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COSTA, Rosalina Pisco | NOVAS, Jorge Casas | SILVA, Paulo Resende da
Revista FORGES - Fórum da Gestão do Ensino Superior
nos Países e Regiões de Língua Portuguesa
n. 2, 2021, p. 62-86
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Participação estudantil (sem fronteiras)?
Percepções, potencialidades e obstácu-
los em contexto de Ensino Superior
Rosalina Pisco Costa1
Jorge Casas Novas2
Paulo Resende da Silva3
Resumo: Apesar de um discurso generalizado em torno da importância estra-
tégica da participação dos estudantes na boa gestão das instituições de ensino
superior como forma de fomentar a inclusão e superar desigualdades, a prática
encontra-se muito aquém dos padrões desejados. Este artigo apresenta resulta-
dos preliminares de uma inquirição a estudantes universitários sobre participa-
ção estudantil no âmbito de um projeto transnacional e interuniversitário em que
a Universidade de Évora é instituição parceira. O projeto STUPS – Participação
Estudantil Sem Fronteiras tem como objetivo geral estabelecer as bases de uma
rede europeia focada no desenvolvimento de novas práticas para promover a
participação estudantil em contexto de ensino superior. Neste texto são explo-
radas as perceções, nomeadamente as vantagens e obstáculos identicados por
estudantes universitários através de um questionário eletrónico aplicado na
Universidade de Évora em 2020. No nal, espera-se que os resultados obtidos
possibilitem a identicação de dimensões chave que permitam reetir de uma
forma ampla e sustentada sobre os diversos desaos que se colocam neste do-
mínio e, ao mesmo tempo, fundamentar sugestões de mudança nos processos
de funcionamento democrático das instituições de ensino superior tendo em
vista o aumento da participação de categorias de estudantes sub-representados
e desfavorecidos nos processos de tomada de decisão.
1 Universidade de Évora, Portugal. rosalina@uevora.pt
2 Universidade de Évora, Portugal. jlnovas@uevora.pt
3 Universidade de Évora, Portugal. pfs@uevora.pt
Participação estudantil (sem fronteiras)? Percepções, potencialidades e obstáculos em contexto de Ensino Superior
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Palavras-chave: Participação Estudantil; Ensino Superior; Associativismo;
Desigualdade; Inclusão.
Student participation (without bor-
ders)? Perceptions, potentials and obs-
tacles in Higher Education context
abstract: Despite a widespread discourse on the strategic importance of
students’ participation in the management of higher-education institutions
to foster inclusion and overcome inequalities, the practice is far below the
desired standards. This article presents preliminary results of a survey on
student participation in the context of a transnational and inter-university
project in which the University of Évora is a partner institution. The general
objective of the STUPS - Student Participation Without Borders, is to lay the
foundations for a European network focused on developing new practices
to promote student participation in the context of higher education. In this
paper, the perceptions are explored, namely the advantages and obstacles
identied by university students in a survey applied at the University of
Évora in 2020. It is expected that the results point to key dimensions allowing
to reect on a broad and sustained manner on the various challenges that
arise in this domain. Moreover, results are expected to base suggestions
for change in the democratic functioning processes of higher-education
institutions, with a view to increase the participation of under-represented
and disadvantaged categories of students in the decision-making processes.
Keywords: Student’s participation; Higher Education, Associations; Ine-
quality; Inclusion.
1 Introdução
A implementação do processo de Bolonha fez-se acompanhar da
armação crescente da importância da participação de estudantes nos
processos de tomada de decisão das instituições de ensino superior.
Apesar da diversidade subjacente aos sistemas de ensino em espaço
europeu, o maior envolvimento de estudantes foi assumido como
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um desiderato simultaneamente académico e político, sendo a par-
ticipação estudantil perspetivada não apenas como uma expressão
de cidadania ativa e plena, mas também como forma de fomentar
a inclusão e superar desigualdades em contexto de ensino superior
(ESU, 2020).
Não obstante a força dos princípios partilhados em torno da
importância estratégica da participação dos estudantes na boa
gestão das instituições de ensino superior, a prática encontra-se
muito aquém dos padrões desejados. Para esta avaliação concorrem
evidências que dão conta de uma participação diferenciada dos jo-
vens na Europa (Fletcher, 2005; Pilkington, Pollock, & Franc, 2018),
a que se juntam indicadores que apontam para uma participação
limitada, quer em termos de quantidade, quer em termos de quali-
dade, nomeadamente no que diz respeito ao envolvimento efetivo
de categorias de estudantes sub-representados e desfavorecidos.
O projeto STUPS – Participação Estudantil Sem Fronteiras é
um projeto transnacional e interuniversitário composto por cinco
instituições parceiras e liderado pela Universidade de Huelva
(Espanha)4. Inclui três instituições de ensino superior (Universidad
de Huelva (UHU), Espanha, Universidade de Évora (UÉ), Portugal
e The University of Applied Sciences of Upper Austria (FH Upper
Austria), Áustria), um órgão público de avaliação e acreditação
de atividades universitárias (Agencia Andaluza de Evaluación y
Acreditación Universitaria (AGAE), Espanha) e a organização es-
tudantil mais representativa da Europa com membros de 40 países
do espaço de ensino superior europeu (The European Students’
Union (ESU), Bélgica).
O objetivo geral do projeto STUPS é aumentar a participação
estudantil e estabelecer as bases de uma rede europeia focada no
desenvolvimento de novas práticas para promover a participação
estudantil em contexto de ensino superior. Para concretizar este
m, os objetivos especícos do projeto visam aumentar e melhorar
o conhecimento, a cooperação, a formação e a sensibilização para
a participação de estudantes. A participação de estudantes é pers-
petivada como fonte de inovação social e fundamental para esta-
belecer uma governança eciente e um sistema de ensino superior
4 Projecto ERASMUS+ (Ref. 2019.1.ES01-KA2O3-065945).
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mais inclusivo (STUPS, 2020). Os grupos-alvo do projeto STUPS
são estudantes, líderes estudantis, estudantes de categorias sub-
-representadas e desfavorecidas e gestores universitários. Assim, o
projeto reconhece o importante papel desempenhado ao nível da
gestão universitária com competência na participação, inclusão e
igualdade dos alunos para dialogar e aumentar a consciência sobre
os benefícios da cooperação.
Neste texto são exploradas as perceções, nomeadamente as
vantagens e obstáculos identicados por estudantes universitários
através de um questionário eletrónico aplicado na Universidade de
Évora em 2020. No nal, espera-se que os resultados obtidos pos-
sibilitem a identicação de dimensões chave que permitam reetir
de uma forma ampla e sustentada sobre os diversos desaos que se
colocam neste domínio e, ao mesmo tempo, fundamentar sugestões
de mudança nos processos de funcionamento democrático das insti-
tuições de ensino superior tendo em vista o aumento da participação
de categorias de estudantes sub-representados e desfavorecidos nos
processos de tomada de decisão.
2 Revisão da literatura
A participação de estudantes no governo das instituições de
ensino superior é considerada um dos valores fundamentais do
Processo de Bolonha e do consequente Espaço Europeu de Ensino
Superior. Tem as suas raízes no modelo democrático de governança
do ensino superior, que surgiu na Europa após as revoltas estudantis
na década de 1960, e estipula que as universidades como as institui-
ções devem ser governadas democraticamente, com a participação
de todos os constituintes politicamente signicativos, incluindo os
estudantes (Klemenčič, 2012). Em Portugal, o papel político que
as associações estudantis desempenharam na democratização da
sociedade portuguesa e o seu envolvimento nas mudanças sociais
e políticas que se seguiram à revolução de 1974 constituem marcos
de referência no que concerne ao desenvolvimento da participação
estudantil. Progressivamente, no período pós 25 de Abril, alterou-se
o status reconhecido aos estudantes no seio das instituições de ensino
superior, nomeadamente o papel especíco que desempenham nos
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processos de decisão colegial, reconhecido e formalizado na legisla-
ção que enforma as ideias de autonomia universitária e politécnica
e que viria a ser publicada, respetivamente, nas décadas de 1980 e
1990 (Cardoso e Santos, 2011).
De forma ampla, a participação estudantil pode abranger todos
os aspetos da vida escolar para os quais os estudantes podem dar
uma contribuição, seja formalmente, por meio das estruturas e meca-
nismos existentes, seja informalmente, por meio de ação individual
(Huddleston, 2007). Nesse sentido, a participação formal é coletiva,
ao passo que a participação informal é individual e diz respeito às
oportunidades informais dos estudantes de inuenciarem a sua
própria situação e educação (Bartley et al., 2010).
Para além de motivações altruísticas, que resultam da crença
de que, ao participarem, os alunos se comprometem com a apre-
ensão e prática dos princípios democráticos, associam-se também
por norma à participação estudantil, e à promoção da mesma, mo-
tivações extrínsecas e intrínsecas (Bergmark e Westman, 2018). As
motivações extrínsecas emergem dos próprios direitos dos alunos
de participar nas decisões que afetam e dão forma à sua educação,
com benefício para a universidade, uma vez que a participação do
aluno é percebida como tendo um impacto positivo nos níveis de
aproveitamento e nas taxas de conclusão dos cursos, fatores centrais
na avaliação da qualidade do ensino. Já as motivações intrínsecas são
determinadas pelos benefícios, para o próprio aluno, que decorrem
do seu envolvimento (participação), nomeadamente em termos de
aprendizagem, desenvolvimento e motivação.
Desde um ponto de vista teórico, a participação estudantil
tende a ser enquadrada em torno de três diferentes perspetivas
(Huddleston, 2007): perspetiva normativa, perspetiva instrumental
ou pragmática e perspetiva educacional. Relativamente à perspetiva
normativa é possível distinguir três abordagens (i) o que, por um
lado, faz assentar a justicativa (da participação estudantil) em
princípios éticos ou normas morais, que podem ou não ser vertidos
na legislação (liberdade de expressão, liberdade de associação, etc.);
(ii) o que, por outro, se consubstancia no conceito de cidadania de-
mocrática, segundo o qual os estudantes são cidadãos com direitos e
responsabilidades, cabendo às escolas o dever de criar as condições
para o seu exercício. A este propósito, Cheng et al. (2020) referem que
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o que se ensina sobre cidadania, principalmente a participação ativa,
deve ser praticado e vivenciado nas escolas, para evitar a alienação
e a apatia. Yuen et al. (2020) defendem, por seu lado, que a rotina de
participação na tomada de decisões não pode ser adiada até à idade
adulta, e que essa preparação para a cidadania deve ser concretizada
com o incentivo à participação dos alunos no governo das escolas;
por m, (iii) o que concebe o envolvimento (participação) dos estu-
dantes mais como uma forma de valorização enquanto indivíduos
e não tanto a de garantir direitos enquanto tal. De acordo com a
perspetiva instrumental ou pragmática, a participação estudantil
gera benefícios para a escola e/ou para a sociedade, na medida em
que induz a maior disciplina, a melhores relações professor-aluno,
menos exclusões e atitudes mais positivas em relação à escola e à
aprendizagem. É associada também à gestão escolar e à tomada de
decisões mais ecazes, sendo que algumas formas de participação
são consideradas como tendo o potencial de inuenciar positivamen-
te a tomada de decisões ao nível da política educacional regional ou
nacional. Finalmente, a perspetiva educacional é centrada na apren-
dizagem individual do aluno, associando a participação estudantil
à melhoria dos resultados educacionais, incluindo o desempenho
geral e aspetos de desenvolvimento e bem-estar pessoal, como a
autoestima ou a autoconança, um maior sentido de autoecácia e
responsabilidade pessoal e coletiva.
O estudo da participação estudantil parece ter-se centrado mais
nas instituições escolares que compreendem os vários ciclos de es-
tudo pré-universitário que nas instituições de ensino superior. Não
obstante, seja qual for o ângulo de análise, a participação estudantil
tornou-se, em certa medida, um aspeto institucionalizado e um direi-
to esperado (Lizzio e Wilson, 2009), e o resultante impacto de longo
prazo, considerando a participação no governo das instituições de
ensino e/ou outras formas de participação, é o desenvolvimento
de habilidades essenciais para a vida dos estudantes e o facto de
os estimular a tornarem-se seres humanos completos e cidadãos
responsáveis (Cheng et al., 2020), o que acaba por desembocar em
sentimentos de pertença e envolvimento, muitas vezes resultado
do reconhecimento e do bem-estar dos estudantes (Masika e Jones,
2016). Ainda assim, como sublinham (Bergmark e Westman, 2018),
é necessário não correr o risco de considerar os processos nos quais
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os estudantes estão envolvidos e ativos como sinónimo de omni-
presença, positividade e ausência de problemas, com a suposição
subjacente de que, sendo observáveis e traduzindo ações públicas
dos estudantes, são desejáveis, e não conceber outras ações mais
passivas, como ouvir e pensar, como sinal de participação.
A questão da participação tem também relevância particular no
que se refere à inclusão social, nomeadamente para instituições onde
categorias de membros ocupam funções dependentes, vulneráveis
ou de baixo status (Lizzio e Wilson, 2009). De facto, como acrescen-
tam os autores, embora a participação estudantil se tenha tornado,
em certa medida, um aspeto institucionalizado e um direito espera-
do, a participação contínua de categorias desvalorizadas socialmente
ou menos representadas nos processos de tomada de decisão traz
benefícios, ao mesmo tempo que suscita desaos particulares. Tudo
isto toma maior relevância e requer redobrada atenção num contexto
de internacionalização crescente, em que as instituições estão a re-
ceber alunos de todas as partes do mundo (Miorando e Leite, 2018).
A diversidade e complexidade das instituições de ensino superior
levanta, pois, questões particulares à participação estudantil que
importa estudar e aprofundar.
3 Enquadramento do estudo e metodologia
O projeto STUPS prevê a concretização de diversas atividades
a m de promover um alto nível de participação, integrar os seus
princípios e resultados para garantir qualidade e excelência de
resultados, e atingir um impacto substancial nas instituições envol-
vidas. Para alcançar esse m, estão previstas atividades de ensino,
aprendizagem e formação, designadamente: um teste piloto de um
índice de participação estudantil, uma simulação de MOOCs sobre
participação estudantil e soft skills, e um workshop para estimular
processos de gestão participativa e integrada (STUPS, 2020).
O método de trabalho é participativo, aberto e transparente,
baseado na cooperação horizontal e multidirecional. Os resultados
esperados estão direta e indiretamente relacionados entre si e podem
ser classicados de acordo com as prioridades que abordam, nomea-
damente (1) melhoria da governança: a melhoria do funcionamento
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democrático e a modernização da gestão são esperadas como re-
sultado da maior participação dos alunos; (2) sistemas de educação
mais inclusivos por meio do aumento da participação de grupos
sub-representados e desfavorecidos nos processos de tomada de de-
cisão dos alunos; (3) inclusão social como resultado de uma cultura
mais equitativa e igualitária de participação das comunidades locais
em consonância com o conceito de osmose social. A longo prazo,
espera-se que o projeto contribua para aumentar a conscientização
de estudantes, gestores e formuladores de políticas. A padronização
de um modelo de análise comum de participação estudantil e inclu-
são ampliada é antecipada graças ao aumento do número de líderes
sociais vindos de origens desfavorecidas (STUPS, 2020).
Como forma de apoiar a participação da Universidade de Évo-
ra no projeto STUPS foi proposta uma auscultação dos estudantes,
centrada principalmente sobre as perceções, vantagens e obstáculos à
participal estudantil em contexto de ensino superior. Empiricamente,
a investigação assumiu a forma de um estudo de caso de natureza
eminentemente quantitativa (Neuman, 2011), circunscrito à Uni-
versidade de Évora. A recolha de dados foi efetuada através de um
questionário eletrónico anónimo, autoadministrado, disponibilizado
online em português na plataforma Google Forms entre 14 e 25 de
Outubro de 2020 sob o título “Participação Estudantil em contexto
de Ensino Superior: Perceções, Potencialidades e Obstáculos”5. Uma
amostra não probabilística, de tipo acidental e em bola de neve foi
construída através de procedimentos de recrutamento especica-
mente desenhados para atender à especicidade desse método de
recolha de dados (Costa, 2017) e incluir estudantes dos vários ciclos
de estudo. O questionário foi composto por um total de 14 questões
distribuídas por três dimensões principais: caracterização sociode-
mográca, caracterização socio-académica e perceções em torno
da participação estudantil. Após a validação e tratamento inicial os
dados foram submetidos a uma análise estatística exploratória. De
modo complementar, e no caso particular das questões abertas, foi
utilizado o software NVivo12 (©QSR International) para desenvolver
uma análise qualitativa de conteúdo de tipo temático-categorial (Neu-
endorf, 2017; Miles & Huberman, 2014). Os resultados apresentados
5 Formulário disponibilizado on-line em URL: hps://bit.ly/3nNtLEj.
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são explorados gracamente através de grácos, nuvens de palavras
e mapas de árvore elaborados na sequência da consulta de frequência
de palavras operada através do NVivo.
4 Resultados
4.1 Caracterização sociodemográca
A amostra inquirida no âmbito do Inquérito por Questionário à
Participação Estudantil na Universidade de Évora (IQ-PEUE/2020)
é constituída por 297 indivíduos, estudantes inscritos à data na
Universidade de Évora. Do total de respondentes, 70,6% armou
ser do sexo feminino e 29,4% do sexo masculino. Os inquiridos
distribuem-se entre os 17 e os 59 anos de idade, sendo que a média
de idades é de 23,59 anos e o desvio-padrão de 8 anos.
Quando questionados sobre se consideram que pertencem a
alguma categoria de estudantes que estão sub-representados ou
desfavorecidos, 85,1% dos inquiridos respondeu negativamente
(Figura 1). Entre os 14,9% que responderam armativamente, as
categorias especicadas dizem respeito, ora à nacionalidade e re-
sidência (e.g. estudantes internacionais e nacionais deslocados da
residência habitual), ora a características de índole individual (e.g.
estudantes com mobilidade reduzida, estudantes com necessidades
educativas especiais, estudantes mais velhos), ora a características de
natureza social, nomeadamente de relação com a esfera económica,
o mundo do trabalho, vida familiar e estilo de vida (e.g. estudantes
desfavorecidos economicamente, trabalhadores estudantes e pais/
mães estudantes (no caso, de menores de idade), trabalhadores es-
tudantes, dirigentes associativos, vegetarianos/vegan). No total, as
categorias mais indicadas foram as relacionadas com as condições
de desfavorecimento económico (10), estudante internacional (9) e
trabalhador-estudantes (7).
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FIGURA 1 – Auto-classicação em categoria de estudantes
sub-representados ou desfavorecidos
Casos válidos=295
4.2 Caracterização socio académica
A maior parte dos estudantes respondentes frequenta
à data um curso de 1.º ciclo na Universidade de Évora.
São 75,1% os que frequentam um curso de licenciatura
ou mestrado integrado, seguidos dos estudantes de
mestrado (18,1%) e de doutoramento (6,8%) (Figura 2).
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FIGURA 2 – Ciclo de estudos que frequenta na Universidade de Évora
Casos válidos=293
Do total de estudantes respondentes, uma percentagem muito
semelhante distribui-se entre aqueles para quem este é o primeiro
ano que estudam nesta universidade (38%) e os que estudam na
Universidade de Évora entre 1 e 3 anos (36,4%). Entre 3 e 6 anos
estão 19,5% dos estudantes inquiridos, seguidos de 4% que estudam
há mais de 6 anos e 2 % de estudantes que estão noutra situação,
como seja a de serem estudantes de mobilidade, frequentarem uni-
dades curriculares isoladas ou porque são estudantes que tendo já
estudado anteriormente na universidade, estiveram alguns anos
fora (Figura 3)
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FIGURA 3 – Antiguidade na Universidade de Évora
Mais de metade dos estudantes inquiridos frequenta um curso
integrado na Escola de Ciências Sociais (59,3%). Uma percentagem
superior a ¼ dos estudantes frequenta um curso integrado na Escola
de Ciências e Tecnologia (26,6%), seguidos de 5,7% de estudantes da
Escola Superior de Enfermagem S. João de Deus e 5,4% de estudan-
tes da Escola de Artes. Do total de respondentes, 3% frequenta um
curso integrado no Instituto de Investigação e Formação Avançada
(Figura 4).
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FIGURA 4 – Unidade Orgânica de acolhimento
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Mais de metade dos estudantes inquiridos frequenta um curso integrado na Escola de
Ciências Sociais (59,3%). Uma percentagem superior a ¼ dos estudantes frequenta um curso
integrado na Escola de Ciências e Tecnologia (26,6%), seguidos de 5,7% de estudantes da
Escola Superior de Enfermagem S. João de Deus e 5,4% de estudantes da Escola de Artes. Do
total de respondentes, 3% frequenta um curso integrado no Instituto de Investigação e Formação
Avançada (Figura 4).
Fig. 4 – Unidade Orgânica de acolhimento.
4.3. Perceções em torno da participação estudantil em contexto de ensino superior
Questionados sobre qual a primeira palavra em que pensam quando ouvem falar em
participação estudantil em contexto de ensino superior, os estudantes inquiridos identificam,
com contagens superiores a 15 referências, “associação” (20), “integração” (16), “estudante(s)”
(15) (Figura 5 e 6)6.
6 As consultas de frequência de palavras executadas utilizaram como critérios principais a
exibição de palavras com mínimo de 3 caracteres e agrupamento “com palavras derivadas”.
4.3 Perceções em torno da participação estudantil em
contexto de ensino superior
Questionados sobre qual a primeira palavra em que
pensam quando ouvem falar em participação estudantil
em contexto de ensino superior, os estudantes inquiridos
identicam, com contagens superiores a 15 referências,
“associação” (20), “integração” (16), “estudante(s)” (15)
(Figura 5 e 6)6.
6 As consultas de frequência de palavras executadas utilizaram como critérios prin-
cipais a exibição de palavras com mínimo de 3 caracteres e agrupamento “com
palavras derivadas”.
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FIGURA 5 – Nuvem de palavras: Qual é a primeira palavra em que
pensa quando ouve falar em participação estudantil em
contexto de ensino superior?
Casos válidos=255
Fonte: Elaboração própria com base em IQ-PEUE/2020 e recurso a NVivo 12 Pro.
FIGURA 6 – Mapa de Árvore: Qual é a primeira palavra em que
pensa quando ouve falar em participação estudantil em
contexto de ensino superior?
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As palavras mais referidas na associação a participação estu-
dantil em contexto de ensino superior parecem signicar simulta-
neamente uma expressão de concretização da participação juvenil
em contexto de ensino superior (a “associação” de “estudantes”),
mas também o, ou um, dos propósitos que cabe a tal associação,
concretamente o de promover a “integração” de estudantes/ “alu-
nos” na universidade.
Quando questionados sobre qual o principal espaço de interven-
ção em que pensam quando ouvem falar em participação estudantil
em contexto de ensino superior, as respostas obtidas identicam,
com contagens superiores a 15 referências, “associação” (47), “uni-
versidade(s)” (39), “estudantes” (38), “aula(s)” (20), “sala(s)” (18) e
“académica” (16) (Figura 7 e 8).
FIGURA 7 – Nuvem de palavras: Qual é o principal espaço de inter-
venção em que pensa quando ouve falar em participação
estudantil em contexto de ensino superior?
Casos válidos=222
Fonte: Elaboração própria com base em IQ-PEUE/2020 e recurso a NVivo 12 Pro.
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FIGURA 8 – Mapa de Árvore: Qual é o principal espaço de interven-
ção em que pensa quando ouve falar em participação
estudantil em contexto de ensino superior?
Casos válidos=222
Fonte: Elaboração própria com base em IQ-PEUE/2020 e recurso a NVivo 12 Pro.
As palavras mais referidas na associação a espaços de interven-
ção para a participação estudantil em contexto do ensino superior
parecem assim apontar para uma dupla perceção: por um lado a
que reconhece de forma inequívoca o papel desempenhado por um
coletivo de pares, aqui expresso na “associação” [de “estudantes”]
que, juntos, fazem ouvir a sua voz no plano macro da “universida-
de”; por outro, o micro espaço que confronta sicamente professores
e alunos, isto é, o espaço da “sala” de “aula”.
Para aferir a participação em várias dimensões da vida aca-
démica os inquiridos foram questionados sobre as áreas em que
participam ou já participaram enquanto estudantes da Universidade
de Évora, nomeadamente, os órgãos de governo e outros órgãos da
Universidade (Conselho Geral, Senado, Conselho de Avaliação), nas
Escolas (Assembleia de Escola, Conselho Pedagógico, Comissões de
Curso, ...), e ao nível da dinamização sociocultural e desportiva (As-
sociação Académica, Núcleo de Estudantes, Liga de Estudantes, Bol-
sa de Voluntariado, ...). A área da dinamização cultural e desportiva
é aquela em que os estudantes mais participam ou já participaram.
Ainda assim, apenas 1/5 (21,4%) dos estudantes inquiridos o fez.
Os valores são ainda mais pequenos para a participação nas Escolas
(9,5%) e nos órgãos de governo e outros órgãos da Universidade
(1,7%). As áreas que parecem atrair mais os estudantes seguem essa
ordem. Em concreto, cerca de metade dos estudantes inquiridos
(48%) não participa nem nunca participou, mas pensa vir a participar
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na dinamização cultural e desportiva, 39,5% nas escolas e 29,9% nos
órgãos de governo e outros órgãos da Universidade. A contrário,
as áreas que parecem ser menos atrativas aos estudantes seguem
precisamente essa ordem invertida: mais de metade dos estudantes
(68,4%) não participa, nunca participou nem pensa vir a participar
nos órgãos de governo e outros órgãos da Universidade, 51% não
participa, nunca participou nem pensa vir a participar nas Escolas,
e apenas cerca de 1/3 (30,6%) não participa, nunca participou nem
pensa vir a participar na dinamização sociocultural e desportiva
(Quadro 1).
QUADRO 1 – Áreas em que participa ou já participou enquanto estu-
dante da Universidade de Évora
Órgãos de
Governo e ou-
tros órgãos da
Universidade
Escolas Dinamização
sociocultural e
desportiva
n % n % n %
Participa ou já
participou 5 1,7 28 9,5 63 21,4
Não participa
nem nunca parti-
cipou, mas pensa
vir a participar
88 29,9 116 39,5 141 48
Não participa,
nunca participou
nem pensa vir a
participar
201 68,4 150 51 90 30,6
Total 294 100 294 100 294 100
Fonte: IQ-PEUE/2020.
Para os estudantes inquiridos, as principais vantagens da
participação estudantil em contexto de ensino superior dividem-
-se entre as que se orientam a uma intervenção na sociedade
(e.g. a possibilidade de intervir na tomada de decisões da vida
organizativa da universidade (69%), a possibilidade de contri-
buir para uma sociedade mais justa (67,3%), a capacitação para
o exercício de uma cidadania ativa (59,5%) e a representação de
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uma categoria de estudantes sub-representados ou desfavoreci-
dos (52%)) e a benefícios no plano pessoal (e.g. o enriquecimento
do currículo (67%), o alargamento da rede de contactos (52,4%)
e a realização pessoal (48%)). O benefício de direitos associados
aos regimes especiais constitui a vantagem menos apontada pe-
los estudantes com um valor percentual grandemente afastado
dos anteriores (20,4%) (Quadro 2).
QUADRO 2 – Vantagens da participação estudantil em contexto de
ensino superior
Vantagem n %
Possibilidade de intervir na tomada de decisões da
vida organizativa da universidade 203 69,0
Possibilidade de contribuir para uma sociedade mais
justa 198 67,3
Enriquecimento do currículo 197 67,0
Capacitação para o exercício de uma cidadania
activa 175 59,5
Alargamento da rede de contactos 154 52,4
Representação de uma categoria de estudantes sub-
-representada ou desfavorecidos 153 52,0
Realização pessoal 141 48,0
Benefício de direitos associados aos regimes espe-
ciais 60 20,4
Casos válidos=294 (Questão de escolha múltipla)
Fonte: IQ-PEUE/2020.
No que diz respeito aos obstáculos à participação estudantil
em contexto de ensino superior, destaca-se sobremaneira o desco-
nhecimento sobre o funcionamento dos órgãos, apontado por 71,8%
dos inquiridos, quando os restantes obstáculos colhem percentagem
inferiores a 50%. De facto, e em geral, parecem ser as considerações
de ordem pessoal as principais na obstaculização à participação
estudantil: o desconhecimento sobre os direitos associados à parti-
cipação estudantil é apontado por 49,5% dos estudantes inquiridos,
COSTA, Rosalina Pisco | NOVAS, Jorge Casas | SILVA, Paulo Resende da
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a mesma percentagem que sublinha a diculdade de conciliação com
o estudo, enquanto 42,5% assinala a falta de tempo e 26,5% a falta
de motivação pessoal. A ausência de uma cultura de participação
estudantil é assinalada por 38,3% dos estudantes inquiridos e a
sujeição a inuências político-partidárias por 23%. De referir ainda
que a inibição à exposição pública constitui o obstáculo menos re-
ferido, apontado por apenas 1/5 dos inquiridos (20,9%) (Quadro 3).
QUADRO 3 – Obstáculos à participação estudantil em contexto de
ensino superior
Obstáculos n %
Desconhecimento sobre o funcionamento dos órgãos 206 71,8
Desconhecimento sobre os direitos associados à partici-
pação estudantil 142 49,5
Diculdade de conciliação com o estudo 142 49,5
Falta de tempo 122 42,5
Ausência de uma cultura de participação estudantil 110 38,3
Falta de motivação pessoal 76 26,5
Sujeição a inuências político-partidárias 66 23,0
Inibição à exposição pública 60 20,9
Casos válidos=287 (Questão de escolha múltipla)
Fonte: IQ-PEUE/2020.
Em questão aberta facultativa foram solicitados aos inquiridos
comentários adicionais, sugestões ou partilhas sobre o tema da
participação estudantil em contexto de ensino superior. Apesar
do número limitado de respostas (18), os estudantes que o zeram
parecem valorizar a participação estudantil como forma de tornar
audível a voz dos estudantes, contribuindo dessa forma para o
exercício de uma cidadania mais ativa e, através dela, atenuar as
desigualdades sociais, inclusive no espaço da universidade:
“Penso que estas iniciativas são bastante importantes e
contribuem para uma sociedade mais justa, estudantes
informados e aconselhados acerca de diversos assuntos.”
Estudante de Licenciatura/Mestrado Integra-
do, 23 anos
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“[é] uma iniciativa bastante importante, uma vez que to-
dos os estudantes devem ter direito a uma voz mais ati-
va na sociedade. Conhecer e discutir sobre os assuntos
da política é uma mais valia para enriquecer o nosso co-
nhecimento a nível pessoal. É necessário uma maior par-
ticipação e disponibilidade de todos se realmente que-
rem mudar as desigualdades que há e mostrar que não
são mais uma pessoa “adormecida” que aceita tudo o
que lhe é apresentado. Os jovens são o futuro! Lutamos
por uma sociedade justa!”
Estudante de Licenciatura/ Mestrado Integra-
do, 18 anos
Não obstante, como os testemunhos adiante demonstram, os
estudantes reconhecem a falta ou limitada participação estudantil
entre os seus pares:
“Eu sinto que os estudantes universitários, só querem
assistir aula e terminar o curso, não pensam em contri-
buir para comunidade, não procuram sair das salas de
aula e não enxergam que universidade não é escola.”
Estudante de mestrado, 31 anos
“[…] a participação estudantil revela, por vezes, a fal-
ta de interesse dos alunos nesta participação. Isso é visí-
vel, muitas vezes, pelo número de pessoas que votam.”
Estudante de doutoramento, 24 anos
“Infelizmente assisto a quase uma década de desinteres-
se por parte de colegas. A maioria reclama, mas só a mi-
noria age.”
Estudante de Doutoramento, 30 anos
A solução apontada passa pela promoção da importância da
participação estudantil junto dos estudantes, seja em iniciativas
mais alargadas, através nomeadamente dos media, seja a partir de
encontros que se socorram de espaços e linguagens próximas dos
estudantes:
COSTA, Rosalina Pisco | NOVAS, Jorge Casas | SILVA, Paulo Resende da
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“Há necessidade da sua promoção”
Estudante de Doutoramento, 51 anos
“Divulgar em vários meios da mídia, sobre a importân-
cia da participação”
Estudante de Mestrado, 48 anos
“[…] Talvez a sugestão passe por promover esta parti-
cipação numa linguagem e ambiente que os estudan-
tes entendam. Não colocar cartazes ou enviar emails,
mas fazer ações de formação, eventos, divulgação, pre-
sencialmente com momentos lúdicos (sim, álcool mode-
rado) e no espaço que estes habitualmente frequentam
(BARUÉ e Bilhar Eborense).”
Estudante de Mestrado, 25 anos
Conclusão
Motivados pelo contexto mais amplo de desenvolvimento de
um projeto transnacional e interuniversitário em que os coautores
são investigadores parceiros, apresentamos neste texto os resulta-
dos exploratórios de um inquérito a uma amostra de estudantes
universitários sobre o tema da participação estudantil.
Apesar do carácter exploratório do estudo e das limitações da
amostra, os resultados obtidos permitem avançar no conhecimento
das perceções, vantagens e obstáculos associados à participação
juvenil em contexto de ensino superior. Desde logo, os dados
analisados evidenciam que na perceção dos estudantes universi-
tários inquiridos para este estudo, a participação estudantil parece
demasiado circunscrita à intervenção das associações académicas.
Não obstante a importância destas associações, inclusive no reco-
nhecimento do papel que desempenham ao nível da integração de
estudantes, a centralidade das respostas em seu redor parece deixar
de fora um entendimento mais amplo sobre a pluralidade de formas
de participação estudantil. Apesar disso, e embora menos frequente,
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emerge como particularmente relevante a enunciação do espaço da
sala de aula como espaço de intervenção de participação estudantil
em contexto de ensino superior. De facto, ao mesmo tempo que os
estudantes reconhecem o papel desempenhado por um coletivo
de pares que juntos fazem ouvir a sua voz no plano macro da vida
universitária, parecem também despertos para fazer do espaço de
sala de aula o lugar da intervenção quotidiana, porventura mais
frequente, próxima e focada.
Os dados recolhidos permitem ainda concluir sobre uma
diminuta participação estudantil em várias dimensões da vida
académica, nomeadamente, nos órgãos de governo e outros órgãos
da Universidade (Conselho Geral, Senado, Conselho de Avaliação),
nas Escolas (Assembleia de Escola, Conselho Pedagógico, Comissões
de Curso, ...), e ao nível da dinamização sociocultural e desportiva
(Associação Académica, Núcleo de Estudantes, Liga de Estudantes,
Bolsa de Voluntariado, ...), um fenómeno transversal que, de acordo
com Cardoso e Santos (2011), pode ser associado a uma certa «fadiga
democrática» entre estudantes e à pressão que sentem para concluir
os estudos, o que deixa pouco tempo para as tarefas mais institu-
cionais. No conjunto, a área da dinamização cultural e desportiva
é aquela em que os estudantes mais participam ou já participaram.
Ainda assim, apenas cerca de 1/5 dos estudantes inquiridos o fez.
Os valores são ainda mais pequenos para a participação nas Esco-
las e nos órgãos de governo e outros órgãos da Universidade. As
áreas que parecem atrair mais os estudantes seguem essa ordem e
as áreas que parecem ser menos atrativas aos estudantes seguem
precisamente essa ordem invertida.
Para o conjunto de estudantes inquiridos, as principais van-
tagens da participação estudantil em contexto de ensino superior
parecem dividir-se entre as que se orientam a uma intervenção na
sociedade (e.g. a possibilidade de intervir na tomada de decisões
da vida organizativa da universidade, a possibilidade de contribuir
para uma sociedade mais justa, a capacitação para o exercício de
uma cidadania ativa e a representação de uma categoria de estudan-
tes sub-representados ou desfavorecidos) e a benefícios no plano
pessoal (e.g. o enriquecimento do currículo, o alargamento da rede
de contactos e a realização pessoal). Sobressaem essencialmente,
portanto, traços de motivações altruísticas e intrínsecas, talvez por-
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que, como noutros estudos (cf. e.g. Bergmark e Westman, 2018), o
benefício para a universidade resultante da participação estudantil
(a motivação extrínseca) parecer ser uma «não-questão» para os
alunos. De referir ainda que o benefício de direitos associados aos
regimes especiais, no sentido mais utilitarista e porventura menos
ético constitui a vantagem menos apontada pelos estudantes com
um valor percentual que se distancia grandemente das restantes.
Quanto aos obstáculos à participação estudantil em contexto
de ensino superior, os resultados apontam para a maior prepon-
derância do desconhecimento, nomeadamente o desconhecimento
sobre o funcionamento dos órgãos, como o principal obstáculo na
perspetiva dos estudantes. De facto, parecem ser principalmente
considerações de ordem pessoal as que obstaculizam a uma maior
participação estudantil (e.g. desconhecimento sobre os direitos as-
sociados à participação estudantil, a diculdade de conciliação com
o estudo, a falta de tempo, a falta de motivação pessoal e a inibição
à exposição pública).
A concluir, o desconhecimento sobre os conteúdos e processos
associados à participação estudantil em contexto de ensino superior
agura-se como o principal desao para um projeto que pretende,
em última instância, aumentar a participação estudantil em insti-
tuições de ensino superior no espaço europeu. Ao mesmo tempo,
consolida a necessidade de desenvolvimento de novas práticas
que permitam uma efetiva promoção da participação estudantil
em contexto de ensino superior. O nosso argumento é o de que o
conhecimento, e não apenas a sensibilização dos estudantes, é fun-
damental para estabelecer uma governança eciente e um sistema
de ensino superior mais inclusivo, democrático e justo.
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