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Teoria das Relações Internacionais com características chinesas: 3 principais abordagens

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Abstract

O interesse por perspectivas não-ocidentais das Teorias das Relações Internacionais (TRI) tem tido bastante avanço na China. A atenção aos enfoques teóricos não-ocidentais baseia-se, principalmente, em uma consideração de que o carácter ocidental das TRI é insuficiente para explicar as relações internacionais da China, que coloca em xeque o pressuposto universalista das TRI. Não obstante, o caráter ocidental e claramente estadunidense/eurocêntrico das TRI é um reflexo evidente da posição dominante destes centros na hierarquia internacional de poder. Assim, as TRI fornecem fontes inesgotáveis de legitimidade tanto para as políticas dos EUA e do Ocidente, quanto para determinados atores, instituições e projetos, ao mesmo tempo em que distorce, ou marginaliza o potencial de narrativas alternativas. É justamente na necessidade de aprofundar a relação entre os trabalhos da academia chinesa e as transformações do sistema internacional que reside a relevância deste trabalho, que tenta abordar explorações teóricas de uma nova forma, além de considerar o potencial de sua contribuição para a exploração de lentes teóricas internacionais alternativas. Este trabalho apresenta um panorama sobre o estudo teórico das Relações Internacionais (RI) na China, por meio de uma pesquisa descritiva dos trabalhos de Zhao Tinyang, Yan Xuetong e Qin Yaqing. O objetivo principal deste artigo é dar uma contribuição ao estudo da TRI, examinando o processo de construção de uma Escola Chinesa de Relações Internacionais. Da mesma forma, esta contribuição visa avançar na identificação de abordagens teóricas chinesas, abordando seus principais autores e suas semelhanças com outras correntes teóricas das RI. Verifica-se que a necessidade de construir uma corrente teórica capaz de enquadrar a visão de mundo da China nas RI, embora passível de complementaridade, se manifesta de maneiras distintas para cada autor. Este artigo analisa esses debates com o objetivo de identificar influências internas (de pensadores e acadêmicos chineses) e externas (das teorias do mainstream ocidental) em torno de uma possível “Escola Chinesa de RI”. Para tanto, o artigo se divide em três seções principais. A primeira consiste em uma contextualização desse processo, analisando a sua evolução e apresentando seus pontos-chaves. A segunda oferece um um levantamento das três principais abordagens da disciplina na China (Excepcionalismo ou Tianxia, a Escola Tsinghua e a Teoria Relacional). A primeira delas aborda o sistema Tianxia e sua visão do mundo como um todo englobado em um único sistema a partir de uma visão filosófica utópica, proposta por Zhao Tingyang. Em segundo lugar, o trabalho de Yan Xuetong, também conhecido como abordagem Tsinghua ou realismo moral. Este autor não é a favor do desenvolvimento de uma escola diferenciada, mas busca oferecer uma perspectiva diferenciada dentro dos arcabouços teóricos ocidentais, incorporando conceitos do pensamento chinês às teorias realistas clássicas. Finalmente, a terceira das abordagens, a integrativa, que usa uma combinação de teorias chinesas e ocidentais para explicar o mundo e a visão da China a partir de uma perspectiva relacional, de Qin Yaqing. Por fim, através de algumas reflexões finais, tentar-se-á situar o potencial contributivo destas abordagens para as RI como um todo.
6º Seminário de Graduação e Pós-graduação da ABRI
Relações Internacionais da América Latina para o Mundo
Área temática: Teoria das Relações Internacionais
TEORIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS COM CARACTERÍSTICAS
CHINESAS: 3 PRINCIPAIS ABORDAGENS
Autores: Luís Filipe de Souza Porto (Universidade Federal do ABC UFABC)
Ana Tereza Lopes Marra de Sousa (Universidade Federal do ABC UFABC)
São Paulo, 06 a 07 de outubro de 2022
Resumo:
O interesse por perspectivas não-ocidentais das Teorias das Relações Internacionais
(TRI) tem tido bastante avanço na China. A atenção aos enfoques teóricos não-
ocidentais baseia-se, principalmente, em uma consideração de que o carácter
ocidental das TRI é insuficiente para explicar as relações internacionais da China,
que colocam em xeque o pressuposto universalista das TRI. Não obstante, o caráter
ocidental e claramente estadunidense/eurocêntrico das TRI é um reflexo evidente da
posição dominante destes centros na hierarquia internacional de poder. Assim, as
TRI fornecem fontes inesgotáveis de legitimidade tanto para as políticas dos EUA e
do Ocidente, quanto para determinados atores, instituições e projetos, ao mesmo
tempo em que distorcem, ou marginalizam o potencial de narrativas alternativas.
É justamente na necessidade de aprofundar a relação entre os trabalhos da
academia chinesa e as transformações do sistema internacional que reside a
relevância deste trabalho, que tenta abordar explorações teóricas de uma nova forma,
além de considerar o potencial de sua contribuição para a exploração de lentes
teóricas internacionais alternativas.
Este trabalho apresenta um panorama sobre o estudo teórico das Relações
Internacionais (RI) na China, por meio de uma pesquisa descritiva dos trabalhos de
Zhao Tinyang, Yan Xuetong e Qin Yaqing. O objetivo principal deste artigo é dar uma
contribuição ao estudo das TRI, examinando o processo de construção de uma
Escola Chinesa de Relações Internacionais. Da mesma forma, esta contribuição visa
avançar na identificação de abordagens teóricas chinesas, abordando seus
principais autores e suas semelhanças com outras correntes teóricas das RI.
Verifica-se que a necessidade de construir uma corrente teórica capaz de enquadrar
a visão de mundo da China nas RI, embora passível de complementaridade, se
manifesta de maneiras distintas para cada autor. Este artigo analisa esses debates
com o objetivo de identificar influências internas (de pensadores e acadêmicos
chineses) e externas (das teorias do mainstream ocidental) em torno de uma possível
“Escola Chinesa de RI”. Para tanto, o artigo se divide em três seções principais. A
primeira consiste em uma contextualização desse processo, analisando a sua
evolução e apresentando seus pontos-chaves. A segunda oferece um levantamento
das três principais abordagens da disciplina na China (Excepcionalismo ou Tianxia,
a Escola Tsinghua e a Teoria Relacional). A primeira delas aborda o sistema Tianxia
e sua visão do mundo como um todo englobado em um único sistema a partir de
uma visão filosófica utópica, proposta por Zhao Tingyang. Em segundo lugar, o
trabalho de Yan Xuetong, também conhecido como abordagem Tsinghua ou
realismo moral. Este autor o é a favor do desenvolvimento de uma escola
diferenciada, mas busca oferecer uma perspectiva diferenciada dentro dos
arcabouços teóricos ocidentais, incorporando conceitos do pensamento chinês às
teorias realistas clássicas. Finalmente, a terceira das abordagens, a integrativa, que
usa uma combinação de teorias chinesas e ocidentais para explicar o mundo e a
visão da China a partir de uma perspectiva relacional, de Qin Yaqing. Por fim, através
de algumas reflexões finais, tentar-se situar o potencial contributivo destas
abordagens para as RI como um todo.
Palavras-chave: Teoria das Relações Internacionais, Escola Chinesa de RI,
Realismo Moral, Tianxia, Teoria Relacional
Introdução
O interesse por perspectivas o-ocidentais das Teorias das Relações
Internacionais (TRI) tem tido bastante avanço na China. A atenção aos enfoques
teóricos não-ocidentais baseia-se, principalmente, em uma consideração de que o
carácter ocidental das TRI é insuficiente para explicar as relações internacionais da
China, que colocariam em xeque o pressuposto universalista das TRI. Não obstante,
o caráter ocidental e claramente estadunidense/eurocêntrico das TRI é um reflexo
evidente da posição dominante destes centros na hierarquia internacional de poder.
Assim, as TRI fornecem fontes inesgotáveis de legitimidade tanto para as políticas
dos EUA e do Ocidente, quanto para determinados atores, instituições e projetos, ao
mesmo tempo em que distorcem, ou marginalizam o potencial de narrativas
alternativas.
Nesse sentido, muitos tomam as TRI como incapazes de oferecer respostas a
questões relacionadas a outras culturas e destacam a necessidade de construir
estruturas alternativas baseadas em diversos legados filosóficos e históricos (BUZAN
e WANG, 2014). De fato, as constantes referências às raízes filosóficas ocidentais
reforçam essa divisão entre os privilegiados criadores de conhecimento e aqueles
que, da periferia, são meros participantes e transmissores.
Como destacam Leite e Máximo (2013), os avanços teóricos da disciplina na
China nos últimos anos têm ganhado atenção, principalmente devido à relativa
juventude do ensino de Relações Internacionais no país. Em seus primórdios,
caracterizou-se por uma reflexão das visões marxista-leninistas produzidas,
principalmente, por acadêmicos, como também pela tradução e adoção de visões
ocidentais e seus paradigmas. No entanto, atualmente, os estudos internacionais na
China exibem cada vez mais a procura de uma iniciativa própria para se exprimirem
em seus próprios termos. Além disso, a rica e vasta história da China abre "uma
importante maneira para explorar ordens mundiais alternativas" que não se baseiam
apenas na história europeia ou ocidental (ZHANG, 2011, p. 63).
É justamente na necessidade de aprofundar a relação entre os trabalhos da
academia chinesa e as transformações do sistema internacional que reside a
relevância deste trabalho, que tenta abordar explorações teóricas de uma nova forma,
além de considerar o potencial de sua contribuição para a exploração de lentes
teóricas internacionais alternativas.
Convém destacar que o debate sobre a contribuição chinesa para a disciplina
se concentra principalmente na promoção de uma terminologia independente que
favoreça a adoção de explicações alternativas. Esta nova terminologia baseia-se no
diálogo entre a filosofia tradicional chinesa e elementos do materialismo histórico e
dialético de sua civilização. Devido à relativa juventude das abordagens teóricas
chinesas das Relações Internacionais, Barbosa propõe chamá-los de “Movimento
Escola Chinesa” (BARBOSA, 2021).
Esse Movimento pode ser localizado de duas maneiras diferentes dentro do
contexto global da disciplina. Em primeiro lugar, surge como uma resposta ao núcleo
predominante da disciplina, tentando afastar discursos como a ameaça chinesa e
teorizar sobre ascensão pacífica e/ou harmonia. Em segundo lugar, a Escola Chinesa
inspira-se nas abordagens teóricas da semiperiferia europeia, principalmente na
Escola Inglesa e em alguns casos no construtivismo, para defender, no primeiro
caso, uma perspectiva própria e, no segundo, a adoção de perspectivas que não são
puramente materiais.
A discussão sobre a existência de uma Escola Chinesa de TRI conduz
inevitavelmente às características que uma teoria deste tipo deve ter. Para Qin Yaqing
(2005), um dos acadêmicos mais importantes do Movimento Escola Chinesa
1
, uma
teoria deve ter três elementos principais. Primeiro, seu desenvolvimento deve ser
baseado na experiência chinesa histórica, cultural, tradicional e contemporânea.
Segundo, deve ter uma vocação geral, alcançando a universalidade além de suas
bases tradicionais. Por fim, seu núcleo teórico deve ser incomensurável em relação a
outras teorias da disciplina, centrado em uma questão teórica central (Ibid, 2005). A
falta de consenso sobre qual deve ser essa questão que dificulta o desenvolvimento
de uma escola chinesa de TRI. Por isso, o autor propõe que esta questão esteja
diretamente ligada ao problema central da China atual, sua relação com a sociedade
internacional, pois considera que as perspectivas ocidentais não têm sido capazes de
explicar os processos de socialização pacífica das potências emergentes carentes de
uma perspectiva empírica, que uma Escola Chinesa poderia fornecer (QIN, 2011).
O objetivo principal deste artigo é dar uma contribuição ao estudo das TRI,
examinando o processo de construção de uma Escola Chinesa de Relações
Internacionais, dando especial atenção à sua progressiva internacionalização. Da
mesma forma, esta contribuição visa avançar na identificação de abordagens teóricas
chinesas, abordando seus principais autores e suas semelhanças com outras
correntes teóricas das RI. O artigo se divide em três seções principais. A primeira
consiste em uma abordagem ao processo de construção de uma Escola Chinesa,
analisando a sua evolução e examinando os postos-chaves deste processo. A
segunda oferece uma um levantamento das três principais abordagens da disciplina
na China (Excepcionialismo ou Tianxia, a Escola Tsinghua e a Teoria Relacional). Por
fim, através de algumas reflexões finais, tentar-se-á situar estas abordagens na
disciplina como um todo, bem como na prática da política internacional chinesa.
O movimento Escola Chinesa das RI
1
Kristensen e Nielsen apontam Qin Yaqing, Wang Yizhou, Wang Jisi e Yan Xuetong como os acadêmicos mais
importantes do “Movimento Escola Chinesa”. Encontrado em KRISTENSEN, Peter; NIELSEN, Ras.
Constructing a Chinese International Relations Theory: A Sociological Approach to Intellectual
Innovation. International Political Sociology, v. 7, n. 1, p. 19-40, 2013
O processo de construção de uma Escola Chinesa de Relações Internacionais
está intimamente relacionado à necessidade de criar novos conceitos e arcabouços
teóricos que expliquem o papel da China na sociedade internacional. A importância
de reforçar teoricamente conceitos do discurso político chinês, como Socialismo com
características chinesas”, Comunidade com Futuro Compartilhado Para a
Humanidade ou o Rejuvenescimento Nacional, oferece aos estudiosos a
oportunidade de criar seu próprio sistema de conhecimento para a explicação desse
fenômeno (GLASER E MEDEIROS, 2007). Apesar de alguns considerarem a
construção de uma teoria própria como um movimento subversivo, convém considerar
o Movimento Escola Chinesa como resposta à aplicação de teorias ocidentais
universais à periferia asiática e chinesa (ACHARYA, 2011).
O Movimento Escola Chinesa deve ser entendido como uma contribuição da
produção teórica baseada na cultura local, tradição histórica e prática política da
China. Contudo, não existe consenso para o seu desenvolvimento. De um lado,
estudiosos buscam incorporar elementos "com características chinesas" ao
arcabouço teórico clássico das RI. De outro lado, os acadêmicos a favor de uma
abordagem teórica própria e independente. Pode-se afirmar que there are many
Chinese voices rather than one, and at this point it looks as though there will be both
schools of IR theory in China and perhaps two or more approaches that might be
labelled ‘Chinese Schools’ (WANG e BUZAN, 2014, p. 18).
No entanto, é possível elencar três formas de abordar as TRIs chinesas,
consideradas mais importantes dentro do Movimento Escola Chinesa de RI, pois elas
convergem em uma estreita relação com a tradição cultural e filosófica chinesa, bem
como na busca de respostas sobre a relação entre a China contemporânea e a
sociedade internacional.
A primeira delas aborda o sistema Tianxia e sua visão do mundo como um todo
englobado em um único sistema a partir de uma visão filosófica utópica, proposta por
Zhao Tingyang. Em segundo lugar, o trabalho de Yan Xuetong, também conhecido
como abordagem Tsinghua ou realismo moral. Este autor não é a favor do
desenvolvimento de uma escola diferenciada, mas busca oferecer uma perspectiva
diferenciada dentro dos arcabouços teóricos ocidentais (YAN, 2011), incorporando
conceitos do pensamento chinês às teorias realistas clássicas. Finalmente, a terceira
das abordagens, a integrativa, que usa uma combinação de teorias chinesas e
ocidentais para explicar o mundo e a visão da China a partir de uma perspectiva
relacional, de Qin Yaqing.
A abordagem Excepcionalista - Tianxia
Os estudos realizados dentro dessa abordagem teórica se baseiam em um
caráter excepcional da China perante o mundo, e estão enraizados no desejo de
transformar a China em uma produtora de conhecimento. O maior expoente dessa
abordagem, Zhao Tingyang, acredita que para a China se tornar uma potência
mundial não basta o desenvolvimento econômico, mas também a criação de
conhecimento. Portanto, de sua perspectiva, a China deve construir novos conceitos
e estruturas globais para alcançar esse status (ZHAO, 2005, 2016, 2019).
Nesse sentido, o autor indica que a redefinição de Tianxia (天下 literalmente,
“tudo sob o céu”) como um conceito político pode ser uma importante contribuição
chinesa para a política mundial (ZHAO, 2021). O autor destaca à dinastia Zhou (1080-
221 a.C.) que, depois de chegar ao poder como uma tribo menos numerosa que
outras, estabeleceu uma visão particular do mundo. Após constatar seu pouco
potencial para se tornar uma potência hegemônica, optaram por explorar outros meios
para manter sua liderança. O sistema Tianxia foi a maneira de manter seu poder.
Como fundamento, o sistema Tianxia apresenta dois elementos importantes. O
primeiro deles é a indiferenciação entre interno e externo (amigo/inimigo;
nacional/estrangeiro, dentre outras contraposições) que está na base da forma como
se fundam as relações internacionais modernas. Zhao (2021) argumenta que o
sistema Tianxia considera o mundo todo “como a unidade a partir da qual se analisa
os problemas” (ZHOU, 2021, p.2, tradução nossa) e não recortes a partir de Estados
Nacionais ou outro tipo de unidade política. A partir da consideração de que o mundo
todo “tudo sob o céu” – é a medida fundamental de partida, toda a existência política
está contida dentro de tianxia (ZHOU, 2021, p.3, tradução nossa). Isto é, existe a
pressuposição apriorística de que o mundo deve ser visto de forma holística como um
sistema no qual não existe a oposição entre doméstico e internacional e, portanto, a
existência de estrangeiros ou inimigos: “o sistema tianxia tem apenas internalidade e
não externalidade” (ZHOU, 2021, p.3, tradução nossa).
O segundo elemento importante desse sistema é que a afirmação de que existe
oposições no mundo político não é lida como um sinônimo de conflito, uma vez que
se considera que a “alterity can be transformed into a shared order of coexistence”
(ZHOU, 2021, p.4). Zhao argumentou que é possível interpretar Tianxia como a
combinação de três significados: a terra do mundo (como um sentido geográfico),
todos os povos do mundo (como um sentido social e cultural) e a instituição mundial
(como sistema político). No caso da Dinastia Zhou, a aplicação desse sistema teria
correspondido geograficamente ao sistema regional asiático com o qual a China
estabelecia relações contínuas no período. Contudo, Zhao considera que Tianxia não
precisa se aplicar apenas a China e que pode ser reatualizado nos dias de hoje como
uma visão cosmopolita do mundo, adequada para resolver os desafios colocados a
governança global no cenário da globalização.
Zhao (2021, p.2, tradução nossa) argumenta que ethnonational systems,
imperialism, and hegemonic power struggles are receding in the reality of globalization
as they are losing efficacy in dealing with current situations”. O fato de as relações
internacionais serem fundadas na diferenciação, oposição e conflito entre interno e
externo, e de ter como base teorias políticas que afirmam a não possibilidade de
conciliação entre opostos cria uma ordem internacional disfuncional, na qual é difícil
estabelecer qualquer tipo de governança adequada para resolver problemas. Assim,
o autor promove o sistema Tianxia, uma contribuição chinesa, como forma de melhor
lidar com os problemas atuais.
Tal sistema teria como base três princípios de caráter notadamente
universalistas. O primeiro deles é de que a solução bem-sucedida dos problemas
mundiais deve ser abordada por meio de um sistema universalmente aceito, e não
pelo recurso à força. Em segundo lugar, este sistema universal seria politicamente
justificado desde que proporcionasse o maior bem-estar comum do mundo. Em última
análise, tal sistema funcionaria ao restaurar a harmonia entre todas as nações e
culturas.
Contudo, é preciso apontar que, na prática, a aplicação de Tianxia na história
chinesa, constituiu-se em um sistema altamente hierárquico, que priorizou a ordem, a
ética e a governança da elite sobre a liberdade, a democracia e os direitos humanos.
É justamente nessa natureza hierárquica que se reflete a influência da visão
confucionista da família, como o elo integral mais importante da sociedade chinesa. O
fato de a perspectiva de Zhao ser mais filosófica, mostrando um caráter utópico de
sua aplicação no mundo, não contribui para que se possa visualizar na prática como
seria a reatualização desse sistema nos dias de hoje. Na verdade, Zhao não explica
de forma sistemática a forma como Tianxia poderia ser estruturada como instituição
mundial ou como seria alcançada; ele simplesmente a exalta como harmonizadora
universal. Como foi um sistema que em termos históricos a China foi colocada como
centro da ordem e a partir disso estabeleceu-se relações hierárquicas com outros
locais, a reedição de Tianxia pode ser interpretada como a emergência de uma ordem
internacional vertical pautada na China.
De todo modo, a obra de Zhao oferece um contraponto interessante entre, por
um lado, a ordem westfaliana como sistema horizontal baseado na igualdade
soberana e, por outro, a da China antiga ou Tianxia, que privilegia a hierarquia através
de um padrão de mundo determinado. Enfatizando essa perspectiva eminentemente
crítica à ordem westfaliana, Zhao opõe a tradição política da Grécia antiga à da China,
argumentando que, embora a primeira, de base política ocidental, voltada
exclusivamente para a polis, o princípio de Tianxia tinha uma eminente perspectiva
globalista (ZHAO, 2019, p. 6).
A submissão do elemento estatal a um global nada mais é do que a evidência
da concepção civilizatória do pensamento chinês. Diante de um sistema internacional
ocidental baseado na soberania, o pensamento chinês inclui a concepção hierárquica
desse princípio em uma perspectiva universal. Isso permite que a China se posicione
como o centro da civilização com base em seu índice civilizatório, marcado por sua
conformidade com os valores e ritos de sua civilização.
O realismo moral” ou o “pensamento Tsinghua”
Em contraste com a perspectiva de Tianxia, os teóricos da Escola Tsinghua e
seu pesquisador mais notável, Yan Xuetong, estão eminentemente ligados às teorias
ocidentais das TRI. Partindo da crença do caráter universal do pensamento científico,
sua visão monista das Relações Internacionais molda definitivamente a teoria dessa
abordagem.
“I am more concerned with how real life and real political behavior
can verify explanatory theory. I do not like what cannot be verified,
because there is no way of knowing if its conclusions are valid.
For instance, in making predictions I like to set a timeframe:
within five years, or within three years (YAN, 2009, p. 241).
As obras teóricas de Yan caracterizam-se por interpretar tanto os assuntos
globais quanto o comportamento da China na sociedade internacional por meio de
uma construção teórica importada das TRI ocidentais. Pode ser interpretado como um
realista neoclássico que teoricamente se conecta com as teorias de estabilidade
hegemônicas ocidentais (Ibid., p 229). Sem dúvida, a aplicação de um marco teórico
importado facilita o diálogo entre a perspectiva Tsinghua e as TRIs ocidentais,
consideradas fulcrais para trazer uma visão chinesa para as teorias existentes. Não
obstante, sua contribuição visa acrescentar hipóteses auxiliares ao núcleo duro
realista, completando uma teoria que ele considera universal por meio de uma visão
chinesa.
Especificamente, as obras de Yan se baseiam em um quadro analítico
importado através do qual ele analisa as ideias de filósofos anteriores à dinastia Qin,
como Confúcio ou Laozi. A releitura da tradição filosófica da época, conhecida como
Idade de Ouro, visa oferecer ferramentas teóricas baseadas no pensamento antigo
para analisar de forma inovadora a realidade internacional contemporânea (YAN,
2011, p 21). Como objeto de sua análise, o autor cita o aprendizado do pensamento
anterior à dinastia Qin de tal forma que permite repensar a estratégia de emergência
da China para evitar erros como os soviéticos ou os japoneses. No entanto, nesta
tarefa, o autor muitas vezes tende a exagerar as semelhanças entre as duas
realidades e a obscurecer suas diferenças (Ibid., p 84).
É possível afirmar que os trabalhos da Escola Tsinghua exploram dois
horizontes teóricos inter-relacionados. O primeiro deles é a análise da filosofia antiga
através de um referencial teórico contemporâneo. Nessa tarefa, Yan se concentra na
análise do poder desses autores e utiliza uma metodologia e terminologia típicas das
ciências ocidentais para classificar essas obras. O segundo horizonte teórico analisa
a estrutura hierárquica do sistema internacional e os tipos de liderança exercidos pelos
Estados mais poderosos. Dessa forma, o primeiro dos projetos teóricos se conecta
com o realismo neoclássico, oferecendo uma análise do poder no estilo dos autores
clássicos e sem esquecer as variáveis não sistêmicas da análise. A segunda, por sua
vez, dialoga diretamente com as teorias realistas hegemônicas, principalmente com
as obras de Gilpin. O autor considera o sistema internacional hierárquico em termos
de poder, normas e responsabilidades, característica que contribui para a manutenção
da ordem internacional anárquica (YAN, 2011, p. 107).
Especificamente, o projeto pré-Qin se concentra em explicar como os
pensadores dessa dinastia entendiam o poder. Na visão de Yan, estes apontavam os
fatores políticos, econômicos e militares como os mais importantes e geralmente
apontavam a habilidade política como base integradora do poder estatal. De fato, Yan
toma Xunzi como um precedente para afirmar que o poder político desempenha um
papel mobilizador do poder econômico e militar. Nesse sentido, Xunzi coloca o poder
político como base do hard power, vinculando essa capacidade política com o acerto
das políticas do próprio Estado (YAN, 2011, p. 77).
Sem dúvida, o conceito de poder político é a peça-chave tanto para Xunzi
quanto para Yan. Define-se que o poder político se baseia na capacidade de
governantes e ministros de mobilizar recursos e, consequentemente, tem efeito
multiplicador (YAN, 2011, p. 140-141). Portanto, a ideia de poder é baseada no
conceito de liderança moral. A moral, para Yan, é o centro do poder político, a fonte
de onde ele emerge e a característica que confere ao sujeito a legitimidade que lhe
permite perdurar no poder. Constitui uma clara referência ao realismo clássico de
Morgenthau, que Yan toma para reviver o sentido moral da ação política (Ibid., p. 75).
Ressalta-se que o conceito de moralidade atingiu uma grande importância na
obra de Yan, a ponto de elaborar as bases de uma corrente realista rotulada de
“realismo moral” a partir de alguns dos mais importantes teóricos ocidentais (YAN,
2020, p. 3). Por meio dessa contribuição, o autor consegue enquadrar suas obras em
uma abordagem diferenciada, mas inclusiva, que dialoga diretamente com as
proposições realistas contemporâneas e insere sua abordagem à margem do debate
realista, como em sua definição sobre liderança:
Leadership is composed of individual policymakers, mainly the
supreme leader and his cabinet members. They represent the
governments of their states. Leadership from the leading states
constitutes the international leadership because of the status of
their states in the international system. As such, these people’s
policy will have a strong impact on shaping international
configuration, norms, order and even the whole system (Ibid., p
3).
Ao tratar a liderança como uma variável independente, o realismo moral rompe
com a tradição clássica de que uma única teoria de RI pode funcionar adequadamente
em um dos três níveis analíticos: indivíduo, estado ou sistema. Apesar de considerar
o sistema internacional como hierárquico, o autor discorda da pouca atenção que os
teóricos da estabilidade hegemônica dão à relação entre a natureza do poder
hegemônico e a estabilidade do sistema como um todo. Dessa forma, a moralidade
do Estado está intimamente relacionada à estabilidade do sistema e à durabilidade de
sua liderança.
O autor desenvolve uma tipologia sobre liderança de acordo com a
moralidade e a forma como ela é exercida. Se Wendt define o sistema internacional
com base nas interações e nas normas que estas geram, para os antigos filósofos
chineses a base é o tipo de poder que cada governante exerce. O governante,
portanto, constitui a primeira variável independente, sendo a ordem internacional uma
variável dependente (Ibid., p 3).
É possível destacar que uma das características mais enriquecedoras da obra
de Yan são suas contribuições práticas sobre os princípios políticos que a China deve
perseguir nos próximos anos, classificadas em três níveis. A primeira, aquela que se
refere à grande estratégia global, que a China deve fazer da hegemonia o objetivo
principal de sua política externa, apresentando sua própria visão universal. A segunda,
no nível da política externa, seus esforços devem se concentrar em demonstrar sua
responsabilidade como potência, promovendo maior abertura na sociedade
internacional e expandindo seu poder político. Por fim, estabelecer estratégias
específicas para a emergência da China, focadas principalmente na criatividade ao
lidar com problemas estratégicos e no reforço e expansão da política de alianças.
A utilização de um arcabouço teórico semelhante ao ocidental, sua linguagem
e seus conceitos importados, bem como a aplicação de uma bibliografia bastante
conhecida nas TRI ocidentais facilitam muito o diálogo entre a Escola Tsinghua e as
RI, principalmente em pesquisas sobre a emergência da China como potência
internacional. O que singulariza os estudos nessa Escola, contudo, é o resgate da
importância da Moral como elemento do poder político, e a atribuição de que é este
poder e a forma como ele é exercido pelas autoridades políticas um dos elementos
centrais a estruturar o sistema internacional.
A teoria relacional de Qin Yaqing
A teoria relacional decorre de uma insatisfação com a forma como as teorias
ocidentais omitem ou interpretam os processos de socialização das potências
emergentes. O principal precursor dessa abordagem, Qin Yaqing, explora as teorias
ocidentais e as utiliza na construção de sua narrativa. Dessa forma, sua construção
teórica constitui simultaneamente uma crítica e uma contribuição inovadora,
principalmente para as teorias construtivistas das RI.
If “rationality” has been a key concept for Western society,
especially during the past three centuries since the
Enlightenment, then its counterpart for Chinese society can be
“relationality.” If we conceptualize this Chinese idea, take it as a
core concept, and theorize on it following the principles of social
sciences, what theory can we work out? (QIN, 2009, p 6).
A revisão das três principais teorias clássicas ocidentais evidencia, na opinião
de Qin, a omissão do elemento social mais significativo do sistema internacional: as
relações (QIN, 2005, 2007, 2009, 2010, 2011, 2012, 2020). Nesse sentido, o autor
sugere uma alternativa e/ou complementaridade a visão racionalista das teorias
ocidentais por meio da relacionalidade chinesa. Seu principal argumento
epistemológico baseia-se em contrastar a dialética hegeliana (“tese” e “antítese”) com
a dialética chinesa zhongyong (yin e yang). A dialética de Zhongyong enfatiza um
modo de pensar “ambos-e” em vez de “ou-ou” e rejeita a dicotômica “tese” e “antítese”
hegeliana.
O debate sobre o caráter da sociedade internacional vincula-se à relação
especial entre as Escolas Chinesas e a Escola Inglesa. Como afirmam Wang e Buzan
(2014, p. 3), ambos os projetos compartilham da motivação em contrabalançar às
teorias do mainstream ocidental. No entanto, a clara vocação global da Escola Inglesa
ainda não foi desenvolvida no caso chinês. Apesar disso, ambos os projetos
compartilham importantes interesses teóricos e conceituais que alimentam o debate,
como: i) a importante orientação normativa com referências claras à história e à teoria
política (p. 32); ii) o interesse por uma sociedade internacional baseada na China
antiga como modelo de sociedade internacional alternativo (p. 21); iii) o surgimento da
China e seu impacto na sociedade internacional (p. 29); e iv) a inter-relação dos
princípios de anarquia e hierarquia (p. 24).
Os vínculos em comum entre as perspectivas anteriormente citadas e o
importante significado do conceito de sociedade internacional entre os acadêmicos
chineses fornecem a base para um debate enriquecedor em torno do conceito
enunciado por Bull. Embora Qin considere o valor da ideia de sociedade internacional
para a compreensão das relações internacionais, ele também critica seu caráter
estereotipado, estático e marcadamente eurocêntrico (QIN, 2020, p. 165). Essas
características, aliás, tornam-se mais evidentes quando a sociedade internacional
global ou europeia encontra outra de caráter regional, cujos membros ainda estão em
processo de socialização (Ibid., 2020, p. 30-31).
Segundo Qin, esse problema é consequência da adoção de uma abordagem
majoritária das TRI que retrata a sociedade internacional como uma entidade. Esta
perspectiva sublinha a necessidade de uma homogeneização das normas e
instituições dos membros da sociedade internacional em relação às adotadas pelas
potências mais importantes (Ibid., 2020, p. 176). Essa homogeneização produz uma
mudança de identidade e a integração gera uma nova síntese derivada da vitória de
um sujeito sobre o outro. Essa visão, na opinião de Qin, impede a existência de uma
sociedade internacional global e cria sociedades regionais entre sujeitos cuja
homogeneidade é, inicialmente, alta (Ibid., 2020, p. 148).
Diante dessa perspectiva estática, Qin propõe compreender a sociedade dentro de
um processo de relações intersubjetivas complexas em movimento (QIN, 2010, p.
142), baseado na dialética zhongyong. A trajetória de pensamento mutuamente
inclusiva tem como eixo a essência epistemológica racionalista em sua base com dois
polos opostos que interagem, mas as relações entre eles não precisam ser marcadas
pelo conflito. Com base no pensamento tradicional chinês, Yaqing argumenta que
(2011, p.140, tradução nossa) “Quando observamos conflito e contradição no mundo,
ele é um fenômeno superficial ou transitório mais do que de caráter essencial, o
caminho ou a natureza do universo que produz todas as oposições é ontologicamente
harmônico em primeiro lugar.” O caráter inclusivo das relações entre os sujeitos
constitui a pedra angular da dialética chinesa ao longo de um processo marcado pela
harmonia (QIN, 2010, p 139-140).
O processo desempenha um papel essencial ao facilitar que identidades sejam
definidas e redefinidas nessas relações, transformando ambas, fugindo da
homogeneidade e caminhando para uma identificação positiva de todos os sujeitos.
Portanto, uma visão da sociedade internacional como um processo permite que as
normas e as instituições sejam consideradas não como ferramentas de governo e
controle, mas como harmonizadoras das relações entre os membros da sociedade
(Ibid., p. 152).
Como consequência dessa visão de processos, Qin Yaqing defende a
construção de uma corrente teórica que ele chama de construtivismo procedimental.
O rótulo construtivista nasce da visão social dessa corrente, da qual discorda em sua
forma de construir relações. No caso chinês, trata-se de um processo marcado pela
relacionalidade, ganhando assim em dinamismo teórico. Essa teoria sistêmica, por
meio de uma abordagem que ressalta a importância das práticas intersubjetivas entre
os atores, enfatiza o papel dos processos sociais no desenvolvimento normativo e
identitário em nível internacional (QIN, 2010, p 129-153).
Desse modo, a abordagem processual é definida por meio de três
características principais. A primeira destaca o caráter simbiótico e mutuamente
constitutivo de agentes e processos. As relações entre processo e agentes não são
lineares, mas têm caráter circular, com constituição singular e holística. Em segundo
lugar, o processo constrói a intersubjetividade, ou seja, o início da interação é o que
lhe sentido e gera um conjunto de práticas sociais e processos relacionais que
conferem sentido à interação. Por fim, a lógica do próprio processo se baseia na
dialética chinesa, que preconiza a inclusão e a heterogeneidade dos atores (QIN,
2009, p. 9-10).
A abordagem particular que Qin propõe permite a sua aplicação prática no
conceito de governança relacional, abordando diretamente a questão de como
governar numa perspectiva menos normativa e mais processual. Portanto, o conceito
de governança relacional é definido como um processo de negociação de acordos
sociopolíticos que gerenciam relações complexas dentro da comunidade para gerar
ordem e estimular comportamentos recíprocos e cooperativos. Tudo isso baseado na
confiança mútua que é gerada pelo entendimento compartilhado de certas normas
sociais e morais.
Como essa definição deixa claro, a governança relacional é caracterizada por
vários traços distintivos. O primeiro deles é que o conceito não faz referência ao
controle, mas enfatiza a importância da negociação. Portanto, se o controle se
caracteriza por um processo unidirecional entre quem o exerce e quem o sofre, no
caso da negociação, tem-se uma relação multidirecional entre os sujeitos, criando
uma rede de relações e processos. Em segundo lugar, a conclusão acima já mostra
que a governança é retratada como um processo dinâmico que é constantemente
coordenado e consultado devido à sua natureza mutável e incerta. Terceiro, o
governado não se constitui em apenas um ator, mas em um sistema de
relacionamentos complexos. Não se trata, portanto, de equilíbrio de poder, mas de
relações. Finalmente, como a definição sugere, a confiança constitui o pilar
fundamental da governança relacional e a peça que a conecta com a filosofia
tradicional chinesa (QIN, 2011, p 133).
Esse modelo de governança baseia-se principalmente na visão interconectada
das relações que Qin deriva da dialética chinesa. Através de processos como
mediação e coordenação, avança-se no sentido da harmonização. A moral,
constituída como pilar e garantidor da boa governança, orienta os atores para uma
evolução praticada pela virtude, e suas relações avançam para essa harmonia.
O caráter distintivo da governança relacional é destacado pela comparação
com a governança internacional clássica. A primeira característica distintiva entre os
dois é a ênfase nas relações sociais e nas práticas dos agentes sociais que, apesar
de suas complexidades, podem reduzir os custos de transações e reforçar a lógica de
troca voluntária de informações. Em segundo lugar, a unidade de análise não é um
ator individual, mas relações contextualizadas em um determinado espaço e tempo.
Ao julgar que as normas, em uma abordagem racional, buscam controlar os atributos
negativos dos atores individualmente, a perspectiva relacional enaltece o papel da
dialética chinesa para que as relações transformem o ator e o faça trabalhar para a
consecução de interesses comuns. Trata-se de uma governança orientada para o
processo, que preconiza a manutenção dessas relações apesar da ausência, pelo
menos imediata, de resultados, uma vez que o próprio processo, segundo a
perspectiva chinesa, tem efeitos transformadores nos atores. Em quarto lugar, o
papel crucial da confiança é uma característica distintiva em relação à perspectiva
racionalista que, considerando os atores como egoístas, exige que os acordos sejam
normativamente e legalmente vinculantes (Ibid., p. 138-139).
A representação desses modelos de governança contribui para complementar
a dualidade entre os conceitos da dialética chinesa e a visão racionalista/hegeliana.
De fato, o próprio Qin considera que, ao lidar com o que entende como um dos
maiores desafios teóricos da disciplina, as relações entre a identidade chinesa e a
sociedade internacional, essas dualidades costumam ser reproduzidas. Por um lado,
a visão hegeliana/racionalista sustenta que, para atingir o objetivo de ascensão
pacífica, a China deve aceitar as instituições primárias e mutáveis da sociedade
internacional, ainda que entrem em conflito com sua identidade. A situação, portanto,
é a de um alter que é transformado pelo ego, homogeneamente, sem que o ego sofra
qualquer variação. Por outro lado, a visão relacional entende a sociedade
internacional não como uma entidade estática, mas como um processo. As relações
entre os dois sujeitos (sociedade internacional como um todo e China) serão
transformadoras para ambas as partes, avançando para uma síntese harmoniosa
derivada da contínua reconstrução e reajuste de identidades (QIN, 2009, p 142).
Como no caso da governança, é interessante e enriquecedor avançar na
oposição dos binômios processo-entidade, legalidade-sociedade ou racionalismo-
relação. No entanto, essa tarefa precisa ser abordada incorporando perspectivas não
ocidentais, neste caso chinesas, e facilitando um vínculo comum de entendimento
entre os dois, como o realizado por Qin.
Conclusão
A análise de construções teóricas das RI distantes do núcleo anglo-saxão e
eurocêntrico da disciplina constitui esforço importante no sentido de avançar para um
progressivo pluralismo da disciplina. Os avanços do Movimento Escola Chinesa são
considerados não apenas como resultado da ascensão da China na sociedade
internacional, mas também relacionados aos processos introspectivos que a disciplina
de Relações Internacionais tem cultivado naquele país.
As teorias enunciadas ao longo do artigo também contribuem com abordagens
e conceitos diferenciados que enriquecem a disciplina. Algumas dessas abordagens,
como parte das contribuições da Escola Tsinghua, estabelecem um diálogo com as
perspectivas teóricas baseadas na disciplina sem tentar, de forma alguma, alterar seu
núcleo teórico, mas fornecer hipóteses adicionais. De fato, um dos pontos fortes dessa
abordagem é o estabelecimento de um código comum de comunicação com as várias
vertentes do realismo. O trabalho de Yan destaca-se pela recuperação da Moral como
elemento importante na análise da política internacional, construindo uma ponte entre
o Realismo Clássico, para o qual a moral era um aspecto importante, e a filosofia
chinesa que, tendo como base a história política da China, considera tal atributo
essencial para o poder político. A contribuição de Yan singulariza-se pela forma como
o autor elenca a moral como base de legitimidade para o exercício do poder
internacional (estabelecendo diálogo com o Realismo Neoclássico), chamando a
atenção para aspectos de análise que geralmente escapam a autores realistas.
No caso de outros projetos, como a teoria relacional de Qin Yaqing, o diálogo
com a Escola Inglesa e o construtivismo tenta proporcionar uma reconstrução de
alguns conceitos centrais, como a concepção de sociedade internacional como
processo. Aborda-se o desenvolvimento de uma teoria propriamente chinesa, mas
coloca-se sua inserção no debate global em diálogo com teorias já estabelecidas. As
sinergias com abordagens que enfatizam o valor de variáveis não materiais são mais
do que notáveis, assim como as críticas às perspectivas materialistas. As
contribuições sobre a natureza processual da sociedade internacional ou o
desenvolvimento de uma teoria sobre governança relacional, embora apresentem um
claro aspecto teórico, têm aplicabilidade prática. Talvez uma das principais
contribuições do trabalho de Qin é sugerir que as relações sejam alçadas a unidade
de análise, em lugar das unidades políticas as quais caracterizam o estudo das
relações internacionais.
Já a abordagem excepcionalista, de Zhao Tinyang, faz o interessante trabalho
de resgatar e atualizar o conceito de Tianxia como uma contribuição chinesa as RI.
Trata-se de uma exploração da ordem internacional/regional estabelecida pela
dinastia Zhou, com um interessante potencial de diálogo com as perspectivas
exploradas por outras ordens antigas, como a grega ou a romana, em sua aplicação
ao presente. Com a proposição de tal aporte, mostra-se que a China tem histórico nas
RI como centro do poder internacional capaz de gerar uma ordem moral e legítima.
Os diálogos que o autor estabelece com bases ontológicas, principalmente da área
da Ciência Política, permitem a singularização de sua contribuição como um trabalho
que parte de referências filosóficas distintas das quais foram utilizadas para a
fundação da área de RI. Enquanto afirma-se que a base da política Ocidental tem sido
a pressuposição da existência de opostos conflitantes, o autor destaca a natureza, a
priori, harmônica dos opostos e a possibilidade de constituição de uma ordem
internacional holística tendo o mundo e não os Estados como unidade política. Em
alguma medida, a contribuição que o autor faz para a análise das relações
internacionais aproxima-se da de autores da Teoria Crítica e do Pós-Modernismo
como Andrew Linklater e Robert Walker, que também questionam a fundação
moderna das RI.
Em comum entre as três abordagens apresentadas o que pode indicar
algumas características básicas de uma possível escola chinesa das RI partem da
história e da filosofia chinesa como base para a teorização e destacam a importância
de aspectos não materiais para a análise das RI. Os trabalhos de Zhao e Qin
convergem para uma base ontológica na qual se pressupõe a existência da harmonia
(em contraposição ao conflito, destacado no geral por muitas referências tradicionais
das RI) e, portanto, abrem mais espaço para possibilidades de construção da paz.
Embora o trabalho de Yan não parta dessa mesma ontologia, o autor considera como
parte de um projeto de paz para a RI o atributo da moral, fator também inerente a
filosofia chinesa.
No entanto, ainda existem aspectos que podem dificultar o desenvolvimento da
Escola Chinesa. No trabalho de Yan, a importância das contribuições ocidentais em
seu arcabouço teórico dificulta sua designação como um projeto propriamente chinês
e a intenção de vincular arcabouços ocidentais com chineses reduz e simplifica
demais as contribuições chinesas. No caso de Zaho e Qin, suas abordagens devem
trabalhar no sentido de construir um arcabouço teórico mais integrado no qual seja
possível visualizar formas de aplicação da teoria, ou pelo menos se esclareça melhor
as variáveis de análise.
De todo modo, um aspecto importante que essas as abordagens teóricas fora
dos centros teórico-políticos tradicionais estimulam é a introdução de narrativas
alternativas, contrastando historiografias e conceitos estabelecidos na disciplina
com novas visões. Assim, as propostas teóricas não anglo-saxônicas e eurocêntricas,
especialmente aquelas feitas a partir do crescente centro de poder internacional que
é a Ásia, são ferramentas essenciais para analisar ordens alternativas do mundo
propostas por estados emergentes, como evidenciado aqui no caso da China.
Especificamente, a estreita relação entre líderes políticos e acadêmicos chineses gera
um diálogo ainda maior entre a prática política e a teoria do que em outros países.
Dessa forma, os aportes teóricos tentam, por um lado, explicar a emergência da China
no atual sistema internacional e aqueles conceitos que os líderes chineses
desenvolveram ao longo desse processo (como liderança moral, apenas para citar
um). Por outro lado, alguns problemas destacados da academia têm uma influência
notável nos círculos de poder do Partido Comunista Chinês.
A exploração dessas três abordagens do Movimento Escola Chinesa nas
Relações Internacionais evidencia a efervescência teórica de acadêmicos periféricos,
que, no entanto, ainda tem um longo caminho a percorrer na construção de
contribuições teóricas que poderão fazer sentido para fora da China. No caso
específico das contribuições chinesas, é importante que a academia estabeleça
claramente o objetivo desses trabalhos teóricos, decidindo se avança para uma
perspectiva diferenciada no estilo das teorias pós-coloniais ou feministas, ou se
direcionar a estabelecer laços com os quadros teóricos predominantes.
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Article
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O estudo de relações internacionais na China tem avançado nos últimos anos com a crescente importância do país no cenário mundial. Cresceram esforços para criar um corpo teórico essencialmente chinês e que reflita sua cultura e filosofia tradicionais, dando forma ao Movimento Escola Chinesa. Há consenso sobre as prováveis origens históricas dessa nova teoria chinesa de relações internacionais e proposições como realismo moral, teoria relacional e sistema “tianxia” atraem crescente atenção, mas não oferecerem ainda modelo alternativo e inovador. A superação desses obstáculos passa pela correção de limitações organizacionais, acadêmicas e teóricas que persistem nas universidades locais.
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Leadership and the Rise of Great Powers received 16 book reviews within 6 months of its publication. Among them, the one by Professor Rajesh Rajagopalan (which appeared in the India Quarterly, 75:3) is the most academically and theoretically compelling. I highly appreciate his sincere theoretical critiques that encourage me to rethink my theory. His review inspired me to have a written conversation with him about the epistemology of the international relations (IR) theory of moral realism.
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The development of International Relations theory (IRT) in China has been framed by three debates since 1979. The first was about China's opening up to the outside world. It started with the question of whether the world was characterized by 'war and revolution' or 'peace and development' between orthodox and reformist scholars and continued to focus on China's interest between orthodox scholars and the newly rising Chinese realists. It resulted in a wide acceptance of the reformist argument that peace and development characterized our era and of the realist view that China was a normal nation-state and should have its own legitimate national interest. The second started in the early 1990s and centered on the better way of realizing China's national interest. It was between Chinese realists and liberals. While the former emphasized national power, the latter proposed the alternative approach of international institutions. The third debate was on China's peaceful rise. It evolved at the turn of the century, when all the three major American IRTs, realism, liberalism, and constructivism, had been introduced into China and therefore the debate was more a tripartite contention. Realists believed that it was impossible for any major power to rise peacefully, while liberals and constructivists both supported the peaceful-rise argument. Liberals stressed more the tangible benefits derived from international institutions and constructivists explored more China's identity in its increasing interaction with international society. Although it was Chinese constructivists who explicitly discussed the identity issue, all the three debates and all the debating sides have reflected this century puzzle since the Opium War - China's identity vis-à-vis international society. These debates have helped push forward the IRT development in China and at the same time established Western IRT as the dominant discourse. A new round of debate seems likely to occur and may center on the question of the world order. This time it may help the newly burgeoning but highly dynamic Chinese IRT to develop and contribute to the enrichment of IRT as knowledge of human life. © The author [2011]. Published by Oxford University Press in association with the Japan Association of International Relations; all rights reserved.
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China's rapidly proliferating global interests and evolving political environment have begun to change the international and domestic context for its foreign policy-making. This article explores the changing inputs into and processes associated with foreign policy-making in China today. It does this by analysing the shifting fortunes of “peaceful rise,” one of the first new foreign policy concepts to be introduced under the Hu Jintao administration. The authors draw several implications from this narrow debate for understanding contemporary foreign policy-making in China. It provides an example of how new foreign policy ideas and strategies can come from outside the formal, central government bureaucracy, and underscores the growing relevance of think-tank analysts and university-based scholars. Finally, the authors argue that the Chinese leadership's decision to eschew “peaceful rise” in favour of “peaceful development” was fundamentally a question of terminology and thus preserved China's strategy of reassuring other nations.
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This Key Concepts pivot discusses the contemporary relevance of the ancient Chinese concept of Tianxia or ‘All-Under-Heaven’ and argues the case for a new global political philosophy. ‘All-under-heaven’ is a conceptualization of the world as the composition of three realms: the physical, psychological and political, which places inclusivity and harmony at the heart of a global world view above other considerations, transcending the notion of nation state. In a highly interconnected and globalized world, the idea of Tianxia can offer a new 21st century vision of international relations and world order, based on a harmonized global organization defined by the “all-inclusiveness principle.” Promoting the ontology of co-existence and relational rationality hand in hand with rational risk aversion in a globalized world, this pivot makes the case that Tianxia could offer a new vision for contemporary world order, redefining the universality and legitimacy of politics.
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This article develops a cultural approach to international theorizing. It argues that a cultural community is the prototype of a community of practice and where, therefore, shared background knowledge plays a significant role in knowledge production and theoretical innovation, because theorists are cultural beings sharing the background of the community in which they live and practice. Social theory, thus, bears the indelible cultural imprints of that community. It correctly aims to be universal but can at best achieve bounded universality. Two cases are used to illustrate the cultural approach: the 'implicit permeation' typical of Western (international relations) international relations theories, which are inspired by key elements of Western culture, history, and practice and the 'explicit penetration' of Chinese IR theories, which rely explicitly on Chinese cultural resources for information and enlightenment. Three Chinese IR theories-Yan Xuetong's moral realism, Zhao Tingyang's Tianxia system, and Qin Yaqing's relational theory-are discussed as specific examples. The cultural approach is both essential and effective for the development of non-Western IR theories. Taking a pluralistic approach, the article also argues for the recognition of a multiverse of knowledge and for the encouragement of non- Western IR theories to grow and engage Western IR theories in a constructive dialog toward reciprocal empowerment. A significant development upon the discipline's centenary would, perhaps, be the rise of a truly global IR project whose hallmark is the growth of non-Western IR theories. © The Author(s) 2018. Published by Oxford University Press on behalf of The Institute of International Relations, Tsinghua University. All rights reserved.
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30年来兴起的的西方国际关系理论三大主流学派——结构现实主义、新自由制度 主义和结构建构主义——有一个共同的缺失,这就是忽视对国际体系过程和国际社会 中复杂关系的研究。本文针对这一重要缺失,借鉴主流建构主义,将“过程”和“关 系”这两个中国文化中的重要理念植入国际关系理论,提出一个过程建构主义的理论 模式。论文将过程定义为运动中的关系,论证了过程的自在性、过程动力和过程在国 际关系中的作用。过程的核心是关系。如果说西方个体本位的社会性质的核心理念是“理性”,那么中国社会文化的一个根本理念则是“关系”。将这个理念挖掘出来并 进行概念化处理,依此确立过程建构主义“关系本位”的基本假定。同时,过程建构 主义还认为,国际社会中的关系网络确定国家身份并孕化国际权力。过程建构主义是 体系层次的进化理论,将分析重点置于国家之间的互动实践,强调过程的自在性以及 对国际规范、国家身份和认同的建构作用。 关键词: 国际关系理论 过程建构主义 关系性 国际规范 国家身份认同 The three mainstream International Relations theories that have arisen in the past thirty years, structural realism, neo‐liberal institutionalism and structural constructivism, have all missed an important dimension, i.e., the study of processes in the international system and of relational complexity in international society. This paper, informed by social constructivism and Chinese philosophical traditions, aims to make up for this missing link and develop a theoretical model of processual constructivism by incorporating and conceptualizing two key Chinese ideas – processes and relations. “Process,” defined as relations in motion, can stand on its own, has its own dynamics, and plays a crucial role in international relations. The core of process, by definition, consists in relations. If “rationality,” rooted in individuality, has been a key concept for Western society, then its counterpart in Chinese society can be “relationality.” Conceptualizing relationality and treating it as the theoretical hard core, processual constructivism holds that relational networking in international society helps nation‐states form their identities and produces international power. Processual constructivism is an evolution theory at systemic level, focusing on interactive practices among states and emphasizing the independent ontology of social processes which play a meaningful role in constructing international norms and state identities.
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Two criticisms have long been directed at the theorization of international relations (IR): ahistoricism and Eurocentrism. Westphalia, it is argued, has been so stigmatized that it has become synonymous with the beginning as well as the end of what we understand as international relations. Rationalist theorizing in general, of both the neorealist and neoliberal persuasions, has produced a set of deductive theories that aim and claim to transcend history.