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Anais do 10º CIDI e 10º CONGIC
Kelli C.A.S. Smythe, Rafael de Castro Andrade (orgs.)
Sociedade Brasileira de Design da Informação – SBDI
Curitiba | Brasil | 2021
Proceedings of the 10th CIDI and 10th CONGIC
Kelli C.A.S. Smythe, Rafael de Castro Andrade (orgs.)
Sociedade Brasileira de Design da Informação – SBDI
Curitiba | Brazil | 2021
O design de Luís Jardim: pesquisa, catalogação e
difusão da memória gráfica pernambucana
The design of Luís Jardim: research, cataloging and
dissemination of Pernambuco's graphic memory
Bruno Pereira Verissimo, Sílvio Romero Botelho Barreto Campello
Luís Jardim, Memória Gráfica de Pernambuco, Metodologia, História do Design
Este artigo relata o processo metodológico da pesquisa nos acervos que resultou no site “O Design de
Luís Jardim”. Para isso adaptou-se o método “Conjunto Metodológico para Pesquisa em História do
Design a partir de Materiais Impressos” (2016) com o objetivo de catalogar e criar um banco de dados
online com as obras que o artista gráfico Luís Jardim produziu para a imprensa pernambucana das
décadas de 1920 e 1930. Portanto, o objetivo deste artigo é apresentar todo o processo da pesquisa, bem
como as adaptações ao método, algumas experiências da catalogação e a contribuição do design da
informação nestes tipos de estudo.
Luís Jardim, Pernambuco Graphic Memory, Methodology, History of Design
This paper reports the methodological process of research in the collections that resulted in the website
“O Design de Luís Jardim”. For this, the method "Methodological Procedures for Design History Research
from the analysis of printed materials" (2016) was adapted in order to catalog and create an online database
with the works that the graphic artist Luís Jardim produced for the Pernambuco press of the 1920s and
1930s. The objective of this paper is to present the entire research process, as well as adaptations to the
method, some cataloging experiences and the contribution of information design in these types of study.
1 Introdução
Se as pessoas não tiverem vínculos profundos com sua memória ancestral, com as referências que
dão sustentação a uma identidade, vão ficar loucas neste mundo maluco que compartilhamos
(KRENAK, 2019).
Apesar das duas décadas de pesquisa sobre o campo da Memória Gráfica no Brasil, o muito
que foi feito durante este período é somente o começo promissor, como bem pontuado pelo
historiador Rafael Cardoso (2018). Os arquivos se tornaram o ambiente fundamental desses
pesquisadores, as metodologias se apresentam como ferramentas cada vez mais sólidas
na condução de tais pesquisas e o campo vem se expandindo e se ramificando nas mais
diversas experiências regionais do país. Está mais que claro que, em termos culturais, somos
diversos brasis dentro de um mesmo território e investigar nossa cultura material a partir
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dessa diversidade é a principal forma de construirmos uma História do Design
essencialmente brasileira.
Priscila Farias e Marcos da Costa Braga (2018), descrevem que a principal e ampla meta
final dos estudos de Memória Gráfica é a de inserir os artefatos gráficos na cultura, na memória
e na identidade local de um povo, através de resgate e constituição de acervos de fontes
primárias de material gráfico para futuras consultas.
A pesquisa de mestrado “O Design de Luís Jardim: Ilustrações e Artes Gráficas para a
Imprensa Periódica Pernambucana do começo do Século XX” (2020) teve como um dos
objetivos o resgate de uma parte da produção gráfica de Luís Jardim, resultando em um banco
de dados das obras que o artista produziu em Pernambuco nas décadas de 1920 e 1930. Para
isso foi realizada visita a acervos e coleta do material, seguindo o método “Conjunto
Metodológico para Pesquisa em História do Design a partir de Materiais Impressos” (2016)
proposto por Letícia Pedruzzi Fonseca, Daniel Dutra Gomes e Adriana Pereira Campos.
Ao final do processo da pesquisa de mestrado foi criado um website em formato de galeria
de imagens, com parte da obra de Luís Jardim coletada durante os estudos, com o intuito de
difundir o material e inseri-lo na memória das pessoas, expandindo e celebrando os estudos
dos impressos efêmeros e os pioneiros do Design Gráfico.
Este artigo tem como objetivo relatar o processo metodológico da pesquisa nos acervos,
que resultou no site “O Design de Luís Jardim”, descrevendo as adaptações ocorridas e o uso
do Design da Informação no processo. Contribuindo com as pesquisas conduzidas seguindo
parâmetros semelhantes a essa e revelando a atuação e obra gráfica do artista Luís Jardim.
2 Luís Jardim, artista gráfico
Luís Inácio de Miranda Jardim nasceu em Garanhuns, interior de Pernambuco, em 1901. Aos
17 anos se mudou para o Recife onde teve suas primeiras digressões nas artes e na imprensa,
mesmo autodidata, tendo nunca frequentado escola de arte ou pintura, se mostrou um cultor do
bico de pena, possuindo uma técnica e experiência incríveis nas artes gráficas, as quais lhe
renderam diversos trabalhos e parcerias na capital pernambucana.
No final da década de 1920 atuou intimamente nas oficinas de produção das principais
publicações pernambucanas da época como a Revista do Norte; na segunda fase do jornal
A Província; auxiliou no projeto gráfico da Revista de Garanhuns e colaborou em diversas
capas e ilustrações para o Diário de Pernambuco e o Jornal do Commercio (Nascimento,
1966, 1967, 1994).
Também no Recife realizou parcerias com figuras influentes da época como Gilberto Freyre,
o qual se tornou seu amigo pessoal, convidando-o em 1934 para ilustrar o Guia Prático,
Histórico e Sentimental da Cidade do Recife, sendo esse um dos seus trabalhos de maior
projeção no período, lhe proporcionando convites para colaborar em outros guias Brasil afora
(Verissimo & Campello, 2019).
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Em 1936 a convite de Rodrigo de Melo Franco e da Sociedade Felipe de Oliveira, Jardim
montou uma exposição de telas no Rio de Janeiro, na Galeria Leandro Martins, com cerca de
40 aquarelas, todas evocando aspectos do Recife e Bahia. O sucesso dessa exposição foi um
dos impulsos que fez o artista se mudar para o Rio de Janeiro.
Na capital fluminense auxiliou Mário de Andrade, junto de outros intelectuais da época, na
elaboração do anteprojeto de lei que deu origem ao Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (SPHAN), em janeiro de 1937 (IPHAN, 2007). E mais tarde, em 1955, ingressou no
Instituto do Açúcar e do Álcool, no setor de Serviço de Documentação da Divisão
Administrativa, onde exerceu a função de chefe da Seção de Documentação (Hélio & Bruscky,
1998). Lá também colaborou como artista gráfico para a revista Brasil Açucareiro, publicação
quinzenal distribuída em todo o Brasil.
A sua atuação como escritor de diversas obras o tornaram popular também na literatura,
principalmente infantil, vencendo em duas categorias diferentes o “Concurso de Literatura
Infantil do Ministério da Educação e Cultura” em 1937 pelos livros Boi Aruá e O Tatu e o
Macaco, escritos e ilustrados por Jardim.
Contudo, seu trabalho de maior interesse no Rio de Janeiro foi na Editora José Olympio
(JO), tendo ocupado cargo de importância nos bastidores das publicações da casa (Verissimo,
2020). O artista, assim como Santa Rosa e Cícero Dias, ilustrou e fez a capa de diversas obras
publicadas pela JO, Mário Hélio e Paulo Bruscky (1998, p. 28) comentam que “só para os
romances de José Lins do Rego chegou a fazer cerca de 200 desenhos”.
A atuação de Luís Jardim como ilustrador e artista gráfico na capital pernambucana se
apresentava, até então, desconhecida dos estudos de Memória Gráfica, ainda que seja um dos
mais significativos de sua obra, tendo em vista o caráter experimental de seus primeiros
trabalhos, a versatilidade com que trabalhava dentro da indústria gráfica, além de fazer parte
do grupo de outros artistas e ilustradores do período.
Mesmo não deixando filhos ou herdeiros de sua arte, após seu falecimento aos 87 anos no
Rio de Janeiro, Luís Jardim deixou um legado nas artes, na literatura e também no design
gráfico, o qual deve ser preservado e resgatado para futuras gerações de estudantes e artistas.
3 Processo metodológico
Como mencionado anteriormente, utilizamos das orientações metodológicas propostas por
Letícia Pedruzzi Fonseca, Daniel Dutra Gomes e Adriana Pereira Campos (2016) em “Conjunto
Metodológico para Pesquisa em História do Design a partir de Materiais Impressos” fazendo
algumas adaptações e mudanças. O modelo propõe as seguintes etapas:
§ Aproximação do pesquisador com o contexto
sócio-histórico do impresso
§ Revisão Bibliográfica
§ Entrevistas
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§ Análise gráfica do impresso
§ Identificação e mapeamento de acervos
§ Registro fotográfico do acervo
§ Organização do acervo digital
§ Elaboração da ficha de análise do impresso
§ Coleta de dados do impresso
§ Análise estatística
§ Discussão dos resultados
A partir deste modelo, o processo metodológico seguiu etapas semelhantes, contudo tendo
em vista a criação do site, tencionando esse como um dos objetivos deste artigo e
incorporando ao método de Fonseca et al (2016) particularidades da pesquisa a respeito de um
artista gráfico, bem como os comentários de Farias e Braga (2018) sobre a inserção na
sociedade dos artefatos estudados, por meio de constituição de acervos para futuras consultas,
como supracitado.
Sendo assim, algumas adaptações e mudanças foram sugeridas ao método e foram
seguidas durante a pesquisa, como vistas no Gráfico 1 e esmiuçadas em seguida:
Gráfico 1: Método adaptado de Fonseca et al (2016), seguido durante a pesquisa.
Construindo um guia
Esta pesquisa teve como fio condutor a trajetória do artista Luís Jardim, compreendendo que a
melhor forma de encontrar pistas sobre sua produção gráfica seria, a princípio, investigando
sua biografia. Logo, um apanhado de informações foram coletadas através da bibliografia
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escrita sobre o artista, bem como sites, publicações, entrevistas concedidas pelo mesmo ainda
em vida e outras referências encontradas.
Estas informações, contidas em ambas as obras, geraram a criação de dois documentos, os
quais representaram ferramentas significativas para o início e o desenrolar da pesquisa. Foram
elas a criação de uma linha do tempo com fatos cronológicos sobre a vida de Luís Jardim
(Gráfico 2) e uma lista de suas peças gráficas. Através desses dois arquivos de dados, pôde-se
visualizar um panorama da pesquisa e a partir disso fazer recortes, estabelecer lacunas e guiar
as visitas posteriores aos acervos.
Gráfico 2: Linha do tempo biográfica de Luís Jardim
Cruzando os dados desses dois arquivos, a linha do tempo e a catalogação primária, e
tendo em vista os objetivos da pesquisa, conseguimos traçar uma narrativa biográfica e
cronológica da trajetória de Luís Jardim, sendo essa uma ferramenta importante na condução
da pesquisa como um todo e também auxiliando na identificação dos primeiros acervos a
serem visitados posteriormente.
Visitando acervos
A visita aos acervos e arquivos é uma prática essencial do pesquisador que busca desvendar
os fatos com base em documentos históricos. Esse tipo de prática, comum aos historiadores, é
uma das etapas imprescindíveis das pesquisas em memória gráfica. Contudo, por se tratar de
uma atividade a qual muitas vezes o pesquisador em Design não tem experiência, buscar
vivências semelhantes e orientações que possam auxiliar na exploração nos acervos de forma
mais ordenada e precisa é uma ótima estratégia.
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Antes de partir para o primeiro destino nos acervos físicos, debruçamo-nos sobre o site da
Biblioteca Nacional (BN), um dos acervos online utilizados nesta pesquisa. A hemeroteca digital
da BN possui um material significativo de periódicos digitalizados de todo o Brasil, disponíveis
gratuitamente para consulta. As pesquisas foram realizadas nas três abas do site, Periódico,
Período e Local, utilizando inicialmente palavras-chave como “Luís Jardim” e “Luiz Jardim”.
A pesquisa inicial à hemeroteca digital, antes das visitas aos acervos físicos, foi relevante
por apresentar certos achados que a bibliografia não havia mostrado até então, através de
citações do seu nome em jornais e revistas constatamos que o artista colaborou em diversos
outros impressos, os quais foram identificados mais tarde nas visitas aos acervos físicos e
catalogados para esta pesquisa.
Uma ferramenta essencial, elaborada nesta fase foi um inventário de assinaturas de Luís
Jardim, construído por meio das obras encontradas nesse acervo digital (Figura 1). Todo esse
material de rubricas e assinaturas serviram como um manual para a identificação de outros
desenhos não creditados, presente nos impressos encontrados posteriormente.
Figura 1: Conjunto de assinaturas de Luís Jardim.
Foram localizados três acervos nas cidade do Recife: Biblioteca Central Blanche Knopf
localizada na Fundação Joaquim Nabuco (FUNDAJ), Biblioteca Pública do Estado de
Pernambuco (BPE) e Arquivo Público Estadual Jordão Emerenciano (APEJE). Os acervos
foram visitados, mais de uma vez, em busca do material, sempre portando algumas
ferramentas como celular com câmera fotográfica para registro das peças, luvas e máscaras
para proteção. No gráfico (Gráfico 3) a seguir resumimos os acervos visitados e os achados:
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Gráfico 3: Mapa dos acervos físicos visitados durante a pesquisa.
Como observado no gráfico, mais de uma coleção foi visitada em cada acervo em busca de
material (infelizmente não foi encontrado material referente a Luís Jardim no Anexo da APEJE,
por esse motivo não entrou no gráfico). A FUNDAJ foi o acervo com mais material coletado, só
da Brasil Açucareiro fotografamos 47 imagens em 18 edições da revista, além da coleção
própria do artista encontrada na Coordenação Geral de Estudos da História Brasileira Rodrigo
Melo Franco de Andrade (CEHIBRA), a qual possui desenhos originais de Luís Jardim feitos
para a revista Brasil Açucareiro.
Catalogação e categorização
As visitas aos acervos físicos renderam bastante material, um montante de mais de 250
imagens, a maioria delas repetidas, já que para evitar a perda de algum detalhe nas
ilustrações, cada uma foi fotografada mais de uma vez. Posteriormente, quando essas
fotografias foram descarregadas num computador, teve início o processo de escolha de quais
se apresentaram de forma mais legível e semelhante aos originais. Nesse processo, restaram
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um total de 90 imagens, uma para cada ilustração. Somada às imagens já digitalizadas
encontradas no acervo online da Biblioteca Nacional (28), obtivemos assim um total
de 118 imagens.
Tendo em vista que as imagens se apresentavam tão distintas no que concerne seu tipo;
acervo; periódico a qual se originava; data e local onde tais publicações pertenciam, a princípio
as agrupamos em pastas e subpastas em uma forma de organização. Sendo assim,
categorizamos todo o nosso acervo em três grandes grupos: [1] Periódicos de Pernambuco
(1928-1936); [2] Periódicos do Rio de Janeiro (1937-1954); [3] Brasil Açucareiro (1957-1972).
Dividimos suas produções dessa forma como uma estratégia de organização do montante
de imagens e a possibilidade de se fazer os recortes necessários. Sempre tendo em vista tanto
o foco da pesquisa (grupo [1] Periódicos de Pernambuco), tanto a construção do site que
objetiva um panorama cronológico das produções do artista.
As imagens também ganharam uma organização sistemática, sendo nomeadas por códigos
que as melhor sintetizasse e identificasse-as nas pastas. Desta forma, elaboramos algumas
legendas comuns a todos os arquivos e as nomeações puderam ser feitas baseado nesse
esquema, seguindo sempre a mesma ordem, mas se adequando a cada artefato diferente,
como orientado pelo método de Fonseca et al. (2016).
A ordem de nomeação se baseou em abreviar o nome do impresso em siglas, seguido de
ano, edição, volume, número, página onde se encontrava a imagem dentro do periódico, sigla
do acervo e o ano de publicação, no caso das imagens as quais não tinha a indicação da
página, colocamos em ordem crescente e utilizamos a sigla IMG para definir imagem. Sendo
assim, o arquivo nomeado como: “PR_A57_N192_P03_BN_1928”, por exemplo, se refere a
imagem de A Província, ano 57, número 192, localizada na página 3, a qual se encontra no
acervo da Biblioteca Nacional, do ano de 1928.
Fichas e metadados
Com o acervo organizado de forma sistemática, foi elaborada fichas de coleta de dados das
imagens e, consequentemente, dos impressos. Fichas desse tipo são bastante importantes na
condução das pesquisas históricas em design, elas estão presentes na maioria dos estudos de
Memória Gráfica e auxiliam os pesquisadores de Design da Informação no gerenciamento
dessas pesquisas, seja na coleta de dados dos impressos ou nas análises gráficas das
imagens. Para Farias e Braga (2018, p.12) “coletar imagens e organizá-las, algumas vezes
dando origem a sofisticadas bases de dados digitais, é um passo necessário para a maioria
dos projetos de pesquisa sobre memória gráfica.”
Em “Proposta de ficha de coleta de dados para análise de acervos de imagens”
apresentado no CIDI 2017 por Luiza Avelar Moreira e Letícia Pedruzzi Fonseca, as autoras
discutem a elaboração de uma ficha de coleta de dados digital para análise de acervos de
imagens tendo como objetivos a padronização, agilidade dessa coleta e validação das análises
por meio da sistematização de procedimentos e tratamentos estatísticos de dados. O trabalho é
bastante elucidativo, servindo de referência para a ficha desenvolvida aqui.
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Já o artigo “Metadados para a descrição de recursos de informação eletrônica: utilização do
padrão Dublin Core”, dos autores Marcia Souza, Laurimar Vendrusculo e Geane Melo,
publicado em 2000 na revista científica Ciência da Informação também serviu de arcabouço
teórico para construção de nossa ficha, tendo em vista que o que é proposto aqui é levantar
informações sobre os dados coletados, através de metadados.
Os autores relatam que o conjunto de metadados proposto em seu estudo é equivalente a
uma ficha catalográfica, fornecendo um conjunto simples de variáveis que podem ser utilizadas
por catalogadores para simples descrição de recursos de informação. Na definição
apresentada pelos autores, “Metadado significa dado sobre o dado. É a catalogação do dado”
(Souza et al, 2000, p. 93). Levando isso em consideração, definimos variáveis em forma de
metadados (informações sobre) para cada dado (as imagens do nosso acervo) que
compuseram nossas fichas de análise.
Cada elemento de metadados que compõem as fichas foi adaptado ao universo do Design,
aos objetivos da pesquisa e aos artefatos a que se destinam. A ficha foi dividida em duas
sessões: informações sobre o impresso como: Categoria, Título, Edição, Data de publicação,
Formato, Local de impressão, Acervo; e a segunda categoria que se destina ao item em si, a
obra do artista, são elas: Tipo, Técnica de produção, Cor, Assinatura do artista, Legenda,
Tipologia/Tema, Elementos que compõem a imagem.
Figura 2: Exemplo de ficha utilizada nas análises.
Os elementos que compõem a primeira sessão de informações sobre o impresso foram
preenchidos com base na coletânea de publicações de Luiz do Nascimento, História da
Imprensa de Pernambuco (1821 - 1954), as quais possuem uma vasta gama de dados sobre a
imprensa pernambucana. Esses elementos de metadados auxiliaram na obtenção de novos
dados, por exemplo, compreender formatos de periódicos, para quais categorias de impressos
o artista mais colaborou, ou até levantar questões sobre as práticas de impressão desses
impressos, além de, é claro, auxiliar na organização do acervo como um todo.
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Já a segunda sessão da ficha se atém às imagens produzidas por Jardim, os resultados que
se espera obter a partir dos elementos dessa sessão vão das técnicas comumente utilizadas
(quando indicada e identificada nos próprios impressos), os temas mais comuns em que o
artista desenvolveu seus trabalhos, diferentes formas de assinar seu nome (como já
mencionado, de extrema importância na busca de novas imagens), utilização de cores nos
impressos e os tipos de projeto, como: ilustração, capa, tipografia, etc., contribuindo para uma
maior compreensão das técnicas e parque gráfico que eram oferecidos à época e com os quais
o artista se relacionava.
Análise estatística dos dados
Os dados foram tabulados a partir das fichas de análise, onde cada célula da tabela ganhou a
informação correspondente a cada variável da ficha. Modificações foram necessárias para se
adequar a essa tabulação, como apontado por Fonseca et al. (2016), algumas informações
qualitativas acabam gerando colunas muito largas e um tempo longo para inseri-las nas
tabelas, sendo sugerido a substituição por códigos numéricos, foi o caso, por exemplo, dos
acervos em que foi mantido a sigla de cada um.
Alguns exemplos dessas substituições no momento da tabela são: a data do impresso,
substituída apenas pelo ano em que cada impresso foi feito, porém na ficha a informação do
dia, mês e ano foi mantida. Em “legenda”, já que em alguns casos as legendas são muito
extensas, colocamos na tabela o trecho em que menciona o nome do artista, por uma questão
de autoria, que iremos discutir posteriormente. Mantivemos as informações de descrição das
imagens apenas nas fichas, por essa ter uma função apenas descritiva e, assim sendo, ser
extensa demais para as células das tabelas.
Ao final da tabulação é comum transformá-las em gráficos para análises estatísticas dos
dados, os gráficos podem ser uma ótima ferramenta de argumentação, além de traduzir um
volume grande de informações em uma comunicação visual e verbal de forma acessível.
Sendo assim, os autores do método que seguimos comentam as interferências do Design da
Informação nesse processo:
Neste método, os procedimentos teóricos-metodológicos do design da informação acompanham o
pesquisador na condução de três etapas da pesquisa: a elaboração da ficha de análise do impresso, a
análise dos dados coletados e, por fim, a discussão dos resultados da pesquisa. Nesses três
momentos, o pesquisador assume o papel do designer da informação (infodesigner) ao passo que se
encarrega de selecionar e organizar informações (Wilbur & Burke, 1998), com a tarefa de registrar e
garantir eficiência da investigação científica (Fonseca et al, 2016, p. 151).
Criamos um infográfico agrupando os diversos dados que o procedimento gerou, auxiliando
na visualização completa das informações aliada a uma síntese visual:
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Gráfico 4: Infográfico com os resultados da tabulação dos dados.
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Discussão dos resultados
A partir do gráfico chegamos a algumas discussões acerca da produção de Jardim no período,
Fonseca et al (2016) recomenda que as discussões tenham sempre em vista os objetivos da
pesquisa. Na dissertação (Verissimo, 2020) apresentamos comentários sobre as configurações
formais das imagens, buscando evidenciar estilos e linguagens gráficas adotados pelo artista
em seus primeiros trabalhos, assim como alguns aspectos tecnológicos. Contudo, neste artigo
o nosso objetivo é a criação de um banco de dados online, isto posto iremos nos ater aos
dados apresentados nos gráficos e como os mesmos auxiliaram na próxima etapa, a
construção do site.
Os dados referentes a assinatura do artista e legenda das imagens, por exemplo, mostram
como, neste tipo de pesquisa do ponto de vista de um artista gráfico, tanto a legenda como a
assinatura do artista auxiliam na autoria das imagens. Portanto, utilizar um conjunto de
assinaturas como ferramenta na identificação de possíveis obras de Luís Jardim foi bastante
útil, já que o mesmo assinava seu nome em diversas combinações diferentes. Assim como, seu
nome é encontrado nas legendas das imagens ora como Luís com “s”, ora como Luiz com “z”,
fato esse percebido logo no início das pesquisas nos sistemas de buscas de acervos online e
sempre verificados nas duas grafias desde então.
O gráfico circular no centro da imagem (Gráfico 4) representa os dados referentes a
participação de Jardim nos periódicos e sua produção nos mesmos, sendo jornais e revistas os
meios em que mais colaborou (um total de quase 80% do total) e seu trabalho com ilustrações
sendo o de maior recorrência, seguido das capas e retratos que produziu.
Desse conteúdo, observa-se as cores em que foram aplicadas em sua impressão, há uma
predominância do uso de apenas uma cor, como vista na parte inferior do infográfico, com
domínio do preto e branco (P&B), sendo o branco a superfície do papel, seguido da cor
vermelha, presente em boa parte de suas produções.
Por último, agrupamos as imagens por temas e tipologias, sendo os de maior ocorrência as
imagens de carnaval; representando pessoas; paisagem urbana e rural; e monumentos. As
imagens de carnaval em sua maioria são as ilustrações de fantasias que Jardim ilustrou para o
Suplemento Carnavalesco do Jornal do Commercio, algumas das imagens representando
pessoas são retratos de personalidades que Jardim criou. Já a grande maioria de paisagens
urbanas, rurais e monumentos pode-se inferir como uma consequência da participação de
Jardim para o Guia de Recife, de Gilberto Freyre, o qual possuía diversas ilustrações feitas por
Jardim sobre esse tema.
Esses resultados atestam a capacidade inventiva de Luís Jardim como ilustrador e artista
gráfico. Sua versatilidade, como já pontuado, foi uma característica bastante explorada pela
indústria, além de seu conhecimento no manejo das tecnologias presentes à época.
Construção o site
Como comentado anteriormente, a criação de um banco de dados resultado da catalogação
partiu do princípio de inserir os artefatos gráficos na sociedade, conforme sugerido por Farias e
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Braga (2018). Além de, também, atuar como ferramenta de difusão da pesquisa científica e da
obra do artista como um todo. Dessa forma, a construção do site surgiu como última etapa,
complementando o método de Fonseca et al (2016).
Na curadoria das imagens que iriam para o site, organizamos o acervo desta forma (Tabela
1), não ignorando as imagens dos grupos [2] Periódicos do Rio de Janeiro (1937-1954) e [3]
Brasil Açucareiro (1957-1972), contudo dando maior ênfase a sua produção em Pernambuco,
incluindo imagens do Guia Prático, Histórico e Sentimental da Cidade do Recife, tendo em vista
a importância que esse trabalho teve em sua produção. Também, agrupamos as imagens do
Suplemento Carnavalesco às capas do Jornal do Commercio, já que o suplemento pertencia
ao jornal.
Tabela 1: Catalogação das imagens escolhidas para o acervo do site.
Ano
Título do periódico
Nº de imagens
1928/1930
A Província
6
1930/1931
Revista de Garanhuns
20
1933
Revista Moderna
2
1934
Ação Pernambucana
1
1934
Guia do Recife
8
1936
Annuario de Pernambuco
1
1935/1936
Diário de Pernambuco
6
1936
Jornal do Commercio
14
1957/1972
Revista Brasil Açucareiro
3
1937/1954
(Rio de Janeiro)
6
Total: 67
Nessa etapa também houve um retorno no contato aos acervos, na forma de solicitação de
autorização das imagens a serem disponibilizadas no site, sabemos da importância dessa
autorização tendo em vista que, em alguns casos, as imagens possuem direitos autorais.
Para a construção do site, alguns dados da pesquisa foram essenciais, a linha do tempo
auxiliou na visualização das imagens de forma temporal. Podendo o usuário navegar pelo site
desde suas primeiras produções na imprensa de Pernambuco até as últimas, através de um
menu. Assim como, alguns gráficos, como a própria linha do tempo, foram incorporados à
página inicial do site, com um texto introdutório apresentando de forma resumida a biografia
do artista.
Alguns dados das análises auxiliaram na escolha da imagem principal da home do site
(Figura 3), a mesma extraída da capa do Jornal do Commercio, representa o carnaval, um dos
temas mais presentes nas obras de Jardim no período, como visto anteriormente.
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Figura 3: Captura de tela da home do site “O design de Luís Jardim”.
O site também cumpriu o papel primordial de utilizar uma interface acessível e responsiva,
funcionando sem distorção de imagens, tanto na navegação desktop, quanto mobile. As
imagens, presentes nesse banco de dados digital, possuem seus tamanhos originais, na
qualidade em que foram fotografadas nos acervos, bem como legendas as identificando.
Ficando disponíveis para futuros pesquisadores que contemplem as obras de Luís Jardim e a
Memória Gráfica.
O site “O Design de Luís Jardim” (https://www.luisjardim.com.br/) foi financiado pela
premiação de ações artísticas e culturais do Edital Criação, Fruição e Difusão - LAB PE, sendo
essa uma realização da Secretaria de Cultura do Estado de Pernambuco – SECULT-PE em
conformidade com a Lei nº 14.017/2020 - Lei Aldir Blanc, e está disponível para acesso.
4 Considerações finais
Este artigo teve como objetivo fazer um relato do processo metodológico da catalogação da
obra de Luís Jardim em Pernambuco e a construção do site como difusão de suas primeiras
produções. Para isso foi levantado um relato biográfico resumido do artista, contando um
pouco sobre suas colaborações para a indústria gráfica pernambucana, por meio da bibliografia
foi possível conhecer um pouco sobre o artista e o contexto histórico vivido pelo mesmo nas
primeiras décadas do século XX.
O método utilizado durante a pesquisa auxiliou na condução da mesma de forma
sistemática, além disso, as sugestões e modificações ao “Conjunto Metodológico para
Pesquisa em História do Design a partir de Materiais Impressos” (2016) auxiliaram na
adaptação para uma pesquisa feita sobre o ponto de vista de um artista gráfico. Dessa forma,
etapas e ferramentas como a linha do tempo, o conjunto de assinaturas de Luís Jardim e
estratégias próprias de busca em acervos pelo seu nome nas duas grafias, por exemplo, foram
imprescindíveis do ponto de vista estratégico da investigação científica.
Anais do 10º Congresso Internacional de Design da Informação | CIDI 2021
Proceedings of the 10th Information Design International Conference | CIDI 2021
B. P. Verissimo & S. R. B. B. Campello | O design de Luís Jardim 1568
As adaptações ao método também permitiram que os pesquisadores desempenhassem o
papel de designer da informação, selecionando e organizando informações por meio de
gráficos, infográficos e fichas, sendo essas, ferramentas de significativo valor para visualização
da condução da pesquisa e verificação dos dados.
Por fim, a construção do site visou a difusão e, consequentemente, a continuidade das
pesquisas acerca de Luís Jardim e da Memória Gráfica de Pernambuco. Disponibilizando
assim, um acervo online para futuros pesquisadores e admiradores das artes gráficas,
reinserindo as produções do artista na memória local e, deste modo, contribuindo com a
compreensão de suas identidades, as quais estão em constante processo de transformação.
Referências
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