Content uploaded by Renan Araujo
Author content
All content in this area was uploaded by Renan Araujo on Jun 24, 2021
Content may be subject to copyright.
Contribuições à Atualização do Conceito de Centro-Periferia à Luz do Capitalismo
Financeirizado: o caso brasileiro
Gabriel Quatrochi*
Renan Ferreira de Araujo**
RESUMO
O presente artigo tem como objetivo demonstrar como a financeirização contribui para aprofundar a
relação centro-periferia e de que forma esta ganha contornos singulares quando expressa em países
periféricos, com destaque, o Brasil. Para tal, em um primeiro momento é construída a definição de
financeirização como padrão sistêmico de riqueza e de que forma as políticas neoliberais originadas
a partir do colapso de Bretton Woods funcionam como ferramenta deste novo padrão de acumulação.
A partir disto, o artigo busca consolidar o argumento ao relacionar a mudança do papel do Estado sob
o neoliberalismo, com enfoque nas modificações da estrutura econômica brasileira a partir da década
de 1990 e de que forma isto contribui para consolidar um tipo particular de financeirização no Brasil.
Como consequência, a construção de um regimes de crescimento completamente associados com a
lucratividade financeira e a perda da autonomia da política econômica.
Palavras-chave: financeirização; neoliberalismo, centro-periferia; Estado; Brasil.
ABSTRACT
The aim of this paper is demonstrate how financialization contributes to deepening the center-
periphery relationship and how it gains singular contours when expressed in peripheral countries,
with emphasis on Brazil. For such, the definition of financialization as a systemic pattern of wealth
is initially constructed and how neoliberal policies originated from the collapse of Bretton Woods
function as a tool for this new pattern of accumulation. Based on this, the article seeks to consolidate
the argument by relating the changing role of the State under neoliberalism, focusing on changes in
the Brazilian economic structure since the 1990s and how this contributes to consolidating a particular
type of financialization in the Brazil. As a consequence, the construction of growth regimes
completely associated with financial profitability and the loss of the autonomy of economic policy.
Key-words: financialization; neoliberalism; center-periphery; State; Brazil.
Área 5 – Dinheiro, finanças internacionais e crescimento
* Doutorando em Economia do Instituto de Economia da Unicamp e Bolsista CAPES.
** Doutorando em Economia do Instituto de Economia da Unicamp e Bolsista CNPq.
1
2
1. Introdução
A formação capitalista contemporânea pode ser analisada sob duas óticas possivelmente
interligadas: a relação centro-periferia, que mesmo sob constante mutação de seus determinantes,
ainda esboça a organização econômica e de poder entre os países capitalistas; e a dinâmica da
financeirização, fenômeno considerado recente neste sistema, contudo fortemente associado ao novo
ritmo da acumulação capitalista inaugurado no fim do século XX.
Para que essas duas óticas sejam colocadas como ferramentas complementares a fim de
analisar o capitalismo contemporâneo periférico, sabe-se que um recorte deve ser feito no sentido de
ir além do conceito estático de centro-periferia, protagonizado pelas abordagens clássicas da teoria
cepalina estruturalista e a teoria da dependência em suas variadas vertentes. Mesmo que sob bases
teóricas diferentes, e objetivos diferentes, a leitura tinha como denominador comum o fato de a
relação centro-periferia ser determinada pela divisão internacional do trabalho, o desenvolvimento
desigual do progresso técnico e a mimetização do padrão de consumo do centro pela periferia
(ABOUCHEDID; PALLUDETO, 2016).
Para avançar sobre a discussão, entende-se que o conceito centro-periferia certamente
permanece válido para explicar as relações capitalistas, contudo, necessita avançar para abarcar a
forma pela qual atualmente se articula a esfera financeira internacional, a qual, de fato, certamente
também explica a relação de dependência entre os polos.
A mudança do sistema monetário e financeiro internacional representada no fim do
sistema de Bretton-Woods deve ser levada em conta para entender as novas configurações da relação
centro-periferia, afinal, a liberalização financeira, o surgimento do dólar como reserva internacional
sem necessidade de lastro e a explosão das inovações financeiras reconfiguraram a dinâmica da
acumulação global, provocando inserções diferenciadas pelos países, e superando a disputa entre
Estados a partir da globalização produtiva e financeira.
Neste contexto de cada vez menos limitação dos fluxos financeiros por regulações e
políticas, a financeirização aparece como um novo padrão sistêmico de riqueza que implica a
predominância da lógica financeira no processo de decisão dos agentes relevantes do sistema
capitalista, intensificando a competição intercapitalista que, por sua vez, acelera a concentração e a
centralização do capital, tendo como consequência lógica a mudança do centro de decisão das esferas
nacionais para as esferas transnacionais (BRAGA et al., 2017).
Ainda que inexista uma definição consensual entre as ciências sociais aplicadas acerca da
financeirização (LAPAVITSAS, 2011), e a despeito de suas primeiras menções datar de desde a
3
década de 1960, por Sweezy e Magdoff (FOSTER; MAGDOFF, 2009), algumas ponderações podem
e devem ser feitas acerca do fenômeno. De pronto, a financeirização não se trata do mero resultado
de um período de liberalizações financeiras, conforme insistem as análises a-históricas de
“desequilíbrios temporários”, típicas dos economistas ortodoxos e neoliberais (TREECK, 2012).
Aliás, não é um “desequilíbrio” porque não se trata de uma anomalia do capitalismo, supostamente
composta de atividades especulativas e parasitárias, mas sim de algo que lhe é, no mínimo, estrutural
(LAPAVITSAS, 2013). E não há nada de “temporário” em tal processo de financeirização porque,
como acertadamente pontuou Chesnais (2016)
1
, esta nem se iniciou com a Crise de 2008 e tampouco
findou nos idos de seus já passados treze anos de “pós”-Crise.
Assim sendo, o lugar comum das extensas análises heterodoxas que se têm encontrado
acerca do fenômeno talvez resida em enxergá-lo como sendo algo sistêmico e dinâmico ao capitalismo
contemporâneo (FINE, 2013). Neste sentido, esta visão certamente suplanta as tradicionais
dualidades entre decisões “reais” e “nominais”, esferas “real” e “monetária”, “indústria” e “finanças”
(KREGEL, 2017), para finalmente se aceitar que finanças e produção devem ser vistas como formas
indissociáveis (CHESNAIS, 2016).
Então, partindo-se do princípio de que a financeirização é fundamentalmente
caracterizada por tal caráter sistêmico e dinâmico, propõe-se aqui a sua compreensão como sendo um
padrão sistêmico de riqueza (BRAGA, 1985; 2000), ou seja, a expressão âmago do próprio capital e
de seu desenvolvimento, como se verá adiante. Riqueza esta que se sustenta e avança com base
naquele capital que, pelo menos em sua essência, já fora descrito por Hilferding (1985) há mais de
um século: o capital financeiro.
Porém e não obstante, a despeito do crescente número de pesquisas que têm explorado o
tema – só entre 2008 e 2017, para se ter um exemplo, segundo levantamento bibliométrico realizado
por Felipini e Palludeto (2019), o número de publicações a esse respeito cresceu a uma taxa média
anual de 11%, em todo o mundo – aquelas que efetivamente abarcam as especificidades típicas dos
países periféricos nesse processo e, em especial, do Brasil, permanecem escassas, motivo pelo qual
se almeja que o presente trabalho possa dar uma importante contribuição. Por exemplo, o papel que
os investidores institucionais, agentes que têm sido de suma importância na financeirização da
economia global, desempenham na financeirização da economia brasileira, e também na influência
das determinações estratégicas dos grandes grupos por aqui, diverge, em muito, daqueles que
desempenham nas economias desenvolvidas ou países do centro
2
. Ou, ainda, o papel que o capital
1
Curiosamente, esta parece ser uma conclusão que resulta do próprio caminhar do pesquisador, desde suas primeiras
elucubrações sobre a “Mundialização do Capital”, passando pela teoria do “regime de acumulação financeirizado” como
“um conjunto de elementos” suspeito em se fazer viável, até o “Capital Financeiro Hoje” (CHESNAIS, 1996; 2002;
2016).
2
Para mais, ver Hiratuka et al. (2019).
4
portador de juros assume como base do processo de financeirização nas economias periféricas
também é bastante diverso daquele que assume nas economias centrais, tópico este que justamente o
presente artigo examinará adiante, com mais detalhes, para o caso do Brasil.
Assim, com mercados financeiros pouco desenvolvidos e com a baixa posição de suas
moedas na hierarquia internacional, a posição dos países periféricos é reafirmada. Os fluxos de
capitais tão importantes neste contexto normalmente chegam sob a promessa de altos patamares de
lucratividade, garantidos pelo Estado, e com alto grau de volatilidade, dado o caráter curtoprazista
dos investimentos.
Desta forma, o presente artigo tem como objetivo analisar como as condições estruturais
que definem a condição periférica também definem a forma de apropriação da acumulação financeira
nesses países. Para isso, a próxima seção fornece o constructo teórico da financeirização enquanto
padrão sistêmico de riqueza, enfatizando as transformações da economia mundial após o colapso de
Bretton Woods. Em seguida, na terceira seção, busca-se conectar a emergência do processo de
financeirização com a integração subordinada das economias periféricas ao sistema monetário e
financeiro internacional. A quarta seção recupera, brevemente, como se expressou, no Brasil, o
conjunto de políticas e reformas introduzidas sob o paradigma neoliberal e de que forma a abertura
da economia brasileira foi crucial para a consolidação do padrão de acumulação financeiro. A quinta
seção analisa mais concretamente como pode ser observada a financeirização no Brasil, elucidando
como as particularidades e a periodização deste processo, da emergência à crise de 2008, reforça a
posição periférica do país. Por fim, algumas conclusões são propostas na sexta e última seção.
2. A Financeirização como um Padrão Sistêmico de Riqueza: transformações e conceito
Embora não haja consenso acerca da definição do conceito de financeirização na
literatura, torna-se importante demarcar a clássica posição de Epstein (2005, p.3) na qual “(...)
financialization means the increasing role of financial motives, financial markets, financial actors
and financial institutions in the operation of domestic and international economies”, entendendo
como finança a expressão da negociação de direitos sobre o valor, a exemplo de operações de crédito,
ações de empresas, títulos públicos, hipotecas e derivativos.
De forma mais delimitada, Braga et al. (2017) entendem que a financeirização é um
padrão sistêmico de riqueza que derivou do colapso da Era de Bretton Woods, compreendendo um
novo estágio do capitalismo, que parte da noção de estoques de riqueza, afetando as decisões de gasto,
políticas econômicas, assim como o movimento dos ciclos econômicos. Esse estágio representa uma
nova forma de gerenciar a riqueza, se apresentando mais como capital fictício em meio a mercados
mais liberalizados e desregulamentados e sob nova institucionalidade, a partir da relação entre os
5
reformulados Bancos Centrais, tesouros nacionais, investidores institucionais, sistema bancário e
companhias não financeiras.
Ainda segundo os autores, o fim da era de Bretton Woods não pode ser analisado apenas
como uma mudança de regras das relações econômicas capitalistas, onde a abertura financeira aparece
como uma ferramenta nova e diferenciada. Em verdade, ocorreu uma mudança na operação do
capitalismo em si. Cada vez menos limitado por regulações e políticas, a flexibilidade da riqueza
intensificou a competição intercapitalista, acelerou a concentração e centralização de capital, e criou
oportunidades para a transformação do dinheiro em mais dinheiro, com crescentes frações dos ativos
se tornado capital fictício, promovida por crescentes inovações financeiras e o aumento dos mercados
financeiros em si.
A volatilidade das taxas de câmbio e de juro pós Bretton Woods se tornaram terra fértil
para a criação de novos mercados, via mecanismos de hedge, criação de derivativos e, claro,
movimentos especulativos em torno de operações de arbitragem. Como consequência dessa expansão
financeira, mecanismos de interação entre os agentes foram sendo melhor desenvolvidos, provocando
um ambiente em que o conjunto da economia capitalista, com destaque para empresas, famílias e o
Estado, foi sendo envolvido, de forma a ampliar mercados, mas também a pulverizar a
responsabilidade pelos ativos financeiros. De forma geral, é o capital fictício quem passa a controlar
as operações capitalistas como um todo, e a lógica financeira passa a dominar a decisão desses agentes
(BRAGA et al., 2017).
No entanto, segundo Becker et al. (2010), há duas bases sobre as quais se assentam os
processos de financeirização. A primeira, e mais comum, é com base no segundo circuito do capital
fictício descrito por Marx, no qual, sucintamente, os lucros gerados no circuito produtivo são
capitalizados num segundo circuito, relativamente autônomo, onde a volatilidade dos preços são
muito mais intensas, de modo que, não incomum, haja uma bifurcação entre os sistemas de preços
dos ativos financeiros e dos ativos produtivos. A segunda, que, como se verá adiante, é típica das
economias periféricas, é a financeirização com base no capital portador de juros (e,
consequentemente, nas altas taxas de juros). Nestes casos, a financeirização acaba revelando um
caráter que os autores denominam de altamente “extrovertido” (ou voltado para fora), pois assenta-
se sobre uma forte dependência de fluxos de capital estrangeiros, os quais, por sua vez, são atraídos
por políticas econômicas que, em nome das infindáveis lutas antiinflacionárias e contra a fuga de
capitais, perseguem o também eterno objetivo de se manterem altas as taxas de juros e
sobrevalorizadas as taxas de câmbio.
Toda essa mudança deve ser encarada como radical quando se busca entender a relação
entre papel do Estado e financeirização historicamente. Segundo Kotz (2015), após a crise de 1929,
as atividades bancárias foram rigorosamente regulamentadas, na intenção de “(…) assure the stability
6
of the banks, to prevent bank failures and panics, and to promote what was seen as the proper
productive role of the financial sector while discouraging speculative activity” (KOTZ, 2015, p.16).
O regime era tão regulado que haviam taxas de juros específicas e restrição de financiamentos para
determinadas atividades, além do mercado bancário ser muito segmentado, sendo que cada banco só
podia exercer um tipo de atividade, existindo bancos exclusivamente comerciais, de poupança, de
seguros e de investimentos. Tal regulação teve dois resultados principais: a limitação das atividades
lucrativas do setor financeiro e um número baixíssimo de falências bancárias até 1973.
A partir da década de 1970, as tensões inflacionárias pressionavam o teto de juros
estabelecido, além de haver um aumento da circulação do dólar internacional que aumentou a
concorrência bancária. Nesse momento, as ideias neoliberais avançavam, criticando a posição
regulada e pedindo pela liberalização em prol da eficiência e da inovação. A pressão surtiu resultado
e, em 1980, a primeira lei para desregulamentação bancária foi assinada, sendo seguida de outras
importantes até os anos 2000.
The Financial Services Modernization Act of 1999 finally largely repealed the Glass-Steagall
Act of 1933 which had forced financial institutions to choose among deposit banking,
investment banking, and sale of insurance. This allowed the formation of financial
conglomerates for the first time since the Great Depression, which raised the possibility that
funds in government-insured deposits could be invested in risky financial activities. In 2000
the Commodity Futures Modernization Act forbade government regulation of derivative
securities, the collapse of which was to play a big role in the financial meltdown of 2008.
Thus, a largely unregulated financial system gradually emerged in the U.S. during the
neoliberal era, and by 2000 financial institutions had been fully freed to pursue virtually
whatever activity promised the highest rate of return (KOTZ, 2015, p.17).
As mudanças provocadas pela ascensão neoliberal pouco a pouco capacitaram o setor
financeiro a ampliar seus mercados, atividades e lucros, além de romper com a relação de servidão
que ocupavam com relação à acumulação de capital não financeiro. Em conjunto, a dinâmica de uma
economia financeirizada permitiu aumentos significativos em processos como a negociação de títulos
de propriedade em bolsas de balcão, securitização (transformação de ativos não financeiros em títulos
negociáveis), derivativos, das atividades financeiras em empresas não financeiras e da formação de
grandes conglomerados financeiros, além do aumento da proporção da distribuição do excedente
social em direção às finanças (RUDE, 2005).
Embora o sistema financeiro ainda cumpra as atividades tradicionais de coletar e realocar
o capital ocioso, a capacidade de alocação de recursos em atividades cada vez mais lucrativas, porém
com alto risco, exigiu a construção de um ambiente institucional capaz de gerenciar o risco, tornar as
transações mais seguras e ainda criar novos mercados a partir desta preocupação. Como
consequência, as finanças passaram a controlar os mecanismos de emissão de crédito (estreitamente
7
conectados com o mercado de ativos), e então a emissão de dinheiro endogenamente, desse modo,
passaram a controlar a criação de nova riqueza (DUMÉNIL; LÉVY, 2001).
Segundo Rude (2005), diante da evolução dos mercados financeiros, tal ambiente,
colocado sobre a rubrica da financeirização, cada vez mais pode ser explicado pela concorrência entre
os capitais para lucrar com os mecanismos de proteção criados para proteger o sistema de possíveis
contingências financeiras que perturbariam a circulação do capital. Isto é, a dinâmica da acumulação
financeira e a liberalização dos mercados permitiram a existência de um complexo mecanismo de
valorização de um valor criado sobre um valor futuro que se baseia na sua própria estrutura
organizacional.
A lucratividade das empresas passou a ser mais dependente do mercado financeiro, o que
modificou sua organização interna. O fato de as indústrias fazerem parte de um conglomerado de
empresas, com os mais diversos acionistas, orientou a sua lucratividade para a valorização de seus
papeis, negociados de forma paralela no mercado financeiro. Tal processo impactou diretamente a
estrutura das indústrias
3
, já que as preocupações com a visão de longo-prazo e a restruturação
produtiva das corporações foram escanteadas, tornando seu investimento e sua estrutura corporativa
dependentes do resultado de suas ações no mercado financeiro, e não mais do retorno direto que essas
atividades fornecem (FINE, 2010, p.19).
Isso não significa que as corporações não maximizavam o lucro antes, mas que agora isso
ocorre sobre a eliminação da capacidade produtiva e do emprego. Duménil e Lévy (2001, p. 599)
demonstraram como a taxa de lucro das empresas financeiras e não financeiras tiveram trajetórias
muito diferentes entre os anos 1960 e 1990, sendo que as financeiras aumentaram vertiginosamente
após a implantação das reformas neoliberais e a consolidação do processo de financeirização,
movimento oposto ao das não financeiras.
Entendendo a financeirização como movimento sistêmico, nota-se que as transformações
não se resumiram a análises estáticas dos processos de acumulação, normalmente associados às
disputas entre Estados-Nação. O enfoque na mudança do papel estatal na estrutura econômica dos
países tem a intenção de demonstrar que, primeiramente o Estado não deixa de ser um agente
importante, pelo contrário, ele muda sua atuação passando a ser central não na determinação do ritmo
da acumulação, mas na estabilização e garantia das transações financeiras. Segundo e não menos
importante, a financeirização abriu o leque das possibilidades de aplicação da riqueza, tirando a
autonomia dos centros de decisão nacionais, e entrando na dinâmica micro de escolha de alocação de
riqueza dos agentes, a exemplo das decisões de gasto das famílias (KALTENBRUNNER;
PAINCEIRA, 2017).
3
Para um debate mais consistente sobre as modificações nas corporações não-financeiras após a financeirização, ver
Crotty (2002).
8
3. Financeirização na esfera periférica
O processo de financeirização acompanha a lógica do desenvolvimento desigual da
abordagem centro-periferia, visto que, segundo Kaltenbrunner e Painceira (2017), o processo de
financeirização é inaugurado e avança principalmente nas economias desenvolvidas, tendo interações
com as economias periféricas. É preciso destacar, rapidamente, que a partir desta comparação, o texto
não busca fazer uma relação entre desenvolvimento e avanço da financeirização, mas demonstrar que
as condições estruturais que definem a condição periférica também definem a forma de apropriação
da acumulação financeira nesses países.
Contudo, algumas economias apresentam características próximas ao processo do centro,
como o Brasil, onde as grandes empresas não financeiras aumentaram a sua participação em ativos
financeiros, aumentaram sua receita financeira e passaram a captar no mercado financeiro,
principalmente o internacional. Além disso, houve aumento significativo das operações especulativas
dessas empresas e bancos nos mercados de derivativos e por fim, aumento do acesso ao crédito e
formação de hipotecas para as famílias. A interação entre as economias chamadas de emergentes com
as economias centrais é assimétrica e subordinada, não apenas pelas condicionantes da “economia
real”, mas principalmente pelos novos condicionantes do crescimento dos mercados financeiros
internacionais e a forma de inserção da periferia nestes (KALTENBRUNNER; PAINCEIRA, 2017).
A assimetria do sistema financeiro internacional tem como pilar o poder exorbitante
transferido aos Estados Unidos
4
e sua capacidade de emitir a reserva internacional. O colapso de
Bretton Woods como marco do início do processo que viria a ser chamado de financeirização também
foi o marco da reafirmação dos Estados Unidos como potência hegemônica, e a simbiose destes
acontecimentos não é uma coincidência histórica. O novo sistema monetário internacional,
caracterizado pela desregulamentação financeira e o fim do lastro do dólar em ouro, permitiu que os
EUA chegassem a uma independência na política econômica sem precedentes, com possibilidade de
endividamento público sem contrapartida ou mecanismos que o pressionem a corrigir sua conta
corrente, exatamente devido a sua capacidade de atrair riqueza financeira para seu sistema financeiro.
O dólar sem lastro permaneceu como divisa chave pois se apoia no sistema financeiro
norte-americano como principal mecanismo de valorização financeira e nos títulos da dívida pública,
que são os mais nobres ativos da economia mundial. Além de garantir o dólar como referência, esses
mecanismos permitem o gerenciamento do déficit dos EUA, o único país que pode fazer isso. Neste
4
Consultar Tavares (1998) sobre a diplomacia do dólar.
9
sentido, os títulos de dívida são muito importantes pois têm risco de crédito mínimo, alta liquidez e
maturidade e boa estrutura para comercialização.
Segundo Metri (2004), essas características permitem que os títulos americanos
desempenhem funções importantes no Sistema Monetário Internacional, como: o fato de prover a
taxa de juros de referência para a formação de preço dos títulos privados; são importantes veículos
de hedge para posições em outros títulos de renda-fixa; facilitam bastante o financiamento de posições
no mercado financeiro e a administração de liquidez, por exemplo quando usados como garantia em
empréstimos; são investimentos seguros de longo prazo, dado o baixo risco de crédito; em resumo,
são o porto seguro do Sistema Monetário Internacional, pois são os ativos mais seguros e com maior
liquidez.
Os títulos da dívida pública norte-americana são os ativos mais nobres deste sistema,
funcionando como instrumento de estabilização, e pilar de sustentação do dólar como moeda flexível
no sentido de estabilizar a fluidez das transações do mercado internacional, como moeda financeira
no sentido de denominar os contratos financeiros, e fiduciária no sentido de não haver mais
necessidade de existir o ouro como reserva de valor necessária.
A supremacia do sistema financeiro dos EUA pode ser explicada, então, por uma
combinação própria do poder do Estado, do capital financeiro e do dólar como moeda da
financeirização. Esse sistema tem um mercado de capitais conexo ao sistema creditício, podendo
servir tanto como canalizador de posições deficitárias e superavitárias como à criação e destruição de
ativos, sendo um espaço propício para o desenvolvimento do capital financeiro. Seu tamanho e
relevância provocaram uma mudança no papel dos Bancos Centrais em torno do mundo em direção
de garantir o desenvolvimento das finanças, tornando sua taxa de juro de curto prazo um instrumento
do sistema financeiro internacional e definindo regras para seu funcionamento a partir do seu Banco
Central (BRAGA; CINTRA, 2004).
Quanto à sustentabilidade e ao desenvolvimento da esfera financeira nos países
periféricos, Corrêa e Vidal (2012) afirmam que as políticas financeiras passaram a focar na
profundidade dos mercados locais e na garantia da capacidade de transferência de renda na forma de
ganhos, dividendos e juros. Essa sustentabilidade na forma de transferir renda foi configurada com
políticas de acúmulo de reservas e do aumento da autonomia dos BCs para evitar que estes
financiassem déficits públicos.
Ainda segundo os autores, entre as reformas institucionais mais significativas estão:
mudanças nas constituições nacionais para consagrar orçamentos equilibrados; sucessivas reformas
tributárias; aumento da dívida do governo subnacional para a acumulação de reservas e a criação de
fundos de estabilidade; atingir taxas de câmbio flexíveis o suficiente para elevar a lucratividade
financeira; manutenção de políticas monetárias restritivas; fortalecimento dos direitos dos acionistas
10
minoritários (mesmo que sejam grandes investidores); reformas legais para facilitar a recuperação de
garantias, melhorias nos registros contábeis financeiros, na transparência financeira e nas normas
contábeis; aumentar o crédito interno; e continuar com as reformas do sistema de pensões.
A assimetria financeira, contudo, não é expressa apenas no poder americano, mas na
capacidade dos países agirem sobre as transações internacionais em sua própria moeda. São chamadas
de moedas chave aquelas que desempenham suas funções pública e privada na dimensão
internacional, enquanto que aquelas que não o desempenham, ou desempenham apenas parte das
funções, são chamadas de moedas periféricas.
Segundo Abouchedid e Palludeto (2016), as três funções da reserva internacional no
Sistema Monetário Internacional devem ser observadas a partir do seu uso público e do seu uso
privado: 1) como unidade de conta: sua função pública é ser uma âncora para outras moedas, enquanto
que na esfera privada deve servir para denominar contratos; 2) como meio de pagamento: sua função
pública é ser um instrumento de intervenção das autoridades monetárias no mercado internacional
com a intenção de manter o valor da sua própria moeda, enquanto que na esfera privada, serve como
veículo de várias transações que ocorrem internacionalmente; e, por fim, 3) como reserva de valor:
sua função pública se dá como reserva do Banco Central, enquanto que na função privada funciona
como um ativo privado.
A condição de periferia é reforçada, portanto, pela nova configuração da estrutura de
acumulação capitalista liderada pela financeirização. A hierarquia monetária condiciona que os países
de moedas periféricas estejam constantemente vulneráveis em duas dimensões: o fato dos fluxos
financeiros serem determinados nos países centrais, o que os torna vulneráveis ao ciclo de negócios;
e, a partir da primeira dimensão, pelo fato desses países terem pequena participação na carteira
internacional de ativos, tornando-os incapazes de evitar uma fuga de capitais nada marginal com
relação a sua economia (ABOUCHEDID; PALLUDETO, 2016).
A iliquidez das moedas periféricas não é um detalhe, em verdade pode ser vista como
determinante do grau de vulnerabilidade externa e da estrutura financeira dos países. Em caso de uma
baixa no ciclo de negócios, ou aumento do ambiente especulativo, a corrida para a liquidez é um
movimento natural e possibilitado pelo alto grau de mobilidade dos capitais (condição sine qua non
para que os países atraíssem esses fluxos financeiros). Os países com moedas fracas, portanto, atuam
buscando garantir um ambiente estável e altamente lucrativo para atrair fluxos financeiros e,
principalmente, para não ficarem de fora da integração financeira. Normalmente as atuações são em
direção a políticas de austeridade constante, mobilidade elevada de capitais e patamares altos da taxa
de juros, além de um mercado em torno dos movimentos rentáveis da taxa de câmbio
(KALTENBRUNNER; PAINCEIRA, 2017).
11
A taxa de juros não tem movimento automático de alta, em verdade, sua composição é
atrelada a taxa de juros internacional e é definida pelo: prêmio pela iliquidez de suas moedas; pelo
“custo-país” (pagamento de um adicional pelo risco que a propriedade do ativo significa pelo
detentor); e pela taxa de câmbio esperada - maioria determinada externamente. Sendo assim, a
hierarquia de moedas contribui para uma assimetria na capacidade autônoma de se tocar políticas
macroeconômicas (fiscal, monetária e cambial) pelos países. A hierarquia de moedas, portanto,
fornece uma dimensão adicional para a relação centro-periferia (ABOUCHEDID; PALLUDETO,
2016).
Ainda segundo Kaltenbrunner e Painceira (2017), essas características acabam
condicionando a natureza da acumulação de capital e estrutura financeira das economias periféricas,
o que perpetua a subordinação monetária. As taxas de juros altas dificultam a demanda doméstica, e
a volatilidade dos fluxos de capital prejudicam a capacidade das moedas em desempenhar outras
funções a nível internacional, podendo até comprometer a emissão de dívida na moeda nacional -
problema que aprofunda a subordinação, devido a variação da dívida acoplada aos movimentos das
moedas reservas em que ela foi emitida.
4. Reformas neoliberais e Financeirização no Brasil: breve recuperação dos anos 1990
O paradigma neoliberal não deve ser tratado como um conjunto simples de políticas
como privatizações, desregulamentações ou mudanças na gestão econômica, uma vez que, dessa
forma, aparentaria ser algo mutável a partir de decisões eleitorais, por exemplo. O neoliberalismo se
trata de um projeto global que, para Saad-Filho (2008, p.342), combina uma estratégia de acumulação
e um modo de reprodução social e econômico, que se baseia em uma associação promissora entre
mercado financeiro, hegemonia norte-americana e o poder estatal, mesmo que sob o véu da não-
intervenção.
Desta forma, o papel do Estado deve ser destacado por se tratar de uma chave possível
de entendimento da relação entre financeirização e neoliberalismo, principalmente quando se trata da
diferença de comportamento das finanças antes e depois das políticas de desregulamentação
financeira após a década de 1980. O processo que marca a relação entre Estado, neoliberalismo e o
surgimento da financeirização foi descrito na seção anterior, contudo, é possível avançar sobre esta
simbiose ao descrever as condições e os efeitos que este conjunto de reformas tiveram no sentido de
abrir as portas para a financeirização em países periféricos, com destaque para o Brasil.
As modificações pelas quais as economias periféricas passaram no decorrer das
décadas de 1980 e 1990 responderam, é claro, ao movimento de reorganização do padrão de
acumulação capitalista que tem como marco o fim de Bretton Woods. Além disso, tais reformas na
12
estrutura econômica e na gestão da política econômica ganharam caráter compulsório tanto para sua
inserção na nova ordem global liberalizada, como para o recebimento dos auxílios de instituições
como o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial para a superação do contexto de alto
endividamento externo, baixíssimo crescimento econômico e alta inflação que as caracterizava
(GIMENEZ, 2007).
Estas transformações ganharam o aspecto de diretrizes, ou manual de instruções, no
que ficou conhecido como os dez pontos do Consenso de Washington. Este documento indica que o
ajuste latino-americano necessitava passar por políticas como: reforma fiscal protagonizada pela
eficiência do gasto público, além de delegar ao Estado apenas a aplicação de recursos em áreas
sensíveis onde não há retorno econômico justificável; abertura financeira; abertura comercial,
liberalização da conta de capitais, desregulamentações, adequação das políticas cambiais aos
objetivos de liberalização comercial global e privatizações (WILLIAMSON, 1992).
Destarte, a elaboração e consolidação de políticas de cunho neoliberal não veio como
uma solução para os problemas de crescimento econômico ou das dificuldades de solvência do Estado
brasileiro, mas sim por uma articulação de interesses financeiros externos e internos fundados sobre
este novo paradigma. Como aponta Gimenez (2007, p. 105-6),
Com a integração à ordem financeira internacional e a volta do crédito externo, mesmo com
o crescimento econômico lento, consolida-se um padrão de valorização da riqueza privada
nacional que, embora liberal, não prescinde do Estado (dívida pública, empresas privatizáveis
etc.) e integra o mercado financeiro internacional nos circuitos nacionais de acumulação.
Assim tem-se internamente, com grande solidariedade de fora, simultaneamente uma enorme
força promotora das reformas estruturais – abertura financeira e comercial, privatizações,
reforma do aparelho do Estado etc. – e a hegemonia da ortodoxia na gestão da política
econômica, monetária, cambial e fiscal.
Cabe destacar que tal hegemonia se ocupou, principalmente, de praticar políticas que
tivessem como destaque a resolução do problema inflacionário, uma vez que a estabilização
monetária se tornava central para a garantia da rentabilidade dos ativos negociados em moeda
nacional. A principal expressão deste processo, como não poderia deixar de ser, foi o sucesso obtido
por um plano de estabilização como o Plano Real, com estabilização via âncora cambial. Segundo
Carneiro (2002), este plano era datado para o contexto em que foi aplicado, uma vez que só foi
possível pela alta liquidez internacional e pela capacidade do Estado brasileiro em atrair o fluxo
necessário de dólares para as necessidades de financiamento do país. Neste sentido, cabe destacar
dois movimentos, um externo, correspondente a uma conjuntura de sobreliquidez do mercado
financeiro internacional, e um interno, que deu garantias de remuneração e segurança aos capitais
externos ingressantes.
13
É claro que a intenção de praticar políticas liberalizantes não atraia capital externo
automaticamente. Foi preciso garantir que o processo de estabilização da moeda nacional ocorresse
com uma oferta adequada de ativos nacionais, o que contribuiu ainda mais com o movimento descrito
na seção dois deste artigo, onde ocorre a substituição do papel do Estado, neste caso o brasileiro,
como agente ativo na promoção do ritmo da acumulação, para um agente ativo na manutenção e
garantia da rentabilidade das transações financeiras.
Neste sentido, observou-se no Brasil um movimento em direção a promoção da
rentabilidade e liquidez dos títulos da dívida pública, políticas de valorização cambial e a elevação
do patamar da taxa de juros. Não menos importante, o processo de abertura comercial pôde ser
observado tanto do ponto de vista da privatização direta ou parcial das empresas públicas brasileiras,
da venda de ativos estatais e da incorporação pelo capital externo das ações depreciadas de bancos e
empresas privadas nacionais que sucumbiram diante deste processo. Ou seja, o processo de
liberalização financeira dependeu tanto da modificação da estrutura econômica e institucional do país,
como de processos agressivos de criação de espaços para a entrada, e então a valorização do capital
financeiro internacional (GIMENEZ, 2007).
A reflexão acerca do padrão de acumulação financeiro expresso pelo neoliberalismo,
fornece condições de compreensão para os movimentos posteriores da economia brasileira. Uma vez
que este padrão de integração das economias nacionais aos mercados globalizados é permanente, é
notório apontar que não se trata, então, de um período de reformas de Estado necessárias a adequação
das economias a padrões contemporâneos, mas sim, que a manutenção do país na esfera de
acumulação financeirizada depende, fundamentalmente, de constantes ajustes de rota em direção a
criação de novos mercados, manutenção da lucratividade financeira e subordinação das esferas
nacionais de decisão, se é que ainda existem.
5. Financeirização à Brasileira: peculiaridades e periodização
Depois da longa esteira de desregulamentações que teve lugar na economia brasileira da
década de 1990 e início dos anos 2000, ficou mais nítido que se estabelecia um regime de crescimento
dirigido pelas finanças, cujas características mais peculiares seriam o seu assentamento sobre a renda
de juros e a sua gravitação em torno do endividamento público, e não no endividamento privado,
característico da financeirização nas economias centrais.
Na intenção de propor uma leitura das circunstâncias e estruturas que determinaram o
surgimento e o avanço do processo de financeirização no Brasil, Bruno et al. (2011) reúnem
elementos que contribuem para uma periodização qualificada deste processo. Os autores apresentam
14
dados que corroboram com a conclusão de que houve, entre 1966-2008, três padrões de evolução
entre as taxas de lucro macroeconômico e de acumulação de capital fixo produtivo.
Esta análise, segundo os autores, permite identificar que, entre 1966-1993, predominou o
regime profit-led growth, ou seja, um regime onde os investimentos eram liderados pelo crescimento
da taxa de lucro, visto que houve uma correlação positiva entre estas taxas mesmo durante crises
econômicas, como a crise do modelo conhecido como “milagre econômico” e as subsequentes crises
durante a década de 1980. A partir de 1994, deixa de haver uma correlação positiva entre ambas as
taxas e os autores destacam uma mudança para outras duas fases. Uma primeira, na qual a taxa de
lucro macroeconômico seguiu em crescimento constante, diferente da taxa de acumulação de capital
fixo produtivo que permaneceu estagnada até 2003, quando se inicia uma terceira fase, na qual essa
taxa passa a apresentar crescimento superior àquela, mas em patamares diferentes visto que a taxa de
lucro apresentou crescimento constante com média anual de 1,8%, desde 1999.
Além disso, outros fatores ajudam a entender o pano de fundo sobre o qual se constitui o
processo de financeirização da economia brasileira. Como destacam Becker et al. (2010) e Bruno et
al. (2011), entre 1975 e 2004, há uma queda expressiva e contínua da parcela de lucro bruto que é
revertida para a formação bruta de capital fixo (FBCF), assim como se observa uma correlação
positiva entre o crescimento da razão entre o total de ativos financeiros não monetários e o estoque
total de capital fixo produtivo com o crescimento da proporção não investida daquele mesmo lucro
bruto. De 2004 a 2008, todos esses indicadores revertem suas trajetórias: a parcela do lucro destinada
a FBCF volta a crescer e a última correlação mencionada se inverte, apontando que as decisões de
investimento estiveram orientadas pela rentabilidade real dos mercados financeiros, e não pelas
características e critérios estritamente produtivos em si.
A compreensão do processo de financeirização da economia brasileira passa pelo
entendimento do que foi apontado inicialmente por Belluzzo e Almeida (2002), e verificado por
Bruno et al. (2011), como o processo de financeirização dos preços. Em síntese, tal processo pode ser
entendido como a generalização da referência à taxa nominal esperada de juros de curtíssimo prazo
que se tornou: critério para os ajustes de preço dos bens; base para definir o rendimento da riqueza
inativa em quase-moedas; e parâmetro para definir quais os preços que compensarão o diferencial de
risco, proteção e liquidez da utilização de ativos destinados à exportação no mercado interno.
Duas são as consequências diretas deste novo sistema. A primeira delas é que a dívida
pública passou a ser a base da renda bancária, funcionando como um lastro para a moeda indexada e
base para a arbitragem entre as duas moedas. Já a segunda, é que a criação de mecanismos
institucionais de defesa da renda, assim como da própria legislação e avanço do sistema bancário em
geral, possibilitaram que a sociedade brasileira se adaptasse ao fato de que níveis mais altos de
inflação eram importantes para manter o valor dos ativos privados.
15
Com a inflação muito acelerada, o risco de desvalorização é crescente caso os ativos
saiam do circuito financeiro para o real, sendo assim, a formação de preços se condicionou a atualizar
os valores desses ativos como solução para a não realização. A inflação nesse tipo de organização
econômica tornou- se fonte de ganhos extraordinários, o que impeliu toda a sociedade a organizar os
interesses em volta desse mecanismo. No Brasil, negar a moeda foi necessário para afirmar o valor
da riqueza, do lucro e até das rendas do trabalho (ALMEIDA; BELLUZZO, 2002).
Assim, concretamente, a financeirização da economia brasileira esteve, num primeiro
momento compreendido entre 1980-93, baseado nos ganhos inflacionários derivados de mecanismos
institucionais de correção monetária e indexação de preços e salários. Para Bruno et al. (2011; 2017)
e Paulani (2009), isso significou que a financeirização pressupôs (e pressupõe) um ambiente
institucional específico – neste caso, dual (coexistência da moeda emitida pelo Estado, que exercia as
funções de unidade de conta e meio de pagamento, e da moeda financeira indexada, lastreada pelos
títulos públicos, e que exercia a função de reserva de valor) e inflacionista.
Depois desse período, aproximadamente entre 1995 e 2008, o que se viu fora um
movimento dos bancos e do sistema financeiro nacional substituindo os ganhos inflacionários pela
renda de juros, pelo inabalável crescimento da dívida pública como proporção do PIB e pelos ativos
financeiros (basicamente, títulos de renda fixa conectados ao endividamento público com taxas de
juros elevadíssimas). Daí que, entre 1995-2006, a rentabilidade dos títulos de renda fixa e de
derivativos tenha representado 50% da receita operacional do sistema bancário-financeiro, com o
crédito representando menos que 20%. Em 2009, 84% da receita operacional do setor derivou da
renda de títulos e valores mobiliários, e apenas 10% das operações de crédito ao consumo e ao
investimento (BRUNO et al., 2011; PAULANI, 2009).
Esse segundo período também se faz útil para contextualizar a conformação da dívida
pública enquanto principal eixo da acumulação rentista-patrimonial no Brasil, de modo que a razão
entre a dívida pública interna líquida e o PIB tenha subido de 17,4%, em 1991, para 52%, em 2009.
Já a relação entre o estoque de ativos financeiros e o estoque de ativos produtivos cresce de 15%, em
1992, para 75%, em 2008 (BRUNO et al., 2011; PAULANI, 2009).
Não obstante, o grande problema posto por este padrão de financeirização que gravita
entorno do endividamento do Estado é que, conforme Mollo (2013), a maior parte dos recursos da
dívida não foram aplicados para o estímulo da produção, mas para o pagamento dos próprios juros,
de modo que os superávitis primários obtidos no período tenham sido insuficientes para cobrir os
juros.
Eis uma das formas pelas quais a condição estrutural periférica explica, e também é
reforçada, pela particularidade do processo de financeirização no caso da economia brasileira.
16
A consequência mais imediata de uma financeirização largamente construída sobre a
renda de juros foi a sobrevalorização cambial que, por sua vez, além de estimular as importações e
inibir as exportações – e, junto, prejudicar também a geração de emprego e renda internos - ainda
contribuiu para deteriorar o saldo da conta corrente do país. É por isso que, nos primeiros anos da
década de 2000, a participação das exportações industriais caiu sistematicamente, e mais ainda as de
alta, média-baixa e média-alta tecnologia, ao passo que cresceram as importações industriais de
média-baixa e média-alta tecnologia, especialmente a partir de 2004. Pari passu, as exportações iam
se fortalecendo cada vez mais unicamente com base nas commodities. Isso tudo resultou numa queda
contínua do saldo comercial da indústria brasileira a partir de 2005. Além desses fatores, há de se
ressalvar que a estrutura de mercado dos produtos exportados, commodities, tende a ser mais
concorrencial, ao passo que que a estrutura de mercado dos produtos importados tende a ser mais
concentrada, característica de insumos intensivos em tecnologia, contribuindo, dessa forma, para a
deterioração dos termos de troca via capacidade de controle dos preços das pautas exportadoras e
importadoras entre centro e periferia.
Contudo, a partir de 2004 e conforme adiantado acima, o que se percebe é uma reversão
de tendência na trajetória da FBCF, que passa a expandir-se.
Ocorre que foi justamente nesse ano que o fator acumulado da Selic, em relação ao capital
produtivo, começou a entrar em queda, de modo que, entre 2004 e 2010 – período no qual a economia
brasileira cresceu, em média, à taxa de 4,5% ao ano – o crescimento médio da FBCF foi de 8,2%. A
FBCF, que historicamente acompanha o comportamento do PIB, só iria entrar em trajetória de queda
a partir de 2011, quando a queda no preço das commodities, o estancamento dos fluxos de
investimento e de exportações com a China, e o fim do ciclo de expansão do consumo doméstico,
marcam, todos, o início de uma longa recessão na economia do país (BRUNO et al., 2011; CORRÊA
et al., 2017).
Sendo assim, nota-se que, pelo período em análise, é possível constatar que o padrão de
financeirização da economia brasileira difere daquele observado nas economias centrais ou
desenvolvidas – padrão este último que, via de regra, é o efetivamente retratado pela literatura – no
que se refere, principalmente, ao capital portador de juros, que, indo ao encontro das previsões aqui
já mencionadas por Becker et al. (2010), se conforma como o eixo central da acumulação rentista
também por aqui. Mas, além disso, ressaltam-se também as condições de acesso da população ao
mercado de capitais – bem mais restritas no caso brasileiro, onde a propriedade é consequentemente
menos pulverizada e mais concentrada
5
; e o mercado de dívida pública, que no caso brasileiro se faz
5
Para mais, ver Lazzarini (2011).
17
o palco da subordinação das finanças públicas, e no limite das próprias políticas econômicas, aos
interesses do grande capital financeiro global.
À parte de tais diferenças, não obstante, faz-se adequado e possível a identificação de
alguns traços gerais que têm caracterizado o processo de financeirização da economia brasileira até o
imediato pós-Crise de 2008.
Num esforço de síntese, pode-se afirmar, portanto, que a financeirização da economia
brasileira, num primeiro momento entre 1991 e 2003, pode ser classificada como sendo do tipo
finance dominated accumulation regime, um regime de crescimento pelo qual a circulação financeira
(e não a contraparte produtiva) se faz a base do processo de (auto)valorização do capital. Neste
período, a liberalização comercial e financeira, que tiveram lugar na economia doméstica dos anos
1980 e 1990, ao disseminar produtos financeiros de alta liquidez e rentabilidade, permitiu que as
empresas defensivamente alocassem uma crescente parcela de seus recursos em atividades
financeiras, de modo a garantir altos ganhos operacionais que não estiveram acompanhados do
aumento na formação bruta de capital fixo (BECKER et al., 2010; BRUNO et al., 2011).
Num segundo momento, entre 2004 e 2008, a financeirização no país tomou contornos
de um regime do tipo finance led growth, no qual o efeito-riqueza e o efeito-acelerador do
investimento se revelam importantes para comandar a compatibilidade dinâmica entre a produção e
a demanda agregada. Neste período, considerada a retomada da FBCF e das taxas de crescimento da
atividade econômica, mas igualmente considerada a queda do fator acumulado da Selic com relação
ao capital produtivo, é possível afirmar que a proporção e a sustentação do crescimento econômico
estiveram associadas ao aumento na rentabilidade real do capital fixo vis a vis a queda do ganho
financeiro, demonstrando que a rentabilidade de referência permaneceu na órbita financeira e não
diretamente na produtiva, a qual se estrutura como instância subordinada à primeira (BRUNO et al.).
Parece claro, portanto, que a financeirização da economia brasileira ocorreu muito mais
pelo capital portador de juros que, assim como em outras economias periféricas, inicialmente esteve
invocado pela luta anti-inflacionista e depois seguiu girando em torno das rendas obtidas a partir do
crescente endividamento do Estado (BECKER et al., 2010).
6. Conclusão
Os desafios da interpretação acerca da financeirização na periferia residem na sua
condição de integração subordinada, externamente determinada pela dependência dos fluxos
financeiros internacionais, e internamente determinada pelo ambiente financeirizado que vem sendo
construído em países maiores, como o Brasil, mas que respondem exatamente a dinâmica financeira
pré-determinada.
18
A análise da financeirização a partir da relação centro-periferia contribui para o
entendimento deste processo como algo não periódico, mas sistêmico. Desta forma, é possível
associar o padrão de integração econômica de economias como a brasileira, com a falta de capacidade
estrutural em superar os ditames de um padrão de acumulação organizado para atender os ditames da
riqueza financeira.
Desta forma, é possível traçar singularidades para a financeirização da economia
brasileira enquanto economia periférica que é, e apontar como ela difere consideravelmente dos
processos de acumulação do capital financeiro observado nas economias centrais em diversos fatores,
como por exemplo: quanto às condições políticas que corroboram a maior ou menor autonomia do
país neste processo; quanto à estrutura de propriedade dos ativos financeiros; quanto ao tamanho, a
relevância e o alcance dos mercados de capitais; e, dentre tantos outros fatores, também quanto à base
sobre a qual tal processo preponderantemente se sustenta e avança (no caso dos periféricos, sobre o
capital portador de juros) e, no limite, quanto ao papel do endividamento público e do próprio Estado.
Especialmente debruçado sobre estes últimos fatores, o presente trabalho procurou
reconstituir a periodização que ajuda a entender o processo de financeirização da economia brasileira,
assim como as particularidades subjacentes a tal processo. O fato da acumulação rentista-patrimonial
estar fortemente apoiado nas rendas que obtém a partir do endividamento do Estado brasileiro parece
cercear a autonomia deste na determinação de suas políticas macroeconômicas – em particular, a
fiscal, sob a égide do equilíbrio das contas públicas e da máxima da austeridade; e a monetária, que,
sob a marca da taxa de juros que seja responsável por eternamente evitar a afamada “fuga de capitais”,
acaba por reverberar na limitada capacidade de criação de crédito e financiamento ao
desenvolvimento da economia doméstica.
As modificações da economia global com a crise do coronavírus trouxeram elementos
novos como o surgimentos de taxas de juros negativas a nível mundial, e a diminuição drástica do
patamar de juros na economia brasileira. É claro que o processo de financeirização não pode ser
relacionado apenas com esta variável, uma vez que mesmo com taxas de juros baixas, ela pode vir a
se expressar na captação de créditos denominados em moedas estrangeiras e o aumento da dolarização
da economia. Sendo assim, o trabalho buscou contribuir para uma conceituação da realidade
brasileira, assim como faz parte de um amplo espectro de pesquisas sobre o tema que tentam com o
devido rigor teórico responder as atualizações do movimento da financeirização no Brasil.
7. Referências Bibliográficas
ABOUCHEDID, S. C. PALLUDETO, A. W. A. The Currency Hierarchy in Center-Periphery
Relationships. Analytical Gains of Geopolitical Economy. Published online: 07 Jan 2016, p. 53-90.
19
ALMEIDA, J. S.; BELLUZZO, L. G. 2002. Depois da Queda: a economia brasileira da crise da
dívida aos impasses do Real. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, caps. 5 e 6.
BECKER, J. et al. 2010. Peripheral Financialization and Vulnerability to Crisis: a regulacionist
perspective. Competition & Change, v. 14, n. 3-4, p. 225-247.
BRAGA, José C. S. 1985 Temporalidade da Riqueza: uma contribuição à teoria da dinâmica
capitalista. Tese de doutorado em Ciência Econômica – Instituto de Economia, Unicamp, Campinas.
______. 2000. Temporalidade da Riqueza: teoria da dinâmica e financeirização do capitalismo.
Campinas: Instituto de Economia, Unicamp, Coleção Teses.
BRAGA, José C. S.; CINTRA, M. A. M. 2004. Finanças Dolarizadas e Capital Financeiro:
exasperação sob comando americano. In: FIORI, J. L. (org.). Poder Americano. São Paulo: Vozes.
BRAGA, José C. S.; DEOS, S. S.; OLIVEIRA, G. C.; PALLUDETO, A. W. A.; WOLF, P. J. W.
2017. For a Political Economy of Financialization: theory and evidence. Economia e Sociedade,
v. 26, número especial, p. 829-856.
BRUNO, M. et al. 2011. Finance-led Growth Regime no Brasil: estatuto teórico, evidências
empíricas e consequências macroeconômicas. Revista de Economia Política, v. 31, n. 5, p. 730-750.
BRUNO, M.; CAFFE, R.. 2017. The state and financialization in Brazil: macroeconomic
interdependencies and structural limits preventing development. Economia e Sociedade, n. 26, p.
1025–1062.
CHESNAIS, François. 1996. A Mundialização do Capital. São Paulo: Xamã.
______. 2002. A Teoria do Regime de Acumulação Financeirizado: conteúdo, alcance e
interrogações. Campinas: Economia e Sociedade, v. 1, n. 11, p. 1-44.
______. 2016. Finance Capital Today: corporations and banks in the lasting global slump. Leiden:
Brill.
CORRÊA, E.; VIDAL, G. 2012. Financialization and Global Financial Crisis in Latin American
Countries. Journal of Economic Issues, v. 46, n.2, p. 541-548.
CORRÊA, M. F. et al. 2017. Financeirização, Empresas Não Financeiras e o Ciclo Econômico
Recente da Economia Brasileira. Economia e Sociedade, 26, 1129-1150.
20
CROTTY, J. 2002. The Effects of Increased Product Market Competition and Changes in
Financial Markets on the Performance of Nonfinancial Corporations in the Neoliberal Era.
PERI Working Paper, n.44.
DUMÉNIL, G.; LÉVY, D. 2001. Costs and Benefits of Neoliberalism. A class analysis. Review of
International Political Economy, v. 8, n.4, p. 578-607.
EPSTEIN, G. 2005. Introduction: financialization and the word economy. In: EPSTEIN, G. (ed.).
Financialization and the World Economy. Cheltenham: Edward Elgar.
FELIPINI, A. R.; PALLUDETO, A. W. A. 2019. Panorama da Literatura sobre Financeirização
(1992-2017): uma abordagem bibliométrica. Economia e Sociedade, v. 28, n. 2, p. 313-337.
FINE, B. 2010. Neoliberalism as Financialisation. In: SAAD-FILHO, A.; YALMAN, G. (orgs.).
Economic Transitions to Neoliberalism in Middle-income Countries: policy dilemmas, economic
crises, forms of resistance. Nova Iorque: Routledge, p. 11-23.
______. 2013. Financialization From a Marxist Perspective. International Journal of Political
Economy, v. 42, n. 4, p. 47-66.
FOSTER, John B.; MAGDOFF, Fred. 2009. The Greatest Financial Crisis: causes and
consequences. Nova Iorque: Monthly Review Press.
GIMENEZ, D. M. 2007. A Questão Social e os Limites do Projeto Liberal no Brasil. Tese de
doutorado em Desenvolvimento Econômico - Instituto de Economia, Unicamp, Campinas.
HILFERDING, R. 1985. O Capital Financeiro. São Paulo: Nova Cultural.
HIRATUKA et al. 2019. The Influence of Heterogenous Institutional Investors on Company
Strategies in Emerging Countries: evidence from Brazil. Competition & Change, v. 23, n. 5, p. 460-
480.
KALTENBRUNNER, A.; PAINCEIRA, J. P. 2017. Subordinated Financial Integration and
Financialisation in Emerging Capitalist Economies: the Brazilian experience. New Political
Economy, p. 1-25.
KOTZ, D. 2015. The Rise and Fall of Neoliberal Capitalism. Cambridge: Harvard University Press.
KREGEL, J. 2017. “Isms” and “Zations”: on fictious liquidity and endogeneous financialization.
Campinas: Economia e Sociedade, 26, p. 879-893.
21
LAPAVITSAS, C. 2011. Theorizing Financialization. Work, Employment & Society, v. 25, n. 4,
p. 611–626.
______. 2013. Profiting Without Producing: how finance exploits us all. Nova Iorque: Verso.
LAZZARINI, S. G. 2011. Capitalismo de Laços: os donos do Brasil e suas conexões. Rio de Janeiro:
Elsevier.
METRI, M. 2004. O Poder Financeiro dos Estados Unidos no Padrão Monetário Dólar-Flexível.
Anais do Encontro IX Encontro Nacional de Economia Política.
MOLLO, M. L. R. 2013. Financialization as the Development of Fictitious Capital: the international
financial crisis and its consequences in Brazil. In: KARAAGAC, B. (ed.). Accumulations, Crises,
Struggles: capital and labour in contemporary capitalism. Berlin: LIT Verlag.
PAULANI, L. 2009. A Crise do Regime de Acumulação com Dominância da Valorização
Financeira e a Situação do Brasil. Estudos Avançados, v. 23, n. 66, p. 25-39.
RUDE, C. 2005. The Role of Financial Discipline in Imperial Strategy. In: PANITCH, L.; LEYS, C.
(eds.). Socialist Register. Londres: Merlin Press, p. 82 - 107.
SAAD-FILHO, A. 2008. Marxian and Keynesian Critiques of Neoliberalism. In: PANITCH, L.;
LEYS, C.; ALBO, G.; CHIBBER, V. (eds.). Socialist Register. Londres: Merlin Press, p. 337-345.
TAVARES, M. C. 1998. A Retomada da Hegemonia Norte-Americana. In: TAVARAES, M. C.;
FIORI, J. L. (orgs.). Poder e Dinheiro: uma economia política da globalização. Petrópolis: Vozes.
TREECK, Till Van. 2012. Financialization. In: KING, J. E. (org.). The Elgar Companion to Post
Keynesian Economics. Cheltenham: Edward Elgar.
WILLIAMSON, J. 1992. Reformas Políticas na América Latina na Década de 1980. Revista de
Economia Política, v. 12, n. 1.