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Confiscações semânticas e afetivas: famílias na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça

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A mobilidade (nomadismo ou semi-nomadismo) de povos jê setentrionais, e o caráter oral das tradições em que se registram sua história e seu envolvimento na paisagem, são dois traços salientes da territorialidade indígena que não encontram acolhimento no regime jurídico desenhado para o reconhecimento de terras indígenas no Brasil. Um dos objetivos deste artigo é evidenciar essa incompatibilidade. Mas os Kisêjdê não desconhe- cem essa dificuldade, sobretudo na medida em que suas consequências práticas se fazem impor. Vivendo um uma paisagem devastada, onde florestas foram convertidas em pastos, próximos demais às plantações de soja e seus venenos, eles se esforçam para sustentar as relações produtivas entre si mesmos e com os espíritos de animais e plantas que com eles coabitam, por meio de uma espécie de política pública voltada para controlar os efeitos das atividades destrutivas do agronegócio. Como parte dessa política, referem-se agora a esses lugares ameaçados por uma expressão que admitem ser uma inovação e que traduzem como “nossa terra” (wa nhõ hwyka). Meu argumento aqui é o de que a emergência da terra como objeto de expressões possivas como essa representa menos a adoção de um conceito de território condicionado por uma lógica alienígena e estatal, do que correspon- de a um passar para o primeiro plano a dimensão antes tomada como dada do envolvimento mútuo entre pessoas humanas e não-humanas, a saber, a T/terra como uma força intangível de que todos participam. Assim, a terra é mantida em movimento, e os Kisêdjê podem continuar se movendo com ela.
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Aqui tem gente de toda qualidade, dizem os moradores da Vila de Cimbres, aldeia Xukuru do Ororubá, localizada entre o agreste e o sertão pernambucano: católicos, evangélicos, catimbozeiros, médiuns, índios, caboclos, entidades, encantos, espíritos, finados, defuntos, santos. Mas nem todas essas qualidades existem do mesmo modo ou são igualmente desejáveis. Nesse trabalho, exploro etnograficamente estes muitos modos que a pessoa pode assumir na Vila de Cimbres através das noções de qualidade e tempo. Aqui, tempo e qualidades são noções que funcionam como inflexões da diferença que, pretérita ou presente, não deixa de se perpetuar, alargando as possibilidades de ser e estar no mundo. Assim, busco mostrar como o mundo Xukuru aparece ora como misturas, ora como purificações instáveis destas qualidades-tempos que em alguns momentos se sobrepõem, em outros apenas se tocam e, em outros ainda, se repelem. Ao mesmo tempo, busco me valer dos usos que os Xukuru fazem de termos comumente apartados em especialidades da antropologia, e explorar os efeitos desse encontro para o fazer antropológico.
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O intuito deste artigo é adentrar numa investigação que considere os modos indígenas de viver e habitar n/a T/terra. Para tal, situo-me etnograficamente entre a constituição de lugares djeoromitxi (língua Macro-Jê, habitantes da Amazônia meridional) e sua história de invasão territorial, mortes por epidemias e deslocamento forçado. Os movimentos de fundação e re-fundação de aldeias, pós-hecatombe, envolvem relações intra-humanas e transespecíficas com seres - espíritos Donos de animais de caça, peixes, árvores, parentes mortos e espíritos malignos. A etnografia dos lugares djeoromitxi aponta para uma certa integralidade de terreno entre parentesco, política (chefia) e território. Essa integralida- de contém uma reflexão indígena sobre os não-indígenas.
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Decidi trazer reflexões ainda informes sobre uma economia política da natureza e de entes não-naturais. Essas considerações dão continuidade a uma crítica em andamento ao relativismo antropológico. Parte dessa crítica consiste no reconhecimento do conflito entre ontologias, bem como das áreas de acordo entre elas. Mas por que é que uma conversa sobre a economia política nos trópicos traz consigo a palavra ontologia em seu próprio título? Esta é a primeira pergunta.
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The cause of COVID-19 and other such pathogens is not found just in the object of any one infectious agent or its clinical course, but also in the field of ecosystemic relations that capital and other structural causes have pinned back to their own advantage. The wide variety of pathogens, representing different taxa, source hosts, modes of transmission, clinical courses, and epidemiological outcomes, all the earmarks that send us running wild-eyed to our search engines upon each outbreak, mark different parts and pathways along the same kinds of circuits of land use and value accumulation.
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Este artigo explora a intrincada trama de relações tecidas por cab- oclos e negros que, no esforço de tornar a vida possível, fazem várias conversões étnico-políticas e econômicas. Pretende-se mostrar como essas transformações – de agricultores-pescadores em trabalhadores nas grandes metrópoles e de caboclos e negros em quilombolas – se processam sem desarticular inteiramente um mundo regido por relações de obrigações mútuas entre vizinhos e parentes. Propõe-se que essas relações formam vicinalidades que se espraiam para além dos povoados, chegando a São Luís e a São Paulo, onde as casas são extensões de uma “casa fundadora” presente no lugar de partida. São tratados aspectos fundamentais da coabitação – como a “criação” das crianças – que incidem na constituição da pessoa. O que está em pauta é que tanto as relações entre pessoas, como entre casas e lugares de vida, são relações de constituição mútua e a lembrar disso, estão os encantados evocando uma ética que rege as relações entre pessoas e também entre estas e determinados lugares.
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Que tipo de encontro é produzido na conjugação entre, de um lado, as Terras Indígenas (TIs) constituídas sob o regime estatal, e de outro os modos indígenas de entender a terra e de habitá-la? Partindo da ideia de que a terra é central para a condição de autodeterminação ontológica e política dos ameríndios, e de que estes sabem melhor do que ninguém que as suas terras não se resumem às TIs, o presente artigo apresenta uma proposta de abordagem das autodemarcações de terra que questiona diretamente a redução da ação política desses povos à pressão sobre o Estado-nação. Para isso, debate contribuições recentes – como a de Oliveira Filho (2018) – e mobiliza tanto a descrição de experiências de autodemarcação como a produção específica sobre retomadas de terra.