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Boletim de
ISSN 2237-8006
SETEMBRO 2020 – Nº 108
A COMPETÊNCIA DOS ESTADOS E MUNICÍPIOS NAS
MEDIDAS DE CONTENÇÃO AO NOVO CORONAVÍRUS
(COVID-19) E A ATUAÇÃO DAS GUARDAS MUNICIPAIS
Marcelo Alves Batista dos Santos
CALAMIDADE PÚBLICA E CRISE NAS FINANÇAS MUNICIPAIS
– A NECESSÁRIA MODERAÇÃO NO EXAME DOS LIMITES
FISCAIS E PISOS CONSTITUCIONAIS
Flavio Corrêa de Toledo Jr.
QUARENTENA REVELA A FRAGILIDADE DO DIREITO
Ivan Barbosa Rigolin
ANÁLISE DOS MECANISMOS JURÍDICOS DA LEI E
JURISPRUDÊNCIA PARA RECUPERAÇÃO DO ERÁRIO
PÚBLICO EM CASOS DE IMPROBIDADE E CORRUPÇÃO
Carlos Kessle Ferreira Brilhante,
Denise Dantas Muniz
FISCALIZAÇÃO POR CONSELHO DE CONTABILIDADE DOS
LIVROS DE SOCIEDADES EMPRESÁRIAS
Luís Rodolfo Cruz e Creuz
1272 . GoVERNET® | A RevistA do AdministRAdoR Público
Artigos e PAreceres | outros temAs de direito AdministrAtivo
Boletim de AdmiNiStRAÇÃo PÚBliCA e GeStÃo mUNiCiPAl | Setembro de 2020
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA GERENCIAL E O
PRINCíPIO DA EfICIêNCIA
Monique Scalco Soares Siqueira
Mestre em Administração Pública pela UFLA. moniquescalco@gmail.com
Denise Dantas Muni Fernando Elias De Oliveira
Mestre em Administração Pública pela UFLA. fernandoeliasti@gmail.com
Priscilla Oliveira Nascimento
Mestre em Administração Pública pela UFLA. Pesquisadora da Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de Minas Gerais. priscilla.juridico.vga@hotmail.com
Vinícius Batista Gonçalves
Servidor Público Federal. Mestre em Administração Pública pela UFLA. vinigoncalves@yahoo.com.br
RESUMO: O princípio da eficiência foi inserido na
Constituição Federal a partir da Emenda Constitucio-
nal nº 19/98 como reflexo da reforma gerencial inicia-
da naquele período. O princípio da eficiência diz res-
peito ao dever da boa administração, em que se deve
buscar o melhor desempenho possível na prestação
dos serviços públicos. Assim, este ensaio analisa a re-
lação do princípio da eficiência e a reforma gerencial
implementada no final do século XX e seus reflexos
sobre a atuação da administração pública.
INTRODUÇÃO
É possível identificar distintos modelos de admi-
nistração pública ao longo da construção histórica do
Estado, sendo que o modelo burocrático de gestão
tornou-se predominante em diversos países do mun-
do no início do século XX. No entanto, fatores como
a crise econômica mundial, a crise fiscal, a dificuldade
para resolver os problemas sociais e a globalização
associada às transformações tecnológicas motivou os
governantes a repensarem sua forma de atuar junto
à sociedade, economia e a forma de administrar o
governo. Para tornar o governo mais eficiente, fo-
ram importadas as práticas de gestão de empresas,
mudando o foco dos procedimentos, cristalizado no
modelo burocrático de gestão, para os resultados.
Essa forma de administrar o Estado é conhecida como
nova gestão pública (NGP) ou administração pública
gerencial (ABRUCIO, 1997; ABRUCIO, 2007).
É nesse contexto de reforma da administração pú-
blica que foi promulgada a Emenda Constitucional
nº 19/98, a qual inseriu o princípio da eficiência no
artigo 37 da Constituição Federal. Assim, tornaram-
-se princípios expressos norteadores da administra-
ção pública, previstos no artigo 37 da Carta Magna, a
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade
e eficiência. O princípio da eficiência diz respeito ao
dever da boa administração, em que se deve buscar o
melhor desempenho possível na prestação dos servi-
ços públicos (NOHARA, 2018). Assim, este ensaio ana-
lisa a relação do princípio da eficiência e a reforma
gerencial implementada no final do século XX e seus
reflexos sobre a atuação da Administração Pública.
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA GERENCIAL
E O PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA
O modelo burocrático de gestão tornou-se predomi-
nante em diversos países do mundo no início do século
XX. Weber é considerado o precursor do modelo por
ter analisado e sintetizado suas principais características
(SECCHI, 2009). No Brasil, a reforma burocrática come-
çou no governo de Getúlio Vargas, entre 1930 e 1945,
com o intuito principal de profissionalizar o funcionalis-
mo público (ANDRADE; CASTRO; PEREIRA, 2012).
No entanto, Secchi (2009) observa que, após a 2°
Guerra Mundial, surgiram diversas críticas em relação
ao modelo burocrático, em virtude das disfunções
burocráticas e seus impactos negativos às organiza-
ções. Diante disso, os governos passaram a buscar
formas alternativas de gestão (ABRUCIO, 1997).
Nesse sentido, no final da década de 1970 e início
de 1980, começou o movimento denominado nova
gestão pública (NGP), orientado para uma visão em-
preendedora na administração pública. O movimen-
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Setembro de 2020 | Boletim de AdmiNiStRAÇÃo PÚBliCA e GeStÃo mUNiCiPAl
to teve início no Reino Unido, durante a gestão da
primeira-ministra Margaret Thatcher, e em governos
municipais dos Estados Unidos (GRUENING, 2001).
A NGP visa a importação de práticas de gestão que
são amplamente utilizados no setor privado para o
setor público, buscando a modernização da admi-
nistração pública, bem como a prestação de serviços
com maior eficiência (HOOD, 1995; LAPSLEY, 2009).
As reformas nesses países foram logo seguidas
por outros, inclusive na América Latina, sendo o Chi-
le o primeiro país a implementá-la. No Brasil, essa
reforma administrativa foi iniciada em 1995, tendo
como principal referência a experiência britânica
(BRESSER-PEREIRA, 2008; MATIAS-PEREIRA, 2016)
Essa reforma foi proposta no governo brasileiro
durante a presidência de Fernando Henrique Cardoso,
mediante a criação do Ministério da Administração e
Reforma do Estado, comandado pelo então ministro
Luiz Carlos Bresser-Pereira (BRESSER-PEREIRA, 2008).
Para Bresser Pereira (1998), a reforma do Estado foi im-
plementada com o objetivo de maximizar a eficiência
e a efetividade da administração pública, melhorar a
qualidade da gestão e decisões governamentais e ga-
rantir o caráter democrático da administração pública.
Esse modelo de gestão, também denominado
gerencialismo, é inspirado na administração priva-
da, mas voltado para a defesa do interesse público.
Busca-se a prestação de serviços públicos com maior
qualidade, tendo como foco o cidadão (COUTINHO,
2000). Segundo Bresser Pereira (2010), o modelo ge-
rencial é uma adaptação do Estado, que se desape-
gou de muitas formalidades e passou a prezar mais
pelos resultados e pela eficiência.
Matias-Pereira (2016) afirma que esse novo modelo
de gestão foi fundamentado na busca contínua pela
qualidade, descentralização e avaliação dos serviços
prestados pela administração pública, além de objeti-
var a produtividade, através de economia e eficiência.
Na gestão gerencial, o Estado incorpora ferramen-
tas próprias do setor privado para administrar os re-
cursos públicos de maneira eficiente, além disso, ele
busca descentralizar políticas e recursos, delegando
autoridades aos gestores públicos de entidades fe-
deradas e locais para atender os “cidadãos-clientes”
(ANDRADE; CASTRO; PEREIRA, 2012). Abrucio (1997)
observa que o gerencialismo busca a modernização da
máquina púbica, mediante contínua busca pela pres-
tação dos serviços públicos com qualidade. Para isso, o
Estado utiliza de instrumentos como a descentraliza-
ção e a avaliação de seus serviços pelos cidadãos.
A administração gerencial (ou governança con-
sensual) objetiva atribuir maior agilidade e efi-
ciência na atuação administrativa, enfatizando
a obtenção de resultados, em detrimento de
processos e ritos, e estimulando a participação
popular na gestão pública. Diversos institutos
de Direito Administrativo refletem esse modelo
de administração gerencial como o princípio da
eficiência, o contrato de gestão, as agências exe-
cutivas, os instrumentos de parceria da Adminis-
tração, a redução de custos com pessoal, descen-
tralização administrativa etc. A noção central da
administração gerencial é o princípio da subsidia-
riedade pelo qual não se deve atribuir ao Estado
senão as atividades de exercício inviável pela ini-
ciativa privada. (MAZZA, 2013, p. 31).
Esse modelo de gestão, baseado na estratégia ne-
oliberal, busca reconsiderar o modo de prestação de
serviços públicos visando maior eficiência, eficácia e
efetividade (MATIAS-PEREIRA, 2016). Para Matias-Pe-
reira (2016, p. 61), o gerencialismo surgiu como “es-
tratégia para reduzir custos e tornar mais eficiente a
administração dos serviços sob a responsabilidade do
Estado; como instrumento de proteção ao patrimô-
nio público; e para amenizar a insatisfação existente
contra a administração pública burocrática”.
É nesse contexto de reforma da administração
pública que é incluído no ordenamento jurídico bra-
sileiro o princípio da eficiência, através da promul-
gação da Emenda 19/98. Assim, o princípio da efici-
ência passou a ser expressamente previsto no artigo
37 da Constituição Federal. O referido artigo esta-
belece que a administração pública direta e indireta
deve obedecer aos princípios da legalidade, impes-
soalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Alexandre (2017) observa que o princípio da efi-
ciência está relacionado ao dever da boa administra-
ção. Para o autor, o princípio: “prima pela produtivi-
dade elevada, pela economicidade, pela qualidade e
celeridade dos serviços prestados, pela redução dos
desperdícios, pela desburocratização e pelo elevado
rendimento funcional” (ALEXANDRE, 2017, p. 172).
Moreira Neto (2014) destaca que a introdução des-
te princípio na Constituição Federal está relacionada
a busca em superar o conceito de poder-dever de ad-
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ministrar, o qual deve ser substituído pelo dever de
boa administração, direcionada à busca de eficiência
na prestação de serviços públicos. Assim, os atos da
administração pública devem ser praticados buscan-
do qualidades intrínsecas de excelência, promovendo
o melhor atendimento possível das finalidades legais.
Para Matias-Pereira (2016), o princípio da eficiên-
cia baseia-se no interesse econômico, pois busca que
a atividade administrativa tenha melhores resultados
com o menor custo possível, mediante a utilização do
meios que já dispõe. O autor acrescenta que o princí-
pio está relacionado ao dever de boa administração.
Di Pietro (2018) afirma que o princípio da efici-
ência pode ser entendido em dois sentidos: modo
de estruturação e organização da administração
pública e o modo de atuação dos agentes públicos,
ambos objetivando o melhor desempenho possível
a fim de obter melhores resultados.
É importante mencionar que o princípio da efici-
ência deve caminhar harmonicamente com os demais
princípios administrativos, não sendo superior a ne-
nhum deles. Assim, tendo em vista que a finalidade do
Estado é o interesse coletivo, nem sempre deve-se en-
fatizar os resultados em detrimento dos procedimen-
tos. Cita-se como exemplo o processo licitatório, que
embora represente maior morosidade, trata-se de ga-
rantia de que as contratações públicas sejam mais van-
tajosas à administração pública. Desse modo, Nohara
(2018) observa que a eficiência no setor público nem
sempre pode ser comparado com a eficiência exigida
no setor privado, visto que as finalidades são distintas.
Di Pietro (2018) reitera esse entendimento ao afirmar
que o princípio da eficiência não pode se sobrepor aos
demais princípios administrativos, sob pena de impor
riscos à segurança jurídica e ao Estado de direito.
Nohara (2018) afirma que algumas regras cons-
titucionais são derivadas do princípio da eficiência,
quais sejam: contrato de gestão, avaliação periódica
de desempenho, escolas de governo. Cita-se tam-
bém as organizações sociais e as agências autônomas
como instrumentos de eficiência da máquina pública.
CONCLUSÃO
Este ensaio discorreu sobre a reforma gerencial
ocorrida no final do século XX em diversos do mundo.
Dentre as mudanças trazidas por essa reforma, desta-
ca-se a busca pela prestação de serviços públicos vi-
sando maior eficiência, eficácia e efetividade, os quais
ensejam no dever da boa administração. O modelo de
gestão gerencial busca a importação de práticas de
gestão que são amplamente utilizados no setor priva-
do para o setor público, voltado para o controle de
resultados. No entanto, conforme demonstrado neste
ensaio, a importação dessas práticas deve ser realizada
com cautela, visto que as finalidades do setor privado
e do setor público são distintas, sendo que a primeira
objetiva o lucro e a segunda o bem comum.
O princípio da eficiência foi inserido na Consti-
tuição Federal a partir da Emenda Constitucional
nº 19/98, como reflexo da reforma gerencial ini-
ciada naquele período, e está relacionado ao de-
ver da administração pública em prestar serviços
com qualidade aliado a economia de esforços e
recursos financeiros. Observa-se que esse princípio
foi inserido na Constituição Federal com o intuito
de superar as disfunções burocráticas, promoven-
do uma gestão mais ágil e eficiente. Por fim, des-
taca-se que este princípio deve caminhar de forma
harmoniosa com os demais princípios administra-
tivos, não sendo superior a nenhum deles.
Referências
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DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 31. Rio de Janeiro: Forense 2018.
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LAPSLEY, I. New public management: The cruellest invention of the human spirit? 1. Abacus, v. 45, n. 1, p. 1-21, 2009.
MATIAS-PEREIRA, José. Manual de gestão pública contemporânea. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2016.
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo. 16. Rio de Janeiro: Forense 2014.
MAZZA, Alexandre. (2013) Manual de direito administrativo. 3. ed. São Paulo:Saraiva.
NOHARA, Irene Patrícia. Direito administrativo. 8. Rio de Janeiro: Atlas 2018.
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