-
quadrado, interpretado da seguinte forma: OR< 1,23 (muito pequeno), OR entre 1,23 e 1,85
(pequeno), OR entre 1,86 e2,99 (médio) e OR> 2,99 (grande)18. Todos os testes estatísticos foram
realizados no software SPSS versão 26.0 (IBM Corp. Armonk, NY), sendo adotado nível de
significância de 5%.
3. RESULTADOS
De acordo com a proposta do trabalho de descrever o perfil dos atletas que representaram
as seleções brasileiras ao longo de mais de um século de competições oficiais e sua relação com o
resultado alcançado nestas competições, é possível observar na tabela 2 a distribuição dos atletas
em relação aos desempenhos coletivos obtidos e suas respectivas competições disputadas. Destaca-
se um percentual elevado de atletas que foram campeões nas competições Copa das Confederações,
Sul-americano Sub-17 e Sub-20. Além disso, o percentual de atletas que chegaram às finais e
semifinais em todas as competições ultrapassa os 50%.
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Tabela 2- Frequência de atletas da seleção brasileira por competições disputadas e seus respectivos
desempenhos coletivos alcançados.
Competição
Mundial
Confederações
Olimpíadas
América
Mundial-20
Mundial-17
SulAm-20
SulAm-17
Total
465
157
234
667
339
333
204
261
Classificação
Campeão
110(23,7)
91(58,0)
18(7,7)
196(25,4)
93(27,4)
79(23,7)
92(45,1)
215(82,4)
Final
155(33,3)
111(70,7)
73(31,2)
430(55,7)
170(50,1)
117(35,1)
113(55,4)
238(91,2)
Semifinal
89(19,1)
23(14,6)
53(22,6)
207(26,8)
57(16,8)
60(18,0)
23(11,3)
-
Quartasfinal
135(29,0)
-
51(21,8)
90(11,7)
91(26,8)
96(28,8)
46(22,5)
-
Oitavas final
39(8,4)
-
57(24,4)
-
21(6,2)
21(6,3)
-
-
Classificação
47(10,1)
-
-
45(5,8)
-
39(11,7)
22(10,8)
23(8,8)
Fonte: os autores.
A partir da tabela 3 é possível observar a distribuição dos atletas por quartis de nascimento.
Em todas as competições referentes às categorias de base foi identificada a presença do EIR, com
predominância de nascidos no primeiro quartil, sendo os valores confirmados pelas razões de
chances apresentadas entre o primeiro e o quarto quartil. Maiores valores foram encontrados nas
categorias sub-17 (Q1xQ4 para Mundial e Sul-americano: 3,14 e 4,44, respectivamente). Nas
categorias adultas a presença do EIR não foi identificada nas Copas do Mundo. Nos Jogos Olímpicos a
predominância esteve no primeiro quartil. Já na Copa das Confederações e na Copa América a
predominância esteve no segundo quartil, o que é confirmado com a razão de chance maior entre o
segundo e o quarto (2,08 e 1,68, respectivamente).
Tabela 3- Avaliação dos quartis de nascimento por competição/categoria dos atletas que
representaram a seleção brasileira de futebol entre 1916 e 2019.
Competição
N
Número (%) de atletas por quartil
X2
p
OR (95% Intervalo de confiança)
Q1(%)
Q2(%)
Q3(%)
Q4(%)
Q1xQ4
Q2xQ4
Q3xQ4
Mundial
465
124 (26,7)
123(26,5)
110(23,7)
108(23,2)
1,830
0,61
1,15(0,8-1,6)
1,15(0,8-1,6)
1,01(0,7-1,5)
Confederações
157
37(23,6)
50(31,8)
46(29,3)
24(15,3)
10,159
0,02
1,54(0,8-3,1)
2,08(1,1-4,0)
1,91(1,0-3,7)
Olimpíadas
233
73(31,3)
63(27,0)
54(23,2)
43(18,5)
8,425
0,04
1,70(1,0-2,8)
1,46(0,8-2,5)
1,25(0,7-2,1)
Copa América
667
160(24,0)
210(31,5)
172(25,8)
125(18,7)
22,109
0,00
1,28(0,9-1,7)
1,68(1,2-2,3)
1,40(1,0-1,9)
M. Sub-20
339
109(32,2)
83(24,5)
89(26,3)
58(17,1)
15,631
0,00
1,90(1,2-2,9)
1,43(0,9-1,2)
1,53(1,0-2,4)
M. Sub-17
333
148(44,4)
72(21,6)
66(19,8)
47(14,1)
71,240
0,00
3,14(2,0-4,9)
1,53(0,9-2,4)
1,40(0,9-2,3)
Sul. Sub-20
204
77(37,7)
51(25,0)
48(23,5)
28(13,7)
23,804
0,00
2,74(1,5-4,9)
1,82(1,0-3,3)
1,71(0,9-3,1)
Sul Sub-17
261
120(46,0)
60(23,0)
54(20,7)
27(10,3)
70,724
0,00
4,44(2,6-7,6)
2,22(1,3-3,9)
2,00(1,1-3,5)
Fonte: os autores.
Ao analisar a distribuição dos atletas nascidos no primeiroe segundosemestres nas diferentes
competições e categorias, observa-se que o EIR estápresente nos atletas que disputaram as
competições internacionais de base, e na categoria adulta, somente nos Jogos Olímpicos e Copa
América.
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Homem et al. O efeito da idade relativa na seleção brasileira. Rev Bras Futebol 2022; v. 15, n. 5, 40 – 52.
Figura 1 - Distribuição (%) e avaliação dos semestres de nascimento por competição.; *= p<0,05
Fonte: os autores
Nas tabelas 4 e 5 pode-se observar a relação entre o desempenho competitivo coletivo e os
semestres de nascimento dos atletas que representaram as seleções brasileiras de futebol em
diversas competições/categorias. Na tabela 4, que mostra as competições/categorias adultas, a partir
da comparação por linhas e representação estatística (p=valor)nota-se que apenas nos Jogos
Olímpicos houve associação entre ser campeão e ter nascido no primeiro semestre, ou seja, ter
nascido no primeiro semestre aumentou as chances em até três vezes de ser campeão, o que
evidencia uma magnitude prática “grande”. Todavia, nas competições/categorias consideradas de
base não foi encontrada nenhuma associação entre ser campeão e o semestre de nascimento.
Tabela 4- Avaliação dos semestres de nascimento dos atletas representantes das seleções brasileiras
de futebol nas competições oficiais adulto entre os anos de 1916 e2019 que foram campeões ou não.
Semestre
Número (%) de atletas campeões
X2
p
OR (95% Intervalo de Confiança)
Sim
Não
Total
Campeões x Não
Campeões
Tamanho do
Efeito
Copa do Mundo
1º semestre
55(22,3)
192(77,7)
247
0,61
0,44
0,88 (0,63-1,22)
Muito pequeno
2º semestre
55(25,3)
162(74,7)
217
Copa Confederações
1º semestre
53(60,9)
34(39,1)
87
0,70
0,40
1,12(0,85-1,47)
Muito pequeno
2º semestre
38(54,3)
32(45,7)
70
Jogos Olímpicos
1º semestre
15(11,0)
121(89,0)
136
5,0
0,025
3,57(1,06-11,98)
Grande
2º semestre
3(3,1)
94(96,9)
97
Copa América
1º semestre
85(23,0)
285(77,0)
370
0,97
0,33
0,88(0,67-1,14)
Muito pequeno
2º semestre
78(26,3)
219(73,7)
287
Fonte: os autores.
X2: teste Qui-quadrado; 1º quartil (Q1): Jan-Mar; 2º quartil (Q2): Abr-Jun; 3º quartil (Q3): Jul-Set; 4º quartil (Q4): Out-Dez; Tamanho do
Efeito: OR< 1,23 (muito pequeno), OR entre 1,23 e 1,85 (pequeno), OR entre 1,86 e2,99 (médio) e OR > 2,99 (grande).*p<0,05.
53,1
55,4
58,1
55,4
56,6
66,1
62,7
69
46,9
44,6
41,5
44,5
43,4
33,9
37,3
31
0
10
20
30
40
50
60
70
80
1 Semestre
2 Semestre
*
*
*
*
* *
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Tabela 5- Avaliação dos semestres de nascimento dos atletas representantes das seleções brasileiras
de futebol nas competições oficiais de base entre os anos de 1977 e 2019 que foram campeões ou
não.
Semestre
Número (%) de atletas campeões
X2
p
OR (95% Intervalo de Confiança)
Sim
Não
Total
Campeões x Não
Campeões
Tamanho do Efeito
Mundial Sub-20
1º semestre
53(27,6)
139(72,4)
192
0,006
0,936
1,01(0,72-1,44)
Muito pequeno
2º semestre
40(27,2)
107(72,8)
147
Mundial Sub-17
1º semestre
59(26,8)
161(73,2)
220
3,431
0,064
1,52(0,96-2,39)
Pequeno
2º semestre
20(17,7)
93(82,3)
113
Sul-americano Sub-20
1º semestre
59(46,1)
69(53,9)
128
0,138
0,711
1,06(0,78-1,46)
Muito pequeno
2º semestre
33(43,4)
43(56,6)
76
Sul-americano Sub-17
1º semestre
143(79,4)
37(20,6)
180
0,89(0,80-1,00)
Muito pequeno
3,432
0,064
2º semestre
72(88,9)
9(11,1)
81
Fonte: os autores
X2: teste Qui-quadrado; 1º quartil (Q1): Jan-Mar; 2º quartil (Q2): Abr-Jun; 3º quartil (Q3): Jul-Set; 4º quartil (Q4): Out-Dez;
Tamanho do Efeito: OR< 1,23 (muito pequeno), OR entre 1,23 e 1,85 (pequeno), OR entre 1,86 e2,99 (médio) e OR > 2,99
(grande).*p<0,05.
4. DISCUSSÃO
O objetivo do presente estudo foi descrever o perfil do EIR na seleção brasileira de futebol
em competições oficiais de diferentes categorias ao longo de 103 anos e observar a associação do
EIR com o resultado final da competição.
Os achados deste estudo mostram que o EIR está presente quando se observa uma grande
população ao longo do tempo em diferentes competições e categorias das seleções brasileiras. Costa
et al.10 demonstraram ter havido aumento do EIR ao longo dos anos na seleção brasileira entre
202.951 atletas com data de nascimento entre 1921 e 1996, registrados pela CBF como profissionais
até o ano de 2011.
Ao se considerar a distribuição dos jogadores por idade, nas competições abordadas neste
estudo o EIR foi mais marcante nas categorias de formação. É uma prática comum no processo de
avaliação as equipes técnicas valorizarem mais os atletas que apresentam maturação biológica
precoce. Em geral, esses jogadores têm maior estatura, são mais fortes e mais rápidos. Dessa forma,
acabam sendo privilegiados na seleção e, por vezes, seguem no processo de avaliação e mais tarde
ingressam nas equipes. Algumas pesquisas também demonstraram a incidência do EIR, como em
mundiais sub-1719,20 e sub-2021,22. Linhares et al.20 também observaram a presença do fenômeno
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Homem et al. O efeito da idade relativa na seleção brasileira. Rev Bras Futebol 2022; v. 15, n. 5, 40 – 52.
entre jogadores das categorias sub-17 e sub-20 que disputaram o campeonato sul-americano em
2015.
No futebol profissional, algumas pesquisas apresentaram resultados que corroboram os
encontrados neste trabalho. Helsen et al.16 constataram a presença do fenômeno nas competições
de destaque de 10 países europeus em duas temporadas (2000-2001 e 2010-2011), havendo
discrepância apenas em Portugal, que não apresentou o EIR em ambas as temporadas, e na Espanha,
que também não fez parte da estatística na temporada 2000-2001. Padrón-Cabo et al.25 estudaram a
influência do EIR em grandes competições nacionais de futebol de países de todo o mundo (Espanha,
Alemanha, Itália, França, Inglaterra, Rússia, Coreia do Sul, Portugal, Holanda, Bélgica, Ucrânia, África
do Sul, Austrália, México e Brasil) na temporada 2014-2015.Os resultados mostraraminfluência do
fenômeno em todas as competições, com exceção da Premier League (Inglaterra) e da K-League
Classic (Coreia do Sul).
No presente estudo não se observou a ocorrência do EIR para jogadores da seleção brasileira
que atuaram na Copa do Mundo. Há um equilíbrio na distribuição das datas de nascimento,
independentemente da variável de agrupamento dos atletas, seja por quartil ou semestre.Nas
categorias mais avançadas, quando o processo maturacional já se encerrou, há uma tendência de
diminuição ou desaparecimento do EIR. Portanto, esse fenômeno é mais comum em categorias de
base, quando os atletas estão passando pelo estágio maturacional.
Se tomarmos como referência a distribuição por semestre, a Copa das Confederações
também não apresenta incidência do EIR – somente se a divisão dos atletas for feita por quartis de
nascimento, onde houve maior porcentagem no segundo quartil. Todas as demais competições
mostraram a presença do fenômeno.
Uma situação semelhante a essa da Copa das Confederações ocorreu no estudo de Julião et
al.19, que analisou atletas de diversas seleções que disputaram o Mundial sub-17 e sub-20, ambos no
ano de 2017. O resultado encontrado demonstrou que, por mais que o percentual em relação ao
semestre de nascimento tenha sido praticamente o mesmo para as duas categorias, houve menor
tendência de atletas nos três primeiros meses e maior nos três últimos, na categoria sub-20. Embora
tenha havido diferença na distribuição dos quartis em relação aos semestres, esta não tem ligação
com o EIR, como nesta pesquisa.
Em relação à associação do EIR com o resultado final da competição, o estudo mostrou que
ser campeão e ser nascido no primeiro semestre foram condições encontradas apenas nos Jogos
Olímpicos. O fato de a seleção brasileira ter sido campeã da competição apenas uma vez pode ser
um viés negativo, podendo estar relacionado diretamente ao grupo vencedor da edição de 2016.
Outro fator a ser considerado é que Olimpíadas é uma competição sub-23, em que os atletas estão
nas primeiras etapas da categoria adulta, quando o EIR ainda pode estar presente.
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Homem et al. O efeito da idade relativa na seleção brasileira. Rev Bras Futebol 2022; v. 15, n. 5, 40 – 52.
No que se refere ao futebol, a literatura parece carecer de estudos que associam o EIR ao
resultado em competições. González-Víllora et al.15realizaram um estudo para analisar o EIR no
resultado de atletas das categorias sub-17, sub-19, sub-21 e adulta que disputaram a Eurocopa de
2012. Os resultados para as categorias de formação mostraram a presença do EIR no resultado final
da competição em cada uma delas, sendo mais expressivo no sub-17. Estes resultados vão de
encontro aos achados neste estudo, que não mostrou evidências entre nascer no primeiro semestre
e ser campeão.
Em outras modalidades esportivas há estudos que associam o EIR ao desempenho, como o
de Oliveira et al.23 realizado no campeonato brasileiro de basquete da categoria sub-17, o qual sugere
que o EIR pode ser o motivo de um melhor desempenho das equipes. No triatlo, os resultados
encontrados por Neto e Júnior22 evidenciaram a associação entre nascer no primeiro semestre e
conquistar uma medalha olímpica. Pesquisa realizada por Rubia et al.27 mostrou que, em
campeonatos mundiais de handebol das categorias sub-19, sub-21 e adulta, o fenômeno estava
associado à classificação final das equipes nas competições.
Vale ressaltar que existem algumas variáveis que podem influenciar os resultados
encontrados no presente estudo. O grande número de edições de algumas das competições, como a
Copa América, acaba por favorecer o EIR em razão de haver uma amostra muito grande de jogadores
envolvidos. Na mesma linha de raciocínio, o pequeno número de edições da Copa das Confederações
pode influenciar nesse fenômeno de maneira contrária. Outra limitação se refere ao resultado
encontrado na tabela 4, que mostrou haver relevância entre ser campeão e ser nascido no primeiro
semestre do ano para os Jogos Olímpicos, mas, como foi discutido, há possibilidades de viés nesse
resultado.
Como sugestão para futuras pesquisas, há fatores relevantes a serem estudados sobre o EIR
em uma perspectiva temporal. Já que o fenômeno do EIR está presente há algum tempo em
pesquisas acadêmicas, seria interessante uma análise da relevância e aplicabilidade dele ao longo
dos anos, para entender se houve diminuição de sua incidência com a popularização do conceito na
literatura. Esse fator não foi observado por Costa et al.10, que analisaram o comportamento do EIR
nos jogadores registrados na CBF nascidos entre 1921 e 1996 e perceberam ter havido aumento
progressivo na incidência do fenômeno ao longo do tempo, algo que não foi feito neste estudo, mas
que poderia ser realizado, visto que, diferentemente desses autores, foram analisados os atletas de
cada equipe em cada competição oficial disputada pela seleção brasileira ao longo de sua
história.Outra sugestão seria a realização de estudos similares no âmbito do futebol feminino.
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Homem et al. O efeito da idade relativa na seleção brasileira. Rev Bras Futebol 2022; v. 15, n. 5, 40 – 52.
No âmbito da prática profissional, é essencial que os profissionais tenham amplo
conhecimento sobre EIR e suas implicações para o processo de detecção e seleção de talentos,a fim
de amenizar a influência negativa do EIR.
5. CONCLUSÕES
O EIR está presente ao longo do tempo nos atletas selecionados para representar as seleções
brasileiras em diferentes competições e categorias, com exceção dos participantes das Copas do
Mundo. Não há associação entre nascer nos primeiros meses do ano e ter sido campeão para os
atletas que representaram as seleções brasileiras em diferentes competições e categorias ao longo
do tempo.
Por isso, é importante reforçar a necessidade de esses conceitos serem mais amplamente
discutidos e trazidos para a prática profissional de dirigentes e comissões técnicas de clubes de
futebol, com intuito de diminuir a presença do fenômeno, evitando assim a perda de talentos na
modalidade.
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