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ETHNOSCIENTIA
ETHNOSCIENTIA V. 5, 2020
www.ethnsocientia.com
ISSN: 2448-1998
D.O.I.: 10.22276/ethnoscientia.v5i1.321
ARTIGO DE REVISÃO– REVIEW ARTICLE
ONDE OS DIAMANTES OCORREM: PLANTAS INDICADORAS DE DIAMANTES NO
BRASIL
WHERE THE DIAMONDS OCCUR: INDICATOR PLANTS OF DIAMOND GEMS IN BRAZIL
Bernardo TOMCHINSKY, Felipe Fernando da Silva SIQUEIRA
Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará, Instituto de Estudos em Saúde e Biológicas, Faculdade de Biologia. Folha 31, Quadra 07, Lote Especial, s/n -
Nova Marabá, Marabá, Pará, Brasil. CEP 68507-590. E-mail: btomchinsky@unifesspa.edu.br
Submitted: 15/07/2019; Accepted: 16/08/2020
RESUMO
As plantas indicadoras são espécies adaptadas a determinados ambientes que podem ser utilizadas pelas
populações humanas para a classificação destas paisagens de acordo com as suas caraterísticas ou
potenciais usos. Entre estas plantas, algumas são utilizadas como indicadoras geobotânicas por estarem
relacionadas à presença de determinados minerais ou propriedades do solo. Este trabalho faz um
levantamento de espécies consideradas indicadores de diamantes no Brasil. A partir de ampla revisão
de literatura foram identificadas cinco espécies vegetais relacionadas com a ocorrência de diamantes no
país (Babarcenia sp., Vellozia sp., Lageonocarpus adamantinus, Schwartzia adamantium e Norante
guianensis). Destas, três foram analisadas quanto as suas distribuições e comparadas com os locais com
registro de ocorrência de diamantes no país. Existe uma sobreposição entre as áreas onde estas plantas
ocorrem e locais diamantíferos. É provável que as espécies de ocorrência mais restrita (L. adamantinus
e S. adamantium) são melhores indicadoras ambientais para a ocorrência de diamantes. Entretanto, com
os dados obtidos neste trabalho, apenas a ocorrência destas plantas não é suficiente como indicador da
presença de diamantes e são necessários outros estudos para a prospecção geológica de corpos
kimberlíticos e de gemas de diamantes em fontes secundárias onde estas espécies ocorrem para
confirmar esta correlação.
PALAVRAS-CHAVE: etnoecologia, etnopedologia, indicador geobotânico, conhecimento tradicional
ABSTRACT
Indicator plants are species adapted to determinate environments that can be used by human populations
to classify these environments. Among these plants, some are used as geobotanical indicators and are
related to the presence of certain minerals or soil properties. This work is a survey of species considered
indicators of diamond gems in Brazil. From literature review, five species of plants related to the
occurrence of diamonds in Brazil were identified (Babarcenia sp., Vellozia sp., Lageonocarpus
adamantinus, Schwartzia adamantium e Norante guianensis). Of three of these species their distribution
were analyzed and compared with diamond areas in Brazil. We found an overlap between the areas
where these plants grown and diamond sites. We believe that more restricted species (L. adamantinus e
S. adamantium) are better environmental indicator for the occurrence of diamond. However, with the
data used in this work, we can´t say that just the occurrence of these plants is sufficient as an indicator
of the presence of diamonds. Further field studies are needed with geological prospecting of kimberlite
bodies and diamond gems in secondary sources where these plants occur to confirm this correlation.
KEYWORDS: ethnoecology, ethnopedology, geobotany indicator, traditional knowledge
INTRODUÇÃO
As espécies vegetais evoluíram nos mais diversos tipos de ambiente, adaptando-se às características
locais (LEIMU e FISCHER, 2008). Altitude, características do solo (como textura, disponibilidade
hídrica, nutrientes e pH), atmosfera, pluviosidade, umidade relativa do ar, temperatura, polinizadores,
dispersores, luminosidade e fotoperíodo podem ser alguns dos fatores limitantes ao desenvolvimento
dos vegetais nestes diferentes ambientes (GUREVITICH et al., 2009). Modelos biogeográficos tentam
explicar a distribuição de cada espécie em função destas diversas variáveis. Desta forma, a ocorrência
de determinadas espécies pode estar associada a algumas destas características limitantes, fazendo
destas plantas potenciais indicadoras da paisagem. Cabe, entretanto, ao ser humano aprender a observar
e identificar tais espécies bioindicadoras de acordo com suas necessidades e especificidades.
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Indicadores geobotânicos são plantas com ocorrência limitada, associada ou com diagnose foliar
visual de toxidez ou deficiência de nutrientes, relacionadas a condições específicas das propriedades
geológicas dos ecossistemas, como a presença e acúmulo de determinados elementos no solo,
distribuição de rochas no terreno, profundidade e perfil do solo, presença de corpos de água
subterrâneos, áreas halófitas, depósitos minerais, entre outros (MARTIN e GOUGHTREY, 1982;
ALLABY, 2020).
Desde o século XVII, a espécie Silene suecica (Lodd.) Greuter & Burdet. (Caryophyllaceae),
conhecida como planta-pirita, é associada à ocorrência de minas de cobre na Escandinávia, o que
atualmente compreende-se que ocorre devido a sua tolerância a níveis tóxicos neste minério (NORDAL
et al., 1999). Na África, Ocimum centraliafricanum R.E.Fr., conhecida localmente como copper plant,
também é associada a áreas com cobre (BROOKS, 1992). Cannon (1971) lista 122 espécies indicadoras
de reservas de minério (indicadoras geobotânicas) em todo o mundo e Brooks (1979) analisa 85 espécies
plantas consideradas indicadoras de diversos minerais (Al, Co, Cu, Au, Fe, Mg, Ni, Bo, Se, Ag, U, Zn),
e observa que, entre elas, as famílias Caryophyllaceae, Fabaceae e Lamiaceae são as mais frequentes.
No Brasil, é comum o uso de plantas ruderais como indicadoras da fertilidade do solo por agricultores
(LORENZI, 2008; PRIMAVESI, 2017). Entre os povos indígenas, Posey (1986) descreve como os
Kayapó classificam os diferentes tipos de ambientes que ocupam a partir da ocorrência de diferentes
espécies de plantas indicadoras de paisagens.
Recentemente, Haggerty (2015) comprovou que a espécie Pandanus candelabrum P. Beauv
(Pandanaceae) ocorre exclusivamente em áreas com afloramento de diamantes na África Ocidental
(Libéria), conforme o conhecimento tradicional previa. O autor descobriu que sua ocorrência é restrita
às localidades com afloramento de chaminés de kimberlito, uma formação geológica proveniente de
rochas magmáticas sob alta temperatura e pressão e que ocasionalmente forma diamantes (JEANSEN e
SHEAHAN, 1995; NIXON, 1995; MITCHELL, 2008). Estes kimberlitos podem ser ricos em diferentes
minerais, como mica, calcita, diopsídio e apatita (BULANOVA, 1995; GRIFFIN e RYAN, 1995), o que
pode gerar um solo de composição e fertilidade especifica contribuindo para o estabelecimento de uma
vegetação adaptada a estas condições ambientais.
A associação entre P. candelabrum e as chaminés de kimberlito foi relacionada da seguinte forma:
devido às formações tubulares encontradas no kimberlito ocorre um aumento da capacidade de retenção
d’água, tornando-o mais argiloso do que os horizontes adjacentes; as raízes de P. candelabrum penetram
nessas chaminés para se fixar; durante o crescimento de P. candelabrum as raízes absorvem
seletivamente íons de Mg, K, P e diminuem a concentração de Fe; e durante o crescimento das raízes
desta espécie ocorre a elevação de rochas ígneas (e.g. ilmenita: mineral de magnetismo fraco [FetiO3])
e eventualmente pequenos diamantes (KLAPPA, 1980; HAGGERTY, 2015). Esta associação está
auxiliando os governos dos países da África Ocidental na localização de depósitos de diamantes
(HAND, 2015).
No Brasil, país com áreas de exploração de diamante conhecidas desde o século XVIII associado a
uma atividade de mineração artesanal, tem-se registrado relatos sobre espécies vegetais relacionadas à
ocorrência desta pedra preciosa (SPIX e MARTIUS, 1824; CORREA, 1984; SILVA JUNIOR, 2005;
PECKOLT e PECKOLT, 2007). Entretanto, a falta de um levantamento sistemático das espécies
vegetais relacionadas à ocorrência de diamantes no Brasil dificulta a produção de estudos que procurem
confirmar esta correlação.
Desta forma, este trabalho tem como objetivo realizar um levantamento das espécies de plantas
relatadas como indicadoras de diamantes no Brasil a fim de fornecer subsídios para futuros estudos que
relacionem as possíveis espécies candidatas com variáveis geológicas.
MATERIAL E MÉTODOS
As espécies vegetais indicadoras de diamantes no Brasil foram levantadas a partir de extensa revisão
de literatura em livros, periódicos e teses. Foram utilizadas as seguintes bases de dados de literatura
científica: Scopus (https://www.scopus.com), Google Scholar (http://scholar.google.com.br), Scielo:
(http://www.scielo.org), Periódicos da capes (http://www.periodicos.capes.gov.br) para a combinação
das palavras “diamantes”, “Brasil”, “plantas bioindicadoras”, “plantas geobotânica” e “plantas
indicadoras”, sem limitação por ano por ano de publicação.
As espécies identificadas tiveram o seu nome atualizado de acordo com a APG IV na Flora do Brasil
2020 (2020) e trópicos (2019) e foram realizadas buscas especificas nas bases de dados já citadas com
o nome válido e sinônimos para identificação de outros usos e descrição morfológica.
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A distribuição e áreas de ocorrência destas espécies foram conferidas a partir das bases de dados do
Herbário Virtual (INCT, 2020), CNCFlora (2018, 2020), trópicos (2019) e Flora do Brasil 2020 (2020)
e comparado com regiões de ocorrência de diamantes no Brasil, a partir dos mapas e documentos
elaborados pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM) e de outras fontes consultadas.
RESULTADOS
Ocorrência de diamantes no Brasil
O Brasil possui registros da exploração de diamantes desde o início do século XVIII, quando foram
descobertos depósitos na região de Diamantina no estado de Minas Gerais. Até o século XIX o país
figurava entre os maiores produtores mundiais, quando foram descobertas jazidas na África do Sul
(SVISERO e CHIEREGATI, 1991; VALE, 2003; COSTA e LUZ, 2005). Ao longo dos séculos foram
encontrados depósitos de diamante em diversas regiões do Brasil, desde o Sul do país em Tibaji, no
estado do Paraná; Itararé e Patrocínio Paulista em São Paulo; Alto Parnaíba e região Central de Minas
Gerais; Aragarças e Piranhas em Goiás; Barra dos Garças, Chapada dos Guimarães, Aripuanã e Juína
no Mato Grosso; Coxim no Mato Grosso do Sul; Chapada Diamantina na Bahia; Gilbués no Piauí;
Imperatriz no Maranhão; Marabá no Pará; Oeste de Rondônia, além de localidades menores no Amapá
e Roraima; com destaque para os estados de Minas Gerais, com 71% das reservas oficiais Brasileiras, e
Mato Grosso com 85% da produção nacional (SVISERO e CHIEREGATI, 1991; VALE, 2003; LIMA,
2016; CABRAL NETO et al., 2017; NANNINI et al., 2017) (Figura 1). O projeto Diamantes do Brasil,
do Serviço Geológico do Brasil (CPRM), concluído em 2017, mapeou 804 ocorrências de diamantes,
142 garimpos, 42 campos e 1.344 corpos kimberlíticos no país (SILVEIRA et al., 2018).
Figura 1 – mapa de ocorrência de diamantes no Brasil (Fonte: SILVEIRA et al., 2018).
Espécies vegetais indicadores de diamante no Brasil
Segundo a literatura consultada, foram identificadas cinco espécies vegetais relacionadas pelas
populações locais com áreas de ocorrência de diamantes no Brasil, duas pertencentes à família
Velloziaceae, uma pertencente à família Cyperaceae (Lagenocarpus adamantinus) e duas à família
Marcgraviaceae (Schwartzia adamantium e Norantea guianensis). As duas espécies de Velloziaceae
(Babarcenia Vand. e Vellozia Vand.), foram mencionadas por Spix e Martius (1824) e não foram
analisadas quanto a sua distribuição, já que os autores não determinaram as espécies e há pelo menos
89 espécies destes gêneros que ocorrem na região de Diamantina descrita pelos autores (INCT, 2020).
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Lagenocarpus adamantinus Nees (Cyperaceae)
Nome popular: capim-dos-diamantes, brilhante, capim-brilhante, capim-diamante, tiririca-dos-
diamantes.
Descrição e ocorrência: Erva terrícola ou rupícola, perene, de 70 cm a 1,1 m de altura, formando
pequenas touceiras laxas, endêmica de campos rupestres do Cerrado no estado de Minas Gerais, com
ocorrências registradas apenas na região de Diamantina e na Serra do Cipó (Figuras 2a e 2b). Ocorre
sobre afloramentos quártzicos como colonizadora primária (ALVES et al, 2009). Por ocupar uma área
restrita, é classificada como Vulnerável (VU) (FLORA DO BRASIL, 2020; CNCFlora, 2018). É crença
popular que vegeta de preferência nos terrenos diamantíferos do estado de Minas Gerais na região de
Diamantina (CORREA, 1982; PECKOLT e PEKCOLT, 2006).
Figura 2ª (esquerda): Coletas de Lagenocarpus adamantinus Nees (Cyperaceae) no Brasil. Fonte: (INCT, 2020).
Figura 2b (direita): Ocorrência e distribuição de Lagenocarpus adamantinus Nees (Cyperaceae) no Brasil (CNCFlora, 2018).
Schwartzia adamantium (Cambess.) Bedell ex Gir.-Cañas (Marcgraviaceae).
Nome local: agarra-pé, mel-de-arara, pau-de-papagaio.
Descrição e ocorrência: É um arbusto ou pequena árvore de até quatro metros de altura, caule tortuoso,
geralmente com raízes adventícias, subcaducifólia ou caducifólia, terrícola, folhas simples, alterno-
espiraladas, subsésseis e glabras, nativa do Brasil e endêmica do Cerrado, com ocorrência em vegetação
de campos rupestres, cerrado (Strictu sensu) e florestas ciliares em terrenos rochosos a mais de 900
metros de altitude (FLORA DO BRASIL, 2020, 2020). Possui 212 registros de coletas no Brasil (Figura
3) (INCT, 2020). Silva Junior (2005) relata que esta é uma espécie considerada indicadora de áreas com
diamante na Chapada dos Veadeiros. Através de sua dispersão (Figura 3), é possível observar que ela
ocorre em municípios da região da Chapada Diamantina, no estado da Bahia, Cristalina, Pirenópolis e
Alto Paraíso, em Goiás e Diamantina em Minas Gerais, locais onde historicamente já foi realizada
exploração de diamantes e cristais.
Figura 3: Ocorrência e distribuição de Schwartzia adamantium (Cambess.) Bedell ex Gir.-Cañas (Marcgraviaceae) no Brasil
(INCT, 2020).
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Norantea guianensis Aubl. (Marcgraviaceae)
Nome local: flor-de-papagaio, planta-dos-diamantes, parreira-da-pedra, rabo-de-arara.
Descrição e ocorrência: Arbustiva volúvel com ramos horizontais a decumbentes, emitindo raízes
avermelhadas ao longo do caule, hemiepífita, folhas obovais com base cuneada e ápice retuso,
inflorescência em racemos terminais multiflorais com ocorrência desde o Suriname até o Brasil Central
e Bolívia, com maior frequência na região amazônica, além de Caatinga e Cerrado em vegetação de
campos rupestres, floresta ciliar, floresta de terra firme, savana amazônica e áreas de canga aberta
(afloramento ferrífero) (TROPICOS, 2020; FLORA DO BRASIL, 2020, 2020). É uma espécie com
ampla distribuição no Brasil e 446 coletas registradas (Figura 4) (INCT, 2020).
Correa (1982) e Silva Junior (2005) dizem que ela vegeta em terras áridas, às vezes diamantíferas,
e por isso, o povo considera-a indicadora, sobretudo na Chapada dos Veadeiros. Entretanto, observamos
que sua distribuição é muito mais ampla do que as áreas diamantíferas, ao comparar com as áreas com
registro de ocorrência de diamantes no Brasil (Fig. 1).
Figura 4: Ocorrência e distribuição de Norantea guianensis Aubl. (Marcgraviaceae) no Brasil (INCT, 2020).
DISCUSSÃO
Nenhumas das três espécies estudadas haviam sido citadas nos trabalhos mais completos
relacionados anteriormente (CANNON, 1971; BROOKS, 1979) e tampouco pertencem às famílias mais
frequentes (Lamiaceae, Fabaceae, Caryophyllaceae) apontadas por Brooks (1979) como geoindicadoras.
As Velloziaceae (Barbacenia sp. e Vellozia sp.) relatadas por Spix e Martius (1824) também não haviam
sido consideradas nestes trabalhos.
Os nomes científicos (válidos e sinônimos) das espécies podem carregar diversos significados
atribuídos por seus autores. L. adamantinus e S. adamantium têm epíteto específico referente a diamante,
que poderia ser relacionado tanto a região onde são encontradas (Diamantina na Serra do Espinhaço,
estado de Minas Gerais) ou a sua relação com a ocorrência de diamante. Nas obras de referência onde
foram publicadas as descrições destas espécies é feita relação apenas à região de ocorrência (SAINT
HILAIRE, 1825; MARTIUS, 1842). Em pesquisa na Flora do Brasil 2020 (2020), é possível encontrar
outras espécies vegetais nativas do Brasil com epíteto semelhante (Camponanesia adamantium, Croton
adamantinus, Hyptis adamantium, Koanophyllon adamantium, Lavoisiera adamantium, Lepidaploa
adamantium e Senecio adamantinus), todas com coletas significativas na região de Diamantina, sendo
que destas C. adamantinus e S. adamantinus possuem apenas um registro de coleta cada, ambos na
região de Diamantina (INCT, 2020).
Enquanto L. adamantinus tem distribuição mais restrita, ocorrendo apenas em uma pequena extensão
de área onda há registro de ocorrência de diamantes, S. adamantium tem distribuição mais ampla, mas
também sobreposta a regiões diamantíferas. Norantea guianesnsis, entretanto, tem a distribuição mais
ampla, com registros em outras regiões do país não diamantíferas (INCT, 2020; TROPICOS, 2020). A
distribuição mais restrita de algumas espécies pode ser um bom indicativo daquelas com maior potencial
de indicador geobotânico, uma vez que essa distribuição restrita pode estar relacionada com variáveis
geológicas locais.
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Morfologicamente, nenhuma das três espécies possui raízes escoras ou superficiais como P.
candelabrum, que Haggerty (2015) relaciona com o soerguimento de gemas de diamante da superfície
do solo.
Além dos fatores ambientais e ecológicos, outras questões podem estar envolvidas com a distribuição
destas plantas, como o seu manejo e outras atividades antrópicas conforme sugerem Levis et al. (2017)
para espécies arbóreas hiperdominantes na região amazônica, e Baléé (1989, 2013) para formações
florestais amazônicas. Entretanto, não foram encontrados registros de uso por populações humanas para
as três espécies estudadas nas referências consultadas, ainda que as plantas da família
Marckgravariaceae (N. guianensis e S. adamatinum) tenham grande potencial ornamental, podendo, por
isso, eventualmente ser cultivadas ou manejadas de alguma forma.
É interessante observar que no Brasil a exploração de diamantes foi feita historicamente de forma
artesanal em fontes secundárias, na superfície do solo ou em aluvião (mineração em rios) (VALE, 2003;
COSTA e LUZ, 2005), de modo que a maior parte das pedras garimpadas é proveniente de rochas
desgastadas e podem ter sido arrastadas por longa distância da rocha matriz (MARSHALL e BAXTER-
BROWN, 1995) e, desta forma, o relato de garimpo de diamantes em determinada região no Brasil pode
não ser necessariamente um indicativo da existência de chaminés de kimberlito e outros minerais
associados na área.
É possível que outros indicadores geológicos sejam utilizados por garimpeiros para a identificação
de áreas com diamantes como a ocorrência de cascalhos diamantíferos (CABRAL NETO et al., 2017).
Esta hipótese pode ser válida e deve ser testada em outros estudos, pois no garimpo se dedica a maior
parte do tempo analisando justamente as rochas. Em vídeos disponíveis na Internet são apresentados
diferentes tipos de cascalho associados à presença de gemas, usualmente com nomes relacionados a sua
forma, como feijão, figo/fígado-de-galinha, chiclete mascado e amendoim, ou a sua composição como
quartzo, ferragem, cristal e hematita. A etnopedologia, área das etnociências que estuda a relação entre
sociedades e solos (ALVES, 2005; ARAÚJO et al., 2013), pode contribuir com este trabalho a partir da
identificação dos diferentes tipos de solo e rochas e seus potenciais de uso pelas populações locais.
Haggerty (2015) observou in loco o adensamento de P. candelabrum em áreas sobre chaminés de
kimberlito já prospectadas e conhecidas na Libéria, o que não pode ser feito neste estudo já que os mapas
de distribuição das plantas neste trabalho foram realizados a partir de coletas conhecidas destas espécies,
sem a confirmação de ocorrência de kimberlitos nestes mesmos locais.
Apesar da comparação realizada entre as áreas de ocorrência das plantas estudadas e das áreas com
registro de diamantes no Brasil, este estudo possui limitações quanto à precisão dos dados geográficos
utilizados. O garimpo de diamantes ocorre em locais restritos e não em toda a extensão dos municípios
listados pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM), e pela escala do mapa disponibilizado e utilizado
(SILVEIRA et al., 2018) é impossível precisar os pontos exatos onde foram realizados estes registros
de diamantes para aproximar dos locais onde as plantas foram coletadas, sendo que as chaminés de
kimberlito possuem no máximo poucas centenas de largura (NIXON, 1995). Ao mesmo tempo não são
todas as plantas coletadas, registradas e utilizadas neste trabalho que possuem localização precisa de sua
ocorrência, podendo ter sua localização ajustada para a sede do município na ausência desta informação
(INCT, 2020), dificultando a elaboração de mapas mais precisos. Também é necessário reconhecer que
o mapa do CPRM utilizado indica apenas os locais onde já há a ocorrência de diamantes confirmada e
não outros locais onde também poderiam ocorrer (SILVEIRA et al., 2018).
Para o aprimoramento da discussão deste trabalho seria interessante entrevistar garimpeiros na região
de ocorrência destas plantas e em locais tradicionais de garimpo. Entretanto, tanto a caracterização da
atividade do garimpo artesanal como ilegal quanto à discrição do garimpeiro com o local do garimpo
ou das técnicas desenvolvidas para evitar possíveis concorrentes, dificultariam esta abordagem.
CONCLUSÕES
Foram encontradas cinco espécies vegetais nativas do Brasil relacionadas à ocorrência de diamantes
no país nas referências consultadas, das quais apenas três foram identificadas até espécie. Apesar da
distribuição destas três plantas sobreporem áreas diamantíferas, não é possível afirmar que apenas sua
ocorrência é suficiente como indicadora de áreas diamantíferas e seriam necessários estudos de campo
para confirmar esta correlação. É provável que as espécies de distribuição mais restrita sejam melhores
indicadoras geobotânicas do que aquelas de ampla distribuição. Trabalhos de biogeografia a partir de
um maior número de amostras coletadas, mais variáveis ambientais analisadas, associada a estudos de
prospecção de minerais no Brasil devem contribuir no futuro para esta discussão.
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AGRADECIMENTOS
Agradecemos aos revisores que leram este manuscrito e fizeram valiosas sugestões para a sua melhora.
REFERÊNCIAS
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