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Os Perigos dos ecras nas criancas – mito ou realidade

Authors:

Abstract

Um especial agradecimento à docente Lídia Oliveira pelo apoio e orientação para a realização deste trabalho.
Silvana Oliveira, Nº mec. 101962 | silvanamvoliveira@ua.pt | https://www.researchgate.net/profile/Silvana-Oliveira-6
SOCIOLOGIA DA COMUNICAÇÃO
NTC 2021/2022
Docente: Lídia Oliveira
Os Perigos dos ecrãs nas crianças mito ou
realidade?
Índice
Abstract ......................................................................................................................................... 2
Introdução ..................................................................................................................................... 2
Metodologia .................................................................................................................................. 2
Resultados e sua discussão ........................................................................................................... 4
Conclusões .................................................................................................................................... 9
Bibliografia .................................................................................................................................. 10
Índice de figuras
Figura 1- Infográfico ...................................................................................................................... 3
Abstract
O presente estudo académico está incluído na Unidade Curricular de Sociologia da
Comunicação, 2º ano do Curso de Novas Tecnologias da Comunicação da Universidade
de Aveiro. Por entre os vários tópicos apresentados para estudo, a escolha recaiu sobre
a “Comunicação nos medias sociais digitais e o foco na dopamina”.
Este estudo visa contribuir para a atual discussão sobre as consequências do uso
excessivo do entretenimento digital em crianças e jovens e tem por base a obra “A
Fábrica dos Cretinos Digitais os perigos dos ecrãs para os nossos filhos”. A obra foi
lançada em Outubro de 2021, por Michel Desmurget, neurocientista francês, diretor de
pesquisa do Instituto Nacional de Saúde de França e com uma larga e vasta publicação
científica. Nesta obra o autor oferece uma síntese o mais exaustiva, precisa e sincera
possível das conclusões científicas existentes. Com esta análise é possível identificar
quais os pilares afetados da nossa identidade e algumas das consequências já
firmemente estabelecidas. Como qualquer outro consumo excessivo de algo, poderá
tornar-se um vício, e deverá ter consequências no foro da Sociologia da Comunicação,
que irei explorar ao longo deste estudo.
Palavras Chave: digital natives, cultura digital, ecrãs tecnológicos, exposição digital,
revolução digital, ferramentas digitais, digital immigrants.
Introdução
A dopamina é um neurotransmissor que desempenha vários papéis importantes no
cérebro e no corpo, nomeadamente no sistema de comportamento motivado por
recompensa. A dopamina está presente no controlo de movimentos, aprendizagem,
humor, emoções, cognição e memória.
O presente mecanismo de validação social implementado através de uma cultura de
likes, de comentários ou recompensas na maioria das redes sociais, televisão ou
videojogos, mexe com os mesmos subsistemas do cérebro que ficam alterados em
pessoas viciadas no jogo ou em drogas. Estes subsistemas controlam a produção e
consumo da dopamina e quando o nível de dopamina aumenta no cérebro, um
aumento do fluxo sanguíneo e uma sensação de maior prazer. É o mesmo que acontece
quando nos exercitamos fisicamente, na comida e até no sexo. Nas redes sociais e
jogos, a gratificação é mais instantânea, o que pode levar a habituação e levar a
alterações nos comportamentos dos indivíduos.
Mediante estes comportamentos, existem ou não consequências para as próximas
gerações, ao serem expostas a um consumo recreativo digital em excesso, e o que é
considerado excesso afinal? É através destas e outras respostas que o autor tenta
elucidar o os leitores ao longo de 4 partes, não para o convencer de acreditar ou não,
mas para lhe transmitir dados de estudos que lhe permitam formular a sua própria
opinião:
1. Prólogo Em quem acreditar?
2. Digital natives a construção de um mito
3. Usos Um incrível frenesim de ecrãs recreativos
4. Impactos Crónicas de um desastre anunciado
Metodologia
A recolha de elementos para a elaboração do trabalho recaiu exclusivamente sobre a
obra acima referida, dando seguimento à sugestão da Docente da Unidade Curricular
de Sociologia da Comunicação. Através da aquisição da mesma e depois da leitura, foi
possível avaliar a qualidade da mesma para ser utilizada neste estudo, uma vez que
evoca nela diferentes estudos devidamente fundamentados. De uma forma
sintetizada em formato de infográfico:
Figura 1- Infográfico
Resultados e sua discussão
“A infância de hoje está exposta a uma orgia digital.” (Desmurget 2021). Trata-se de
uma reflexão do autor e que serve de alerta para a necessidade de haver mais
informação científica e sua divulgação, que possibilite decisões mais esclarecidas dos
cidadãos, nomeadamente os pais atuais e que estão encarregues da educação dos
filhos.
É óbvio que a revolução digital vem para ficar e que o mundo está em constante
mudança, e importa observar como estão as novas gerações a serem preparadas para
o futuro que é incerto, imprevisível e todavia desconhecido. Estarão a ser “produzidos”
cidadãos cultos, ativos e criativos ou por outro lado, escravos e viciados da sua própria
servidão?
Não se trata de catalogar a tecnologia como uma coisa positiva ou negativa, mas sim,
analisar de que forma é utilizada.
O consumo recreativo do digital, segundo o autor, é “absolutamente astronómico”
(Desmurget 2021). Os países acumulam anualmente mais de 1000 horas para uma
criança no jardim de infância 1,4 meses de exposição; 1700 horas (2,4 meses) em
estudantes do ensino básico e 2650 horas (3,7 meses) em estudantes do secundário.
Somadas as horas nos primeiros 18 anos de vida, representam o equivalente a cerca
de 30 anos escolares, ou 15 anos de um emprego a tempo inteiro. Satisfeitos com esta
situação parecem estar inúmeros peritos mediáticos, em que psiquiatras, académicos,
pediatras, sociólogos divulgam declarações indulgentes para confortar pais e o público
em geral. O mundo pertencerá agora aos digital natives, que atestam que o próprio
cérebro está mais veloz, mais reativo e mais mais apto para trabalhar
colaborativamente. Se por um lado estimula a motivação e criatividade, por outro, a
influência está a afetar todas as dimensões da humanidade, desde a física (obesidade,
envelhecimento cardiovascular), à emocional (agressividade, ansiedade), passando
pela cognitiva (linguagem, concentração). Perante estas duas possibilidades, algumas
pessoas e orgãos intitucionais estão a optar pela prudência, começando a colocar
alguns limites à exposição digital. A China chega mesmo a proibir o consumo durante o
período de tempo por norma dedicado ao sono. Alguns quadros dirigentes das indústrias
digitais (Steve Jobs, mítico antigo patrão da Aple) estão já a proteger os seus filhos dos
instrumentos digitais que os próprios comercializam, optando por colocá-los em escolas
privadas sem ecrãs.
Então, em quem devemos nós, educadores, acreditar?
A nova geração apresenta, segundo o autor, 3 traços distintos: o zappig, a impaciência
e o coletivo e esperam uma resposta imediata em tudo: tudo se deve passar-se
depressa. Gostam de trabalhar em equipa e possuem uma cultura digital transversal
instintiva. Muitos fogem do raciocínio demonstrativo e dedutivo em prol de tentativa-
erro. As tecnologias digitais estão embutidas nas suas vidas, na escola, de tal forma
que já não são separáveis. Mas, se os alunos mudaram radicalmente, estarão eles a
serem formados por pessoas que já não estão ao mesmo nível, uma vez que, por falta
de formação, recorrem a uma linguagem datada e da era pré-digital?
Estas evoluções, em que todas as ferramentas se tornaram extensão dos próprios
cérebros, revestem-se de uma profundidade tal que tornam obsoletas as atuais
abordagens pedagógicas? Uma coisa é certa, a omipresença dos ecrãs engendrou uma
nova geração de seres humanos, totalmente diferente das anteriores e peritos no
manuseamento e compreensão das ferramentas digitais. Para manter a eficácia e
credibilidade, o formato escolar deve imperativamente adaptar-se a esta revolução.
A validade de tais afirmações tem sido avaliada de há 15 anos para cá pela comunidade
científica. Até à data não existem provas convincentes para sustentar estes estereótipos
geracionais (digital natives), classificados como uma lenda urbana, um mito por direito
próprio, que satisfaz os ingénuos. Segundo a ciência, esta nova geração não existe,
existindo apenas pequenos focos que correspondem vagamente ao estereótipo
esperado do geek, mas mais uma exceção do que regra. Ao contrário das crenças
populares, a esmagadora maioria dos aspirantes a geeks apresenta um nível de domínio
das ferramentas digitais, no melhor dos casos, hesitante. Na sua maioria, estes jovens
sentem dificuldade em dominar determinadas competências informáticas rudimentares,
tais como configurar a segurança dos seus dispositivos, usar programas de
processamento de texto e cálculo, edição de vídeo, acrescentar memória a um
computador, entre muitas outras. De referir ainda que a geração “obsoleta” foi quem
criou e desenvolveu essas ferramentas e ambientes, contrariando o conceito de que os
digital natives são mais aptos que as anteriores. As práticas das novas gerações
articulam-se ao redor de atividades recreativas, básicas e pouco formativas (programas
de televisão, filmes, séries, redes sociais, videojogos, sites de compras, etc.). “Acreditar
que os digital natives são especialistas equivale confundir uma charrua com uma nave
especial” (Desmurget 2021). Refere ainda que os digital immigrants (adultos) são tão
competentes e dedicados como os seus descendentes, sendo que mesmo os mais
velhos conseguem, quando sentem necessidade e vêem utilidade, e conseguem
penetrar nesse novo universo. Resumindo, os digital natives não existem e a crença de
que manipulando tecnologia digital o seu cérebro teria crescido em força ou volume
graças a essas tecnologias não passa de uma lenda, reforça o autor. Acaba por se ter
tornado num subterfúgio dos pais, levando-os a crer que os seus descendentes são ou
serão verdadeiros génios digitais e que ao dar-lhes livre acesso lhe estarão a
proporcionar esse brilhante futuro.
O digital representa um claro progresso e o autor não pretende afirmar que a influência
dos ecrãs é unicamente negativa. O impacto depende é da utilização que as novas
gerações fazem do digital. Existem 3 perguntas complementares que deverão ser
exploradas pelos educadores: o quê, quanto tempo e quem para melhor compreender
a questão:
O quê - Determinar que ecrãs utilizam os nossos filhos, de que forma e para que fins,
como são efetivamente utilizados no dia a dia.
Quanto tempo duração dos consumos particulares (televisão, videojogos, actividades
escolares, etc.) em relação ao tempo recreativo total (tempo “roubado” a outras
atividades mais favoráveis ao desenvolvimento).
Quem a utilização de ecrãs varia, em especial, de acordo com a idade, o género e o
meio socioeconómico.
Somos, como todos sabemos, criaturas de hábitos, e à semelhança do que acontece
com os nossos hábitos alimentares, de estudo, sociais ou de leitura, as práticas digitais
que utilizadas posteriormente, encontram as suas raízes no tipo de utilização que é feito
em tenra idade. Aquilo de que os ecrãs privam as crianças (estímulos e experiências)
revela-se muito difícil de recuperar mais tarde. Tudo aquilo que não ficar estabelecido
durante os primeiros anos do desenvolvimento em termos de linguagem, coordenação
motora, cálculo, hábitos sociais e gestão emocional, entre outros, será cada vez mais
difícil de adquirir à medida que o tempo for passando. A textura do nosso cerébro,
equiparada a plasticina, vai endurecendo com o passar da idade, permitindo claro aos
adultos aprenderem, mas não da mesma forma das crianças. É na pré-adolescência (8
aos 12 anos) que as crianças assistem a uma diminuição considerável do número de
horas de sono, pelo que ganham, em média, entre 60 a 90 minutos de vigília, que é
totalmente oferecido às gerigonças digitais. Na adolescência (13 aos 18 anos), o tempo
de ecrã aumenta ainda mais, também devido à generalização dos smartphones,
equivalendo a 30% do dia.
Como fator potenciador que estimula a utilização, está a disponibilidade física de ecrãs.
Ter toda uma panóplia de aparelhos em casa favorece claramente o consumo, e ainda
mais se focarmos na divisão do quarto, permitindo acabar-lhes com o sono, com a saúde
e o aproveitamento escolar. A este fator acresce o peso dos hábitos familiares e da
azáfama constante dos educadores. É importante sublinhar, desde a infância, a razão
dos limites impostos. No fundo, para que seja eficaz a longo prazo, o quadro restritivo
não deverá ser entendido como punição arbitrária, mas sim como uma exigência
positiva, para que a criança adira ao comportamento e interiorize os benefícios.
Para estabelecer limites na utilização de ecrãs é necessário perceber o desenvolvimento
e plasticidade do cérebro, conforme abordado anteriormente. O ideal, segundo Michel,
é não expor crianças com idade inferior a 6 anos a ecrãs recreativos, uma vez que
roubam tempo precioso ao seu desenvolvimento. Esse tempo pode e deve ser
preenchido com atividades facultativas como a dança, o ténis ou violino, permitindo á
criança aprender a sentar-se, manter-se de pé, andar, correr, controlar necessidades
fisiológicas, cordenar mãos, entre muitas outras. Mesmo após os 6 anos, o acesso não
deveria ser maior do que uma hora diária, defende o autor.
Mitos à parte, o que é de facto a realidade destes digital natives? Qual é o seu presente
e o seu futuro? Qual é o seu desenvolvimento intelectual e saúde, serão felizes? Qual
é na realidade o impacto dos ecrãs no comportamento e desenvolvimento da criança?
Como referido anteriormente, as ferramentas digitais afetam os quatro pilares da nossa
identidade: o cognitivo, o emocional, o social e a nossa saúde. Eis algumas das
consequências já reconhecidas pela ciência:
Influências relativamente diretas: alteração do sono, a memorização, as capacidades
de aprendizagem e oo funcionamento intelectual diurno são perturbados, alterando o
desempenho escolar.
Influências indiretas: quando o sono é alterado enfraquece o sistema imunitário,
colocando a criança em maior risco de adoecer.
Influências a longo prazo: maturação cerebral afetada pela perturbação do sono e
risco de dimunição de QI em gerações futuras.
Influências em cascata: a privação de sono é um fator importantíssimo na obesidade,
desencandeando uma série de consequências, desde o absentismo até à natureza
destrutiva dos estereótipos.
Claro que, grande parte das influências é parcial e, segundo o autor, seria absurdo
imputar toda a responsabilidade aos ecrãs, uma vez que o sucesso escolar depende
diretamente de fatores de natureza social, demográfica e social, no entanto, inúmeros
estudos demonstram que o uso cumulativo de dispositivos digitais (incluindo a televisão,
smartphones e especialmente videojogos) diminuem de forma significativa o
desempenho escolar. Quanto mais aumentar o tempo de ecrãs, mais as notas descem,
compara.
São lançados constantemente “estudos científicos” mais equiparados a fake news do
que a estudos e que têm originado alvoroços mediáticos a nível global. O do chocolate
(que tem gordura e açucar) não engordar ou dos videojogos melhorarem os resultados
escolares. Estes “estudos” não passaram de ensaios com metodologias deficientes,
publicações não corroboradas por bases científicas, mas dos quais os media fizeram
capas e grandes destaques. No entanto, não se deve generalizar, uma vez que, desde
que não sejam violentos, alguns jogos que têm por base matemática, lógica e conquista,
promovem certas competências nas crianças.
Relativamente ao acesso a ferramentas digitais nas escolas, e tendo por bases os
estudos disponíveis, é claramente possível verificar que as crianças que aprendem a ler
ou escrever num teclado, apresentam mais dificuldade em reter e reconhecer as letras
do que aquelas que aprendem com as mãos, lápis e folha de papel. Revelam também
mais dificuldade em aprender a ler, dado que o desenvolvimento da escrita, apoia
fortemente o desenvolvimento da leitura e vice-versa.
Do ponto de vista prático, torna-se evidente que algumas ferramentas digitais podem
facilitar o trabalho do aluno, embora quanto mais se cede à máquina uma parte
importante das nossas atividades cognitivas, menos os neurónios encontram matéria
para se estruturarem, organizarem e conectarem. Para conseguir novamente um
equilíbrio, dever-se-á provar que o que é apreendido dispõe de um valor geral, que afeta
positivamente o desempenho escolar e que oferece um verdadeiro valor acrescentado
educativo, sendo a tecnologia utilizada como auxílio pedagógico e não como substituto
de um professor bem treinado. Assim, a tecnologia pode otimizar um ensino de
excelente qualidade, mas nunca compensar um ensino deficiente.
Mas então, qual a razão das escolas se encontrarem num frenezim na digitalização do
sistema de ensino? Só existe uma explicação racional para esta questão e prende-se
com ordem económica. Substituíndo o humano pelo digital é possível vislumbrar uma
significativa redução de custos. O que é difícil compreender é como é que uma natureza
desencarnada poderá ser mais motivadora, mobilizadora e eficaz do que uma presença
humana real. Apesar do que os seguidores desse método de ensino (MOOC por
exemplo), é infinitamente mais constrangedor aprender dessa forma do que com um
professor qualificado. Felizmente, realça o autor, esta evidência está aos poucos a vir à
tona nos meios de comunicação social. Para além do MOOC, o potencial da Internet
também deve ser questionado. Certamente, a web contém, em teoria, todo o
conhecimento do mundo, mas ao mesmo tempo, todos os disparates do mundo. Cabe
ao ser humano, filtrar e escolher a sua fonte de informação, para além da hierarquização
estar baseada em algoritmos que maior parte das vezes não sabemos a sua estrutura.
Está visto que a utilização de ecrãs afeta fortemente o desempenho escolar, mas este
impacto está para além da esfera escolar da criança. O que está em causa é a própria
essência do humano em desenvolvimento, da linguagem à concentração, da memória
ao QI, da sociabilidade ao controlo emocional. Esta é uma agressão silenciosa para o
autor, levada a cabo se hesitações ou temperança, em benefício de poucos e em
detrimento da maioria. Desde o momento da sua conceção, a criança está programada
para a interação social, se o ambiente à volta dela se revelar defeituoso, o indíviduo só
pode expressar parte das suas capacidades. Desta forma, as interações promovidas,
ou restringidas, moldarão, de forma decisiva, todo o seu desenvolvimento, mais uma
vez, desde o cognitivo, passando pelo social.
“Mais ecrãs significa menos partilha e diálogo” (Desmurget 2021) e para promover o
desenvolvimento da criança mais vale investir na interação humana do que nos ecrãs,
uma vez quanto mais tempo pais e crianças passam nos ecrãs, mais a extensão e a
riqueza das suas relações mútuas diminui.
Sem grandes surpresas, a influência dos ecrãs influencia no desenvolvimento da
linguagem desde cedo, o que parece sustentar a ideia apresentada ao início, de evitar
a exposição da criança numa fase inicial da sua vida. Alguns estudos confirmam que a
probabilidade de atraso na aquisição linguística se multiplica várias vezes pela
exposição à televisão. A exposição ao défice do vídeo afeta a capacidade auditiva de
discriminação de sons, afetando não a fonética da criança, mas também o léxico,
diminuindo o vocabulário das crianças expostas em relação às que experienciam maior
contacto humano.
No que diz respeito aos videojogos na criatividade, é indiscutível que têm uma forte
capacidade inovadora, mas transferir a capacidade do designer para o utilizador, é
altamente ilusório. Dizer também que os jogadores se tornam mais bem equiparados
para trabalhar em grupo também parece outra afirmação perfeitamente gratuita, uma
vez que esta criatividade é fruto de mentes solitárias. Não será à toa que quando existe
um problema, um brainstorming coletivo tende a ser mais produtivo do que se um
elemento ou vários, pensassem sozinhos. Na atenção e rapidez parece, todavia, haver
consenso, uma vez que a declaração é assente em dados concretos. O jogador,
consegue uma ligeira otimização do processamento da informação visual recebido pelo
cérebro, conseguindo assim responder um pouco mais depressa a certos elementos
visuais no seu ambiente. Usando esta simples comparação em que a concentração é
um mecanismo que concentra toda a luz num lugar e escurece todo o resto, nos
videojogos acontece o oposto. Como o jogador tem de estar constantemente a varrer o
espaço visual, provoca uma atenção bastante dispersa, colocando por terra essa
afirmação de que os videojogos melhoram a concentração. Resumindo, os videojogos
são tão prejudiciais como a televisão e os dispositivos móveis. Aliás, uma meta-análise
realizada sobre o assunto confirmou, sem a menor ambiguidade, a existência de uma
relação positiva entre o consumo de ecrãs recreativos e perturbações de atenção.
Quanto maior for o consumo digital, mais alteradas ficam a qualidade e a duração do
sono, que atua diretamente sobre a concentração. Quando se fala de consumo digital
não tem de ser persistente ou longo para ser nocivo e descarrilar o comboio do
pensamento, basta um sinal sonoro do telemóvel para a nossa atenção se voltar
imediatamente para isso, despoletando uma série de perguntas: quem é, o que poderá
ser, devo olhar, devo esperar, etc. Como é preciso reconstruir o fluxo reflexivo e montá-
los novamente, gasta-se tempo e energia no processo e a fiabilidade cognitiva e a
produtividade ficam comprometidas. É aqui, que quando se diz que a organização
neuronal se libertou dos tormentos da realização sequencial, alcançando agora o
multitasking, não passa de uma ideia absurda, uma vez que o cérebro é incapaz de
realizar duas coisas ao mesmo tempo sem perder precisão, exatidão e produtividade. O
nosso cérebro não é um processador informático. Quando muito, podemos usar de
malabarismos, ou seja, processamos algo, passamos para outra coisa, armazena-se a
informação numa memória temporária, retomamos a primeira coisa, etc., sendo isto
suscetível de erros, omissões e perda de informação.
O nosso cérebro é ancestral e encontra-se geneticamente programado para adquirir
informações e receber uma recompensa sob a forma de dopamina (neurotransmissor
responsável por levar informações para várias partes do corpo e, quando é liberado
provoca a sensação de prazer e aumenta a motivação) sempre que tiver sucesso. É o
que acontece com a Internet, mais exatamente com as redes sociais. Para ficarmos
cativos, precisamos de libertar um pouco de dopamina de forma regular. É aí que entra
o like ou o comentário, que nos pressionará a contribuir cada vez mais e portanto,
receber mais comentários e likes.
Conclusões
O que devemos reter desta obra é que em primeiro lugar, a informação oferecida ao
público em geral carece de rigor e fiabilidade, uma vez que os jornalistas não têm tempo
para aprofundar todas as problemáticas, de forma a poderem expressar-se e peritar as
fontas de informação, tal é a quantidade de informação constante a processar. Em
segundo lugar, o consumo digital recreativo dos jovens é extravagante e descontrolado
e incide sobre atividades essencias ao desenvolvimento, tais como o sono, leitura,
capacidade de concentração, convívio familiar, trabalhos escolares, práticas desportivas
e artísticas, etc. Em terceiro lugar, este consumo está a prejudicar seriamente o
desenvolvimento intelectual e emocional das gerações futuras. Em quarto lugar, o nosso
cérebro não está preparado para a bruteza que o atinge. Para se desenvolver necessita
de temperança sensorial, presença humana, atividade física, sono e uma dieta cognitiva
favorável. Com o bombardeado constantemente a nível percetivo, o colapso das
relações interpessoais, perturbação do sono, comportamento sedentários, o cerébro
sofre e tem dificuldade em desenvolver-se. O facto é, que apesar de tanta interação
digital, vivemos numa era em que as depressões acontecem cada vez mais e em faixas
etárias baixas, que pode desencadear outros problemas, nomeadamente a taxa de
suícidio, principalmente nos jovens (bulling, frustações, pressões, etc.).
Algumas atitudes que podemos tomar e retiradas desta obra, com as quais concordo
plenamente, embora reconhecendo a dificuldade:
Não desistir, como pais e cidadãos preocupados, temos o dom da escolha e nada nos
obriga a compactuar com a entrega de dispositivos aos nossos filhos, até porque até à
data não existe estudo que a privação de ecrãs para fins recreativos possa levar ao
isolamento social ou outra desordem emocional. Enquanto que a presença destes ecrãs
tem impacto, a ausência não tem.
Outro aspecto é estabelecer regras precisas de consumo, de acordo com as permissas
abordadas na obra. Eis o que sugere o autor:
Antes dos 6 anos, nada de ecrãs! A criança tem toda uma panóplia de atividades a
realizar e que proporcionam toda uma série de desenvolvimentos motores, cognitivos e
intelectuais.
Depois dos 6 anos, restringir o consumo de 30m a 1 hora por dia.
Não permitir ecrãs no quarto da criança, se por um lado potenciam o uso abusivo, podem
também desencadear acessos inadequados.
Restringir conteúdos impróprios sob qualquer forma de ecrã ao máximo. No mínimo,
respeitar as restrições etárias.
Nada de ecrãs antes da escola, potenciar o diálogo com a criança, à mesa do pequeno
almoço, por exemplo.
Nada de ecrãs antes de dormir, o consumo de conteúdos excitantes é particularmente
nocivo e devíamos desligar tudo pelo menos hora e meia antes de dormirmos, para que
o nosso cérebro também comece a “desligar”.
Os ecrãs devem ser utilizados um de cada vez, e mantidos fora do alcance durante as
refeições, trabalhos de casa e conversas familiares.
Todo este tempo vazio pode ser dedicado a atividades como falar, interagir, dormir,
praticar desporto, artes, leitura, ou a não fazer simplesmente nada (que leva a criança
a ser criativa e procurar formas de se entreter). Devemos incentivar a este tipo de
comportamento para potenciar a interatividade e afetividade entre humanos (combate
ao isolamento). Outro aspecto importante é privilegiar o contacto com a natureza e o sol
(green time), que atua também sobre os níveis de serotonina e influencia positivamente
o sono e combate as depressões.
Na minha opinião senecessário já um grande esforço para existir algum tipo de
retrocesso neste tipo de comportamentos em ecrãs, já muito enraízados na sociedade
atual. Existe à volta dos mediatodo um sistema ou estratégia montado e com
interesses económicos difíceis de contrariar e gerações mais novas (e não só) bastante
dependentes da tecnologia. No entanto, entendo que a cada estudo mais aprofundado
sobre as consequências, se poderá dar um passo na direção correta. Será necessária
concerteza muita comunicação, muita “formatação” desde cedo, muitas iniciativas que
poderão começar nos pediatras, infantários, escolas e claro, em casa. Mas, se é
possível incutir tópicos como reciclagem, preservação do ambiente, este tema não é
impossível de se trabalhar.
Este trabalho permitiu enriquecer e esclarecer um ponto de vista que, embora não tenha
previamente dedicado estudo, já adivinhava ser perigoso. Como em tudo na vida, para
que seja saudável, deve ser equilibrado e no meu ponto de vista é o mais importante a
retirar desta análise. Devemos tentar poupar as novas gerações a este flagelo, e quando
não mais possível, permitir, limitar, mas sobretudo monitorizar.
Sem remorços, o futuro já nos agradece.
Bibliografia
Desmurget, Michel. 2021. A Fábrica de Cretinos Digitais - Os Perigos Dos Ecrãs Para Os Nossos
Filhos. 1st ed. edited by Contraponto. Lisboa: Contraponto.
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