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Intervenção local com crianças e famílias face à pandemia COVID-19: ProChild CoLAB em Guimarães

Authors:
  • ProChild COLAB

Abstract and Figures

A pandemia COVID-19 desenvolveu-se em Portugal, a partir de março de 2019, de forma acelerada, obrigando a adaptações muito rápidas das entidades públicas, dos serviços, das empresas e dos/as cidadãos/ãs, com vista a conter os seus efeitos sanitários, sociais e económicos. A incerteza que carateriza a sociedade contemporânea, em mui- tos dos seus domínios e setores, apresentou-se, desta vez, sob a forma microscópica de um vírus, capaz de, por si só, obrigar à alteração, com caráter de urgência, de hábitos consolidados, formas de sociabilidade ancestrais, planos e projetos de existência maduramente estabelecidos.
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Intervenção local com crianças e famílias
face à pandemia COVID-19:
ProChild CoLAB em Guimarães
https://doi.org/10.21814/uminho.ed.24.4
Manuel Jacinto Sarmento
Manuel Jacinto Sarmento (ORCID: 0000-0002-6556-9498) é Professor Associado do
Instituto de Educação e membro do Centro de Investigação de Educação (CIEC) da
Universidade do Minho.
Gabriela Trevisan
Gabriela Trevisan (ORCID: 0000-0003-0137-5034) é socióloga e investigadora do
ProChild CoLAB.
Helena Grangeia
Helena Grangeia (ORCID: 0000-0002-5521-8352) é psicóloga e investigadora do Pro-
Child CoLAB.
Marlene Sousa
Marlene Sousa (ORCID: 0000-0003-2991-3017) é psicóloga e investigadora do Pro-
Child CoLAB.
Inês Guedes de Oliveira
Inês Guedes de Oliveira (ORCID: 0000-0003-2359-7842) é Professora Auxiliar do
Departamento de Comunicação e Arte da Universidade de Aveiro.
Adelina Paula Pinto
Adelina Paula Pinto é Vice-Presidente da Câmara Municipal de Guimarães.
Adriana Sampaio
Adriana Sampaio (ORCID: 0000-0001-7347-1282) é Professora Auxiliar e Vice-Pre-
sidente da Escola de Psicologia e membro do Centro de Investigação em Psicologia
(CIPsi) da Universidade do Minho.
Bárbara Figueiredo
Bárbara Figueiredo (ORCID: 0000-0002-8209-7445) é Professora Associada com
agregação Escola de Psicologia e Diretora do Centro de Investigação em Psicolo-
gia (CIPsi) da Universidade do Minho.
Gabriela Bento
Gabriela Bento (ORCID: 0000-0003-4113-5692) é psicóloga e investigadora do Pro-
Child CoLAB.
Mariana Carvalho
Mariana Carvalho (ORCID: 0000-0003-2081-3909) é arquiteta e investigadora do
ProChild CoLAB.
Teresa Freire
Teresa Freire (ORCID: 0000-0001-5773-381X) é Professora Auxiliar da Escola de Psi-
cologia e membro do Centro de Investigação em Psicologia (CIPsi) da Universidade
do Minho.
Marlene Matos
Marlene Matos (ORCID: 0000-0002-2194-839X) é Professora Auxiliar da Escola de
Psicologia e membro do Centro de Investigação em Psicologia (CIPsi) da Universidade
do Minho.
Isabel Soares
Isabel Soares (ORCID: 0000-0002-2707-7089) é Professora Catedrática da Escola de
Psicologia e membro do Centro de Investigação em Psicologia (CIPsi) da Universidade
do Minho.
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INTRODUÇÃO
A pandemia COVID-19 desenvolveu-se em Portugal, a partir de março de 2019,
de forma acelerada, obrigando a adaptações muito rápidas das entidades públicas, dos
serviços, das empresas e dos/as cidadãos/ãs, com vista a conter os seus efeitos sanitários,
sociais e económicos. A incerteza que carateriza a sociedade contemporânea, em mui-
tos dos seus domínios e setores, apresentou-se, desta vez, sob a forma microscópica de
um vírus, capaz de, por si só, obrigar à alteração, com caráter de urgência, de hábitos
consolidados, formas de sociabilidade ancestrais, planos e projetos de existência madu-
ramente estabelecidos.
Todos os setores da sociedade foram atingidos pela pandemia. No entanto, fo-
ram-no de forma distinta, em função das condições de desigualdade e de diversidade da
estrutura social. Também essas diferenças se manifestaram no que respeita às gerações
e etapas da vida. O vírus ataca de forma e com efeitos diferenciados as pessoas idosas,
as pessoas adultas e as crianças. No caso da geração mais jovem, o impacto da pan-
demia manifestou-se a vários níveis: os quotidianos escolares foram substituídos por
aprendizagens realizadas no espaço doméstico, com apoio televisivo e das ferramentas
informáticas; o convívio familiar rotineiro ampliou-se em cada 24 horas, pela presença
dos/as pais/mães no horário de trabalho, em situação de teletrabalho, de lay-o ou de-
semprego; a relação intergeracional com avôs/avós e parentes mais velhos/as viu-se subi-
tamente interrompida, sob a ameaça da contaminação; a confraternização e a brincadei-
ra entre pares deu lugar ao isolamento e à solidão, ou a interações visuais pelo telemóvel
ou nas redes sociais; o espaço público foi condicionado em período de connamento e
não só os parques infantis foram encerrados, como a invisibilidade social das crianças
ganhou uma expressão direta no esvaziamento das cidades, de repente despojadas dos
seus munícipes mais jovens; algumas crianças, em situação de maior vulnerabilidade,
sofreram diretamente os efeitos psicológicos, sociais e económicos da pandemia: torna-
ram-se mais expostas aos impactos na saúde mental das respetivas famílias, perderam,
nalguns casos, o contacto com os/as professores/as e as escolas, nomeadamente pelo
facto de não possuírem meios eletrónicos de contacto e sofreram carências alimentares
por empobrecimento dos/as pais/mães.
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Rapidamente, um conjunto de relatórios de grandes agências internacionais sina-
lizou os riscos e os perigos para as crianças e jovens face à pandemia COVID-19 e assinalou
a imperatividade de medidas capazes de minimizar e contrariar os respetivos fatores (e.g.,
Alliance for Child Protection in Humanitarian Action, 2019; Bakrania & Subrahma-
nian, 2020; Reimers & Schleicher, 2020; International Commission on the Futures of
Education, 2020). O conjunto dessas medidas apresenta alguns pontos comuns: devem
ser adotadas medidas com urgência e acuidade; é fundamental que os seus contextos de
aplicação sejam devidamente identicados, o que exige proximidade; é necessário que as
ações sejam diversicadas, para atender à diversidade de situações, mas devidamente arti-
culadas, de acordo com o princípio de diversicar com coerência; devem ser devidamente
integradas e coordenadas; devem sustentar-se numa ética do cuidado, que é, também, a
base de uma “economia do cuidado” (Reis, 2020); por último, devem basear-se no conhe-
cimento cientíco e devem ser devidamente monitorizadas e avaliadas.
Todos estes aspetos - acuidade, proximidade, diversidade com coerência, inte-
gração, ética do cuidado, fundamento cientíco - constituem a base de modelos de ação
que assumem a criança como centro da intervenção, com a preocupação da promoção
do seu desenvolvimento e bem-estar, na perspetiva da garantia dos seus direitos.
Foi um modelo também assente nestes princípios aquele que se desenvolveu na
intervenção com crianças face à pandemia COVID-19 no município de Guimarães, a
partir da Câmara Municipal, em parceria com o ProChild CoLAB.
O ProChild CoLAB é o laboratório colaborativo que tem por missão o com-
bate à pobreza e à exclusão social na infância, enquadrado numa abordagem cientíca
transdisciplinar que articula os setores público e privado. Constituído a partir da ini-
ciativa da Universidade do Minho, conta como associadas as principais universidades
portuguesas, empresas de referência nacional, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e
o Município de Guimarães.
O modelo integrado de intervenção nas crianças e famílias foi desenhado pelo
ProChild CoLAB em estreita relação com a Câmara Municipal de Guimarães e consti-
tui o programa de intervenção especíca, articulando-se com outras ações do Municí-
pio dirigidas para outros setores populacionais (designadamente para as pessoas idosas)
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e para outros âmbitos de ação (nomeadamente a economia), bem como com as ações
promovidas pelas autoridades e agentes locais de saúde. Este modelo é também com-
plementar de medidas adotadas pelo município na resposta a necessidades identicadas
nas crianças no que respeita, designadamente, à distribuição de alimentos, ao forneci-
mento de computadores e disponibilização de acesso à internet e ao apoio e acompa-
nhamento social das famílias.
No seu conjunto, o modelo procurou dar resposta às necessidades identicadas,
nomeadamente no que respeita aos efeitos da pandemia na saúde mental das crianças,
às necessidades educativas das crianças, ao acompanhamento do desenvolvimento, à
promoção da parentalidade positiva e à promoção da ludicidade, no quadro de criação
de condições de bem-estar pessoal e social.
De seguida apresentar-se-ão os fundamentos do modelo, as suas especicações e
as suas concretizações em projetos da intervenção realizada.
1 FUNDAMENTOS DO MODELO DE INTERVENÇÃO
Um princípio base e transversal a todos os projetos do ProChild CoLAB é o
desenvolvimento de respostas integradas e apoiadas na evidência cientíca, envolvendo
a colaboração e articulação intersectorial entre a equipa de prossionais e os vários ser-
viços de apoio à infância e às famílias na comunidade.
Na fase de caracterização do território do Município de Guimarães e de auscul-
tação dos/as prossionais das diferentes instituições (nais de 2019 e início de 2020),
caram patentes diversas necessidades e diculdades, entre as quais se salientam as rela-
cionadas com a articulação de respostas e com a provisão de práticas que se sustentem
em conhecimento empiricamente validado. Da mesma forma, foi salientada a impor-
tância de uma ação concertada, interdisciplinar e colaborativa entre os/as diferentes
prossionais para a obtenção de resultados positivos e duradouros. Tornou-se evidente
a importância do ProChild CoLAB assumir um papel catalisador e mediador entre
os/as prossionais do Município de Guimarães, dando resposta às necessidades elenca-
das pelos/as mesmos/as.
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Assim, no âmbito da sua atuação, o ProChild CoLAB propôs-se desenvolver um
modelo colaborativo, intersectorial e multinível de formação de prossionais para uma
intervenção centrada na criança e nos seus contextos de vida (as intervenções concretas
serão apresentadas no ponto 4 deste texto). Este projeto abrange todo o território do
Município de Guimarães e integra prossionais de diferentes áreas que, na sua prática,
atuam ao nível dos contextos de saúde, educação e proteção. O objetivo é melhorar as
práticas e políticas do município, introduzindo modelos empiricamente validados, não
só ao nível da intervenção junto das crianças e famílias, mas também ao nível da atuação
dos/as próprios/as prossionais.
Este projeto baseia-se em modelos com evidência empírica da sua ecácia, fun-
damentando-se:
(1) numa estratégia de implementação assente numa abordagem colaborativa e
multinível;
(2) no modelo Exploration, Preparation, Implementation and Sustainment (Aa-
rons, Hurlburt, & Horwitz, 2011) que orienta as fases de operacionalização e de
manutenção;
(3) nos princípios do modelo IDEAS Impact Framework (Center on Develo-
ping Child, Universidade de Harvard) para a sua avaliação.
Este projeto tem, assim, como missão primordial desenvolver, implementar e
avaliar um modelo colaborativo, multinível e intersectorial de formação de prossio-
nais para uma intervenção centrada na criança e na família a partir de práticas baseadas
na evidência empírica. Especicamente, este projeto procura:
(1) colmatar a lacuna existente ao nível da relação entre a ciência e a prática;
(2) promover a adesão às práticas baseadas na evidência cientíca, bem como a
sua sustentabilidade;
(3) e fomentar o trabalho colaborativo e intersectorial entre prossionais, enti-
dades e contextos comunitários, da saúde, da educação e da proteção à criança.
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Neste sentido, este projeto visa assegurar não a qualicação dos/as prossio-
nais/atores sociais ao nível das práticas e modelos cienticamente válidos e ecazes, mas
também as condições intra e intersectoriais para a sua implementação, cumprindo com os
critérios de delidade, sustentabilidade e escala (Walsh, Rolls, Reutz, & Williams, 2015).
Os seus objetivos não se esgotam, porém, nos/as prossionais, mas estendem-se
às crianças, famílias e instituições do município. Com este modelo procura-se promo-
ver e agilizar, ao nível das crianças e respetivas famílias, o acesso a intervenções ecazes
e adequadas às suas especicidades e necessidades, fomentando o seu bem-estar físico,
psicológico e socioemocional. Ao nível das instituições, procura-se melhorar as suas
práticas, tornando-as mais céleres e ecazes, potenciando os seus recursos. Por m, ao
nível do município tem como objetivo delinear uma ação concertada e empiricamente
sustentada, melhorando as práticas relativas à intervenção na infância.
No contexto da pandemia COVID-19, considerando os princípios enuncia-
dos, e com o objetivo de promover e assegurar a saúde, bem-estar, educação e prote-
ção das crianças, foi desenvolvido o projeto “ProChild Collaborative Action Against
COVID-19”. Assente nos princípios de uma intervenção comunitária colaborativa, in-
tersectorial e multinível, este projeto procura dar resposta às múltiplas necessidades e
desaos que crianças e famílias enfrentam neste período pandémico. E que necessida-
des e desaos são esses?
2 IMPACTO DA PANDEMIA COVID-19 NAS CRIANÇAS E FAMÍLIAS
A pandemia COVID-19 está a ter implicações sociais e económicas signicati-
vas, que se repercutem no modo de vida de crianças, famílias e suas comunidades. Estes
efeitos apresentam uma natureza desigualitária, não democrática, afetando particular-
mente indivíduos com vínculos laborais precários, com menor escolarização e ligados a
ramos prossionais particularmente afetados pelas mudanças trazidas pela pandemia,
como o turismo, a hotelaria e a restauração (Silva et al., 2020). De acordo com Rodri-
gues (2020), a pandemia COVID-19 acentuou desigualdades existentes (e.g., famílias
dependentes do trabalho informal caram sem rendimentos e sem acesso a proteção
social), fez emergir novas formas de desigualdade (e.g., a ligação de algumas crianças
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ao sistema de ensino degradou-se e a capacidade de acompanhamento online dos con-
teúdos escolares mostrou-se muito dependente das condições sociais dos/as alunos/as)
e enfraqueceu mecanismos de proteção e de combate às desigualdades (e.g., o encerra-
mento das cantinas escolares impossibilitou o acesso a refeições gratuitas por parte de
crianças que beneciavam deste apoio; “connaram-se” situações de violência domésti-
ca, que não foram reportadas aos serviços de proteção).
Paralelamente, surgem desaos sem precedentes no campo da saúde pública, no-
meadamente que se refere à vigilância e mitigação dos impactos adversos e potencial-
mente traumáticos da pandemia nos indivíduos, famílias e comunidades. Apesar de a
maioria dos indivíduos poder não desenvolver uma resposta traumática face ao cenário
atual de adversidade, está já demonstrado que a perda, o medo e o stress, fortemente as-
sociados à COVID-19, exacerbam problemas de saúde mental já existentes e contribuem
para uma maior incidência de perturbações relacionadas com o stress e o trauma (Qiu
et al., 2020). Enquanto fator de stress, o atual cenário de pandemia apresenta caracte-
rísticas que acentuam a sua natureza traumática, nomeadamente a indenição sobre a
evolução e o limite temporal da pandemia, a mortalidade associada à infeção, a extensa
cobertura mediática, o isolamento social, as perdas nanceiras e/ou a potenciação das
vulnerabilidades sociais (Horesh & Brown, 2020). A gura 1 esquematiza alguns dos
efeitos da pandemia COVID-19 nos indivíduos, famílias, comunidade e sociedade.
No cenário atual de pandemia, as crianças destacam-se como um grupo de risco
no que respeita aos efeitos adversos na saúde mental (Qiu et al., 2020). A pandemia
altera drasticamente os contextos de vida da criança, aumentando o risco ou agravando
situações já existentes de desproteção nos contextos socioeconómicos, familiares ou de
acolhimento (Sistovaris et al., 2020).
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Figura 1. Impacto socioecológico da pandemia COVID-19 (adaptado a partir do esquema
da Alliance for Child Protection in Humanitarian Action, 2019, p. 2).
Destacam-se os efeitos das medidas de connamento na saúde física (e.g., desre-
gulação de padrões de sono, exercício físico e alimentação) e mental das crianças que,
associados à sua duração prolongada, ao medo da doença, à informação inadequada ou
alarmista, ao espaço limitado, à disfunção e stressores familiares (Liu, Bao, Huang, Shi,
& lu, 2020; Wang, Zhang, Zhao, & Zhang, 2020), aumentam a incidência de pertur-
bações associadas ao stress e trauma (Sprang & Silman, 2013). O afastamento do meio
escolar contribuiu para o surgimento de sentimentos de solidão, tristeza e frustração
por parte das crianças, que se viram privadas de interações presenciais com os pares e
com os/as professores/as e de momentos lúdicos nos recreios, centrais para o seu desen-
volvimento e bem-estar. Os resultados preliminares de um estudo transnacional coor-
denado pela Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa e ProChild CoLAB
corroboram este impacto ao nível de indicadores clínicos de ansiedade nas crianças
portuguesas em período de pandemia, apontando para 11.3% numa amostra de 565
crianças entre os 6 e os 16 anos.
“Estar na escola” passou a signicar estar muitas horas em frente a ecrãs, sendo
que este formato online trouxe problemas signicativos para muitas crianças, que se
viram afastadas de qualquer hipótese de contacto com os pares e com os professores. A
carência de meios informáticos e de ligação à internet em muitos agregados familiares
impossibilitou a comunicação e acentuou a desigualdade no acesso a oportunidades
de aprendizagem de qualidade. O sucesso do ensino à distância viu-se refém de uma
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multiplicidade de fatores extra escola (e.g., disponibilidade dos/as pais/mães; equipa-
mentos existentes) que, apesar dos esforços das autarquias, das escolas e dos/as profes-
sores/as, não foram completamente superados.
Além disso, o connamento contribuiu para o surgimento ou agravamento de
fatores de risco para os maus-tratos às crianças. Na ausência de apoio formal e informal,
as famílias procuram dar resposta, num mesmo espaço e tempo, às responsabilidades
inerentes ao trabalho pago, ao cuidado e à educação das crianças e às tarefas domésti-
cas (Alliance for Child Protection in Humanitarian Action, 2019; UNICEF, 2020).
Esta sobrecarga gera maior stress, conito familiar e deterioração das práticas paren-
tais, potenciando situações de maior risco/perigo para as crianças. O connamento e
o encerramento das escolas e de serviços comunitários de apoio às famílias favorecem a
sua invisibilidade ao Sistema de Proteção da Criança, o que é evidente no decréscimo
de 29.7% das sinalizações às CPCJ entre janeiro e abril de 2020, comparativamente ao
período análogo de 2019.
Pelos motivos apresentados, o cenário é preocupante, especialmente em crian-
ças e famílias já vulneráveis devido, por exemplo, a contextos e processos de exclusão
socioeconómica, a dinâmicas abusivas no seio familiar e a necessidades ou condições de
saúde especiais. A atuação dos diferentes setores da comunidade (e.g., saúde, educação,
proteção) é absolutamente imprescindível para a minimização do impacto da pande-
mia nas crianças e famílias. Mas como?
3 ESPECIFICIDADES DA INTERVENÇÃO COMUNITÁRIA EM PERÍODO
PANDÉMICO
3.1 A intervenção comunitária como prática transformadora
A intervenção comunitária é uma prática complexa que implica a consideração
de múltiplos fatores, desde logo, a própria denição adotada para a ideia de comuni-
dade. Se, por um lado, pode ser denida como um conjunto de indivíduos que, apesar
das diferenças que os separam a nível social, cultural e económico, partilham o mesmo
território e alguns laços e interesses em comum, implica também ideias de tolerância,
reciprocidade, conança e capacidade de partilhar valores comuns. Assim, apela para
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uma ideia relativamente abstrata de representação da vida social que estabelece limi-
tes e descontinuidades articiais: quem está dentro/fora e o nós/eles (Lillo & Rosello,
2001). Apesar desta multiplicidade de signicações, a comunidade constitui-se como
“uma área da vida social que se singulariza pela adesão que mantêm os seus integrantes,
com um sentido de pertença que não se entende sem a presença de níveis mínimos de
solidariedade e de intercâmbio de signicados, características psicológicas e culturais.”
(Caride-Gomez, Freitas, & Callejas, 2007, p. 132). Qualquer projeto de intervenção co-
munitária tem por base a resolução de problemas concretos, envolvendo a participação
da população em todas as etapas - desde a identicação dos problemas às suas soluções
- procurando, também, dotá-la de recursos próprios que permitam uma abordagem
emancipatória da intervenção e não uma intervenção que prolongue a dependência dos
seus membros face a serviços e intervenções externas, para lá das necessárias.
O contexto pandémico vivido pela comunidade e, especicamente, pelo territó-
rio de Guimarães levantou necessidades de intervenção mais complexa que pudesse res-
ponder à excecionalidade de um tempo de crianças sem escola e sem espaço público, de
famílias sem trabalho e da casa como espaço central da vida de todos/as. A constatação
de que seria necessário um reforço de intervenção junto das crianças e suas famílias foi
óbvia, desenhando-se um conjunto de possibilidades que permitissem chegar às crian-
ças em casa e às suas famílias. Para este efeito, é fundamental a existência de uma relação
entre serviços e comunidades, da relação de proximidade e da alocação dos recursos ne-
cessários à satisfação dessas necessidades. As comunidades cumprem importantes fun-
ções sociais, tais como a socialização e transmissão cultural, a promoção de participação
social e integração dos membros do coletivo, a promoção e formação de identidades
coletivas, entre outros (Caride-Gomez et al., 2007). Estas funções, no entanto, encon-
tram maiores desaos com processos de connamento, evidenciando a necessidade de
se pensar em estratégias que permitam minimizar os riscos sociais, económicos e indi-
viduais resultantes desses processos, quer para as crianças quer para as pessoas adultas.
Independentemente do quadro em que se situem as noções de comunidade, uma
premissa fundamental na intervenção comunitária: o conhecimento prévio das suas
diferentes componentes é condição central para o sucesso das intervenções.
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Para esse conhecimento, há um conjunto de elementos que se assumem como
particularmente relevantes: o território, a população, as necessidades, os recursos/
presença de organizações sociais e comunitárias, a partilha de interesses comuns,
um passado histórico e cultural comum, entre outros de particular relevância (Ca-
ride-Gomez et al., 2007). A análise destes elementos permite então o conhecimento
aprofundado de uma dada comunidade, de modo a que as intervenções aí preconiza-
das correspondam às necessidades identicadas pelos seus membros e pelas diferen-
tes instituições que nela intervenham.
Daremos aqui particular atenção aos seguintes elementos:
Território - nenhum território é neutro, uma vez que ele enforma problemas so-
ciais e equaciona diferentes modos de vida das populações que o habitam. Um mesmo
território (re)produz diferentes realidades socioeconómicas, culturais e mesmo educa-
tivas. A esse propósito lembramos as conceções de “territórios da pobreza” (Capucha,
2000) ou políticas urbanas de broken windows (Fernandes, 2006), que ajudam a en-
quadrar a forma como as políticas públicas dirigidas a diferentes comunidades podem
potenciar ou mitigar as diferentes vulnerabilidades que apresentem. Assim, o conheci-
mento do território engloba, entre outros: o espaço geográco, as congurações (rurais,
urbanos, semiurbanos...), as redes de transporte e acessibilidades, os locais de reunião
da população as estruturas sociais, educativas e de saúde, à disposição dos seus mem-
bros. Espaço e tempo assumem-se como condições fundamentais da existência huma-
na e consubstanciam a relação indivíduo-sociedade, sempre construída numa relação
especíca entre espaço e tempo. “O cruzamento entre o encontro e o confronto fazem
com que o território passe a ser uma realidade viva, não somente da explosão das con-
tradições sendo também de resolução, tanto pelo crescimento de consciência cidadã,
como pela renovação do Estado e seus organismos, que hoje têm novas funções e po-
tencialidades de intervenção, entre elas, a intervenção social.” (Marchioni, 2004, p.71).
Esta realidade viva do território permite, nalmente, analisar as suas potencialidades e
vulnerabilidades na construção das vidas das pessoas que os habitam.
Em período de connamento torna-se expectável que as vulnerabilidades já exis-
tentes no território se agravem e novas surjam, sendo necessário acelerar esse processo
de reconhecimento e o desenho de intervenções ecazes.
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População - corresponde ao conjunto de membros de uma comunidade, entre
os quais se produzem inter-relações, interesses e valores comuns que criam sentimentos
de pertença (Lillo & Roselló, 2001). As populações de uma dada comunidade são
concretas, e torna-se necessário conhecê-las em diferentes dimensões: demográcas,
socioeconómicas, prossionais, familiares... Mas, também, nas dimensões socio-an-
tropológicas, culturais e simbólicas. Aqui podem analisar-se, por exemplo os grupos
(formais e não formais, obrigatórios e não obrigatórios, espontâneos e não espontâ-
neos...); as coletividades (representa a população total de uma comunidade); as fa-
mílias (tipos de famílias, predominâncias, etc.); a evolução da população, as taxas de
pobreza, os níveis de bem-estar e a qualidade de vida, os níveis de habilitações literárias
das populações, etc. É deste conhecimento aprofundado das populações e sua relação
com o território, que a fundamentação das propostas e desenho de políticas locais de
intervenção deverá partir.
Necessidades - as necessidades assumem uma dimensão complexa e não sim-
plista na intervenção numa comunidade. Para tal, é necessário identicar as necessida-
des percecionadas como tal pela própria comunidade e possíveis formas de as suprimir
- participação ativa das comunidades, através do aumento de recursos disponíveis, por
exemplo, ou de uma distribuição mais equitativa dos mesmos. Da mesma forma, não
se trata de identicar somente as já existentes, mas projetar as de médio e longo prazo.
Novamente, o período de connamento de crianças e famílias permitiu identicar ne-
cessidades imediatas, como: manutenção da escola em casa, através do fornecimento de
equipamento às famílias; apoio alimentar às crianças, pela ausência do suporte escolar
e apoio nanceiro às famílias com cortes substanciais de salário. No entanto, houve
também a possibilidade de começar a desenhar necessidades a médio prazo, para lá des-
tas: o apoio a pais/cuidadores/as ao nível da saúde mental, a construção de modelos de
intervenção social integradores e inovadores, a construção de atividades de educação
não formal (dada a ausência de projetos no período de pandemia), entre outros.
Importa sublinhar, de qualquer modo, que a intervenção comunitária não deve-
rá reduzir-se à mera supressão de necessidades: ela deve potenciar o desenvolvimento de
comunidades, sendo sobretudo, um modo de “organizar relações com maior liberdade
e autonomia; permitir uma eleição mais pessoal das atividades e das relações, dar ‘vida’,
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reconhecendo a existência de um sujeito autónomo que participe no desenvolvimento
do mundo ao qual pertence (…)” (Besnard, 1996, p.19). Promove, por isso, uma inter-
venção onde os grupos se assumem como componente ativa, participante e protago-
nista, acreditando-se que apenas será efetiva quando exista participação e colaboração
por parte dos/as seus/suas destinatários/as. Assim, centra-se em lógicas participativas e
mobilizadoras da capacidade dos/as cidadãos/ãs para a mudança; mobiliza diferentes
metodologias, endógenas, sociais e educativas que permitam reconhecer a singularida-
de das comunidades, as suas proximidades e tensões e a sua heterogeneidade e mobi-
lizam-se para exercícios centrados na cidadania ativa, multicultural e participativa. As
abordagens centradas nas pessoas constituem-se então como ação política - exercício de
poder para inuenciar sistemas políticos, práticas e atitudes. As mudanças nas políticas
devem acompanhar-se de organizações de defesa dos mais desiguais e que possam pro-
mover solidariedade. É, pois, fundamental o reconhecimento das comunidades como
contexto das suas próprias iniciativas, o que implica a adaptação a um território e co-
letivo humano especícos, com identidades coletivas especícas. Trata-se de um pro-
cesso de cumplicidade social, onde não se desenha o desenvolvimento para as pessoas,
mas sim, com as pessoas, procurando a melhoria das condições de vida, aproveitando
os recursos existentes e alargando-os a novas redes de solidariedade social de modo a
satisfazer as diferentes necessidades percecionadas pelas próprias comunidades. Como
observam André e Abreu (2006), a eventual resolução das formas mais graves de ex-
clusão só será possível se se encontrarem formas inovadoras de revelar necessidades, de
cooperar e de democratizar a gestão pública.
No entanto, são conhecidos os grupos sociais e etários com maiores vulnerabili-
dades, nomeadamente os que se encontram em maior risco de pobreza. O contexto de
pandemia reforçou fortemente essas vulnerabilidades e criou “novos” grupos suscetíveis
de pobreza e, por isso, com necessidade de apoio institucional. Prevendo-se que os efeitos
socioeconómicos destes grupos permaneçam a médio prazo, estes modelos integradores e
inovadores de intervenção social deverão ser capazes de identicar esses grupos e, com eles,
encontrar as soluções mais adequadas com os recursos disponíveis. Também aqui, reco-
nhecer a diversidade e heterogeneidade dos grupos em risco/situação de vulnerabilidade
contribui para aumentar a ecácia e pertinência dos modelos de intervenção desenhados.
81
A Universidade do Minho em tempos de pandemia (Re)Ações
INTERVENÇÃO LOCAL COM CRIANÇAS...
Uma das condições de sucesso em intervenção comunitária prende-se com a rea-
lização de diagnósticos sociais participativos e uma forte mobilização dos trabalhos em
rede. “As parcerias ou redes sociais de parceiros são estruturas de ação integrada que
põem em comum recursos com vista a atingir determinadas nalidades, como partilhar
pertenças, fazer circular informação, produzir ajudas, mobilizar capital social, ligar os
agentes económicos ou controlar as políticas públicas.” (Hespanha, 2008, p. 8-9). No
entanto, e apesar das vantagens facilmente reconhecidas, Hespanha identica dicul-
dades: legitimidade de intervenção (poder local/político versus instituições de terreno);
cooperação institucional; participação e responsabilização; recursos e participação dos
cidadãos. Finalmente, deverá ser tido em conta o risco da individualização das medidas.
O modelo de intervenção agora desenhado, em particular atendendo à comple-
xidade do momento socio-histórico em que nos encontramos, orienta-se pelos prin-
cípios enunciados e mobiliza os seus quadros de ação e metodologias de intervenção
que sustentem o médio e longo prazo, centrando-se na multiplicidade de necessidades
identicadas e na inovação da intervenção. O momento que vivemos implica aprender
a trabalhar em complexidade, procurando o sucesso para os desaos que se possam
colocar no futuro (Nissen, 2020). Pensar criativa e criticamente os papéis dos/as pro-
ssionais das diferentes áreas de intervenção, preparando-os/as para diferentes cenários
designados de crise, torna-se imperativo. O ProChild CoLAB, em conjunto com a Câ-
mara Municipal de Guimarães, deniu esta questão como a necessidade central da sua
atuação em tempos de pandemia, nomeadamente na criação da gura do gestor de crise,
com formação especíca para atender a essa complexidade e incerteza na intervenção,
reetindo sobre as particularidades dos seus territórios e das pessoas e grupos que os
compõem. E de que forma poderá a intervenção comunitária responder aos desaos
trazidos pela pandemia COVID-19?
3.2 Especicidades da intervenção comunitária em período de crise pandémica
Face aos novos desaos trazidos pela pandemia foi necessário conceber a inter-
venção comunitária no âmbito de um modelo integrativo assente numa abordagem
colaborativa, intersectorial e multinível à luz das orientações da intervenção em crise e
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A Universidade do Minho em tempos de pandemia (Re)Ações
informada pelo trauma, por forma a responder às necessidades das famílias e das crian-
ças, no que respeita à saúde física e mental, à proteção e à educação.
Um programa, um sistema ou uma organização que é informada pelo trauma:
(1) reconhece o impacto generalizado do trauma e as possíveis trajetórias para a recupe-
ração; (2) reconhece sinais e sintomas nos indivíduos, famílias, prossionais e noutros/as
envolvidos/as; (3) responde integrando conhecimento sobre políticas, procedimentos e
práticas e (4) procura resistir ativamente à retraumatização (Samhsa, 2014).
A abordagem informada pelo trauma baseia-se no conhecimento sobre o impac-
to dos acontecimentos potencialmente traumáticos em múltiplos domínios e ao longo
da vida. É uma abordagem compreensiva e multinível, na medida em que reconhece
o impacto destes acontecimentos: (1) no indivíduo, manifestando-se nas suas atitudes
ou nos seus comportamentos; (2) nas relações, por exemplo, no sistema familiar ou na
relação entre pares; (3) nas organizações, como a escola e (4) nas comunidades (Matlin et
al., 2019; Tebes. Champine, Matlin, & Strambler, 2019). Em particular, a adoção des-
ta abordagem possibilita o reconhecimento do potencial traumático trazido pela crise
pandémica no desenvolvimento e organização de respostas comunitárias com reexo
a diferentes níveis (individual, relacional, organizacional, comunitário), durante e no
período pós-pandemia. Para além disso, as ações que integram esta abordagem devem
procurar ser especícas para responder no imediato às necessidades trazidas pela crise/
acontecimento traumático, mas também deverão ser sucientemente exíveis para per-
mitir a adaptação do indivíduo a novos stressores que possam surgir (Tebes et al., 2019).
Esta é, por isso, uma abordagem que antecipa resultados a curto, médio e longo prazo.
Do ponto de vista comunitário, torna-se essencial conjugar esforços de diferen-
tes atores sociais e setores da comunidade para desenvolver respostas coordenadas e
integradas para responder à crise, indo ao encontro das necessidades no imediato e para
promover a resiliência, fazendo frente às consequências vindouras e à possibilidade de
novas crises. É precisamente este o racional subjacente à concetualização das comunida-
des informadas pelo trauma (Matlin et al., 2019), que inspirou a proposta de modelo
de intervenção comunitária de resposta à crise pandémica. Com o objetivo de desen-
volver comunidades resilientes, as comunidades informadas pelo trauma procuram:
1) capacitar para a identicação precoce de risco psicossocial no sentido da promoção
INTERVENÇÃO LOCAL COM CRIANÇAS...
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A Universidade do Minho em tempos de pandemia (Re)Ações
INTERVENÇÃO LOCAL COM CRIANÇAS...
da resiliência; 2) estabelecer redes intersectoriais e integradas de serviços e respostas; 3)
partilhar informação e recursos comunitários e 4) difundir e incorporar princípios de
uma abordagem informada pelo trauma nos serviços e políticas (Samhsa, 2014).
É importante salientar que o modelo defendido por Matlin et al. (2019 para as
comunidades informadas pelo trauma, que tem como proposta preparar as comunida-
des para responder às experiências adversas na infância (e.g., maus-tratos) e promover
a sua resiliência, integra uma perspetiva de saúde das populações como complementar
às práticas clínicas informadas pelo trauma. Ou seja, para além de uma perspetiva clí-
nica focada na redução de sintomas e da perturbação causada pelo trauma, acresce a
prevenção do risco psicossocial, a promoção da saúde e o desenvolvimento de políticas
públicas. Nesta abordagem, o foco das respostas desloca-se das causas individuais da ex-
posição ao trauma para os determinantes macrossociais da saúde, tais como a carência
alimentar, o desemprego, a violência comunitária, as condições de habitação decitá-
rias, entre outras (Tebes et al., 2019).
Um corolário desta perspetiva da saúde das populações aplicada a acontecimen-
tos com potencial traumático, como é o caso da pandemia COVID-19, é a noção de
que há desigualdades sociais na base da distribuição dos casos da doença. A perspetiva
de saúde das populações direciona a atenção para essas desigualdades, uma vez que ao
reduzi-las está a promover a saúde da população em geral.
A proposta de Matlin et al. (2019) integra os princípios subjacentes à ciência da
saúde das populações com aqueles que fundamentam a abordagem focada no trauma,
daqui derivando um modelo tridimensional que deverá sustentar o fortalecimento das
comunidades face à adversidade, como é o caso da atual crise pandémica. Este modelo
tridimensional, representado na gura 2, consiste em três componentes:
(1) uma abordagem que combina a prevenção do risco e a promoção da saúde
com intervenções intencionalizadas para o tratamento, que deverá ser ope-
racionalizada através de uma intervenção concertada e colaborativa entre os
serviços da comunidade. Deve integrar intervenções mais abrangentes de
promoção do bem-estar, implementadas independentemente da ocorrência
da experiência potencialmente traumática/crise e respostas clínicas altamente
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A Universidade do Minho em tempos de pandemia (Re)Ações
INTERVENÇÃO LOCAL COM CRIANÇAS...
especializadas direcionadas para a redução da sintomatologia decorrente da
experiência traumática;
(2) uma estratégica socio-ecológica que opera ao nível individual, relacional, or-
ganizacional e comunitário;
(3) intervenções focalizadas no trauma para as pessoas com sintomatologia trau-
mática e universais para todos os indivíduos num contexto ou população, por
exemplo, uma escola, um agrupamento de escolas, uma organização, uma co-
munidade ou um concelho.
Figura 2. Modelo tridimensional da saúde das populações aplicado às práticas informadas
pelo trauma (retirado de Matlin et al., 2019, p.4)
Tebes et al. (2019) sugerem que este modelo tridimensional está alinhado com
uma estratégica combinada de prevenção dos riscos e de promoção da saúde da popu-
lação, o que ajuda a operacionalizar o próprio modelo. Importa considerar que uma
abordagem híbrida deverá combinar estratégias universais, seletivas e indicadas, num
continuum de intervenção, por forma a potenciar o impacto na saúde da população e
os benefícios de cada ação. Como se traduzem estes princípios na intervenção em Gui-
marães, no âmbito do ProChild Collaborative Action Against COVID-19?
APPROACH
Treatment/ Prevention/
Healing Promotion
Individual
Relational
LEVEL (Family,
Couple,
Peer)
Organizational
Community/
Systems
Trauma-Specific
TARGET Universal
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A Universidade do Minho em tempos de pandemia (Re)Ações
INTERVENÇÃO LOCAL COM CRIANÇAS...
4 AÇÃO COLABORATIVA PROCHILD CONTRA A COVID-19
É baseado nos princípios elencados ao longo deste documento que o ProChild
CoLAB tem vindo a desenvolver, em articulação com o Município de Guimarães,
projetos de intervenção comunitária que têm por objetivo promover o bem-estar e a
resiliência das crianças durante e após o período de pandemia COVID-19. Para tal,
tem contado com a mobilização da rede social de emergência do município e da sua
articulação com os prossionais dos setores da educação, saúde e proteção das crianças.
As intervenções implementadas visam o reforço e a reorganização dos recursos existentes
no sentido de uma intervenção comunitária multinível que se baseia em estratégias
universais, seletivas e indicadas que serão adequadas às necessidades evidenciadas pelas
crianças e famílias, tal como indicado na Figura 3. Serão apresentadas em seguida, cada
uma destas estratégias.
Figura 3. Denição de estratégias universais, seletivas e indicadas.
Estratégias universais
Apoio às creches
Na reabertura das creches e jardins de infância, após o período de connamen-
to imposto pela pandemia, considerou-se importante disponibilizar um documento
de apoio aos/às prossionais de educação de infância, no sentido de contribuir para
Estratégias
indicadas
Estratégias
seletivas
Dirigidas a indivíduos que exibem
sinais de perturbação
Dirigidas a subgrupos ou segmentos da população
geral com características específicas identificadas
como de risco
Dirigidas à população geral sem prévia análise do
grau de risco individual
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A Universidade do Minho em tempos de pandemia (Re)Ações
INTERVENÇÃO LOCAL COM CRIANÇAS...
um retomar positivo e tranquilo das crianças, famílias e prossionais a estes contex-
tos. O documento intitulado “Redescobrir a qualidade em educação de infância em
tempos de mudança”, salienta dimensões promotoras do bem-estar de todos na rea-
tivação destas respostas educativas, alinhando-se com as orientações publicadas pela
Direção-Geral da Saúde, a 13 de maio de 2020, no âmbito da reabertura das creches.
Procurou-se adotar uma visão construtiva, exível e positiva face às exigências que a
situação de pandemia impõe, sem se perder o foco em torno de aspetos considerados
essenciais para a promoção do desenvolvimento e aprendizagem da criança: (i) comu-
nicação com as famílias; (ii) autocuidado dos/as prossionais e trabalho colaborativo;
(iii) promoção de relações interpessoais; (iv) abordagem pedagógica e organização do
ambiente educativo e (v) articulação e cooperação intersectorial. Em cada temática,
pretendeu-se suscitar a reexão dos/as prossionais de educação de infância, formu-
lando-se questões que apontam para possíveis formas de atuação face às problemáticas
identicadas (e.g., “Em tempos de pandemia COVID-19 é necessário reduzir o -
mero de crianças por sala. Como é que podemos tirar partido da redução do número
de crianças? Na organização dos grupos, atendemos às características, preferências e
competências de cada criança?”). Desta forma, destacou-se a pluralidade de alternati-
vas para superar os desaos da pandemia e cumprir as orientações da Direção-Geral da
Saúde, respeitando-se as especicidades de cada contexto.
Através deste documento, reconhece-se o papel fundamental que os/as pros-
sionais de educação de infância desempenham na vida das crianças e as múltiplas com-
petências (e.g., exibilidade, criatividade, trabalho de equipa) que apresentam face a
períodos de maior desao e imprevisibilidade.
O documento foi disponibilizado no site do ProChild CoLAB e divulgado nas
suas redes sociais. Paralelamente, foi enviado para todas as creches e jardins de infância
do município de Guimarães através dos serviços da Câmara Municipal. Junto das cre-
ches de Pevidém, envolvidas no projeto “Desenvolvimento e Educação em Creche” do
ProChild CoLAB, expressou-se também a disponibilidade da equipa para apoiar dire-
tamente os/as prossionais destas instituições na superação de diculdades decorrentes
da situação de pandemia.
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A Universidade do Minho em tempos de pandemia (Re)Ações
INTERVENÇÃO LOCAL COM CRIANÇAS...
ProChild Kit(e)
Como dissemos anteriormente, com o afastamento das crianças das escolas e do
espaço público, tornou-se clara a necessidade de desenvolver umprojeto de interven-
ção multidisciplinar direcionado a crianças do1º ciclo do ensino básico, no sentido de
minimizar os efeitos da pandemia COVID-19 no dia-a-dia das crianças, considerando
as mudanças profundas e repentinas que se zeram sentir nos modos de interação e no
isolamento em relação aos pares e aos adultos de referência.
Neste sentido, considerou-se que através da educação não formal e, consequen-
temente, através da ação dos professores de Atividades de Enriquecimento Curricular
(AEC), seria o meio mais ecaz de se chegar às crianças e de se encontrarem respostas
que contrariassem os efeitos da pandemia COVID-19 no dia a dia das crianças.
O Kit(e)-KidsTransformingEducation-é composto por um conjunto de
estratégias e ferramentas educativas para professores/as, estruturadas por temas, pre-
tendendo contribuir para a concretização dos seguintes objetivos especícos: criar/
trabalhar/concretizar oportunidades de desenvolvimento de competências múltiplas
nas crianças; identicar, apoiar e encaminhar crianças que experienciassem dicul-
dades emocionais e comportamentais, fornecendo conhecimentos e estratégias úteis
aos professores para atuar nestas situações; criar oportunidades de formação para
professores/as das AEC sobre competências socio-emocionais e acompanhamento
das crianças em situação de pandemia.
O Kit(e) envolveu diretamente 46 professores AEC, das áreas da atividade física
e desportiva e das artes performativas, a trabalhar com diferentes escolas do 1º ciclo do
ensino básico do município no âmbito dos projetos desenvolvidos pelas cooperativas
municipais “A Ocina” e a “Tempo Livre” e um conjunto de turmas, cuja seleção foi
feita pelos próprios professores, atendendo ao conhecimento existente sobre as crian-
ças e aos objetivos do projeto.
Foram construídas 3 propostas de atividades a serem desenvolvidas e dinami-
zadas pelos professores, à distância com os seus alunos. Estas atividades tinham como
pano de fundo a Casa como contexto de vida das crianças.Desenvolveram-se, para tal,
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A Universidade do Minho em tempos de pandemia (Re)Ações
INTERVENÇÃO LOCAL COM CRIANÇAS...
várias sessões de trabalho com os professores, de apoio às atividades a realizar com as
crianças, formação sobre temáticas especícas como a identicação e acompanhamen-
to de crianças que experienciem diculdades emocionais e ainda formação nas tuto-
rias emocionais.
A par destas sessões, recorreu-se à Plataforma +Cidadania e a partir das suas
funcionalidades criou-se um espaço de comunicaçãovirtualdireta entre os professores
AEC e as crianças, bem como se criaram fóruns de discussão para promover a reexão
dos professores sobre a importância do brincar e do papel do adulto nesse processo e
um banco de recursos, para que os professores pudessem consultar para atividades que
desejassem desenvolver no futuro.
Com o ProChild Kit(e) foi possível atingir os objetivos propostos, nomeada-
mente a redução do afastamento das crianças do espaço escolar, ainda que efetuado
virtualmente e o desenvolvimento de competências dos professores AEC, nomeada-
mente no acompanhamento das crianças e na aprendizagem de estratégias educativas
inovadoras no âmbito da educação não-formal.
Estratégias seletivas
Gestores ProChild para a infância
No âmbito da intervenção em crise na infância, uma das estratégias implementa-
das foi a constituição e capacitação de um grupo de prossionais do setor da educação
-Gestores ProChild para a Infância. Estes/as gestores/as de crise constituíram-se como
guras de referência num trabalho de mediação e proximidade junto das crianças e
respetivas famílias e em estreita articulação com as respostas municipais e da comuni-
dade. A atuação destes prossionais de primeira linha teve por objetivo a mitigação dos
efeitos da pandemia e do connamento na saúde e bem-estar das crianças, sobretudo
nos casos de maior vulnerabilidade social. As suas funções passaram por: 1) estabe-
lecer uma relação de apoio, restabelecer a segurança, garantindo o conforto físico e
emocional de crianças e famílias; 2) ajudar a identicar as suas preocupações e necessi-
dades imediatas; 3) oferecer apoio prático e dar informações úteis; 4) (re)estabelecer o
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A Universidade do Minho em tempos de pandemia (Re)Ações
INTERVENÇÃO LOCAL COM CRIANÇAS...
contacto das pessoas com a sua rede de apoio social; 5) articular as respostas da comu-
nidade face às necessidades identicadas.
O modelo de trabalho do ProChild CoLAB junto destes gestores incluiu um
plano de formação para a denição de um perl consistente de competências de comu-
nicação, de apoio e de gestão de crise, bem como o acompanhamento e a supervisão do
trabalho dos/as gestores. Este modelo foi implementado entre abril e julho de 2020,
tendo sido realizadas oito sessões de acompanhamento, formação e supervisão do tra-
balho dos/as gestores, realizadas via videoconferência. Estas sessões permitiram:
1. identicar temáticas relevantes para a atuação dos/as gestores e desenvolver
competências associadas através da formação e da disponibilização de materiais
de apoio para o efeito (e.g., autocuidado para prossionais de primeira linha,
comunicação com as crianças em contexto ou situação de crise, identicação e
avaliação dos riscos psicossociais nas crianças em período pandémico);
2. monitorizar os casos acompanhados pelos/as gestores/as através de uma cha
de monitorização de caso. Os dados obtidos a partir desta cha de monitoriza-
ção foram compilados em relatórios periódicos e alvo de análise e discussão pelo
grupo, em cada sessão;
3. supervisionar a atuação e as práticas dos/as gestores/as através da apresentação
e discussão de casos concretos, partilhados na sessão pelas suas particularidades,
complexidade ou especial gravidade;
4. Promover a articulação com outras entidades (e.g., gestores do território,
agrupamentos de escolas, CPCJ), estabelecendo-se canais de comunicação di-
reta entre entidades e serviços que possibilitaram a implementação de respostas
integradas.
Os 12 gestores/as para a infância atenderam 107 casos durante a primeira fase
de implementação deste modelo. As prioridades de intervenção acompanharam a evo-
lução da pandemia e das medidas de contingência aplicadas. Numa primeira fase, prio-
rizaram-se respostas de primeira necessidade, nomeadamente de apoio à habitação, à
alimentação e despesas da casa e à aquisição de bens de primeira necessidade (e.g., ves-
tuário, calçado, óculos). Na fase pós-connamento, com a reabertura das creches e
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A Universidade do Minho em tempos de pandemia (Re)Ações
INTERVENÇÃO LOCAL COM CRIANÇAS...
jardins de infância, surgiram com mais frequência necessidades de acompanhamento
da situação familiar, encaminhamento para ATL e de apoio psicológico. No que respei-
ta às áreas críticas de intervenção identicadas no acompanhamento de pessoas adultas,
destacaram-se as preocupações com a doença (COVID-19) e com a vida após a pande-
mia, bem como as perdas de recursos. Foram também críticos os sinais de perturbação
emocional tanto nas pessoas adultas como nas crianças, sendo que foi esta a área que
mais se destacou como de particular importância no apoio às crianças.
Estratégias indicadas
Com a nalidade de providenciar estratégias indicadas à resolução dos problemas
de saúde mental relacionados com a pandemia nas crianças do município de Guimarães,
foi desenvolvido e está atualmente em curso um projeto de investigação-ação que inclui
um estudo clínico com o objetivo estudar a efetividade dos procedimentos de rastreio,
avaliação e intervenção psicológica indicados, especicamente delineados considerando
os efeitos da pandemia na saúde mental das crianças dos 3 aos 10 anos de idade e respe-
tivas famílias, e suscetíveis de serem replicados noutros contextos comunitários.
Desta forma, a participação dos agentes comunitários necessários à realização
desta iniciativa foi ativada, nomeadamente a Câmara Municipal de Guimarães, o Pro-
Child CoLAB, o Centro de Investigação em Psicologia da Universidade do Minho
(CIPsi) e a Associação de Psicologia da Universidade do Minho (APsi-UMinho). As
estratégias indicadas integram-se de forma sequencial e consistem em:
1. Rastreio de problemas ou perturbação psicológica nas crianças com idades
compreendidas entre os 3 e os 10 anos do ensino pré-escolar e primeiro ciclo da
rede pública do Município de Guimarães, tal como reportados pelos/as encar-
regados/as de educação (e titulares das responsabilidades parentais) em questio-
nários preenchidos na plataforma ProChild integrada com a plataforma +Cida-
dania (https://maiscidadania.cim-ave.pt/).
2. Avaliação psicológica das crianças que pontuam acima do ponto de corte no
rastreio, a qual é realizada com base nas respostas dos/as encarregados/as de edu-
cação (e titulares das responsabilidades parentais) a questionários preenchidos na
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A Universidade do Minho em tempos de pandemia (Re)Ações
INTERVENÇÃO LOCAL COM CRIANÇAS...
plataforma ProChild e numa entrevista clínica dirigida, para validação da pre-
sença de problemas ou perturbação psicológica nas crianças relacionadas com a
pandemia.
3. Intervenção psicológica indicada junto de crianças com problemas ou
perturbação psicológica relacionadas com a pandemia, e respetivas famílias. O
protocolo de intervenção integra uma intervenção psicológica de banda larga
com estratégias indicadas, direcionada a crianças com problemas ou perturba-
ção psicológica decorrentes da pandemia COVID-19 (e.g., Riegler et al., 2020),
bem como uma psicoterapia dirigida com estratégias indicadas para remediar
as perturbações psicológicas que foram associadas na literatura à pandemia
COVID-19 (Lucassen et al., 2015), que poderá ou não ocorrer dependendo da
(in)ecácia da intervenção psicológica de banda larga. A intervenção psicológica
disponibilizada é adaptada à idade da criança, com protocolos distintos para as
crianças em idade pré-escolar ou escolar.
Este projeto, com início previsto em outubro de 2020 e término em junho de
2021, conta com a colaboração de diferentes entidades com o objetivo de dar respos-
ta a todas as fases deste projeto. As entidades promotoras são as seguintes: Câmara
Municipal de Guimarães; Centro de Investigação em Psicologia da Universidade do
Minho (CIPsi); Associação de Psicologia da Universidade do Minho (APsi-UMinho);
ProChild CoLAB Against Poverty and Social Exclusion. As entidades parceiras são as
seguintes: Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra; Centro de Investi-
gação do Núcleo de Estudos e Intervenção Cognitivo-Comportamental (CINEICC)
da Universidade de Coimbra; Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa; Fa-
culdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto; Instituto de
Saúde Pública da Universidade do Porto. De referir ainda o apoio das seguintes entida-
des: Centro de Medicina Digital P5, Escola de Medicina, da Universidade do Minho;
Agrupamento de Centros de Saúde do Alto Ave, integrado na Administração Regional
de Saúde do Norte, IP; Hospital da Senhora da Oliveira Guimarães, E.P.E.
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A Universidade do Minho em tempos de pandemia (Re)Ações
INTERVENÇÃO LOCAL COM CRIANÇAS...
CONCLUSÃO
O futuro apresenta-se, tal como o presente, complexo e incerto. Sabemos, já,
que as consequências da crise pandémica não são iguais para todos/as e que agudizam
vulnerabilidades previamente existentes, nomeadamente as de natureza mais estru-
tural (Caldas, Silva, & Cantante, 2020). Paralelamente, grupos até aqui com condi-
ções de existência relativamente estáveis necessitam de apoio de diferentes institui-
ções para poderem organizar as vidas pessoais e familiares em período de crise aguda
pós-COVID-19. A preparação de modelos integradores e inovadores, que atendam a
essas características, parece ser crucial neste momento.
A intervenção local e de proximidade, tem vindo a demonstrar ser absoluta-
mente crucial. O modelo colocado em prática em Guimarães é um dos caminhos
possíveis para a intervenção. O facto de ser baseado no conhecimento cientíco e
de atribuir grande protagonismo aos/às agentes sociais, educadores/as, cuidadores/
as, atores/atrizes do trabalho social, potenciando a sua formação no terreno e acom-
panhando os seus esforços e desempenhos é, certamente, um dos seus atributos dis-
tintivos. Mas não é de menor importância a centralização na criança e na família, a
análise cuidadosa das suas condições de existência, das suas perceções e das suas emo-
ções, bem como o foco contínuo na preocupação em promover o desenvolvimento
e o bem-estar, em particular nos contextos marcados pela pobreza e a exclusão. Esta
intervenção social, assente no conhecimento existente, é também uma fonte para
novo conhecimento e ganha todo o sentido no âmbito de uma ética do cuidado, que
corresponsabiliza o poder local, os/as atores/atrizes locais, os serviços públicos, a aca-
demia e as instituições do sistema cientíco nacional.
A intervenção realizada em Guimarães põe também em relevo a importância
na denição e concretização das políticas em estreita cooperação com o conhecimento
cientíco. As respostas originais do modelo de intervenção e das suas ações estratégicas
- o dispositivo de formação, os/as gestores/as de infância, o ProChild Kit(e), a interven-
ção na saúde mental - são a consequência do cruzamento de uma vontade política forte
de serviço público com a imaginação e o sentido de inovação, solidamente ancorados
na investigação e na evidência cientíca.
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A Universidade do Minho em tempos de pandemia (Re)Ações
INTERVENÇÃO LOCAL COM CRIANÇAS...
Nesse sentido, o modelo de intervenção face à crise pandémica COVID-19 não
se esgota neste tempo de calamidade e de doença, na medida em que possui virtuali-
dades para uma intervenção social promotora do desenvolvimento e do bem-estar da
criança no período pós-COVID, não menos ameaçador do que o presente. São hoje
mais claros os passos a dar perante estes novos desaos.
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Prueba piloto de una intervención de habilidades de crianza por telepsicoterapia para familias veteranas: Implicaciones para el manejo de estrés parental durante COVID-19 Los cambios en la vida diaria creados por la nueva pandemia del virus corona (COVID-19) han resultado en una situación en gran medida sin precedentes para millones de familias en todo el mundo. Familias están bajo un estrés considerable y los padres pueden experimentar mayor angustia psicológica e rupturas en la relación padre-hijo. Algunos padres pueden ser particularmente vulnerable a estresores recientes, incluidos aquellos con preexistencia de trastornos psicológicos y disfunción familiar. En los Estados Unidos, veteranos militares son una de esas poblaciones en riesgo. Los desafíos recientes pueden exacerbar condiciones preexistentes y aumentar el estrés de los padres, lo que afecta negativamente al niño y funciones familiares. En este artículo, compartimos nuestras experiencias desarrollando y poniendo a prueba un programa de habilidades para padres de telepsicoterapia para veteranos militares. La intervención, consejos para padres en línea (OPPT), combinaron módulos educativos basados en la web que abordandan el desarrollo infantil y la crianza positiva, con coaching en vivo (a través de enlace de videoconferencia) de habilidades parentales. Cuarenta y un veteranos con un niño entre las edades de 3 y 9 años se inscribieron en este ensayo y 22 completaron la intervención de 6 sesiones. Los veteranos que completaron la intervención experimentaron reducciones significativas en depresión, estrés parental y disfunción familiar con efectos de tamaño medio a grande (El valor de Cohen oscilaba entre .53 y .98). Los veteranos también reportaron mejoras significativas en los comportamientos de sus hijos. Estos hallazgos tienen implicaciones importantes relacionadas con la viabilidad y efectividad de las intervenciones de telepsicoterapia para apoyar a familias en riesgo y promover interacciones positivas entre padres e hijos y el funcionamiento familiar durante la COVID-19 crisis y más allá. A nivel práctico, OPPT e intervenciones similares de telepsicoterapia para las familias podrían modificarse para ser entregadas a través de teléfonos inteligentes para aumentar accesibilidad y rentabilidad para familias de todo el mundo.
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The Issue: Coronavirus-19 (COVID-19) is transforming every aspect of our lives. Identified in late 2019, COVID-19 quickly became characterized as a global pandemic by March of 2020. Given the rapid acceleration of transmission, and the lack of preparedness to prevent and treat this virus, the negative impacts of COVID-19 are rippling through every facet of society. Although large numbers of people throughout the world will show resilience to the profound loss, stress, and fear associated with COVID-19, the virus will likely exacerbate existing mental health disorders and contribute to the onset of new stress-related disorders for many. Recommendations: The field of traumatic stress should address the serious needs that will emerge now and well into the future. However, we propose that these efforts may be limited, in part, by ongoing gaps that exist within our research and clinical care. In particular, we suggest that COVID-19 requires us to prioritize and mobilize as a research and clinical community around several key areas: (a) diagnostics, (b) prevention, (c) public outreach and communication, (d) working with medical staff and mainstreaming into nonmental health services, and (e) COVID-19-specific trauma research. As members of our community begin to rapidly develop and test interventions for COVID-19-related distress, we hope that those in positions of leadership in the field of traumatic stress consider limits of our current approaches, and invest the intellectual and financial resources urgently needed in order to innovate, forge partnerships, and develop the technologies to support those in greatest need.
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The Coronavirus Disease 2019 (COVID-19) epidemic emerged in Wuhan, China, spread nationwide and then onto half a dozen other countries between December 2019 and early 2020. The implementation of unprecedented strict quarantine measures in China has kept a large number of people in isolation and affected many aspects of people’s lives. It has also triggered a wide variety of psychological problems, such as panic disorder, anxiety and depression. This study is the first nationwide large-scale survey of psychological distress in the general population of China during the COVID-19 epidemic.
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Mental health disorders are common and disabling for young people because of the potential to disrupt key developmental tasks. Implementation of evidence-based psychosocial therapies in New Zealand is limited, owing to the inaccessibility, length, and cost of training in these therapies. Furthermore, most therapies address one problem area at a time, although comorbidity and changing clinical needs commonly occur in practice. A more flexible approach is needed. The Modular Approach to Therapy for Children with Anxiety, Depression, Trauma, or Conduct Problems (MATCH-ADTC) is designed to overcome these challenges; it provides a range of treatment modules addressing different problems, within a single training program. A clinical trial of MATCH-ADTC in the USA showed that MATCH-ADTC outperformed usual care and standard evidence-based treatment on several clinical measures. We aim to replicate these findings and evaluate the impact of providing training and supervision in MATCH-ADTC to: (1) improve clinical outcomes for youth attending mental health services; (2) increase the amount of evidence-based therapy content; (3) increase the efficiency of service delivery. This is an assessor-blinded multi-site effectiveness randomized controlled trial. Randomization occurs at two levels: (1) clinicians (≥60) are randomized to intervention or usual care; (2) youth participants (7–14 years old) accepted for treatment in child and adolescent mental health services (with a primary disorder that includes anxiety, depression, trauma-related symptoms, or disruptive behavior) are randomly allocated to receive MATCH-ADTC or usual care. Youth participants are recruited from ‘mainstream’, Māori-specific, and Pacific-specific child and adolescent mental health services. We originally planned to recruit 400 youth participants, but this has been revised to 200 participants. Centralized computer randomization ensures allocation concealment. The primary outcome measures are: (i) the difference in trajectory of change of clinical severity between groups (using the parent-rated Brief Problem Monitor); (ii) clinicians’ use of evidence-based treatment procedures during therapy sessions; (iii) total time spent by clinicians delivering therapy. If MATCH-ADTC demonstrates effectiveness it could offer a practical efficient method to increase access to evidence-based therapies, and improve outcomes for youth attending secondary care services. Trial registration Australian and New Zealand Clinical Trials Registry ACTRN12614000297628.
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POLÍTICAS SOCIAIS: NOVAS ABORDAGENS, NOVOS DESAFIOS Pedro Hespanha (CES/FEUC, Portugal) De uma forma sintética, a nova geração de políticas sociais privilegia a inserção social em vez da subsidização do risco, a participação activa dos beneficiários no desenho e aplicação das medidas em vez da submissão passiva às determinações dos técnicos sociais, a personalização da ajuda em vez da sua massificação, a co-responsabilização do prestador e do beneficiário na aplicação da medida, a descentralização do desenho das medidas de política e a sua gestão partilhada pelas instituições locais, o efeito de proximidade em vez da solicitude distante, a flexibilidade das acções em vez da tipificação das valências. Pautando-se por princípios de eficácia e de cidadania, há que reconhecer que as políticas sociais são hoje mais exigentes na sua aplicação e também mais vulneráveis a distorções. Constitui um desafio para todos e, em particular, para os cientistas sociais desocultar os processos de enviezamento e ajudar a repensar as políticas de forma a reconduzi-las aos seus objectivos mais nobres.
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Objectives: This study investigated the psychosocial responses of children and their parents to pandemic disasters, specifically measuring traumatic stress responses in children and parents with varying disease-containment experiences. Methods: A mixed-method approach using survey, focus groups, and interviews produced data from 398 parents. Adult respondents completed the University of California at Los Angeles Posttraumatic Stress Disorder Reaction Index (PTSD-RI) Parent Version and the PTSD Check List Civilian Version (PCL-C). Results: Disease-containment measures such as quarantine and isolation can be traumatizing to a significant portion of children and parents. Criteria for PTSD was met in 30% of isolated or quarantined children based on parental reports, and 25% of quarantined or isolated parents (based on self-reports). Conclusions: These findings indicate that pandemic disasters and subsequent disease-containment responses may create a condition that families and children find traumatic. Because pandemic disasters are unique and do not include congregate sites for prolonged support and recovery, they require specific response strategies to ensure the behavioral health needs of children and families. Pandemic planning must address these needs and disease-containment measures.
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Highlights Adverse Childhood Experience (ACEs) may be mitigated by trauma‐informed social environments. However, there is little empirical evidence that show how community approaches can address ACEs. A participatory change process was implemented by a community coalition in response to ACEs. Data was used to track implementation, generate hypotheses and guide a community response to ACEs. Results show how one community initiated steps to build a resilient, trauma‐informed community.
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Population studies indicate that trauma exposure is ubiquitous and has a significant impact on health. Trauma-informed practice seeks to address the health consequences of trauma through integrative responses that incorporate an understanding of the effects of trauma, the multiple pathways to recovery, and the potential for re-traumatization. Current trauma-informed practice considers trauma exposure an individual clinical problem rather than a societal problem with population health consequences. Population health refers to the aggregated health status of individuals who share some characteristic, such as trauma exposure, and includes the study of determinants that shape the distribution of health outcomes in specific populations. In this paper, we describe a population health perspective for trauma-informed practice that complements the current clinical perspective, and then discuss implications of that perspective for programs, systems, and policies. We summarize essential concepts about trauma over the life course and describe principles of population health science relevant to trauma-informed practice. We then discuss implications of these principles by identifying four priorities for trauma-informed practice from a population health perspective: (a) adopting trauma-informed policies to prevent trauma exposure and to foster resilience in the aftermath of trauma; (b) infusing trauma-informed practice into everyday activities so it is a routine part of interpersonal transactions; (c) incorporating trauma-informed practices into existing service systems; and (d) adapting existing treatments to incorporate trauma-informed principles for population health impact.