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http://dx.doi.org/10.15448/1980-864X.2021.1.39802
ESTUDOS
IBERO-AMERICANOS
Estudos Ibero-Americanos, Porto Alegre, v. 47, n. 1, p. 1-16, jan.-abr. 2021
e-ISSN: 1980-864X | ISSN-L: 0101-4064
Artigo está licenciado sob forma de uma licença
Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional.
1 Bolsistas de Produtividade do CNPq.
Mateus Henrique de
Faria Pereira1
orcid.org/0000-0001-7489-7365
matteuspereira@gmail.com
Valdei Lopes de Araujo1
orcid.org/0000-0001-8913-2509
valdei354@gmail.com
Recebido em: 28/12/2020
Aprovado em: 03/01/2021
Publicado em: 30/04/2021.
Resumo: Neste ensaio tentamos demonstrar que o presente e o futuro tam-
bém são história e devem ser dimensões da historiograa. Para isso, retomamos
episódios de nosso livro Almanaque da COVID-19 e algumas de nossas leituras
de momentos-chave do ano a m de reetir sobre o que temos chamado his-
toricidade atualista. Em alguns momentos, lançamos mão da retrospectiva, em
outros, optamos por manter o efeito anacrônico de certas passagens a m de
evidenciar o aspecto contingente de toda representação do tempo. Dividimos o
texto em três partes principais. Na primeira, apresentamos os deslocamentos mais
recentes na hipótese sobre uma historicidade atualista. Na segunda, reunimos
alguns episódios de 2020 como modo demonstrar o que estamos chamando
atualismo em suas relações com a política e a história. Por m, apontamos ca-
minhos preliminares de uma ação com efeitos contra-atualista.
Palavras-chave: Atualismo. COVID-19. Historicidade. Política. Tempo.
Abstract: In this essay we try to demonstrate that the present and the future
are also history and must be dimensions of historiography. For that, we return to
episodes from our book Almanac da COVID-19 and some of our readings of key
moments of this year in order to reect on what we have called updatist histori-
city. In some moments we use the retrospective as a tool, in others we choose
to maintain the anachronistic eect of certain passages in order to highlight the
contingent aspect of all representation of time. We divided the text into three
main parts. The rst presents the most recent shifts in the hypothesis about an
updatist historicity. In the second, we gathered some episodes from 2020 as a way
to elucidate what we are calling updatism in its relations with politics and history
and, nally, we point out preliminary paths for action with counter-updatist eects.
Keywords: Updatism. COVID-19. Historicity. Politics. Time.
Resumen: En este ensayo partimos de la noción de que el presente y el futuro
también son historia y deben ser objeto de reexión historiográca para el gran
público. Retomamos algunos episodios de nuestro libro Almanaque da COVID-19
y algunas de nuestras lecturas de momentos clave del año para reexionar
sobre la historicidad actualista de 2020. En algunos momentos utilizamos la
retrospectiva, en otros optamos por mantener el efecto anacrónico de algunos
pasajes para resaltar el aspecto contingente de toda relación con el tiempo. Divi-
dimos el texto en tres partes principales, en la primera presentamos los cambios
más recientes en la hipótesis sobre una historicidad actualista, en la segunda
reunimos algunos episodios de 2020 como una forma de dilucidar mejor lo que
llamamos actualismo en sus relaciones con la política y la historia, nalmente,
en la última parte tratamos de señalar algunos caminos preliminares de una
acción con efectos anti-actualista
Palabras clave: Actualismo.COVID-19. Historicidad. Política.Tiempo.
SEÇÃO: TRIBUNA
Atualismo: pandemia e historicidades no interminável 2020
Updatism: pandemic and historicities in the neverending 2020
Actualismo: pandemia e historicidades en el interminable 2020
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Introdução
É possível abordar o presente e o futuro como
dimensões da história e da historiograa?2 Para
responder a essa pergunta utilizamos uma espé-
cie de retrospectiva fragmentária para abordar
os climas, as interpretações e as experiências
decisivas do ano de 2020 tendo como base
algumas reexões iniciadas em Almanaque da
COVID-19: 150 dias para não esquecer (PEREIRA;
MARQUES; ARAUJO, 2020). Em uma aborda-
gem historiográca experimental, inspirado em
Gumbrecht (1990) e Faria (2015) e fundamentada
nas perspectivas teóricas e metodológicas da
analítica da historicidade (ARAUJO, 2013) e da
curadoria de história (ARAUJO, 2017), tentamos
resistir às pressões de um tempo que nos leva
a pensar e sentir nos limites de um conceito de
atualização que recusa ao passado e ao futuro
qualquer potencial transformador. Reintegrar o
futuro e o passado ao presente e esses a uma
concepção de história não reduzida a um passado
morto são operações que podem contribuir para
tornar visíveis a contingência e a liberdade como
condições da ação humana.
Durante a escrita do Almanaque as interven-
ções públicas precisavam interpretar os eventos
do dia, assumindo seu caráter fragmentário. No
entanto, essas projeções permitiam que o futuro
fosse incorporado ao nosso ativismo enquanto
historiadores. Àquela altura, como o temor do
projeto acalentado pelo bolsonarismo de des-
truição da democracia. Agora, no tempo deste
ensaio, esses futuros não realizados (ainda?)
podem ser experimentados apenas como futu-
ros passados, mas, àquela altura, eram futuros
possíveis, muito concretamente vividos. Assim,
uma análise dessas historicidades encontra sua
melhor analogia na imagem de um novelinho de
temporalizações (diversas formas de combinar
passados, presentes e futuros) do que em uma
linearidade sucessiva e bem-organizada.
2 Parte desta reflexão contou com a colaboração de Mayra Marques. Apoio: CAPES, CNPq, FAPEMIG e UFOP. Agradecemos à Verônica
Pereira, João Cezar de Castro Rocha, Eduardo F. Felipe, Rebeca Gontijo, Temístocles Cezar, Patrícia Valim, LuisaRauter, Marcelo Abreu, Mayra
Marques, Walderez Ramalho, Beatriz Vieira, Caroline Bauer, Géssica Guimarães, Julio Bentivoglio, Breno Mendes, Carolina Barbosa, Henrique
Estrada, Fernando Nicolazzi, Clarice Seixas, Daniel Pinha, Cristina Meneguello, Thiago Lima Nicodemo, Daniel Faria, Marcelo Rangel, Alexandre
Avelar, Eliana Dutra, Gisele Venâncio. Agradecemos, também, à Márcia Motta e ao INCT Proprietas pelo apoio e interlocução neste projeto.
Por mais que como historiadores possamos
esticar alguns os, para tecer narrativas e expli-
cações, a história vivida é como um gato em seu
jogo com novelos que constantemente retorna o
o de eventos ao seu emaranhado original. Nes-
sa direção, nossa hipótese é que incorporar, de
forma consciente, o presente e o futuro à escrita
da história pode nos ajudar a ir além da agitação
atualista em direção a uma postura crítica da
realidade do capitalismo contemporâneo, sem
limitar-se a estratégias reativas e nostálgicas.
Diante do temor da COVID-19 e do bolsona-
rismo e como parte do projeto do Almanaque
da COVID-19, iniciamos intervenções no deba-
te público, principalmente por meio do portal
Jornalistas Livres, procurando pensar a relação
entre historicidades e política. Em um primeiro
momento, a ideia era realizar uma parada reexiva
para evitar sermos devorados pelas atualizações
do trágico e fatal encontro, para milhares de bra-
sileiros, entre o vírus SARS-COV-2 e Bolsonaro. O
Almanaque, um híbrido entre cronologia, diário e
crônica, foi pensado também como um arquivo
de experiências que se formava ao mesmo tem-
po em que o evento-pandemia. Na ausência de
elementos de sentido consensuais, a cronologia
e outros gêneros de escrita com menor exigência
interpretativa permitiram a existência de um livro
instantâneo, que se escrevia no tempo monstro
de um evento monstro (NORA, 1972; WHITE, 1999).
Mas, diferente da experiência de escrita do
Almanaque, aqui, renunciamos à cronologia line-
ar, e a sua útil ilusão de sentido, para privilegiar
fragmentos que pensamos serem potentes em
movimentar a hipótese atualista. Acreditamos que
a análise e a descrição de historicidades ocultas
pelo atualismo podem nos ajudar a ativar/ampli-
car outras historicidades mais emancipatórias
que estão sempre disponíveis no redemoinho
da história. Anal, a estratégia atualista só pode
funcionar se aceitamos a sua pretensão de ser
a única forma de existir no tempo.
Mateus Henrique de Faria Pereira • Valdei Lopes de Araujo
Atualismo: pandemia e historicidades no interminável 2020 3/16
1 Atualismo, uma hipótese em
movimento
Chamamos de atualismo essa historicidade
hegemônica, em que o real se confunde com a
atualidade experimentada como um presente
vazio e autocentrado. Para tentarmos sair da
“gaiola” atualista precisamos desaar a com-
preensão corriqueira de que a história é apenas
passado. Parcela signicativa das chamadas
história do tempo presente e história pública
parecem avançar nessa direção de uma reivin-
dicação do presente pela história. Entendemos
que esse desao é cada vez mais necessário.
Estamos, desde 2016, reetindo sobre possíveis
alternativas teóricas e políticas que contribuam
para compreendermos a emergência das direitas
e extremadireitas mundiais, partindo da avaliação
de que as direitas têm se expandido por surfar
melhor na agitação do uxo de atualizações. As
direitas têm se beneciado da desinformação,
alimentando e sendo alimentadas por um am-
biente amplamente favorável à disseminação
das chamadas fakenews.
Nos termos desenvolvidos no livro Atualismo
1.0: como a ideia de atualização mudou o século
XXI (PEREIRA; ARAUJO, 2018), atualismo é uma
categoria que busca compreender alguns as-
pectos de como vivenciamos as urgências de
nosso próprio tempo.3 A categoria parte de uma
descoberta empírica e temporal, pois as palavras
atualização, em português, e update, em inglês,
ganharam destaque a partir de meados dos
anos 1960, signicando o melhoramento de algo
através de sua adequação ao presente, ou seja,
através de uma versão mais nova.
A experiência atualista está incorporada na vida
cotidiana, na estratégia das grandes empresas,
inseridas no interior das lógicas do capitalismo de
vigilância, que consiste, dentre outros aspectos,
oferecer produtos e serviços em constante atua-
lização. Em nosso tempo, não são apenas objetos
3 A hipótese do atualismo tem sido também movimentada pela recepção crítica, cf., por exemplo, Souza Neto (2020) e Ramalho (2020)
para duas resenhas mais exaustivas sobre o Atualismo 1.0 e o Almanaque da Covid-19, respectivamente. Para algumas apropriações/
diálogos com o conceito/tema do atualismo/atualização cf. Laitano (2020), Clavert (2018), Ramos (2018), Turin (2018), Schwengber (2018)
Moraes (2019), Rangel (2019), Marcelino (2018), Machado (2019), Nascimento (2020), Santos (2020), Giarolla (2019), Souza (2019), Pinheiro
(2020), Lowande (2020), Varella e Bonaldo, (2020) e Kosteczka (2020). Além da interlocução de vários colegas, em especial, os que parti-
ciparam do evento Atualismo: temporalidades (in)atuais, organizado por João Cezar de Castro Rocha, em 2019, na Casa de Leitura Dirce
Côrtes Riedel/ UERJ, Rio de Janeiro.
e programas que “precisam” estar atualizados,
os humanos também vivem, constantemente,
a pressão, o medo e o desejo por atualização. E
os sujeitos se percebem e são percebidos como
mais ou menos atualizados ou obsoletos, tendo
em vista a forma como lidam com a pressão
desse movimento de repetição com novidades.
Dessa forma, ser novo não é sinônimo de estar
atualizado. Um produto pode ser novo, mas, ao
mesmo tempo, desatualizado, já que a obso-
lescência programada é parte das estratégias
do capitalismo de vigilância e sua historicidade
atualista. Um fato que conrma essa constatação
é a observação de que a maior parte dos humanos
está disposta a pagar ou aceitar a atualização
automática de produtos sem reetir muito sobre
esse processo incessante. Por outro lado, quando
a maior parte está ciente dos riscos, sente-se
incapaz de reagir de outro modo senão conar
no automatismo do “eu aceito”.
As transformações do mundo da técnica têm
modicado a nossa relação com o futuro, pois,
paulatinamente, ele tem deixado de ser o lugar da
transformação e da esperança para se tornar uma
cópia atualizada deste lugar e, por essa razão,
ele é, em teoria, melhor do que o presente, mas
não diferente dele. Assim, enquanto as teorias
do presentismo e do presente amplo insistiam
na predominância de expectativas catastrócas
com relação ao futuro, a historicidade atualista
tem o futuro como algo garantido como repetição
em expansão linear do presente; dito de outro
modo, o futuro atualista é apenas o presente 2.0.
Portanto, essa experiência do tempo produz e
é produtora de uma compreensão de que a ação
não é necessária ou possível. Paradoxalmente, o
progresso técnico cria a expectativa de mudança/
atualização constante, o que produz uma agitação
temporal que diculta o diagnóstico e a abertura
para transformações estruturais.
A agitação temporal tende a dicultar a parada
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reexiva, induzindo obsoletos e atualizados a
simplesmente se deixarem levar pelas energias
liberadas, por exemplo, pelo uxo contínuo de no-
tícias no smartphone, televisão ou computadores
conectados à internet. Os sentimentos básicos em
relação à agitação temporal, que alguns líderes
políticos manejam muito bem, são, em especial, a
ansiedade, provocada pela liberação energética,
do lado dos atualizados, e a nostalgia, ou desejo
de quietude, pelo lado dos obsoletos. Claro que
esses dois tipos existem em cada um de nós em
graus variados, assim como podem variar em
intensidade a depender da conjuntura; podem
inclusive atuar em um mesmo indivíduo como
polos complementares que se compensam em
busca de equilíbrios dinâmicos.
Para sobreviver à ansiedade e à nostalgia do
atualismo, assim como poder sair do uxo con-
tínuo de atualizações atualistas do passado e do
futuro pelo tempo presente, é necessário criar
possibilidades de desatualização e atualizações
históricas, o que é mais do que desacelerar o
tempo. Oscilar entre o atual e o inatual é entender
que podemos ainda ter um papel sobre o futuro,
que o presente pode ser futurizado e passadizado
por julgamentos e decisões que podemos fazer
e tomar. O futuro, em especial, não tem de ser
apenas uma escolha entre um destino único e
homogêneo ou a catástrofe, como ca subjacente
na temporalidade atualista. Muitas vezes, encon-
tramos a palavra sintonia, no discurso social que
trata da necessidade de atualização, no sentido de
que é preciso estar em sintonia com o presente.
Mas, atualizar pode também ser entendido como
transformar o presente em algo mais próximo de
processos e formas de vida do passado ou que
possamos desejar no futuro. O presente não é
uma realidade imóvel fechada sobre si mesma.
Outro efeito do tempo atualista é a crença de
que estar atualizado com as últimas notícias é o
mesmo que estar certo. A expansão dos canais
de notícias 24 horas e das novas plataformas
digitais se alimentam dessa pulsão atualista
pela atualização. Nesse ambiente, as fakenews
tendem a desempenhar papéis determinantes.
No lugar de checar fontes, buscar as suas origens
e consequências, toda a nossa energia é captu-
rada pelo próprio uxo contínuo das notícias e
de seus comentadores. Não parece casual que
a hibridização entre propaganda, comerciais,
religião, política e entretenimento seja um fe-
nômeno simultâneo ao tempo atualista. Assim,
não por acaso, a política atualista é dominada
por infomerciantes, tele-evangelistas e subce-
lebridades opiniático-digitais.
Portanto, a atualização em função da própria
atualidade tem como uma de suas fontes prin-
cipais a explosão de notícias em uxo contínuo.
Esse fato possibilita que o valor de verdade passe
a ser confundido com o valor de novidade ou
atualização da informação recebida, criando um
campo propício para a disseminação de mentiras
que funcionam como verdades, as chamadas
fakenews. Desde 2016, quando começamos a
desenhar a hipótese atualista, procuramos apontar,
em nossas publicações, o caráter inédito da atual
onda de desinformação, ressaltando a sua força
em produzir universos paralelos simulados nos
quais é possível viver com relativo grau de sucesso.
A estratégia utilizada por Trump e seus os alia-
dos de, antes mesmo do resultado das eleições
de 2020, produzirem um ambiente conspiracional
integrado para acomodar seus eleitores e clien-
tes talvez seja o melhor exemplo do sucesso da
fabricação de realidades simuladas com alto grau
de projetividade e integração (GIULIANI, 2020).
Um caso extremo do que estamos descre-
vendo pode ser visto no canal do YouTube de
Rudolph Giuliani, chamado Common Sense, uma
espécie de podcast que é também veiculado em
vídeo em plataformas como o YouTube. O canal
tem quase meio milhão de inscritos, tendo sido
criado em janeiro de 2020. No dia 27 de novem-
bro de 2020, um dos seus episódios recupera
evidências e argumentos falsos que provariam
a existência de um amplo esquema articulado
de fraude nas eleições. Além disso, o ex-prefeito
de Nova Iorque, e principal advogado de Donald
Trump, aparece – para o nosso assombro – como
garoto propaganda, em dois intervalos comer-
ciais, na transmissão de quase 14 minutos. Em
um deles, vendendo assinaturas de um seguro
Mateus Henrique de Faria Pereira • Valdei Lopes de Araujo
Atualismo: pandemia e historicidades no interminável 2020 5/16
contra fraudes em titularidades imobiliárias e, no
outro, fazendo propaganda de uma tabacaria de
luxo. Ao nal, ca evidente que a audiência, atra-
ída pela narrativa de fraude eleitoral, é também
nanciadora-consumidora de serviços os mais
diversos, tudo empacotado como uma mistura
de entretenimento e (des)informação.
Pois foi presenciando esses e muitos outros
acontecimentos semelhantes, no Brasil e no
exterior; e, em especial, com o passar do tempo
da pandemia, em 2020, que constatamos que
em certas dimensões da temporalidade atualista
muitas vezes a “verdade” é aquela que se apre-
senta na forma de notícia, de news, em especial,
em uxo contínuo. E a notícia mais recente e
atual tende a ser tomada como a mais verdadei-
ra, principalmente se ela tiver sido produzida e
compartilhada pelos membros de nossa bolha ou
nosso enclave. Assim, entender parte da história
da pandemia e do pandemônio de 2020, no Brasil,
passa, necessariamente, por entrar em alguns
universos paralelos, a m de analisar a produção
e as formas de manipulação das news, sejam elas
verdadeiras e/ou fake, isto é, simuladas.
2 Fragmentos anacrônicos de reflexão
Nesta parte deste ensaio queremos trazer
novamente à reexão (a repetição pode ser uma
forma histórica de atualização) alguns temas
que emergiram do confronto entre o atualismo
e a pandemia. Ressaltamos, como já dissemos,
que, diferente da organização do Almanaque
da COVID-19 em que a cronologia serviu para
dar algum sentido que resistisse à pressão pela
dispersão, aqui pretendemos condensar alguns
temas sem a pretensão de representar esses
fenômenos como cópias de processos reais. São,
portanto, fragmentos de experiência e pensa-
mento anacrônicos, já que não esperamos que
seu sentido surja de sua própria posição em um
tempo linear. De algum modo, recolocar essas
reexões em uma linha do tempo desguraria o
fato de que, para os autores, elas já habitam um
plano de simultaneidades que só muito violen-
tamente poderia ser quebrado.
Derrota da agitação trumpista-atualista?
A essa altura já podemos dizer que o “Show
de Trump” foi cancelado, mas, que, por outro
lado, o trumpismo está muito mais estruturado
do que alguns analistas supunham. A divisão e
a polarização social, cultural e política permane-
cem e, talvez, estejam mesmo se fortalecendo.
Na eleição dos Estados Unidos a lógica das
pequenas maiorias foi mais uma vez vencedo-
ra. A pandemia e a sua gestão criminosa, por
parte do governo Trump, foram decisivas para
a sua apertada derrota, mas o discurso de nor-
malização e unidade, articulado por Biden, foi
incapaz de se converter em uma vitória propor-
cional ao |tamanho das ambições. No início do
ano, quando estávamos ainda animados com
o desempenho de Sanders nas primárias do
Partido Democrataera inimaginável pensar que
a verdadeira facada, isto é, a contingência dessa
eleição, se chamaria SARS-CoV-2. Além dessa
derrota, assistimos, ainda, às derrotas relativas
de Bolsonaro (e não do bolsonarismo) e de par-
te da esquerda (em especial, na eleição para o
executivo) nas eleições municipais. Eleições em
que a desinformação voltou a desempenhar um
papel desestabilizador em algumas cidades, em
especial, no segundo turno.
Guilherme Boulos surge como uma esperança
renovadora, lançando pontes entre a velha e nova
esquerda, entre atualizados e obsoletos. Porém,
uma parte signicativa da esquerda continua
com diculdades em criar projetos de futuro,
com exceção da esquerda mais atualizada, cuja
estratégia regional nem sempre é facilmente
reconhecida em seu potencial de criar amplas
solidariedades e novas maiorias. Mas, foi justa-
mente essa esquerda atualizada, isto é, a que
criou pontes entre atualizados e obsoletos do
campo progressista, que saiu vitoriosa nas elei-
ções de 2020, mesmo que simbolicamente, em
alguns casos. É ela que aponta um caminho de
futuro e renovação a ser aprendido, em especial,
pelos setores obsoletos desse campo.
Corrobora esse fato a declaração de Jacques
Wagner, do Partido dos Trabalhadors (PT), que,
dois dias após o término do segundo turno, ar-
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mou que o seu partido deveria fazer “uma mu-
dança de conteúdo, quer dizer, para atualizar
o seu conteúdo, e uma mudança geracional,
botando gente mais nova” (JB NO..., 2020). E que
não teria nada contra seus colegas de idade,
mas que era preciso trazer a “outra geração para
ocupar espaço”. Seria esse um bom exemplo de
atualização histórica ou própria? O ex-governador
evita simplesmente atribuir à geração mais nova
o potencial de atualização, uma vez que separa
muito claramente a atualização dos conteúdos
e a renovação geracional, além de reforçar o
lugar de sua própria geração nesse movimento
de fusão. Nessa mesma entrevista ele ressalta a
importância da presença da sênior Erundina na
chapa do jovem Boulos, em São Paulo.
Apesar disso, o quadro que descrevemos em
Do Fake ao Fato (PEREIRA; ARAUJO, 2020) se
mantém em nossa análise estável, em especial,
na maior ecácia da articulação estratégica entre
atualizados e obsoletos de direta. Lembremos
que, depois da queda de Moro, Bolsonaro abra-
çou o centrão, e que isso se deve, em parte, à
pandemia. O centrão acabou sendo o grande
vitorioso das eleições municipais de 2020. Além
disso, o sucesso das candidaturas militares e
evangélicas é um fenômeno a ser considerado. A
título de exemplo, lembremos que para cada dez
prossionais de segurança que se candidataram,
um foi eleito no primeiro turno (LIMA, 2020).
Muitos analistas apontaram o cansaço com
a agitação e a instabilidade do novo normal de
Trump como uma das causas de sua derrota. Mas
essa mesma agitação mostrou-se eciente em
garantir-lhe a maior votação de um presidente
em disputa por um segundo mandato na história
dos EUA. A narrativa da fraude eleitoral demonstra
como as estruturas da desinformação continuam
ecazes e, mesmo, com um grande potencial de
radicalização, como assinala a rápida emergência
da NewsMax TV como desao à suposta posição
mais moderada da Fox News em defesa do “Show
de Trump” (GRYNBAUM; KOBLIN, 2020).
Joe Biden promete a volta da política tradicional,
4 Do original: “both people’s conceptions and the assessments of experts made today can be outdated tomorrow.”
resta saber se os atualizados da esquerda e da
direita permitirão, ou se a velha política será capaz
de atender às enormes expectativas dos eleitores
em um mundo que parece desmoronar. Dessa
maneira, estaríamos, então, na encruzilhada entre
duas possibilidades? De um lado, uma atualização,
em estilo moderno e, de outro, uma atualização em
chave atualista, que se alimenta tanto de algumas
estruturas da modernidade (foco no sujeito, demo-
cratização e setorização de valores, politização,
racionalidade instrumental) quanto da destruição
de outras (autonomia das instituições, regulação
dos limites entre política, religião, arte, ciência,
informação e propaganda, direito das minorias)?
Sobre a política e a antipolítica atualista
A pandemia é um chamamento para repen-
sarmos a relação humana com os animais, com o
meio ambiente, com o mundo natural, é mais do
que nunca atual e urgente. Entre tantos motivos,
está o fato de que as pandemias originárias de
zoonoses estão diretamente ligadas à articulação
entre a vida humana e as outras formas de vida,
pois são, também, crises ecológicas e se relacio-
nam, portanto, com os tempos do antropoceno,
com os tempos da história, do capitalismo e com
a atual crise climática (CHAKRABARTY, 2009,
2018; KRENAK, 2019; entre outros).
Em termos de vida e sabedoria prática, a
experiência dessa catástrofe existencial (ORD,
2020), isto é, da pandemia da COVID-19, e as
suas evidências diárias, nos levam a rever as
certezas do que foi dito e feito no dia anterior.
Isso signica que o que parece correto a ser
feito agora pode estar desatualizado amanhã:
“Tanto as concepções das pessoas quanto as
avaliações de especialistas feitas hoje podem
estar desatualizadas amanhã.” (JORDHEIM et al.,
2020, tradução nossa).4
É nesse contexto que, muito rapidamente,
jornalistas, cientistas e intelectuais começaram
a publicar textos sobre o vírus, em especial, a
partir da realidade europeia. Observamos que
muitos deles ainda são elaborados sob certas
Mateus Henrique de Faria Pereira • Valdei Lopes de Araujo
Atualismo: pandemia e historicidades no interminável 2020 7/16
lógicas coloniais da geopolítica do consumo e
da produção intelectual/cientíca, o que muitas
vezes signica tomar a priori o “centro” como o
lugar de elaboração de teorias e a “periferia”
como o lugar de coleta de dados e aplicação de
resultados (PEREIRA, 2018).
Do nosso ponto de vista, interessa pensar se
a irrupção da COVID-19 suspende, transforma,
problematiza, mas também pode radicalizar
as diversas dimensões do atualismo. Uma das
consequências da pandemia tem sido o apro-
fundamento da relação entre a historicidade
atualista e o capitalismo contemporâneo em
suas contínuas mutações.
O capitalismo em mutação absorve e reproduz
esse evento catastróco pela multiplicação e pelo
aprofundamento do controle digital da sociedade
e do arruinamento de certas dimensões da vida e
instituições políticas em sentido moderno, como
várias análises sobre o capital e o trabalho con-
temporâneo têm mostrado, conforme observamos
nas reexões de ShoshanaZubo, Thomas Piketty,
Paulo Arantes e Ricardo Antunes, entre outros. Por
isso, a agitação atualista pode ser interpretada
tanto em termos de uma antipolítica quanto de
uma nova (e assustadora) forma de política emer-
gente das sociedades capitalistas na “era digital”.
Especicamente, em relação a emergência da
pandemia da COVID-19, tendemos a acreditar que
entre janeiro e fevereiro, ocorreu, no “Ocidente”,
um grande erro de interpretação acerca do vírus,
ao se pensar que ele seria uma repetição ou um
fenômeno parecido com o SARS-CoV-1. Mas, à
medida que a COVID-19 avançava e se mostrava
um perigo muito maior do que se pensava, a
maioria dos países passou a seguir as instruções
da Organização Mundial da Saúde (OMS). No
entanto, no Brasil, o presidente estava em con-
ito com os seus próprios ministros da Saúde,
negando a seriedade da pandemia e estimulando
atitudes irresponsáveis, que poderiam contribuir
para aumentar a contaminação.
Será que a negação e os crimes deste governo
civil-militar poderiam ser fruto da convicção da
impunidade, simbolizada e autorizada na Lei de
Anistia de 1979? Uma atualização dessa história
ocorreu em 2020, por meio da autorização, por
parte do Supremo Tribunal Federal (STF), da co-
memoração do Golpe de 1964, postada no site
do Ministério da Defesa. Da mesma forma que o
bolsonarismo nega a memória da violência dos
tempos da Ditadura (militar-civil?), ele também
nega a ciência, quando lhe convém. No entanto,
ele não admite ser anticiência, mas, ao contrário,
defende uma ciência “verdadeira”, aquela condi-
zente com suas crenças. Anal, o negacionismo
bolsonarista cresceu a partir de 2014, quando uma
reação aos trabalhos da Comissão Nacional da
Verdade trouxe à tona uma comunidade de me-
mória que negava o passado autoritário brasileiro
e suas violências (PEREIRA, 2015; entre outros).
Ao que parece, com o passar do tempo e da
pandemia no Brasil, a convicção de impunidade
passou a operar em conjunto com o medo; medo
de uma reação social negativa em relação aos
pronunciamentos e atitudes do presidente, cujo
emblema maior talvez seja a fala de Bolsonaro, du-
rante a reunião ministerial do dia 22 de abril, sobre a
possibilidade de seus ministros e ele serem presos
caso um governo de esquerda assuma em 2022.
Outro exemplo que corrobora essa ideia do
medo de uma reação social negativa ocorreu no
dia 29 de março, quando o Twitter decidiu apagar
das suas redes duas postagens do presidente,
que contrariavam as orientações da OMS em
relação à COVID-19. Nicolazzi ([2020]) sintetiza
bem os nossos dramas, vividos no início e ao
longo da pandemia:
em situações de crise, que muitas pessoas
demonstram sua grandeza, como se percebe
na atuação dos prossionais de saúde e dos
cientis tas e pesquisadores que correm atrás do
tempo para encontrar a cura para o COVID-19,
que outras tantas pessoas, por mais endinhei-
radas que sejam, revelam sua miséria.
Pandemia, aceleração e fakenews
Ao que parece, a nossa experiência dessa
catástrofe existencial não se circunscreve a uma
suposta aceleração do tempo histórico, seja ela
sincrônica ou não (ROSA, 2010; TURIN, 2019; CAIA-
NIELLO, 2020, entre outros). Desse modo, como
argumenta Ramalho (2020a), momentos de crise
8/16 Estudos Ibero-Americanos, Porto Alegre, v. 47, n. 1, p. 1-16, jan.-abr. 2021 | e-39802
são, também, momentos de mudança acelerada.
Crises podem se relacionar com a aceleração, mas
não se limitam ou se reduzem a ela. Assim, o tema
acaba por limitar muito a análise da experiência de
crise. Além disso, diversos estratos da aceleração
do tempo moderno é, também e em grande me-
dida, assincrônica. Assim, creditar boa parte das
atuais transformações a uma suposta mudança
no regime de aceleração da modernidade pode
nos fazer incorrer em vários erros, em especial, o
de “inacionar” demais a temática e a percepção
do fenômeno, isto é, de reduzir a crise a apenas
uma de suas camadas e dimensões.
Conrma o nosso argumento o fato de que
para certas pessoas, as redes sociais acabam
impondo algum tipo de ritmo de trabalho atu-
alista. Assim, a pessoa acorda achando que vai
fazer algo que tinha planejado, mas o uxo das
redes a leva em outras direções, causando dis-
persão, mais do que agitação. Desse modo, não
se pode decidir, pode-se apenas surfar ou não,
na onda que te leva, assim como na atual onda
epidêmica, para outra direção ou mesmo para
lugar nenhum. Não apenas a epidemia do vírus
nos atinge, mas também a infodemia, que já
existia antes e parece ter sido intensicada pelo
surgimento do novo coronavírus.
Também se pode perceber uma tendência a
acreditar que a informação mais atual, as news, são
sempre mais verdadeiras, o que muitas vezes faz
com que uma notícia não tenha sua veracidade veri-
cada antes do seu compartilhamento em massa. O
que se vive é a agitação, ou mesmo o adoecimento.
Talvez por isso a ideia de aceleração, sincronizada
ou não, parece ser insuciente para pensar nesse
acontecimento. Ou seja, estamos dentro mesmo
de uma temporalidade viral/epidemiológica e, por
consequência, das doenças epidêmicas e seus
múltiplos tempos de contágios, mortalidades e
emergências, que ganha especicidade tendo em
vista, por exemplo, as diversas formas de mobilida
-
de contemporâneas, as mudanças do capitalismo
atual e a revolução tecnológica/digital.
Além do grande número de mortes e de infec-
tados, a experiência dessa catástrofe existencial
atinge um número maior de pessoas também
pela agitação e transformação que a experiência
de isolamento implica, já que ela cria mudanças
na vida ordinária (a tão falada “normalidade”), em
nossos hábitos, cotidianos e experiências. A esse
respeito, destacamos que, entre meados de mar-
ço e abril de 2020, mais de 1/3 da humanidade
foi submetida a algum tipo de isolamento.
Se por um lado, certos aspectos da historicida-
de atualista parecem lembrar uma radicalização
de tendências modernas, enquadrando-se na
perspectiva de uma hiperaceleração; por outro,
o questionamento, a desregulação e a perda de
autonomia de subsistemas, como a religião, a
política, e a mídia, revelam um lado do atualismo
que parece dissolver estruturas fundamentais da
modernidade, deixando em seu lugar um vazio
continuamente ativado pela agitação, mais do
que simplesmente diferentes acelerações.
A dimensão atualista do vírus
No dia 9 de fevereiro, um dia depois da entrega
do segundo hospital para atender pacientes infec-
tados pelo vírus, e construído em tempo recorde
pelo governo chinês, a possibilidade da COVID-19
ser menos letal, mesmo apresentando uma taxa
de mortalidade estatisticamente menor que o
coronavírus anterior, começava a desmoronar.
O número de mortos na China chegava a 811,
superando o total global da epidemia de SARS
de 2002-2003. A experiência passada não parecia
ser suciente para lidar com a contingência e a
novidade do acontecimento.
A relativização da nova atualização continuou ao
longo de fevereiro. No dia 21 desse mesmo mês,
por exemplo, a Itália anunciou o início da quaren-
tena de 50 mil pessoas. Para muitos italianos era
um alarmismo e um exagero desnecessário. No
Brasil, várias pessoas aproveitaram para dizer que
tínhamos que dar mais atenção, por exemplo, para
o retorno de casos de sarampo, que é muito mais
contagioso do que a COVID-19 (ROSSI; BUONO,
2020). Muito se disse, também, sobre a dengue,
que matava mais pessoas e era mais preocu-
pante. Em 20 de fevereiro, 87% dos novos casos
infectados estavam na China. Em quinze dias a
situação mudou drasticamente, o que levou a
OMS a declarar a pandemia, no dia 11 de março.
Mateus Henrique de Faria Pereira • Valdei Lopes de Araujo
Atualismo: pandemia e historicidades no interminável 2020 9/16
No dia 26 de fevereiro, perguntávamos: “seria
o Corona um vírus atualista?” Nossa indagação
nasceu da reportagem com o epidemiologista
Wanderson Oliveira, responsável pelo combate
ao coronavírus no Brasil pelo Ministério da Saúde.
Oliveira armava que estávamos vivendo uma “in-
fodemia”, ou seja, uma epidemia de informações,
muitas delas falsas (OLIVEIRA, [2020]). O epidemio-
logista brasileiro armava para os representantes
estaduais, com ele reunidos, que as informações
eram perecíveis, porque “não dá tempo para o sis-
tema se adaptar às novas evidências, pois logo em
seguida surgem outras”. Parece que do ponto de
vista das notícias e da própria dinâmica da pande-
mia, as lógicas atualistas parecem se aprofundar.
O próprio Oliveira armou que os dados escorrem
pelas mãos, pois estamos vivendo uma epidemia
em tempo real (OLIVEIRA, 2020).
Tempo, epidemiologia e negação
Por que boa parte das autoridades sanitárias
mundiais esperavam, a princípio, a repetição da
SARS-COVID? Acreditamos que, em grande parte,
pelo fato de as análises epidemiológicas serem
prisioneiras de uma concepção restrita, talvez
até historicista, do tempo histórico. Gil Sevalho
(1997), epidemiologista brasileiro, vem, desde
o m do século passado, criticando os limites
dessa concepção. Para ele, essa percepção epi-
demiológica opera um corte no tempo a partir da
análise estatística, amputando a historicidade e
a multiplicidade temporal dos aspectos sociais e
históricos envolvidos na complexidade do adoe-
cer humano coletivo. Considerar essas dimensões
abriria o pensamento epidemiológico para uma
melhor ou mesmo para outra compreensão das
infecções emergentes e da relação homem-na-
tureza, o que signica levar em conta processos
de determinação não linear, e sistemas dinâmicos
que se alteram a cada momento, por exemplo.
No entanto, esses desaos não destituem a
razão epidemiológica hegemônica, a ponto de
desqualicar a sua ecácia. A própria crise que
vivemos é testemunha, tanto do seu valor, quanto
dos seus limites. No caso brasileiro, por exemplo,
pelo menos até meados de março, a experiência
com outras epidemias indicava que estávamos
mais preparados para a COVID-19 do que, por
exemplo, para a H1N1 (FIOCRUZ..., 2020). Naquele
momento, um dos virologistas responsáveis pelo
descobrimento do Zica Vírus, relativizava o im-
pacto da pandemia no Brasil e destacava que o
SARS-COVID 2 não iria conseguir sobreviver no
calor (FARMACÊUTICO..., 2020). Essa também foi
uma armação precipitada.
O acúmulo da experiência também veio (e, de
certa forma, ainda está em curso) com o tempo
e com o ritmo de difusão do tsunami epidemio-
lógico. Essa é uma armação que serve a nós
brasileiros, mas também a muitos outros povos
para os quais a novidade também “veio a dar a
praia”. Sensação muito bem sintetizada na man-
chete de um jornal português, exposta no m
de março: “COVID-19 em Portugal. A caminho do
desconhecido e a tentar atrasar o passo” (NUNES,
2020). Uma manchete, uma síntese, uma consta-
tação: a de que vivemos um momento em que
atrasar o passo pode ser mais prudente do que
a chegada rápida a um incerto futuro.
Como experiências arrasadoras temos os casos
relativos ao momento vivido pela Itália e pela
Espanha, cujo presente pode representar um
futuro que ninguém gostaria de ter, mas que além
de imaginável, é possível e pode se reproduzir,
como a experiência americana aponta. Mas essa
reprodução não é automática, pois depende,
antes de tudo, de decisões políticas e oportunas.
O bolsonarismo parece ser capaz de atualizar
o seu discurso para qualquer um dos cenários
nais possíveis em relação à pandemia: caso o
isolamento social dê certo, ele vai dizer que a
COVID-19 era realmente só uma “gripezinha”; caso
a pandemia tenha efeitos devastadores para o
Brasil, ele poderá culpar os chineses pelo vírus,
dizer que a quarentena não funcionou e culpar
os defensores do isolamento social, como pre-
feitos e governadores, pela queda da economia.
Ou, ainda, pode se beneciar do impacto do
coronavoucher. Bolsonaro também se atualiza à
medida em que reforça as ideias que o elegeram
e se esforça para aparecer nas manifestações
a seu favor, mantendo-se em constante clima
10/16 Estudos Ibero-Americanos, Porto Alegre, v. 47, n. 1, p. 1-16, jan.-abr. 2021 | e-39802
de campanha, mesmo já ocupando o cargo de
presidente há mais de um ano. (Em novembro,
Bolsonaro negou ter chamado a COVID-19 de
gripezinha, mesmo tendo feito duas vezes pu-
blicamente em março).
Assim, ao longo de março e abril, vários países,
inclusive o Brasil (SCHUQUEL, 2020), em parte,
inspirados nos modelos chinês e sul coreano,
montavam e ampliavam as suas estratégias de
combate à pandemia a partir de práticas de vi-
gilância das pessoas, por exemplo, em relação à
mobilidade, ao controle da temperatura corporal,
dos movimentos, dos batimentos cardíacos, e
também das ligações telefônicas e dos acessos
virtuais, entre outras ações (ROSSI, 2020). Mas não
se trata aqui de pensar a eciência no controle da
pandemia a partir da dicotomia entre ditaduras
e democracias (FUKUYAMA, 2020; entre outros).
Ao m de março, o Imperial College London
estimava que as medidas de contenção adotadas
em onze países europeus conseguiram evitar 59
mil mortes (FLAXMAN et al., 2020). Àquela altura
já era possível vislumbrar as dimensões locais
dessa tragédia global, inclusive, porque o próprio
vírus já esbarrava nos poderosos.
Guerras de atualizações culturais e a crise
das estátuas
Assim como Trump e Johnson, algumas pes-
soas temem que a derrubada de estátuas pos-
sa signicar um apagamento da história. Mas
a verdade é que muitas estátuas já estavam
“apagadas” no cotidiano e só voltaram a fazer
parte da memória coletiva no momento de sua
derrubada. Além disso, esses atos são fotogra-
fados, lmados e amplamente compartilhados
na internet; assim, pode-se dizer que, embora a
estátua não esteja mais presente na cidade, ela
pode se manter presente na memória através
dessas mídias, assim como o debate e o momento
de sua derrubada podem ser aproveitados como
oportunidades para a educação histórica e a
reexão sobre os valores sociais. A acusação de
apagamento, feita por aqueles que consideram
a remoção de estátuas um ato de vandalismo,
desconsidera que a história, vivida e pensada,
é feita de revisões (ABREU, 2020; entre outros).
Discernir o revisionismo do negacionismo nos
parece importante: partimos do princípio de que
o negacionismo dissimula um projeto legítimo de
revisão e, nesse sentido, ele tem um parentesco
evidente com o tipo de mentira que associamos
à desinformação, em especial, ao neologismo
fakenews, que podemos traduzir como notícias
simuladas, mais do que simplesmente falsas. Por
vezes, são verdades que funcionam. O revisionismo
que distorce e dissimula é uma estratégia nega-
cionista, pois ele opera não apenas fatos falsos,
mas também interpretações, argumentos e valores
distorcidos para defender um determinado posi-
cionamento político (PEREIRA, 2015; entre outros).
No entanto, não podemos considerar que todo
revisionismo seja uma estratégia negacionista ou
mesmo que a única estratégia do negacionismo seja
se fantasiar de revisionismo. As reinterpretações da
história fazem parte do seu processo de produção,
sendo necessárias e, muitas vezes, bem-vindas.
A historiograa, aqui entendida como a escrita da
história prossional, geralmente se movimenta a
partir de revisões do conhecimento herdado, seja
motivado por movimentos internos à disciplina ou
por transformações do próprio processo histórico.
No Brasil, a atual onda negacionista, que trouxe
à tona o saudosismo em relação à ditadura e a
perda da autoridade de historiadores, professores
e cientistas em geral, colaborou para a eleição
de Bolsonaro, em 2018. Em geral, os políticos
negacionistas têm como estratégia a luta contra
falsos inimigos, a disseminação de teorias da
conspiração e fantasias regressivas, nas quais o
país precisa voltar a ser como um “antes” ctício
em nome da possibilidade de um projeto de
futuro antidemocrático.
Como essas fantasias não resolvem os pro-
blemas reais, é preciso que esses políticos con-
tinuem fantasiando incessantemente. Muito di-
ferente desse negacionismo histórico, cientíco
e ético é a revisão, isto é, o revisionismo histórico
honesto, que busca trazer à tona a complexidade
do passado, mostrando que nenhum período his-
tórico é homogêneo ou livre de críticas. A história
sempre se reformula, assim como outras ciências
Mateus Henrique de Faria Pereira • Valdei Lopes de Araujo
Atualismo: pandemia e historicidades no interminável 2020 11/16
que se desenvolvem a partir da discussão e da
descoberta de novas fontes, problemas e teorias.
“Maiorias” ameaçadas e identidades
predatórias
Em agosto a revista Piauí revelou que no dia 22
de maio Bolsonaro pensou seriamente em enviar
tropas para fechar o Supremo Tribunal Federal.
eu golpismo e autoritarismo, tão bem analisados
por Bauer (2020) e Pinha (2020), são uma estru-
tura do movimento que corporica. Ainda assim,
como mostra, entre outros, Aarão Reis (2020),
não podemos explicar o bolsonarismo apenas
em função das tradições autoritárias brasileiras,
mesmo que essa seja um elemento importante.
Do nosso ponto de vista, o bolsonarismo e o
trumpismo podem ser entendidos como atuali-
zações da longa história do reacionarismo-au-
toritário. Mas, no atual contexto, representam
movimentos de dissimulação das maiorias pre-
datórias em supostas minorias, mediados pela
desinformação, guerras culturais e redes sociais
empresarialmente controladas.
Bolsonaro e Trump fazem, a todo o tempo, esse
jogo de representarem uma “maioria” ameaçada
e supostamente oprimida. Esse tipo de estratégia
tem se mostrado eciente e será um fenômeno
duradouro. Nos termos do antropólogo indiano
Arjun Appadurai (2009), trata-se de uma angústia
da incompletude que parece estar no DNA dos
estados nacionais. Fato que implica a construção
de identidades predatórias, isto é, identidades
majoritárias que se representam como ameaçadas
em suas fantasias narcísicas de viverem em uma
sociedade sem diferenças, onde todos seriam o
retrato delas mesmas. Nas eleições municipais
de 2020 percebemos que o núcleo dos discursos
da maioria dos candidatos evangélicos e militares
tem como base esses códigos. Assim, Bolsonaro
não precisa interferir diretamente nas eleições,
pois a agenda, a linguagem e a energia de seu
movimento já estão colocadas nos pleitos, atra-
vessando um amplo espectro partidário.
Enquanto o campo progressista não for capaz
de entender as mudanças em curso, por exem-
plo, nos mundos da religião, do capital, da (des)
industrialização e do trabalho, o bolsonarismo,
entendido como uma atualização histórica local,
circunstancial e singular da tradição conservado-
ra/reacionária-autoritária, continuará a construir
uma forte base social e não apenas nas periferias
das grandes cidades, como parece ter sido o caso
da eleição de 2018 (BENITES, 2020).
Sem abandonar suas especicidades e pau-
tas, um dos desaos do campo progressista é
construir discursos e políticas públicas concretas
também para as “maiorias ansiosas”, as quais po-
dem se tornar, como dissemos, predatórias, mas
que também podem assumir formas solidárias.
Do contrário, o medo continuará a ser o afeto
dominante de nossa vida política e social. O bol-
sonarismo sempre esteve entre nós e continuará
presente por muito tempo, nos resta trabalhar
para desativá-lo, atualizando outras histórias.
Derrotar Trump não é o mesmo que derrotar o
neoliberalismo, o capitalismo de vigilância e suas
relações parasitárias com a historicidade atualista.
Mais um homem negro é assassinado no Brasil:
João Alberto Freitas é espancado até a morte
por seguranças do supermercado Carrefour. O
mundo supera 60 milhões de infectados pelo
novo coronavírus. Já são quase 1 milhão e meio
de mortos. O Brasil responde por mais de 10%
dos casos e são mais de 170 mil vidas perdidas.
A Europa e os EUA enfrentam a “segunda onda”
do vírus. Como sugere o nosso colega Walderez
Ramalho, após a leitura de uma das versões desse
texto, a própria ideia de ondas da pandemia tem
relação com as temporalidades da atualização.
A sensação de asxia permanece e 2020 parece
mais um ano que se recusa a terminar.
3 Considerações finais: brechas
contratualistas
Em seu ensaio de 1972 intitulado “Mentira na Po-
lítica”, Hannah Arendt analisa os chamados Penta-
gon Papers, uma coleção de relatórios produzidos
por agências dos Estados Unidos detalhando os
bastidores das decisões políticas para o Vietnã. Os
relatórios secretos foram vazados em reportagem
do The New York Times em 1971, provocando ampla
e negativa repercussão. Para Arendt, os relatórios
12/16 Estudos Ibero-Americanos, Porto Alegre, v. 47, n. 1, p. 1-16, jan.-abr. 2021 | e-39802
demonstravam como a manipulação organizada
e sistemática da mentira poderia corromper a
democracia, assentada em práticas de “desfac-
tualização” da realidade, na substituição do juízo
pelo cálculo de probabilidades e na busca de
manipulação psicológica no lugar de resultados
concretos nas políticas públicas.
Arendt denunciava que um dos objetivos da
administração Nixon era desacreditar a impren-
sa antes das eleições de 1972. Na descrição da
lósofa, o escândalo do uso da mentira como
política pública sistemática só foi possível pelo
autoengano produzido pelo efeito bolha na con-
junção entre agências públicas e thinktanks que
se reforçavam mutuamente e que tentaram con-
vencer a sociedade da validade de suas próprias
fantasias. Essas fantasias encontraram em uma
opinião pública bem-informada por uma imprensa
com credibilidade o seu limite operativo. Por m,
e ainda de interesse para nossa investigação,
Arendt escreve que ao ler os relatórios tinha a
impressão de que computadores e não “toma-
dores de decisão” haviam sido soltos no sudes-
te asiático (ARENDT, 1972, p. 168), esse caráter
automatizado representava a crença em uma
concepção de história em que a contingência
poderia ser plenamente eliminada.
Talvez o que temos chamado atualismo tenha
um parentesco óbvio com esse ethos emergen-
te identicado por Arendt, e sua disseminação
epidêmica possibilitado pelo enfraquecimento
justamente de instituições como a imprensa e os
especialistas. Talvez, em 2020, as ambiguidades e
contradições desse processo tenham ganhado uma
visibilidade inédita. Fato que contribuiu, também,
para a possibilidade da emergência de brechas
contratualistas que estavam dispersas ou latentes.
Assim, tendo em vista as reexões desses
fragmentos anacrônicos e, a partir de nossas
investigações, ao longo de 2020, chegamos à
conclusão que o que chamamos de atualismo
foi reforçado, não sem ambivalências, por certos
aspectos da vivência da pandemia no Brasil, a
5 Na língua inglesa a palavra disinformation é reservada para as práticas deliberadas e planejadas de se produzir e promover infor-
mações falsas, desse modo, considera-se como um tipo particular de misnformation, já que este último conceito abrangeria as formas
deliberadas e não deliberadas através das quais as informações falas são disseminadas. Na Wikipédia em português, os redatores intro-
duziram a expressão “informação falsa” para traduzir o conceito de misinformation. Assim, haveria desinformação quando a informação
falsa é produzida e/ou disseminada de modo deliberado.
saber: a) isolamento/solidão, impulsionados pela
quarentena e o trabalho em casa; b) dependência
maior do digital e das estruturas do capitalismo
de vigilância; c) ansiedade pelas atualizações,
alimentada pela infodemia e crise política; d)
disseminação das guerras culturais e de suas
lógicas baseada em (des) e (mis)informação5; e)
normalização da distração, agitação, confusão e
do ruído como estratégias do debate (anti)polí-
tico. Isso não signica dizer que, em paralelo, os
indivíduos e as instituições não estejam reagindo
a esse aprofundamento, como ca visível na
aliança com a velha política a que o bolsonaris-
mo acabou abraçando após ser ameaçado em
diversas frentes, bem como nos freios parciais ao
projeto destrutivo e autoritário do bolsonarismo
por parte do legislativo, judiciário e da imprensa
em suas formas tradicionais e digital.
Se tivermos razão, ainda nos resta o desao
de lidar com mais uma pergunta: como reetir
sobre as brechas contratualistas na conjuntura?
Acreditamos que nós, historiadores(as), preci-
samos estar atentos para outras historicidades
emergentes, não convencionais e indisciplina-
das (PEREIRA, 2019; AVELAR; BENTIVOGLIO,
2019; RODRIGUES, 2019; NICOLAZZI et al., 2019;
OLIVEIRA, 2018; GUIMARÃES, 2020; SANTOS et
al., 2017; entre outros,). Há, portanto, brechas
contratualistas na conjuntura descrita de forma
fragmentada acima, a saber: a) demanda por
ação na crise e seu potencial kairológico (RAMA-
LHO, 2020c); b) a evidenciação dos ambientes e
estruturas do capitalismo de vigilância com sua
entrada da agenda política via, por exemplo,
projetos de regulamentação; c) a inserção, mes-
mo que a contragosto, de setores “obsoletos de
esquerda” no universo digital, ainda que seja cedo
para pensar o seu legado, pois há ambivalências
nessa imersão; d) emergência de novas formas
de organização política (coletivos) que podem
apresentar um potencial contratualista e nos
levar para além do historicismo.
Mateus Henrique de Faria Pereira • Valdei Lopes de Araujo
Atualismo: pandemia e historicidades no interminável 2020 13/16
Assim, uma das nossas tarefas principais é
reativar histórias no tecido homogêneo da his-
toricidade atualista. Não apenas produzir mais
histórias, pois de algum modo há mesmo um
excesso de histórias e pseudo-histórias atualis-
tas, o atualismo não é carente de história, já que
se trata ainda de um fenômeno humano. O que
precisamos é de abrir espaço e reativar outras
camadas e formas de historicidade não atualistas
que possam nos ajudar a viver melhor (OLIVEIRA;
PINHA, 2020, por exemplo).
Por mais incoerente que possa parecer, o
universo paralelo do trumpismo, por exemplo,
consegue dar sentido a essa agitação em um
ambiente em que os demais sistemas parecem
existir apenas para traduzi-lo. Talvez aqui nova-
mente a palavra simulação seja a chave, pois
mesmo a citada NewsMax não pode deixar de
parecer com uma rede de notícias real, embora
nada tenha daquilo que na modernidade garantiu
ao jornalismo o seu lugar dentre as instituições da
democracia. No limite, essa noção de simulação
nos ajuda a entender como a história produzida
pela nova direita, mesmo quando não usa do
negacionismo, apenas simula os procedimentos
de uma historiograa acadêmica. Sem essa si-
mulação ela perderia ecácia, o que não signica
que podemos confundir essa produção com
aquilo que produz a disciplina histórica, da forma
como se constituiu, enquanto uma das estruturas
dos estados nacionais modernos (CEZAR, 2018;
DUTRA, 2013; entre outros).
Um caminho contratualista passa pela reivindi-
cação do presente como parte incontornável do
trabalho do historiador (resgatando, por exemplo,
o legado dos Annales de uma história a partir
do presente), mas com uma ênfase renovada
na compreensão do passado e do futuro como
tempos presentes, ativos, que não estão ao dis-
por do presente apenas, mas que formam uma
parte de nosso ambiente existencial. Assim, não
é apenas tratar o presente como um espaço de
uma historiograa especializada – embora isso
seja também relevante – mas como dimensão
transversal em qualquer esforço de historicização.
Resistir de modo rme à tendência, que já estava
presente em certas derivações do historicismo, de
que história é a ciência do passado, ideia que se
ancora na experiência cotidiana que naturaliza a
identicação da história com um passado morto.
Talvez devêssemos retomar a ideia de pro-
cesso, desde que não seja aplicado a uma com-
preensão totalizante e global da realidade. A
história humana é, também, formada por pro-
cessos regionais, setoriais, que podem oferecer
uma compreensão importante de duração não
atualista, de evidenciar os efeitos de passado e
futuro no presente, sem reintroduzir a imagem
do bonde da história e seu atônito anjo vingador
como passageiro involuntário.
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Mateus Henrique de Faria Pereira
Doutor em História pela Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG), em Belo Horizonte, MG, Brasil; professor
da Universidade Federal de Ouro Preto, (UFOP), em
Ouro Preto, MG, Brasil.
Valdei Lopes de Araujo
Doutor em História Social da Cultura pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), no
Rio de Janeiro, RJ, Brasil; professor da Universidade Fe-
deral de Ouro Preto (UFOP), em Ouro Preto, MG, Brasil.
Endereço para correspondência
Mateus Henrique de Faria Pereira/ Valdei Lopes de
Araujo
Universidade Federal de Ouro Preto
R. do Seminário, s/n
Centro, 35420-000
Mariana, MG, Brasil