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Abstract

Em 1822, em sentido estrito, havia somente um banco no país, o Banco do Brasil. O primeiro objetivo deste artigo foi avaliar, por meio de relatórios do Ministério da Fazenda, sua atuação como fornecedor de crédito ao governo desde a Independência até sua extinção em 1829. Num segundo momento, analisou--se o que disse a imprensa da corte sobre os negócios bancários no contexto da emancipação política. A pesquisa mostrou que, na altura da Independência, embora os bancos não tenham sido protagonistas da expansão do mercado de crédito no país, o Banco do Brasil cumpriu uma importante função no financiamento do gasto público e na consolidação da Independência. Desse modo, o artigo procurou contribuir para esclarecer o papel do banco no financiamento dos gastos públicos depois da Independência e captar, pela imprensa, o efeito de seus desdobramentos políticos sobre a confiança na instituição.
A Independência e o banco,
Brasil 1821-1829
Thiago Fontelas Rosado Gambi
Pieter Gotfred Bertichem/Domínio público/ Wikimedia Commons
Foto: Marco Túlio Frei re Baptista/D omínio público/ W ikimedia Commo ns
resumo
Em 1822, em sentido estrito, havia
somente um banco no país, o Banco do
Brasil. O primeiro objetivo deste artigo
foi avaliar, por meio de relatórios do
Ministério da Fazenda, sua atuação como
fornecedor de crédito ao governo desde
a Independência até sua extinção em
1829. Num segundo momento, analisou-
-se o que disse a imprensa da corte sobre
os negócios bancários no contexto da
emancipação política. A pesquisa mostrou
que, na altura da Independência, embora
os bancos não tenham sido protagonistas
da expansão do mercado de crédito no
país, o Banco do Brasil cumpriu uma
importante função no financiamento
do gasto público e na consolidação da
Independência. Desse modo, o artigo
procurou contribuir para esclarecer o
papel do banco no nanciamento dos
gastos públicos depois da Independência
e captar, pela imprensa, o efeito de
seus desdobramentos políticos sobre a
conança na instituição.
Palavras-chave: bancos; crédito; Banco
do Brasil; Independência.
abstract
Strictly speaking, in 1822 there was only one
bank in the country, the Banco do Brasil.
The rst goal of this article was to evaluate,
through reports of the Ministry of Finance,
its performance as a credit supplier to the
government from Independence until its
extinction in 1829. In a second moment, it
was analyzed what the court's press said
about the banking business in the context
of political emancipation. The research
showed that, during the Independence
period, although banks were not the
main players in the expansion of the credit
market in the country, Banco do Brasil
played an important role in financing
public spending and in the Independence
consolidation. Thus, the article sought
to contribute to clarifying the role of
the bank in financing public spending
after Independence and to understand,
through the press, the eect of its political
developments on trust in the institution.
Keywords: banks; credit; Banco do Brasil;
Independence.
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N
a altura da Independência,
o Brasil contava com
apenas uma instituição
bancária, o Banco do
Brasil, fundado ainda
em 1808. Os primór-
dios da história desse
banco, cuja extinção se
dará alguns anos depois
da Independência, em
1829, são curiosos pelo
menos por três aspec-
tos. Primeiro, porque
foi criado mais ou menos simultaneamente
aos chamados “bancos nacionais” de países
europeus e dos Estados Unidos. O da ex-
-colônia do Norte foi criado ainda no nal
do século XVIII e os de diversos países euro-
peus, como França e Bélgica, foram apare-
cendo na primeira metade do século XIX.
Não deixa de ser surpreendente que o Brasil
tenha acompanhado, pelo menos de partida, a
formação desses bancos em países com eco-
nomias relativamente mais desenvolvidas. O
segundo aspecto inusitado é o fato de ser uma
instituição monetária e creditícia concebida
para ser a mais importante de todo o Império
português e, portanto, esperava-se concretizá-
-la em solo lusitano. Mas os irônicos ventos
da história sopraram sua construção para a
colônia, xando-a no Rio de Janeiro em vez
de Lisboa. E o terceiro remete a uma quebra
da sequência lógica esperada numa relação
entre metrópole e colônia, isto é, o Banco de
Lisboa, a instituição bancária metropolitana,
foi criado somente em 1821, bastante tempo
depois de sua congênere colonial. Em outras
palavras, ao contrário do esperado, a primazia
nesse caso foi da colônia e não da metrópole.
Esses três curiosos aspectos nos levam a
pensar, com razão, em certa precocidade da
atividade bancária no Brasil, uma colônia que
se adiantava à metrópole e se colocava na
proa do desenvolvimento nanceiro da época,
THIAGO FONTELAS ROSADO GAMBI é professor
da Universidade Federal de Alfenas (Unifal-MG).
O autor agradece os comentários de Yolanda Blasco-
-Martel e o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de Minas Gerais (Fapemig).
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mas o país perdeu o passo. Sem desmerecer
a importante experiência do primeiro Banco
do Brasil, é preciso considerar o contexto
econômico em que se inseria, a partir do
qual já se poderia vislumbrar que o país em
inusitada posição de proa no desenvolvimento
nanceiro paulatinamente escorregaria para
um lugar na popa. Em meados do século
XIX, Souza Franco (1848, p. 25) compa-
rava a miséria bancária do Rio de Janeiro
à miríade de bancos de Nova York. Assim
como em diversos países da América Latina,
o deslanchar dessas instituições no Brasil
se daria apenas no último quartel daquele
século (Marichal, mimeo.).
O fato da precoce criação de um banco
no Brasil não ter resultado, posteriormente,
em desenvolvimento nanceiro pode ser em
parte explicado pelas circunstâncias históricas
acidentais que resultaram na fundação de um
banco português no Brasil, ou seja, o Banco
do Brasil não foi criado como expressão de
uma demanda da economia por moeda e
crédito, embora não tenha deixado de auxiliá-
-la nesse sentido, mas principalmente como
um instrumento para nanciar as despesas
da corte transferida para o país diante da
invasão francesa em 1808.
O objetivo de nanciar o Estado não deve
ser visto como um problema em si mesmo.
Não era raro encontrar bancos nacionais
atuando dessa maneira em outros países. O
Banco do Brasil também era uma instituição
emissora de notas bancárias conversíveis em
metal, isto é, seus portadores poderiam trocá-
-las, à vontade, quando quisessem, pelo mon-
tante equivalente em metal. Tampouco havia
novidade nesse aspecto, pois era comum à
época a adoção da moeda metálica ou do
papel-moeda conversível em metal nos países
mais desenvolvidos nanceiramente.
A emissão de notas conversíveis o obri-
gava a manter certa relação entre suas emis-
sões e suas reservas em metal. Evidente-
mente, se houvesse um aumento da emissão,
a reserva em metal deveria acompanhá-lo. O
problema aparecia quando havia uma despro-
porção signicativa entre emissões e reserva
metálica a ponto de comprometer a conversão
das notas em metal.
Essa breve explicação facilita compre-
ender a relação entre a despesa pública e a
emissão do Banco do Brasil. Se a primeira
era nanciada, ainda que parcialmente, pela
segunda, o crescimento da despesa pública
pressionava o aumento da emissão. E se a
reserva metálica do banco não acompanhasse
esse movimento, a conversibilidade de suas
notas e, consequentemente, sua credibilidade
seriam ameaçadas. Dada a relação muito
próxima entre o governo e o banco, caberia
questionar a inuência de uma situação de
instabilidade política como a da Independên-
cia sobre a conança na instituição.
A conança é um ativo fundamental para
qualquer banco. No caso de bancos de emis-
são, sua perda poderia implicar corridas pela
conversão, levando-os, no limite, à falência.
É verdade que o Banco do Brasil passou por
situações delicadas desse tipo ainda antes
da Independência, especialmente em 1818
e 1821, como veremos adiante. Se nesses
contextos a conança do público no banco
já parecia esmorecer, a circunstância política
de 1822 poderia levar portadores de suas
notas a uma desconança nal.
Contudo, não foi o que aconteceu. Se
não houve uma profunda ruptura econômica,
política e social entre a colônia e a Inde-
pendência, tampouco a situação do banco se
alterou signicativamente com a emancipa-
ção. Apesar de fragilizado, ele se manteve
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ativo até sua extinção e continuou a cumprir
um importante papel no nanciamento das
despesas do país recém-independente.
Portanto, o artigo tem como objetivo
mostrar, por meio de relatórios do Minis-
tério da Fazenda, a importância do Banco do
Brasil no nanciamento do governo durante
o processo de Independência e captar, por
meio da imprensa, a inuência desse pro-
cesso sobre a conança na instituição. Ele
está organizado em três seções. A primeira
procura caracterizar o crédito no Rio de
Janeiro à época da Independência, com o
intuito de compreender o papel e o funcio-
namento do banco na economia colonial. Se
não havia bancos, além do Banco do Brasil,
como funcionava o mercado de empréstimos
na então capital do Império português? A
segunda seção aborda, por meio dos rela-
tórios do Ministério da Fazenda, o papel
do Banco do Brasil nos anos anteriores e
posteriores à emancipação. Qual foi, anal,
sua função no processo de Independência?
Uma vez compreendido o papel do banco,
passamos a analisar como ele apareceu na
imprensa por volta de 1822, a m de ava-
liar a conança do público no banco num
contexto de instabilidade política. Diante
da perspectiva da Independência, o que a
imprensa publicava sobre o Banco do Brasil?
O CRÉDITO NA CORTE
E O CRÉDITO DO BANCO
Se na altura da Independência o país
contava com um único banco formalmente
constituído, o Banco do Brasil, não sur-
preende que uma parcela signicativa dos
empréstimos feitos na corte, num Rio de
Janeiro que experimentava uma expansão da
população e do mercado de consumo desde
a chegada da família real e da abertura dos
portos, estivesse associada a indivíduos, casas
comerciais e outras instituições não bancá-
rias (Ryan Jr., 2007, pp. 78-9).
O primeiro Banco do Brasil foi extinto
em 1829. Depois dele, outros bancos priva-
dos surgiram somente na segunda metade
da década de 1830 e, especialmente, nas
décadas de 1840 e 1850. Mesmo assim não
eram muitos e essa escassez de bancos, de
acordo com Ryan Jr. (2007, p. 89) e Penna
(2019, p. 308), não impediu a expansão do
mercado de crédito na cidade do Rio de
Janeiro, principal praça comercial do país,
entre 1820 e 1860. Nesse período, o número
de contratos na corte cresceu de 110 para
508 e o valor total dos empréstimos saltou
de 45 mil para 737,5 mil libras. Na primeira
metade do século XIX, o crescimento popu-
lacional e da economia teriam induzido a
formação da demanda que alavancou as tran-
sações creditícias, prescindindo da existência
de bancos. Tal desempenho levou o autor a
concluir que o caso do Rio de Janeiro no
século XIX desaa a concepção segundo a
qual os bancos seriam uma condição para
o desenvolvimento do mercado de crédito
(Ryan Jr., 2007, p. 93).
Como mencionado, o mercado de cré-
dito no Rio de Janeiro era marcado, na
verdade, pela predominância dos emprésti-
mos individuais, especialmente associados
a comerciantes. Para ilustrar, a análise das
ações de execução entre 1821 e 1850, feita
por Piñeiro e Saraiva (2014, p. 140), mostra
a presença maciça desse grupo entre cre-
dores e devedores envolvidos com a jus-
tiça. Os comerciantes costumavam manter
relações de crédito entre si, seja por meio
da concessão de prazos para o pagamento
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de mercadorias, seja por intermédio de
instrumentos financeiros, como as usuais
letras de câmbio e letras da terra1, e tam-
bém empréstimos mútuos e cauções. Além
do crédito interpessoal, é preciso lembrar
ainda a atuação na oferta de empréstimos
de instituições como o Juízo dos Órfãos,
Santas Casas, companhias de seguros e
caixas econômicas (Aidar, 2020, p. 245;
Penna, 2019; Saraiva & Alvarenga, 2017;
Marcondes, 2014, p. 750; Piñeiro & Saraiva,
2014, p. 137; Gorenstein, 1993, p. 143).
Ao analisar o crédito na província da
Bahia, Mattoso (1992, pp. 509-10) chegou
a uma conclusão parecida com a do estudo
de Ryan Jr. para o Rio de Janeiro, ou seja,
graças àqueles instrumentos financeiros e
às relações individuais, com destaque para
as transações entre comerciantes, o mer-
cado de crédito e o “mundo do comércio”
prosperaram na província mesmo sem o
protagonismo de instituições formais de
crédito, como os bancos.
Na avaliação de Gorenstein (1993, p.
145), o comércio e, por extensão, as rela-
ções de crédito passaram por uma rede-
finição com a Independência em que as
velhas práticas coloniais, sem resistir às
mudanças, a elas se adaptaram. Assim,
práticas coloniais permaneceram nas rela-
ções de crédito e mantiveram espaço para
a ascensão social pelo contato com mem-
bros da corte e do governo.
Era esse, aproximadamente, o cenário
do crédito no Brasil da Independência, um
mercado de alcance local, predominante-
mente informal, com laços estreitos com o
comércio e sustentado por relações pessoais.
Se o crédito se expandiu com a ampliação
do mercado consumidor e a modernização
dos instrumentos financeiros, por outro lado,
mantiveram-se as relações informais e pes-
soais nesse tipo de transação, com o peso
da herança colonial deixada pela presença
da corte e do governo no país.
Essas considerações nos fazem pensar
sobre o caráter do desenvolvimento do mer-
cado de crédito no Brasil na primeira metade
do século XIX. Como mostraram Ryan Jr.
e Mattoso, parece indiscutível a expansão
quantitativa desse mercado no período, seja
em número de contratos, seja em termos de
valores. Contudo, a quase ausência do cré-
dito institucional, mais especicamente, do
crédito bancário, pode ajudar a explicar a
permanência de características de um mer-
cado pouco desenvolvido baseado em rela-
ções pessoais, com prazos curtos e baixo
valor médio de empréstimos, além de ele-
vadas taxas de juros (Aidar, 2020, p. 260;
Ryan Jr., 2007, p. 99).
Alternativamente, Summerhill (2015, p.
217) debita o baixo desenvolvimento de ins-
tituições privadas de crédito no país durante
o Império na conta de um Estado que soube
construir um importante mercado de dívida
pública e, ao mesmo tempo, restringir a for-
mação de instituições privadas capazes de
fazer orescer as nanças. Por isso, o Brasil
não teria seguido a trilha virtuosa do desen-
volvimento nanceiro proposta por North
e Weingast (1989, p. 825), segundo a qual
a imposição de limites ao poder estatal e
a consequente ascensão do crédito público
seriam seguidas pelo desabrochar dos mer-
cados nanceiros privados.
Qual seria, então, o papel do Banco do
Brasil no mercado de crédito da corte? Um
dos pontos fundamentais da tese de Ryan Jr.
1 Para letra de câmbio, cf. Corrêa (2020).
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sobre o crédito no Rio de Janeiro no século
XIX é que os bancos brasileiros dessa época
surgiram como complemento, e não como
substitutos, do mercado de crédito não ban-
cário. Em relação ao crédito privado, esse
parece ter sido também o papel do primeiro
Banco do Brasil. Para ilustrar, seu balanço
de março de 1821 revela mais de 3 mil con-
tos em dívidas de particulares, um montante
signicativo, embora bem mais modesto do
que os quase 9 mil contos em notas emitidas
e em circulação (Lisboa, 1821). Do mesmo
modo, se tomarmos seus lucros no ano de
1822, veremos que, aproximadamente, 99
contos se deveram a operações com par-
ticulares – desconto de letras e prêmio de
dívida –, enquanto quase 320 contos se refe-
riram a operações com o governo – prêmio
da dívida do Tesouro (O Espelho, ed. 129,
11/02/1823, pp. 1-2).
Esses dados indicam com clareza o des-
compasso entre as operações realizadas com
particulares e com o governo. Na verdade, na
época da Independência, mas não só, também
antes e depois dela, o negócio do banco era
mesmo com o governo. Embora tenha atuado
no crédito particular, seu papel principal foi
nanciar o gasto público, atuação essencial
para consolidar a Independência brasileira.
O BANCO, O TESOURO
E A INDEPENDÊNCIA
A situação do Tesouro no início da década
de 1820 não era das mais promissoras. Pouco
menos de um ano antes da Independência, em
21 de setembro de 1821, d. Pedro escrevia ao
pai, num tom quase desesperado, dizendo não
haver dinheiro para pagar as contas e não
saber o que fazer (Correspondência, 1872,
p. 10). Nogueira da Gama, futuro Marquês
de Baependi e importante personagem na
construção da Independência, foi escrivão do
Tesouro e, posteriormente, em 1823, ministro
da Fazenda de d. Pedro, sucedendo a Mar-
tim Francisco. Em seu relatório sobre as
nanças públicas desse período indicava a
necessidade, por parte do Tesouro, de honrar
seus pagamentos e, ao mesmo tempo, a fra-
gilidade das contas públicas que ameaçava
o cumprimento dessas obrigações.
Algo precisava ser feito e as alternati-
vas não eram muitas. Não se podia contar
com recursos enviados pelas províncias, pois
algumas enfrentavam seus próprios proble-
mas financeiros e outras ainda resistiam
à Independência; tampouco seria prudente
aumentar a carga de impostos em tão con-
turbado contexto político. Era o que dizia
o relatório da Comissão de Fazenda da
Câmara, publicado em maio de 1822, ao
analisar o estado do Tesouro (Carreira, 1889,
p. 82). Sobraria a alternativa de recorrer a
um empréstimo, mas quem se habilitaria
a emprestar recursos a um devedor reco-
nhecidamente em dificuldades financeiras?
Restava, ainda, apelar ao Banco do Brasil.
É sabido que, quando criado, uma de
suas finalidades explícitas era justamente
financiar o gasto público. Ao mesmo tempo,
como instituição emissora, deveria se equi-
librar para atender à demanda do governo,
de seus clientes privados e, simultaneamente,
garantir a conversibilidade de suas notas em
metal, ao portador e à vista. O equilíbrio
se manteve durante o primeiro decênio de
seu funcionamento, construindo a confiança
do público em suas notas. Entretanto, em
1818, começaram as dificuldades que con-
tribuíram para levá-lo à extinção (Andrada,
1923, p. 12). O Gráfico 1 mostra o compor-
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tamento das emissões do Banco do Brasil
entre 1810 e 1829.
É possível notar que, desde 1818, além de
emitir notas continuamente até 1829, numa
média de 2.200 contos anuais, a retirada de
notas de circulação permaneceu quase sem-
pre abaixo da emissão, com exceção dos anos
de 1821, 1828 e 1829. Consequentemente, a
emissão de notas em circulação assumiu uma
trajetória ascendente praticamente ininter-
rupta até a extinção do banco. Essas infor-
mações por si sós não são sucientes para
mostrar a diculdade com a conversão de
suas notas e, por conseguinte, com a perda
de conança que levava à sua desvalorização
em relação ao metal. Contudo, o aumento
signicativo da emissão em circulação sina-
lizava problema, como ilustra o Gráco 2.
Se considerarmos a soma do capital e do
fundo de reserva como os recursos disponí-
veis para fazer frente à conversibilidade da
emissão em circulação, enxergamos melhor o
problema do banco ao constatar a amplitude
cada vez maior entre as duas curvas. Além
disso, se tomarmos a razão entre a emissão
em circulação e os recursos disponíveis, per-
cebemos depois de 1818 que ela permanece
muito próxima ou acima do triplo, limite de
segurança para se garantir a conversibilidade.
Mas qual seria a relação entre a diculdade
do banco em manter a conversibilidade de
suas notas e o aperto do Tesouro?
Bem, se no início da década de 1820 a
situação das contas públicas não era boa, a
do Banco do Brasil também inspirava cui-
dados, já que ambos estavam estreitamente
vinculados por laços de crédito. Por isso,
na mesma carta referida acima, d. Pedro
fez uma sombria previsão segundo a qual
“a província vai estourar logo que o banco,
o tísico banco, que é o meu termômetro,
GRÁFICO 1
Emissão, emissão em circulação e resgate de notas
do Banco do Brasil (1810-29) – em contos de réis
Fonte: Brasil (1860, Annexo B)
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estiver com o dinheiro exausto (que para
isso não faltam nem quatro meses, pelos
passos gigantescos com que ele marcha para
a cova, aberta pelos seus dilapidadores); ele
de todo já não tem nem ouro nem prata,
e só sim algum cobre [...] por consequên-
cia, como não tem crédito nem com que
o alcance, os seus bilhetes valem muito
pouco, ou quase nada” (Correspondência,
1872, p. 10, grifo nosso).
Nessa passagem, o então regente parece
associar a fragilidade do banco à sua má
administração2, sem lembrar a dívida do
Tesouro com a instituição. Porém, aí está a
relação: o aumento da emissão, especialmente
a partir de 1818, estava associado em boa
medida à necessidade de nanciamento dos
gastos públicos. Em suas Reexões sobre o
Banco do Brasil oferecidas aos seus acionis-
tas, opúsculo publicado por volta de março
de 1821, José Antonio Lisboa mostrou que
a dívida do Tesouro com o banco montava
a aproximadamente 4.800 contos diante de
um ativo total de cerca de 13.700 contos.
A análise foi escrita depois do decreto
de 7 de março que informou o retorno de
d. João a Portugal e causou uma corrida ao
banco. Assim, o texto em favor da instituição
era uma maneira de mitigar a desconança
do público. Ademais, dizia Lisboa (1821, p.
14), até aquele momento não havia informa-
ção clara sobre o banco, sequer se sabia ao
certo o volume de suas emissões. Por isso, o
recém-nomeado deputado da Junta coletou o
balanço de março de 1821 para tentar mos-
GRÁFICO 2
Fonte: Brasil (1860, Annexo B)
Banco do Brasil: capital + fundo de reserva x emissão
em circulação (1810-29) – em contos de réis
2 A má administração do banco, especialmente até
1821, é tratada em Lisboa (1821) e Sampaio (1821) e
mencionada no relatório do Ministério da Fazenda de
1827 (apud Franco, 1848, p. 14). Cf. também Franco
(1848, pp. 12-5) e Cardoso (2010, p. 177).
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trar justamente a solvabilidade do estabele-
cimento, aliás, ele avaliava que, apesar de
diculdades conjunturais, o banco teria uma
posição até vantajosa (Lisboa, 1821, p. 16).
Ora, dizia o dono das reexões, para o
Banco do Brasil garantir a conversão de sua
emissão bastava ao Tesouro e às estações
públicas pagarem suas dívidas. Lisboa pen-
durou seu argumento na conança do cré-
dito público: um particular poderia falhar
um pagamento de repente, mas o Tesouro
público jamais poderia se encontrar nessas
circunstâncias e, se a nação era solvável,
o banco também o era. Por isso pergun-
tava, em tom encorajador: “Quem pode pois
recear que o Banco do Brasil deixe de ser
pago dos empréstimos e suprimentos que
tem feito ao Tesouro Público?” (Lisboa,
1821, pp. 17-9). Era evidente, porém, que o
governo não tinha como saldar essa dívida
(Sampaio, 1821, p. 7).
Por isso, Souza Franco recearia. Em
sua obra sobre os bancos do Brasil, publi-
cada em 1848, partiu do trabalho de José
Antonio Lisboa para avaliar a situação do
banco e apontou que a razão entre a emis-
são e o fundo de capital excedia em muito
o triplo3. Mas não só: ao considerar como
crédito os efeitos em carteira e o caixa, e
como débito a emissão, saques, depósitos
e letras a pagar, percebeu um saldo contra
o banco de pouco mais de 6 mil contos.
Sua conclusão era de que, mesmo quitada
a dívida do Tesouro, o banco não conse-
guiria garantir a conversibilidade de suas
notas e, portanto, estava insolvente já em
1821, ao contrário do que dizia o deputado
da Junta. O cerne do problema estaria jus-
tamente no aumento excessivo da emissão,
na medida em que, em sua visão, o banco
deixou de ser um financiador do comércio
para se tornar mera caixa suplementar do
Tesouro (Franco, 1848, pp. 9-12).
A queda contínua da subscrição de ações
a partir de 1818 parece corroborar essa
análise e, nesse caso, o processo político –
retorno de d. João e Independência – parece
ter inuenciado negativamente a conança
do público no banco, pois foram 20 ações
subscritas em 1821 e apenas 13 em 1822,
conforme mostra o Gráco 3.
Mesmo d. Pedro, em seu manifesto aos
governos e nações amigas, de agosto de
1822, não parecia nutrir muita esperança
de quitar a dívida com o banco enquanto
dependesse da cortes de Lisboa. Segundo
o príncipe regente, elas sabiam
“que o Brasil estava esmagado pela imensa
divida do Tesouro ao seu Banco Nacional,
e que, se este viesse a falir, de certo inu-
meráveis famílias ficariam arruinadas, ou
reduzidas à total indigência. Este objeto
era da maior urgência; todavia nunca o
credito deste Banco lhes deveu a menor
atenção; antes parece que se empenhavam
com todo o esmero em dar-lhe o último
golpe” (Egas, 1916, p. 146).
Seja na apreciação otimista de Lisboa,
na análise cética de Souza Franco ou na
crítica de d. Pedro às cortes, cava evidente
o problema que entrelaçava a necessidade de
recursos por parte do governo, sua dívida
3 Em sua análise da conversibilidade, Souza Franco
considerou o fundo de capital do banco apenas como
o capital e o fundo de reserva, deixando de fora a re-
ceita decorrente do alvará de 1812. Se a considerasse,
a razão caria pouco abaixo de 3, conforme mostrou
o Gráco 2. O alvará de 20 de outubro de 1812 esta-
beleceu um imposto sobre seges, lojas e embarcações
para o fundo de capital do Banco do Brasil.
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com o banco e as emissões. Esse entrelaça-
mento estava na raiz do seu descrédito e da
desvalorização de suas notas no mercado,
e teria se tornado crônico a partir de 1818,
desde antes da Independência (Say, 1839, p.
93; Franco, 1979, p. 66).
Por isso, em sua obra, Souza Franco
(1848, p. 11) foi assertivo em refutar a tese
de que os gastos decorrentes da Indepen-
dência teriam sido a causa das dificuldades
do banco. Embora seja inegável a manuten-
ção da trajetória ascendente das emissões
depois da emancipação, sua situação em
termos de garantia da conversibilidade era
frágil há algum tempo. Era de se esperar,
portanto, uma reação dos acionistas con-
trária a esse estado de coisas. Contudo, é
preciso considerar que o banco também era
favorecido em sua relação com o governo
(Lisboa, 1821, p. 12; Sampaio, 1821, p.
9). Pesavam ainda as relações pessoais de
crédito herdadas da colônia e os favores
prestados ao governo em troca de honrarias
e mercês (Aidar, 2018, p. 17). Além disso,
conforme ilustra o Gráfico 4, o pagamento
ascendente e certo de dividendos contri-
bui para explicar a débil resistência aos
pedidos do governo.
Como veremos, é possível inferir que boa
parte das emissões do banco realmente aca-
bou no Tesouro e se, por um lado, o fragi-
lizou, por outro, viabilizou o pagamento de
dividendos aos acionistas e o nanciamento
de diversos gastos públicos importantes para
consolidar a Independência, inclusive cam-
panhas militares. São diversos os analistas
que apontam essa relação entre o banco e o
nanciamento do gasto público. Souza Franco
assinalou a exigência nanceira, por parte
do Tesouro, em virtude da Independência
e avaliou, como há pouco mencionado, que
o banco havia se reduzido a mero fornece-
dor de recursos ao governo (Franco, 1848,
pp. 11-2). Castro Carreira (1889, p. 89), no
GRÁFICO 3
Fonte: Brasil (1860, Annexo B)
Subscrições de ações do Banco do Brasil, anual e acumulada (1809-29)
dossiê bicentenário da independência: economia
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alvorecer da República, ao analisar a fra-
gilidade das nanças do Tesouro em 1822,
armou que a intervenção do governo no
banco aumentava e este era arrastado por
uma “onda de desmoralização”. Historiadores
do banco como Freire (1907, p. 16), Viana
(1926, p. 119) e Franco (1979, pp. 93-4) indi-
caram suas emissões como fonte de recur-
sos do governo. Mais recentemente, Carrara
(2016, pp. 8 e 58) considerou o banco, ao
lado do erário, a coluna vertebral do novo
Estado brasileiro ao assegurar-lhe recursos
indispensáveis para sua sustentação nan-
ceira e armou que seus empréstimos eram
utilizados como recursos extrascais para
nanciar os mais variados tipos de despesa.
A exposição aos acionistas do banco de
1823, feita pelo seu então presidente José
Antonio Lisboa, corrobora essa informação.
Além de mencionar o suprimento de recur-
sos em montante equivalente ao que viria
das províncias, lembrou ainda que o banco
manteve as tropas portuguesas no Rio da
Prata mesmo quando o Tesouro de Lisboa
cortou os pagamentos em setembro de 1820.
Ao nal, José Antonio Lisboa manifestava o
desejo de que o Banco do Brasil se expan-
disse para todas as províncias do Império e
se tornasse “uma rme coluna do Estado”
(O Espelho, 1823, ed. 129, pp. 1-2).
Mas isso não chega a ser novidade, já que
essa era mesmo uma das nalidades do banco,
se não a mais importante. Coletar evidências
quantitativas desse nanciamento, por sua vez,
não é tarefa das mais fáceis, pois os relatórios
do Ministério da Fazenda e as informações
sobre o banco à época não eram bem organi-
zados, tampouco bem sistematizados ou con-
áveis, como atestam Nogueira da Gama sobre
o governo e o próprio José Antonio Lisboa
GRÁFICO 4
Fonte: Brasil (1860, Annexo B)
Banco do Brasil: dividendos líquidos por ação (1810-29) – em mil-réis
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137
sobre o banco. Apesar disso, o Gráco 5 tenta
relacionar a variação da dívida do Tesouro
com o banco e as suas emissões anuais, a m
de sugerir a associação dessas últimas com o
nanciamento do gasto público.
Carrara (2016, p. 60) já havia notado essa
relação entre os anos de 1816 e 1818. Em
sua análise, dos quase 2.500 contos emitidos
nesse período, 1.970 contos teriam entrado
no Tesouro como suprimento. Embora a
análise da documentação utilizada neste
trabalho não permita associar clara e ine-
quivocamente as emissões e os gastos por
ela financiados, a Tabela 1 mostra uma
importante participação da dívida com o
banco no total da dívida do Tesouro.
GRÁFICO 5
Fonte: Brasil (1823, pp. 30-2; 1826, p. 145; 1827, p. 15; 1860, Annexo B)
Variação da dívida do Tesouro com o Banco do Brasil,
emissões anuais e emissão em circulação – em mil-réis
Fonte: Brasil (1823, pp. 30-2; 1826, p. 145; 1827, p. 15)
TABELA 1
Dívida passiva do Tesouro (1822-29) – em mil-réis
Emissão Var. Dívida BB-Tesouro Emissão em circulação
dossiê bicentenário da independência: economia
Revista USPSão Paulo n. 132 • p. 125-148 • janeiro/fevereiro/março 2022
138
A evolução da dívida com o banco depois
de 1822 e sua participação de aproximada-
mente um terço do total da dívida passiva
do Tesouro sugerem a importância do banco
no nanciamento do gasto público, inclusive
das campanhas militares nas províncias onde
havia resistência à separação de Portugal
ou ao movimento de centralização política
promovido por d. Pedro. Lisboa (1821, p.
23) menciona numa nota de suas Reexões
o nanciamento de forças terrestres e marí-
timas no Rio da Prata e no Rio de Janeiro,
e Franco (1979, p. 110) arma que foram
utilizados recursos do banco para custear a
expedição do almirante Cochrane para com-
bater a chamada “Confederação do Equador”,
agitação política iniciada no Recife em 1824.
O relatório do Ministério da Fazenda de
1825, assinado por Nogueira da Gama, é
explícito ao elencar as despesas extraordi-
nárias exigidas pela conjuntura política a
partir de 1821. Esse tipo de despesa deveria
ser coberto com receitas também extraor-
dinárias, como os suprimentos feitos pelo
banco. Dizia o então ministro da Fazenda:
“Uma revolução no Brasil, a maior que se podia
imaginar, ocasionou sucessos assombrosos. Foi
necessário criar-se uma marinha de guerra,
um exército, combater e expulsar os lusitanos
armados do território brasileiro ao Norte e ao
Sul, subsidiar as províncias necessitadas com
armamento e dinheiro, expugnar a anarquia
que se apoderou de algumas e as assolou; fazer
expedições navais dispendiosas e, nalmente,
defender e suscitar a Causa Sagrada do Império
contra os seus numerosos inimigos internos e
externos” (Brasil, 1826, p. 126).
Essas palavras evidenciam a necessidade
de recursos para nanciar campanhas mili-
tares, a m de consolidar a Independência.
Nelas não aparece, todavia, o vínculo dessas
despesas com o banco. Ele surge, porém, no
relatório do Ministério da Fazenda do ano
seguinte, assinado por João Severiano Maciel
da Costa, Marquês de Queluz. Depois de
apresentar a diculdade de nanciar despe-
sas extraordinárias em ascensão, o ministro
dizia que o banco era o único fornecedor de
fundos para o governo, mas reclamava que o
Tesouro, além de pagar juros por eles, ainda
tinha que lidar com a enorme desvalorização
de suas notas, pois assim eram fornecidos
os recursos (Brasil, 1827, p. 3).
Ainda em 1824, as tropas do Sul, lidera-
das pelo português Frederico Lecor, Visconde
da Laguna, conseguiram retomar Montevidéu,
que havia sido capturada por insurgentes
éis às cortes de Lisboa. No ano seguinte
iniciou-se o conito pela independência do
Uruguai. Os relatórios do Ministério da
Fazenda trazem informações especícas
sobre a chamada Campanha da Cisplatina,
como mostra a Tabela 2.
Ainda que a Tabela 2 apresente dados
de orçamento, é possível inferir, junto às
evidências qualitativas apresentadas, a par-
ticipação do banco no seu nanciamento.
Freire (1907, p. 46) chega a armar que o
aumento da dívida do Tesouro se deveu à
guerra com o Uruguai e que quase toda a
despesa havia sido sustentada pelo banco.
Os dados apresentados nesta seção pro-
curaram evidenciar a importância do Banco
do Brasil para viabilizar nanceiramente a
aquisição da soberania política. No entanto,
ao fornecer os recursos necessários para con-
solidar a separação por meio de emissões
excessivas, comprometeu a conversibilidade
de suas notas e, por extensão, a sua reputa-
ção junto ao público. Se, de um lado, mesmo
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TABELA 2
depois da Independência o banco cumpriu
seu papel de auxiliar o governo, de outro,
a necessidade permanente de recursos por
parte do governo o prejudicou e o levou a
um declínio irreversível.
Concordamos com Souza Franco (1848, p.
11) que os gastos derivados da Independência
não foram a causa de sua ruína, pois, como
mencionado, seus problemas se arrastavam
desde pelo menos 1818, todavia, o rompi-
mento político com Portugal abriu espaço
para o aumento do gasto público e seu nan-
ciamento pelo banco. Qual teria sido a rea-
ção do público em relação ao banco diante
da perspectiva da Independência? Uma das
maneiras de nos aproximarmos dessa reação
é consultar os jornais da época e vericar o
que diziam sobre o Banco do Brasil, assunto
da próxima seção.
O BANCO NA IMPRENSA
POR VOLTA DE 1822
No início da década de 1820, na esteira
da revolução liberal portuguesa, a imprensa
brasileira gozou de um período de liber-
dade expresso no aumento significativo do
número de periódicos e panfletos, parte
deles crítica do absolutismo. Para se ter
uma ideia desse aumento, basta dizer que,
no Rio de Janeiro, em 1820, havia apenas
um periódico em circulação contra 11 no
ano seguinte (Santos, 2010, p. 62).
Autores diversos observam que, no Bra-
sil, a ideia de Independência ainda não era
clara em 1821 (Costa, 1981, p. 101; Pimenta,
2009, p. 58). De acordo com Bethell (2008,
p. 195), embora o país tivesse trilhado o
caminho da separação de Portugal desde a
abertura dos portos, a Independência não era
o desejo predominante nessa altura e passou
a ser somente por estímulo da revolução do
Porto, do retorno de d. João para Portugal
e do reacionarismo das cortes, convocadas
pelo monarca para elaborar uma constituição
para Portugal e para o Brasil. Esse último
aspecto teria forçado a classe dominante bra-
sileira a se unir em torno da Independência.
Ao analisar jornais da época, Santos
(2010, p. 58) conrma que a emancipação,
embora reconhecida, não aparecia manifes-
tamente na imprensa, nem possuía ampla
adesão. A alternativa da separação de Por-
tugal ganhou corpo somente em 1822 e logo
os periódicos se tornariam importantes ins-
trumentos da disputa política vinculada ao
destino do país (Sodré, 1999, p. 43), ilustrada,
simplicadamente, pela cisão entre as elites
portuguesa e brasileira (Bethell, 2008, p.
Fonte: Brasil (1826, pp. 3, 152, 187; 1827, p. 12)
Orçamento de despesa extraordinária do Tesouro (1825-28) – em mil-réis
dossiê bicentenário da independência: economia
Revista USPSão Paulo n. 132 • p. 125-148 • janeiro/fevereiro/março 2022
140
182). A elite brasileira, composta também
de portugueses com interesses econômicos
no Brasil, apoiava a imprensa crítica da
dominação lusa e da ameaça de volta ao
monopólio (Sodré, 1999, p. 45).
Com a maior liberdade de imprensa a
partir de 1820 e com o retorno de d. João
no ano seguinte, o noticiário era dominado
pela questão política e, com o tempo, a Inde-
pendência e a defesa de uma constituição
protagonizaram o debate nos periódicos,
por isso, não surpreende a menor impor-
tância atribuída a questões econômicas ou
ao Banco do Brasil especicamente. Como
analisa Santos (2010, p. 68), na linha de
Morel (2016), a imprensa dessa época foi
mais fundamental para moldar identidades
políticas no Brasil do que para expressar inte-
resses econômicos, embora, evidentemente,
seja possível identicar tais interesses como
pano de fundo das alternativas políticas em
jogo (Oliveira, 1999). A união de diversas
tendências – de monarquistas a republica-
nos – em torno da Independência contra as
cortes se desfez no nal de 1822, quando foi
cassada a liberdade de imprensa no Brasil,
com o fechamento de jornais críticos a d.
Pedro (Sodré, 1999, p. 61).
Se instituições creditícias e monetárias
vivem e sobrevivem fundamentalmente
da confiança das pessoas, o que dizia a
imprensa de um Banco do Brasil fragilizado
e, consequentemente, enfrentando uma cres-
cente desvalorização de suas notas? Passa-
mos a apresentar a partir de agora como o
banco figurou nos principais periódicos da
corte por volta de 1822, a fim de captar pela
imprensa o efeito do processo político sobre
sua credibilidade. Foram coletados dados,
entre junho de 1821 e setembro de 1823,
nos seguintes jornais: Correio do Rio de
Janeiro, Gazeta do Rio de Janeiro, Drio
do Rio de Janeiro, A Malagueta, Reverbero
Constitucional Fluminense, Compilador
Constitucional, Político e Literário, Cor-
reio Braziliense e os Annaes Fluminenses.
Nessa época, a imprensa dedicada aos
assuntos comerciais e financeiros ainda não
havia aparecido. O Jornal do Comércio, o
Diário Mercantil e o Semanário Mercantil,
por exemplo, foram criados posteriormente.
Ainda assim os jornais que circulavam na
corte tratavam, entre outras coisas, de notí-
cias de negócios. Havia, é verdade, grande
número de anúncios relativos a questões
do cotidiano, como a perda de bilhetes,
a oferta de ações para venda, a chamada
para a distribuição de dividendos. O Diário
do Rio de Janeiro, um jornal mais infor-
mativo do que de opinião (Sodré, 1999, p.
50), publicava informações sobre o banco,
como avisos sobre a retirada de notas de
circulação e sua queima, além de dar publi-
cidade à eleição de sua direção (Diário,
ed. 12, 14/8/21, p. 90; ed. 22, 26/3/22, p.
84; ed. 3, 4/9/22, p. 1).
A Gazeta do Rio de Janeiro, jornal áulico
(Sodré, 1999, p. 49) que transcrevia extratos
das sessões das cortes, publicou a sessão
em que lhes foi apresentado o decreto de
março de 1821, que nacionalizava a dívida
do Tesouro com o banco, mencionando como
justicativa o auxílio ao governo por meio
do desconto de letras e pagamento de obras
(Gazeta, ed. 100, 20/10/21, p. 2). Esse não
deixa de ser um indício da participação do
banco no nanciamento de obras públicas.
Os jornais publicavam também cartas por
meio das quais é possível perceber dicul-
dades associadas à falta de numerário em
circulação, especialmente dinheiro miúdo
para troco, à conversão das notas do banco
Revista USP • São Paulon. 132 • p. 125-148 • janeiro/fevereiro/março 2022
141
e sua desvalorização. Uma carta publicada
em abril de 1822, em A Malagueta, tra-
tando de questões do Tesouro, avaliava que
a emissão em circulação era suciente para
atender à demanda das transações, mas que
faltavam notas miúdas simplesmente porque
o banco decidiu não colocá-las para circu-
lar (A Malagueta, ed. 20, 27/4/22, p. 82).
Ainda em 1821, o Reverbero Constitucional
Fluminense, apoiador da Independência e
editado por Gonçalves Ledo e Januário da
Cunha Barbosa, publicou uma longa carta
também reclamando da falta de numerário:
“[...] andamos todos os dias à cata de duas
patacas para comprarmos o necessário ao
jantar, com mais pena e desagrado do que
temos para ganharmos o valor das mesmas
duas patacas [moeda de prata de 320 réis]
[...] estimarei muito que me suscite outro
sistema melhor, que me livre do incômodo
de adormecer meditando aonde e porque
modo acharei troco de 4.000 réis na manhã
seguinte para comprar o almoço” (Reverbero,
ed. 3, 15/10/21, pp. 28-32).
A questão do dinheiro miúdo talvez
dissesse respeito mais ao Tesouro. Embora
associada ao banco pelo primeiro missi-
vista, os estatutos impediam a impressão de
notas de baixo valor. Porém, a dificuldade
de conversão era um problema do banco,
ainda que sua origem e solução estives-
sem vinculadas ao governo. É sabido que,
especialmente a partir de 1818, o banco em
alguns momentos a restringiu, chegando a
suspendê-la. Os jornais captaram o pro-
blema em publicações como esta, na seção
de Variedades do Compilador Constitucio-
nal: “Com bastante admiração nossa temos
visto que algumas sentinelas do Banco dão
com o couse [sic] da arma em alguns dos
que ali vão trocar bilhetes quando há grande
aperto. Será essa a maneira de tratar-se um
Povo Constitucional?” (Compilador, ed. 10,
8/3/22, p. 6). É a mesma impressão publi-
cada no Reverbero pouco depois, tendo o
Banco do Brasil como alvo, embora não
seja mencionado explicitamente:
“[...] qualquer pessoa, que tem ideias de
comércio, sabe que crédito é a boa opinião
que os outros homens têm da riqueza, boa fé
e pontualidade de alguma pessoa ou socie-
dade: e que circulação é uma operação que
fazem as casas alcançadas, que não podendo
satisfazer pontualmente as suas dívidas, usam
de algum desvio ou rodeio para entreter os
seus credores e espaçar o pagamento que não
podem fazer no seu vencimento, iludindo-se
muitas vezes a si mesmos, ou querendo iludir
os outros com a esperança de uma futura
solução. Esta operação, que é quase sempre
ruinosa, longe de granjear espécie alguma de
crédito, o destrói e diminui, iludindo unica-
mente” (Reverbero, ed. 27, 14/5/22, p. 321).
De modo mais claro, já passado quase um
ano da declaração de Independência, uma
carta de José Antônio Pinheiro Carvalhal
reclamava ao redator do Correio do Rio de
Janeiro que foi quatro vezes ao banco para
trocar um bilhete e não conseguiu, porque
o Sr. Peçanha só trocaria bilhetes de seus
protegidos escolhidos a dedo. O missivista
pedia ao governo a correção desse tipo de
abuso (Correio, ed. 7, 8/8/23, p. 27). Poucos
dias depois, outra correspondência se quei-
xava da diculdade de trocar uma nota de
400 mil-réis (Correio, ed. 11, 13/8/23, p. 44).
E, no mês seguinte, mais uma reclamação
sobre o troco e o sr. Peçanha. Desta vez, o
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missivista chamou a atenção para a escassez
de metal em razão da desproporção entre a
emissão do banco e sua reserva metálica.
Aludiu ao nanciamento da guerra no Sul e
à dívida do Tesouro com a instituição e pedia
providências para que seu crédito não fosse
aniquilado (Correio, ed. 31, 6/9/23, p. 1).
O problema da desvalorização das notas
do banco aparece num diagnóstico publicado
no Reverbero (suplemento à ed. 2, 8/10/21)
segundo o qual a condição para a conança
na emissão seria a equivalência entre o preço
do metal e o valor do numerário, sugerindo
a perda de valor do papel diante do metal.
Como discutido na seção anterior, a des-
valorização das notas estava associada ao
descompasso entre a emissão e as reser-
vas do banco, e, por sua vez, a emissão
atendia ao nanciamento do gasto público.
Talvez por isso o padre Antônio João de
Lessa tenha relacionado em seu comentário,
feito em correspondência ao Correio do Rio
de Janeiro,o desfalecimento do Tesouro e
estremecimento do crédito do banco” (Cor-
reio, ed. 59, 22/6/22, p. 243).
O Correio Braziliense e o Correio do
Rio de Janeiro zeram críticas à atuação do
governo junto ao banco em edições publi-
cadas entre janeiro e junho de 1822, ambos
motivados, aparentemente, pela criação do
Banco de Lisboa no último dia do ano ante-
rior. O primeiro, em janeiro de 1822, noti-
ciava a criação desse banco e reclamava do
tratamento dado pelas cortes ao Banco do
Brasil (Correio Braziliense, jan./22, p. 95).
Interessante notar na edição seguinte a inu-
ência da experiência brasileira na avaliação
feita pelo jornal de que o banco português
não conseguiria despertar a conança do
público por ter sido criado para emprestar ao
governo (Correio Braziliense, fev./22, p. 185).
Em março de 1822, o mesmo jornal reco-
nhecia uma melhora na administração do
banco e o auxílio de comerciantes ingleses,
provavelmente por destinarem capitais para
a instituição. O problema em sua avaliação
era o governo, que trabalharia para ani-
quilar o banco. Em sua defesa, cobrava o
pagamento da dívida do Tesouro e exigia
o fim da interferência governamental, pois
estava convencido de que “a menor inge-
rência do Governo é peçonha que mata a
todo o Banco, e tanto mais violentamente
quanto maior for essa ingerência” (Correio
Braziliense, mar./22, p. 300). Vale lembrar,
nesse ponto, que o Correio Braziliense cir-
culava entre comerciantes que transitavam
por Londres, Lisboa e Rio de Janeiro, e era
financiado por eles (Oliveira, 2017, p. 110),
então, não surpreende a menção positiva
aos comerciantes estrangeiros em contraste
com a avaliação de outro periódico, como
veremos adiante.
O jornal também estava certo de que as
cortes operavam contra o banco – por exem-
plo, ao retirar-lhe direitos garantidos pelos
estatutos de venda do pau-brasil, urzela e
outros produtos – e exortava o governo a,
além de quitar sua dívida, controlar suas
nanças de modo a contribuir para a melho-
ria da situação. Julgava que a ruína do banco
brasileiro, defendida explicitamente em Por-
tugal, seria também o início da ruína das
nanças públicas e do Estado. Em sua visão,
a culpa pelas diculdades do banco era mais
do governo do que de sua administração
(Correio Braziliense, abr./22, pp. 448-9). A
crítica do Correio Braziliense tinha, portanto,
dois alvos: o governo brasileiro, pelo descon-
trole de suas nanças e suas consequências
para o banco, e as cortes, pelo descaso e
ataque à instituição brasileira.
Revista USP • São Paulon. 132 • p. 125-148 • janeiro/fevereiro/março 2022
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Pela mesma época, em abril de 1822, o
Correio do Rio de Janeiro publicou uma
história concisa dos bancos comerciais por
ocasião da criação do Banco de Lisboa pouco
tempo antes. De modo geral, criticava nessa
história a intervenção do governo em bancos
particulares por desmobilizar a conança do
público em instituições cujo sucesso depen-
dia essencialmente de sua credibilidade. Nas
palavras do jornal, para ser bem-sucedido
bastaria ao banco “muito crédito, inabalável
crédito e imperdível crédito” (Correio, ed.
12, 23/4/22, p. 45).
Nessa linha, não se podia esperar uma
análise positiva do caso brasileiro e, de
fato, o articulista critica, talvez com algum
exagero, o governo e a administração do
banco por dilapidarem recursos dos acio-
nistas sem estimular a expansão da econo-
mia: “Nenhuma fábrica de papel pardo se
estabeleceu no Brasil; nenhuma estrada de
comunicação se abriu entre duas capitanias;
nem manufatureiros alguns foram convidados
a passarem ao Brasil debaixo da proteção
do banco” (Correio, ed. 13, 24/4/22, p. 51).
Entre maio e junho de 1822, o jornal
publicou novas críticas ao governo e à admi-
nistração do banco (Correio, ed. 27, 10/5/22,
pp. 108-9 e ed. 41, 29/5/22, p. 167), além
do requerimento de seu representante em
Lisboa, João Rodrigues Pereira de Almeida,
solicitando às cortes, em tom dramático, que
o governo pagasse sua dívida para evitar a
destruição do banco e o prejuízo de milhares
de acionistas espalhados por todo o Brasil
(Correio, ed. 51, 8/6/22, pp. 206-8).
José Vitorino dos Santos e Souza e Anto-
nio Rodrigues de Oliveira eram os redatores
dos Annaes Fluminenses, que circulou em
edição única em janeiro de 1822. Consta
nessa edição um longo artigo escrito por
eles intitulado “O Banco do Brasil em 1821”.
De maneira geral, é um artigo em defesa do
banco, que buscava explicar a falta de con-
ança do público na instituição naquela con-
juntura e aventar soluções para recuperá-la.
Para os articulistas, o banco já havia pas-
sado por problemas anteriormente sem perder
a conança do público, mas sua credibilidade
teria sido verdadeiramente abalada com o
retorno de d. João para Portugal em abril
de 1821 e a consequente saída de recur-
sos do banco para o exterior. Desde então,
argumentam, o banco restringiu a conversão
e por isso suas notas estariam se desva-
lorizando. Nesse ponto criticaram, não só
a diculdade de conversão, mas a arbitra-
riedade ensejada por ela no momento em
que o público levava suas notas aos guichês
do banco para convertê-las (Annaes, ed. 1,
/1/22, pp. 21-2), como também revelaram
as críticas mencionadas há pouco.
Apesar disso, enfatizavam o crédito do
banco e armavam que, além da segurança
das notas, seria de interesse geral fazê-lo
prosperar para fomentar a riqueza nacional
(Annaes, ed. 1, 1º/1/22, p. 23). Para susten-
tar sua posição, diziam que, além de ter
seus empréstimos reconhecidos como dívida
nacional por decreto de março de 1821,
“[...] o Banco do Brasil não tem o seu crédito
radicado em fundos quiméricos; e os bilhetes
que aqui circulam, não são a moeda papel de
outros países: grandes rendas do Estado, todos
os impostos de seges, carruagens, armazéns,
tavernas, etc. e todas as rendas públicas que
lhe foram consignadas foram a sua garantia”
(Annaes, ed. 1, 1º/1/22, p. 31).
No entanto, reconheciam a signicativa
desvalorização de suas notas diante do ouro
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e da prata. Segundo eles, essas notas circu-
lavam por praticamente metade do valor que
representavam (Annaes, ed. 1, 1º/1/22, p. 24).
Paradoxalmente, a desvalorização resultante
da desconança nas notas do banco viria,
em parte, da conança anterior que havia
permitido ao banco fazer, nas palavras dos
articulistas, “emissões ousadas”, maiores do
que a prudência recomendaria (Annaes, ed. 1,
/1/22, p. 24). Naquela ocasião, creditaram
a maior diculdade do banco à saída de d.
João e dos metais, porém, segundo eles, esse
seria um problema temporário (Annaes, ed.
1, 1º/1/22, p. 32).
O artigo segue dizendo não ser justicada,
portanto, a perda de conança enfrentada
pelo banco e, em contraste com o Correio
Braziliense, apontou a crítica também para
a atitude de comerciantes que, em vez de
levarem metais para o banco ou para o mer-
cado, promoviam um entesouramento que os
encarecia e obrigava o banco a recorrer à
conversão em cobre. Entretanto, não deixam
de mencionar que o meio mais ecaz para
reduzir a dívida do Tesouro com o banco
seria reduzir a despesa pública (Annaes, ed.
1, 1º/1/22, pp. 41-2). Finalmente, encerram
o artigo armando a importância do banco
como credor do Estado:
“[...] o Banco do Brasil tem produzido e
produz um aumento excessivo de riquezas,
que todo mundo conhece; e é disto uma
prova a grande dívida em que o Tesouro
público está para com ele; além dos devedo-
res particulares, como sabemos. De certo, a
não ser o banco, El-Rei não acharia jamais
credores de tão grande importância, como
o banco tem adiantado; e a ser, como se
diz, essa dívida contraída em razão das
urgências do Estado; ou os negócios ter-
-se-iam perdido, a não existir o banco; ou
ter-se-ia recorrido (com vergonha dizemos)
à Inglaterra, que tem sabido tirar do nosso
desleixo todas as grandes vantagens que
o nosso governo podia e devia ter tirado
deste imenso mar de riquezas” (Annaes,
ed. 1, 1º/1/22, p. 46).
A pesquisa na imprensa revelou que as
notícias e análises sobre o banco apare-
ceram com mais frequência antes do pro-
cesso de Independência. É notável não
haver, na documentação analisada, um
vínculo entre a movimentação política e
a perda de confiança no banco. Contudo,
uma possível explicação para isso é o fato
de que suas dificuldades já vinham desde
antes de setembro de 1822. Mesmo depois
da Independência, seus problemas conti-
nuaram muito semelhantes aos de 1818 e
1821 debatidos na imprensa e já conheci-
dos pelos leitores. Talvez por isso, pelos
jornais, a emancipação política não tenha
suscitado maior desconfiança num público
já desconfiado com o banco.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A motivação deste artigo foi pensar os
bancos no Brasil na época da Independên-
cia. Sabendo-se que nessa altura havia no
país somente o Banco do Brasil, procurou-
-se costurar sua relação com a Independên-
cia mirando dois objetivos: o primeiro foi
mostrar a importância do banco no nan-
ciamento de gastos públicos essenciais para
a consolidação da emancipação política. O
segundo foi captar, por meio da imprensa,
o efeito do processo de Independência sobre
a conança do público no banco.
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O artigo tentou mostrar, em primeiro
lugar, que o mercado de crédito na primeira
metade do século XIX se desenvolveu no
Brasil, especialmente na corte, prescindindo
da atividade bancária. O grosso do crédito
era fornecido por indivíduos, com especial
participação de comerciantes. O Banco do
Brasil também ofertou crédito a particula-
res, porém, suas operações mais importantes
foram feitas com o governo. Anal, um de
seus objetivos, tal como consagrado em seus
estatutos, era justamente fornecer recursos
para nanciar o gasto público.
Em seguida, por meio de relatórios do
Ministério da Fazenda, inclusive o relatório
sobre a crise de 1857, procuramos mostrar
que a relação entre o banco e o Estado se
aprofundou depois da Independência, ou seja,
a tendência de aumento do fornecimento de
recursos do banco ao governo se acentuou
depois de 1822 até sua extinção. Vimos que
o aumento da emissão, derivada, em boa
medida, da demanda de recursos por parte
do governo, fragilizou o banco na medida em
que o aumento de recursos para conversão
das notas não a acompanhava.
Advertimos também que esse processo
não se iniciou com a Independência e já era
um problema desde pelo menos 1818. A volta
de d. João para Portugal em 1821 o agravou.
Portanto, a Independência não trouxe novos
problemas ao banco, pois eram os mesmos
de antes, apenas os aprofundaram em vir-
tude do aumento da demanda de recursos
para consolidá-la. Mesmo fragilizado por
essa demanda, o banco garantiu os recursos
necessários para nanciar importantes gastos
relativos à emancipação política.
Não se deve, portanto, desprezar o papel
do Banco do Brasil nesse processo, espe-
cialmente no suprimento de campanhas
militares nas províncias e na região da
Cisplatina. Além disso, é preciso conside-
rar também o auxílio à circulação, uma
vez que as notas do banco faziam parte
do meio circulante da época, fundamental
para garantir a realização das transações
e a dinâmica da economia.
Finalmente, o artigo tentou captar, por
meio da análise de jornais por volta de
1822, a eventual desconfiança no banco
provocada pelo processo político. É pre-
ciso lembrar que, nessa época, os jornais
eram meramente informativos ou trata-
vam muito mais de questões políticas do
que econômicas. Os jornais dedicados
especificamente ao comércio ainda não
haviam sido lançados nesse ano. Contudo,
como a questão do Banco do Brasil se
misturava à política, ele apareceu em
algumas edições no período analisado.
Além de notícias banais sobre o cotidiano
do banco, foram publicadas também ava-
liações sobre sua situação.
Essas avaliações, em sua maioria, fala-
vam claramente da situação deplorável do
banco, isto é, da dificuldade de conversão
e, consequentemente, da desvalorização de
suas notas. Talvez por isso a questão mais
importante tratada nessas avaliações dizia
respeito ao pagamento da dívida do Tesouro
e suas demandas em relação ao banco, isto
é, tratavam da relação entre o banco e o
governo. Também de maneira geral, o tom
é de crítica à intervenção do governo no
banco, frequentemente apontada como a
principal culpada pela difícil situação do
estabelecimento. A administração do banco
também é criticada, mas em menor grau.
Por outro lado, é reconhecida a importân-
cia do banco para a economia e, inclusive,
para o financiamento do gasto público.
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Quase não se menciona o efeito da Inde-
pendência sobre o banco. Basta dizer que
boa parte das publicações sobre ele está con-
centrada antes de setembro de 1822, fato
não muito surpreendente se considerarmos
que o processo ganhou corpo nos últimos
instantes. Não obstante, as propostas econô-
micas das cortes para o Brasil, que tinham
intenção de restabelecer restrições comer-
ciais, já ameaçavam há tempos os interesses
de comerciantes brasileiros e também por-
tugueses com negócios no país, causando
certa agitação política.
A queda na subscrição das ações do
banco em 1821 e 1822 sugere que alguma
desconfiança a Independência fomentou,
todavia, ela não parece ter sido capaz de
alterar de maneira significativa a expecta-
tiva em relação ao banco, pois seus proble-
mas já estavam dados desde 1818, quando
a conversão começou a falhar. Esta é uma
hipótese para explicar por que um processo
político como a Independência, que carrega-
ria certo grau de incerteza sobre a economia
e também sobre o banco, não chegou a se
tornar um fato suficientemente relevante
para a imprensa. Pesa também, é claro, o
fato dessa imprensa se dedicar mais aos
assuntos políticos do que econômicos, mas,
como vimos, o banco estava ligado intrin-
secamente a questões políticas.
Em síntese, mesmo não sendo prota-
gonista dos debates nos jornais do início
da década de 1820, e apesar de todas as
dificuldades, o Banco do Brasil supriu o
Tesouro praticamente até sua extinção em
1829, facilitando os meios e os recursos de
que as rendas reais e as públicas necessi-
tassem para ocorrer às despesas do Estado,
inclusive aquelas associadas à Independên-
cia, cumprindo o desiderato impresso no
alvará de sua criação.
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Abstract This dissertation investigates the private and non-institutional credit market in the city of Rio de Janeiro between the years of 1820 and 1860. Based on research and analysis of newspaper, notary books, debt ligation, judicial attachments and bills of exchange registries, this study seeks to build the background of the city´s credit market, one in which becomes evident a strong complementarity between the different credit titles in circulation at the time. Even though Rio has had no banking system between 1829 and 1838, the city experienced a sharp demographic and commercial boom during this period. Such an increase in the city’s economic activity was responsible for a striking rise in the demand for investment capital. Such demand was met by a coordinated state effort that striven to allocate and redirect private savings towards the market. Such movement was responsible for the emergence of a vast and complex private credit market in which one of its cornerstones was the presence of an intertwined relationship between credit and private property. The city also had a thriving pawning and second-hand goods markets that were able to accommodate and foster these circular dynamics observed between private property and credit transactions. This created a background where slaves played an relevant role. Both the trans-Atlantic and domestic “businesses of slavery” generated thousands of negotiable titles, working as a propeller for credit circulation. At the same time, 65% of debit litigation in the period had at least one slave guaranteeing unpaid debts. The enslaved human beings served as one of the main guarantors for credit circulation in Rio de Janeiro during the first half of the nineteenth century. Resumo A presente tese tem como foco o mercado privado e não institucional de crédito na cidade do Rio de Janeiro entre os anos de 1820 a 1860. Através de uma análise de jornais, livros de notas, ações de execução de dívidas, penhoras judiciais e registros de letras, buscou-se traçar um quadro que evidência a complementaridade entre os diferentes instrumentos de crédito em circulação na praça carioca durante o período. Embora a cidade não tenha contado com um sistema bancário entre os anos de 1829 até 1838, isto não impediu um acentuado crescimento demográfico e comercial. Este incremento nas atividades econômicas gerou forte demanda por capital que foi suprida por um incentivo estatal que visava direcionar a poupança e capitais privados ao mercado, criando com isso um amplo e complexo mercado privado de crédito cujo um importante pilar de sustentação foi a presença de uma relação interligada e circular entre crédito e propriedade privada. A cidade contava na época com um aquecido mercado de penhor e de segunda mão que foi capaz de absorver e impulsionar este movimento cíclico entre crédito e propriedade. Dentro deste quadro, a escravidão teve um papel de destaque. Os “negócios da escravidão,” tanto os transatlânticos, quanto os domésticos, geraram milhares de títulos negociáveis, servindo como um propulsor à circulação do crédito. Ao mesmo tempo, 65% dos litígios tiveram escravos penhoradas como garantia às dívidas em atraso, fazendo da propriedade em seres humanos escravizados um dos principais lastros à circulação do crédito durante a primeira metade do século XIX na cidade do Rio de Janeiro.
Article
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Despite the existing restrictions, the mortgage market grew up in Brazil throughout the nineteenth century and beginning of XX. The institutional changes made possible the market expansion by means of banks and private agents, mainly during the second half of nineteenth century. There was an advance of the banking system, especially at the end of the nineteenth century, even with the expressive presence of foreign institutions at the beginning of the twentieth century. Although these transformations occurred in the period of the study, the mortgage market was still concentrated in the hands of private agents. Almost the totality of transactions happened between individuals. Even at the beginning of the twentieth century, when there was an advance in the banking system, the moneylenders still performed a much more significant quantity of mortgage transactions than the banks. © 2014, Instituto de Pesquisas Economicas da FEA-USP. All rights reserved.
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Este artigo retoma e problematiza o tema classico da Independencia do Brasil como um movimento revolucionario. Primeiramente, discute o conceito revolucao em meio ao proprio processo de ruptura entre Brasil e Portugal; em seguida, analisa sinteticamente aspectos da historiografia desse problema nos seculos XIX e XX; por fim, reorganiza a questao de acordo com contribuicoes historiograficas que, nas ultimas decadas, tem avancado no entendimento do processo historico em si a partir da premissa de seu carater revolucionario.
Article
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The article studies the evolution of the constitutional arrangements in seventeenth-century England following the Glorious Revolution of 1688. It focuses on the relationship between institutions and the behavior of the government and interprets the institutional changes on the basis of the goals of the winners—secure property rights, protection of their wealth, and the elimination of confiscatory government. We argue that the new institutions allowed the government to commit credibly to upholding property rights. Their success was remarkable, as the evidence from capital markets shows.
Book
The Cambridge History of Latin America, the first large-scale authoritative survey of Latin American history from ca. 1500 to the present day, is a work of international collaborative scholarship. It aims to provide a high-level synthesis of existing knowledge in chapters written by leading scholars in their fields. Each chapter is accompanied by a bibliographical essay. Volume IX, Brazil since 1930, is the final volume of the 12 volume History to be published. It examines the profound political, economic, and social changes experienced by Brazil in the 70 years from 1930 to the present day. Part I consists of four chapters on politics in Brazil: 1930–1945, 1945–1964, 1964–1985, and 1985–2002. Part II consists of three chapters on the Brazilian economy: 1930–1980, 1980–1994, and 1994–2004, and one chapter on social continuity and social change in Brazil from 1930 to 2000.
Article
This is an investigation into the readings of the Portuguese colonization of America in the Brazilian independence process. The analysis was founded on periodical documentation published in Brazil between the years of 1821 and 1822 and references made by same to the Portuguese colonization of America, a diversified past, which is unified through discourse by means of adjectives such as colonial or similar expressions. In theoretical terms, the investigation was triggered by Reinhart Kosellecks view of the historical time, which was originated by the difference between experience and expectation and more specifically inserted in an ample debate, related to the formation of State and the Brazilian nation. It was important to understand how the readings of the past were used as political tools and how such readings in turn engendered the development of the idea of a specifically Brazilian history, thus justifying political projects that made the independence feasible. In broader terms, the 7 objective was to face the mediation problems between the formation of State and the appearance of the nation, over and above the precedence of one dimension over the other. Esta é uma investigação sobre a leitura da colonização portuguesa da América no processo de independência do Brasil. A análise fundamentou-se em documentação periódica publicada no Brasil entre 1821 e 1822 e suas referências à colonização portuguesa da América, um passado diversificado, e que se unifica pelo discurso por meio de adjetivos como colonial ou expressões semelhantes. Em termos teóricos, a investigação partiu da perspectiva analítica de Reinhart. Koselleck a respeito do tempo histórico que se concebe na diferença entre experiência e expectativa e, de modo mais específico, se insere em um debate amplo acerca da formação do Estado e da nação brasileira. Procurou-se compreender como a leitura do passado foi utilizada como ferramenta política, e como a mobilização do passado engendrou, por sua vez, a construção da ideia de uma história especificamente brasileira, justificando projetos políticos que viabilizaram a independência do Brasil. De maneira mais ampla, objetivou-se enfrentar o problema das mediações entre formação do Estado e surgimento da nação para além da precedência de uma dimensão sobre a outra.
Artigo apresentado no seminário internacional "Empréstitos, donativos y especulaciones con la real hacienda en los imperios ibéricos
  • B Aidar
AIDAR, B. Financiar o Império: o Banco do Brasil e seus acionistas, 1808-1821. Artigo apresentado no seminário internacional "Empréstitos, donativos y especulaciones con la real hacienda en los imperios ibéricos". México, Instituto Mora, 2018.