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Património em feminino

Authors:
  • Conservatório de Música C. Gulbenkian, Braga, Portugal

Abstract

(www.soutelo.eu) Com a queda das torres gémeas de Nova Iorque, em 2001, um novo período de recuperação da harmonia das proporções está reagindo contra o 'tudo vale' do pós-modernismo. A novidade é que agora são as mulheres as que começam a comandar o desenvolvimento social.
31 | 27 junho 2 018
AS ARTES ENTRE AS LETRAS ANO IX
Rudesindo Soutelo
compositor e mestre
em Educação Artística
Desenhei no quadro uma linha vertical e ou-
tra horizontal. Perguntei aos alunos qual das
duas linhas representaria melhor a socieda-
de na qual vivem; a resposta foi unânime. A vertical
era descrita por eles como a representação do poder
de uns indivíduos sobre os outros. Quanto mais baixa
é a posição nessa linha, maior é o peso do poder, di-
ziam os mais esclarecidos. Repeti a pergunta em tur-
mas diferentes e a resposta era sempre a mesma.
O arquiteto renascentista, Leon Batista Alberti, que
construía harmonias baseando-se na música dos nú-
meros, formulou no livro IX de De Re Aedicatoria o
conceito de ‘consensus partium’ como a interdepen-
dência do todo e a parte, ou uma conspiração das par-
tes e o todo, de acordo com um número, uma ordem e
um lugar denidos, “princípio absoluto e primeiro da
natureza”1.
Esse poder vertical, justicado durante séculos pela
oposição entre o divino e o humano, subjaz nas par-
tes e no todo duma sociedade que, desde o grande re-
nascimento, se quer humanista, mas que permanece
coberta por uma densa nuvem teocêntrica que pas-
sou de focar-se nos valores do ser, para ressaltar os va-
lores do ter. Na essência do poder vertical está sem-
pre o referente masculino como valor moral inques-
tionável.
Foi preciso espicaçar a imaginação e a inteligência
dos alunos para encontrar algo, nesta sociedade, que
pudesse ser representado pela linha horizontal. Her-
bert A. Simon, em As Ciências do Articial, arma que
“a complexidade ou simplicidade de uma estrutu-
ra depende criticamente da maneira como a descre-
vemos”2 e num artigo posterior introduz o conceito
de ‘parcimónia’, que seria a relação da complexida-
de dos dados observados com a complexidade da
fórmula que os representa, explicando muito a par-
tir de pouco3. Assim como a ciência procura parcimó-
nia, não simplicidade, a linha horizontal acabou por
representar, na parcimónia da aprendizagem, o po-
der colaborativo da negociação, do respeito pelas di-
ferenças, da aceitação do outro, e onde os valores têm
como referente o feminino, numa neo-modernidade
sem dominações.
O património cultural em masculino, que nos legou
a história, não pode ser negado nem esquecido, mas
sim deve ser reinterpretado à luz do feminismo. A
perceção, como diz Pierre Boulez em Les Neurones
Enchantés, é uma experiência de aprendizagem prá-
tica e também teórica4. Se recebemos uma aprendi-
zagem baseada no poder vertical, teremos diculda-
des em interpretar as formas, as complexas subtilezas
e os benecios de um poder horizontal.
A linha vertical começou a inclinar-se entre o nal
do século XIX e o início do XX, num novo período re-
nascentista, o Modernismo, que reagiu ao individua-
lismo romântico com uma nova harmonia das pro-
porções clássicas. Na música, o opressivo poder fáli-
co da tonalidade foi desmantelado por Debussy, Stra-
vinski, Schönberg, Bartok e os seus seguidores. Sig-
mund Freud interpreta os sonhos. Albert Einstein
mede a Energia. A poesia ultrapassa a rima. Wassily
Kandinsky descobre que a beleza não precisa de gu-
ração. Antoni Gaudí constrói monumentos com colu-
nas inclinadas e formas desaantes. A mulher veste e
age, pela primeira vez, ao seu gosto e começa um s é-
culo de lutas pelos direitos de género. A vertical cur-
va-se, mas resiste a ser derribada.
Com a queda das torres gémeas de Nova Iorque, em
2001, um novo período de recuperação da harmo-
nia das proporções está reagindo contra o ‘tudo vale’
do pós-modernismo. A novidade é que agora são as
mulheres as que começam a comandar o desenvol-
vimento social. Na música erudita, as mulheres es-
tão a modernizar o repertório e, quando olham para o
passado, reinterpretam as obras sem os estereótipos
masculinos. Na ciência, na literatura, nas artes, e até
na política as mulheres começam a exercer o poder;
na Espanha já há um governo com maioria de mulhe-
res, e até o jornal El País é agora dirigido por uma mu-
lher.
O novo património cultural é o poder horizontal
construído desde o respeito pela diferencia e, ainda
que o poder vertical continue presente, o feminismo
está a esvaziá-lo de argumentos. A parcimónia, como
o artista, numa aprendizagem cidadã colaborativa,
expressará a beleza “explorando uma economia ex-
trema dos meios”5.
Que o equilíbrio e o sossego da linha horizontal orien-
tem o percurso dos alunos e o de As Artes entre As Le-
tras, na parcimónia de mais um aniversário em femi-
nino, o nono. Parabéns!
Património
em feminino
no ta
1 Alberti, L. B. (1553). L’architecture et art de bien bastir
(Vol. IX, cap. 5, f. 192). París: J. Kerver.
Obtido em 10 de junho de 2018, de http://architectura.cesr.univ-
-tours.fr/Traite/Textes/CESR_4781_9.pdf
2 Simon, H. A. (1981). As ciências do articial.
(L. M. Pereira, Trad.) Coimbra: Arménio Amado, p. 336.
3 Simon, H. (2002). Science seeks parsimony, not simplicity;
Searching for pattern in phenomena. Em A. Zellner,
H. A. Keuzenkamp, & M. McAler, Simplicity, Inference
and Modeling (pp. 3272). Cambridge University Press.
4 Boulez, P., Changeux, J.-P., & Manoury, P. (2016).
Las Neuronas Encantadas. Barcelona: Gedisa, p. 99.
5 Ibid. p. 75.
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Chapter
The idea that simplicity matters in science is as old as science itself, with the much cited example of Ockham's Razor, 'entia non sunt multiplicanda praeter necessitatem': entities are not to be multiplied beyond necessity. A problem with Ockham's razor is that nearly everybody seems to accept it, but few are able to define its exact meaning and to make it operational in a non-arbitrary way. Using a multidisciplinary perspective including philosophers, mathematicians, econometricians and economists, this 2002 monograph examines simplicity by asking six questions: what is meant by simplicity? How is simplicity measured? Is there an optimum trade-off between simplicity and goodness-of-fit? What is the relation between simplicity and empirical modelling? What is the relation between simplicity and prediction? What is the connection between simplicity and convenience? The book concludes with reflections on simplicity by Nobel Laureates in Economics.
Obtido em 10 de junho de
  • L B Alberti
Alberti, L. B. (1553). L' architecture et art de bien bastir (Vol. IX, cap. 5, f. 192). París: J. Kerver. Obtido em 10 de junho de 2018, de http://architectura. cesr.univ--tours.fr/Traite/Textes/CESR_4781_9.pdf
As ciências do artificial
  • H A Simon
Simon, H. A. (1981). As ciências do artificial.
Coimbra: Arménio Amado
  • M Pereira
M. Pereira, Trad.) Coimbra: Arménio Amado, p. 336.