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CURRÍCULO E FORMAÇÃO NA EDUCAÇÃO
DE JOVENS E ADULTOS: TENSÕES E
DESAFIOS
Ana Célia Dantas Tanure (PMFS)*
https://orcid.org/0000-0002-5201-0759
Graça dos Santos Costa (UNEB)**
https://orcid.org/0000-0001-7770-0118
RESUMO
Este artigo tem por objetivo discutir a política curricular – Aprendizagem
ao Longo da Vida – proposta do Estado da Bahia para a educação de jovens
modalidade de ensino. A metodologia desse estudo está baseada na abor-
-
estudo, constatamos que, apesar dessa política curricular ter sido construí-
da coletivamente, com o apoio dos movimentos populares ligados à EJA, e
-
eles concordem com seus princípios e com suas orientações metodológicas.
-
rantia de espaço de estudo e planejamento nas escolas, como possibilidades
de mudança na materialização do currículo.
Palavras-chave:
ABSTRACT
CURRICULUM AND TRAINING IN YOUTH AND ADULT
EDUCATION: TENSIONS AND CHALLENGES
-
-
-
dora Pedagógica da Rede Estadual de Ensino. E-mail: anatanure@gmail.com
-
gracacosta@
gmail.com
Ana Célia Dantas Tanure; Graça dos Santos Costa
Revista Internacional de Educação de Jovens e Adultos, v. 03, n. 05, p. 98-115, jan./jun. 2020 99
-
-
-
-
Keywords:
RESUMEN
CURRÍCULO Y FORMACIÓN EM LA EDUCACIÓN DE JÓVENES Y
ADULTOS: TENSIONES E DESAFIOS
Este artículo tiene por objetivo discutir la política curricular – Aprendizaje
a lo largo de la vida – propuesta del Estado de Bahía para Educación de Jó-
estudios de este tipo de enseñanza. La metodología de este estudio se basa
-
resultado, se ha observado que, aunque esta política curricular se construyó
colectivamente, con el apoyo de movimientos populares vinculados a EJA,
están de acuerdo con sus principios y con sus orientaciones metodológicas.
-
posibilidades de cambio.
Palabras clave:-
100
1. INTRODUÇÃO
A Educação de Jovens e Adultos – EJA, como
modalidade de educação básica, torna-se
desdobrada enquanto política pública a par-
do Brasil de 1988, que promulga, em seu Art.
205, a garantia do direito de todos à educa-
ção. Assim, a EJA se insere no processo de
escolarização dos sistemas de ensino para
atender a jovens e adultos, representantes
legítimos de processos históricos de desi-
gualdades sociais, pedagógicas e econômi-
cas. É certo que a EJA “sempre compreendeu
um conjunto muito diverso de processos e
aquisição ou à ampliação de conhecimentos
-
sionais ou de habilidades socioculturais”
(Haddad, 2000, p. 108).
Essa discussão de conhecimentos bási-
socioculturais está intrinsecamente ligada
ao currículo escolar que, no caso da EJA,
representa, em grande parte, as lutas políti-
cas, econômicas e ideológicas de determina-
ser apenas um agrupamento de conteúdos e
atividades escolares neutras e desinteressa-
das. Arroyo (2013, p. 17) reconhece o currí-
culo como “um campo político de disputas,
quanto às suas estruturas e seus ordena-
mentos, mais que objetos de indagações e
mais do que veículo em movimento”.
-
-
ção desse currículo, a partir de seus valores
debate se potencializa diante da comple-
essa modalidade de educação, pois um cur-
deve ser entendido como uma “construção
cultural” (Sacristán, 2000) que transcende
as salas de aula.
em 19 de novembro de 2008, o governo es-
tadual apresenta uma nova política curricu-
lar para a EJA, intitulada Política de Educa-
ção de Jovens e Adultos da Bahia – Apren-
dizagem ao Longo da Vida, construída por
ampla representatividade social e institu-
-
dencia ainda o direito de aprender ao longo
-
tam educação aos Jovens e Adultos.
Nessa perspectiva, o currículo da EJA da
-
de atender à diversidade da EJA. Entretanto,
qualquer que seja a proposta curricular, ela
perpassa pela tradução e compreensão dos
-
currículo tão diverso voltado ao diálogo,
à humanização da relação pedagógica na
construção de conhecimentos pelos jovens
representa um recorte da pesquisa de mes-
trado1
Pós-Graduação em Educação da Universida-
-
nal em Educação de Jovens e Adultos (MPE-
1 Este artigo apresenta dados parciais da pesquisa
-
culo da EJA: um estudo de caso sobre o currículo
prescrito, o implementado e o realizado em uma
escola polo no interior da Bahia”,
Ana Célia Dantas Tanure; Graça dos Santos Costa
Revista Internacional de Educação de Jovens e Adultos, v. 03, n. 05, p. 98-115, jan./jun. 2020 101
-
sores e as políticas de currículo da Educação
de Jovens e Adultos vigentes no Estado da
Bahia.
-
remos o processo de construção, implemen-
tação e concepções da política curricular da
EJA – BA – Aprendizagem ao Longo da Vida.
sobre esse currículo, assim como os desa-
-
plementação da proposta curricular.
2. O CURRÍCULO DA EJA E A
FORMAÇÃO DOS PROFESSORES:
UM CAMPO DE TENSÕES
O campo educacional da EJA na Bahia con-
atendimento da educação básica aos jovens
e adultos, reais sujeitos de direitos dessa
modalidade. Decerto, essas políticas curri-
-
dos cursos de licenciaturas não atendem à
-
-
rios, que deem conta pedagogicamente des-
docente (SOARES E PEDROSO, 2016. p.264)
(Soares, 2007; Ventura, 2012; Paiva, 2012).
Essas pesquisas evidenciam, ainda, o dis-
tanciamento da EJA das discussões das li-
vir a atuar nessa modalidade, visto serem
o ensino nas turmas da EJA, mesmo que de
-
res que atuam na EJA “[...] no mais das vezes,
‘caem’ nessa modalidade de ensino sem ter
escolhem, [...] a motivação consciente tem a
ver com questões pessoais e de necessidade
docência na rede privada[...]” (Paiva, 2012,
p. 89). Do grupo de participantes da pesqui-
-
-
nal em Educação de Jovens e Adultos (MPE-
2. Esse mestrado se
apresenta pioneiro no Brasil enquanto mes-
contribui para ampliar as discussões desse
-
sas e as ações sociais desenvolvidas pelos
projetos de intervenção na comunidade.
Assim, ele “visa a produção de conhecimen-
tos, a atualização permanente dos avanços
2 Antes de concretizar o mestrado em EJA, muitas
-
educadores da EJA. Destacamos a Licenciatura
plena em Pedagogia, com habilitação em Educa-
ção de Jovens e Adultos, pioneira no Brasil, e a
Especialização em Educação de Jovens e Adultos,
realizada na capital e no interior.
102
educação de jovens e adultos, atendendo às
-
do com o Projeto do curso, esse mestrado
objetiva
[...] a preparação de recursos humanos de
-
área da educação de jovens e adultos para
atuar no mercado de trabalho, visando às
peculiaridades desse campo de atuação e
aos novos paradigmas educacionais nessa
-
e intervenções, que já provocam impactos
sociais, econômicos, culturais e educacio-
intervenções que se voltam a dar retorno à
mapeamento histórico, criação de blogs, etc.
-
-
sores das redes municipais e estaduais, que
estão presentes em todos os territórios baia-
nos, cujas produções visam à compreensão
uma EJA inovadora e emancipatória.
em EJA seja muito importante para dar uma
maior visibilidade acadêmica e social a esse
dos sujeitos envolvidos e cria possibilidades
-
ção de mudanças substanciais no percurso
histórico da EJA, pois investir em políticas
-
oportunidade e de possibilidades educacio-
nais, que promovam a cidadania e o direito à
educação. Entretanto, os investimentos em
-
nas salas de aula com estudantes jovens e
adultos.
Ventura (2012, p. 74) contribui nesse
debate, evidenciando “que há uma clara re-
lação entre a ausência da discussão sobre
-
sino na EJA seja pautado por improvisação
ou pela reprodução do currículo do ensino
seriado do diurno no noturno. A superação
-
mentadoras do conhecimento e da organi-
zação do currículo, requer reconhecimento
dos estudantes da EJA como sujeitos, logo,
requer “[...] o estabelecimento de diálogos
-
teriormente tecidos pelos educandos e os
conteúdos escolares” Haddad (2000, p. 87).
-
-
cedo, 2013) e sujeitos importantes a contri-
2002).
Lidar com currículos recentes e tão di-
versos dos currículos praticados pela esco-
-
-
sores, que possibilite garantir nas escolas
planejamento do trabalho pedagógico, prin-
Os programas curriculares da EJA, implan-
tados pela Secretaria de Educação da Bah-
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Revista Internacional de Educação de Jovens e Adultos, v. 03, n. 05, p. 98-115, jan./jun. 2020 103
metodológicos que reconhecem o estudan-
te como sujeito político e crítico, assistido
por uma pedagogia humanista, muito diver-
sos dos currículos praticados por essa mo-
dalidade, historicamente, no ensino diurno
seriado.
Pensar no campo do currículo da EJA re-
-
(2007) chama a atenção para algumas ques-
tões de análise que impactaram mudanças
-
re e Moacir Góes possibilitou a consciência
-
-
todos próprios para essa modalidade de en-
-
vimento de inclusão, cada vez mais crescen-
te, de jovens na EJA. Muitos são adolescentes
amplia a diversidade geracional nas salas de
-
mento do processo de ensino e aprendiza-
gem. Lidar com essa diversidade de gera-
-
lidade e conhecimento para desenvolver, da
-
res em saber lidar com tempos humanos tão
que devem ser pauta de estudo dos proces-
Haddad e Di Pierro (2000, p. 126) con-
tribuem para esse debate, ao evidenciarem
pela má qualidade do ensino. Esta, aliada às
considerável número de jovens a abandonar
-
cativas para utilizar os conhecimentos esco-
lares com autonomia no seu cotidiano. Logo,
-
junto da população, assiste-se à gradativa
um numeroso grupo de jovens e adultos,
cujo domínio precário da leitura, da escrita
-
cente evasão vivenciada na EJA na Rede es-
tadual da Bahia, que impacta diretamente a
continuidade do trabalho docente.
-
ganização curricular, “[...] que separa a pes-
soa que vive e aprende no mundo daquela
que deve aprender e apreender os conteú-
dos escolares” (Haddad; Di Pierro, 2000, p.
do ensino e os saberes de vida dos alunos,
em grande parte, são desvalorizados, ou os
estudantes jovens e adultos são submeti-
dos a um currículo oriundo do ensino des-
tinado às crianças, negando-se a condição
de serem sujeitos de sua própria história,
ou constroem-se representações que os es-
tigmatizam na sociedade como incapazes.
maio 2016), no campo de pesquisa, que “[...]
achava que a EJA era um bico, que o aluno
noturno não tinha estudado, não tinha es-
tudado porque não quis, não só pelas con-
dições sociais; ele não valorizou” (Tanure,
2016, p. 129).
-
104
-
lização entre movimentos sociais, como as
de licenciatura nas universidades de todo o
Brasil.
Nessa perspectiva, Paiva (2012, p. 90) ra-
-
-
-
-
dades docentes, estimulados e orientados à
pesquisa, à leitura da variedade da busca de
-
ciada e particular de cada escola, de cada
to.
APRENDIZAGEM AO LONGO
DA VIDA: CONCEPÇÕES DE UM
CURRÍCULO HUMANISTA
No atendimento à Educação de Jovens e
Adultos, o governo do Estado da Bahia im-
plantou a Política de EJA - Aprendizagem ao
Longo da Vida, a partir de 2009, em todas
-
tadual de Ensino. A Educação de Jovens e
-
trabalho e sobrevivência dos jovens e adul-
tos que se colocam como principais destina-
tários dessa modalidade de educação” (Bah-
-
na representa um grande passo da política
diversidade dos sujeitos jovens e adultos,
que vivem, muitas vezes, a responsabilidade
da garantia da sobrevivência pelo trabalho
e que interromperam, em algum tempo, o
-
mental ao sucesso do trabalho educativo e
da construção do currículo da EJA.
2009, p. 9), encontros de escuta de diver-
sos segmentos e representações ligadas
à EJA, seja da dimensão escolar, “educan-
dos(as), educadores, gestores e coordena-
dores pedagógicos das Diretorias Regionais
-
sociais (MOVA); Sistema S (Serviço Social da
-
as Secretarias de Educação do Estado e do
levantamento de dados via questionários
escolas e cursos de EJA, da capital e interior
-
tor concreto nessa construção, mas um gru-
po de pessoas envolvidas com a assessoria
-
royo.
A política curricular da EJA, intitulada
Educação de Jovens e Adultos – Aprendi-
com 36 páginas, organizado em 6 sessões,
apêndice. Ao longo dele estão desenvolvidos
teórico-metodológicos da educação da EJA;
Ana Célia Dantas Tanure; Graça dos Santos Costa
Revista Internacional de Educação de Jovens e Adultos, v. 03, n. 05, p. 98-115, jan./jun. 2020 105
-
o acompanhamento da aprendizagem.
A organização do currículo da EJA em
orienta o trabalho pedagógico em Temas
Geradores, a serem desenvolvidos anual-
mente, um por bimestre. Esses temas, en-
quanto viabilidades de discutir as diversas
questões sociais vivenciadas pelos sujei-
tos da EJA em seu cotidiano, articulam as
diversas áreas de conhecimento, possibi-
litando um planejamento interdisciplinar
-
tidisciplinar vigente ainda no ensino. Essa
organização interdisciplinar entre as áreas
saberes advindos da cultura e da socieda-
saberes que precisam ser considerados em
um currículo de EJA.
A proposta orienta a seleção dos conteú-
dos mediante a realidade, a necessidade e o
interesse dos estudantes, organizados por
de desenvolver habilidades e competências
-
mos perceber nas orientações curriculares
a sugestão de saberes necessários para cada
e temas geradores, elencados em modelo
que contemplam temas diversos, voltados
ao trabalho, ao meio ambiente, à identidade
e cultura, à globalização e à economia soli-
dária.
respaldadas no documento Agenda para o
futuro, que demanda aos países membros
“iniciativas que possibilitem o cumprimen-
to da agenda no Brasil e em todos os países
que colaboraram na construção da Declara-
ção de Hamburgo” (Gomes, 2013, p.39). O
documento orienta ainda a equivalência de
matrícula da nova proposta, que substitui a
proposta anterior, o Programa Aceleração,
-
As orientações curriculares dessa po-
-
ca” dos estudos da psicogênese de Piaget
e nas concepções de educação de adultos
respaldada “pelos ideários da Educação
-
mudança, por certo, de paradigmas para
-
logo entre educando e aprendente que
dialógico de interação. Nessa interação, no
-
porque “Quem ensina aprende ao ensinar
e quem aprende ensina ao aprender. Quem
-
mar esse currículo em práticas educativas
decisões políticas. Ensinar, assim, pressu-
-
aos sujeitos envolvidos.
É importante ressaltar as contribuições
-
tudos renovaram o pensamento pedagó-
inspirou os principais programas de al-
106
dos anos 60 e seu legado teórico e prático
educação” (Tanure e Oliveira, 2015). Vale
-
ternacional a se tornar patrimônio da hu-
-
cional do Programa Memória do Mundo da
Subsidiada nos conhecimentos de Pau-
adultos, essa política curricular renova o
trabalho na EJA, quando reconhece as es-
-
cesso educativo, propondo um novo currí-
culo, novas práticas pedagógicas e um novo
olhar para os processos de avaliação; quan-
do possibilita acompanhamento de percur-
so de aprendizagem, avaliação contínua,
substituição de notas por conceitos ava-
liativos e planejamento coletivo. Enquanto
concepção de currículo, a proposta distin-
gue a EJA dos outros segmentos de escola-
e olhares menos escolarizados, pois a EJA
não deve ser comparada a um suposto mo-
2009. p. 17). A proposta curricular, assim,
-
discussões pedagógicas:
1º Tempo: Aprender a Ser, contendo 03
-
nia e Trabalho; Saúde e Meio Ambiente).
-
duração cada um (Trabalho e Sociedade;
Meio Ambiente e Movimentos Sociais).
-
p. 20).
Essa proposta caracteriza-se ainda pela
-
juvenil e adulto. É importante ressaltar que
a proposta de planejamento de trabalho
-
como Língua Portuguesa, Língua Estrangei-
da Natureza e Sociedade, com as disciplinas
-
-
disciplinares que envolvam os estudantes,
construam autonomia e ampliem suas com-
petências.
-
dantes jovens e adultos, essa política e pro-
com a diversidade, para atender às especi-
como Garantia da continuidade nos estudos.
Nele são ressaltadas orientações que pro-
põem uma articulação das redes estaduais
e municipais, no sentido de garantir a conti-
nuidade dos estudos na EJA.
Ao analisar essa proposta curricular,
pedagógicas avaliativas, a elaboração de
projetos didáticos e a organização de pla-
-
Ana Célia Dantas Tanure; Graça dos Santos Costa
Revista Internacional de Educação de Jovens e Adultos, v. 03, n. 05, p. 98-115, jan./jun. 2020 107
consequentemente, o atendimento a esses
sujeitos na Educação de Jovens e Adultos.
Mas, apesar das propostas possibilitarem
essa articulação, percebemos, pela nossa
trajetória, que as escolas ainda mantêm um
trabalho pedagógico pautado nos moldes do
ensino diurno e num processo de avaliação
questões se revelam cotidianamente no dis-
curso e na prática docente e impedem que
-
tivamente, na sua essência, implementada, o
-
-
sores que atuam nesse segmento de ensino.
Acreditamos, como Arroyo (2013), no
poder e na posição central que o currículo
assume na estruturação do papel da esco-
pedagógicas no trabalho educativo do pro-
como representa várias dimensões, sejam
estruturais, culturais, pedagógicas ou so-
-
-
mento de primeira ordem na concretização
desse processo”; logo, sua participação na
construção de qualquer currículo se torna
proposta.
4. UM ESTUDO DE CASO
SOBRE A REPRESENTAÇÃO DO
CURRÍCULO DA EJA
Para a realização deste percurso, utilizamos
a abordagem qualitativa com cunho partici-
-
do, a pesquisa qualitativa possibilitou tra-
motivos, das aspirações, das crenças, dos
21) dos sujeitos envolvidos. Essa perspecti-
(1986), permitiu uma leitura mais ampla da
-
presentações sobre o currículo da EJA.
-
Educação da Bahia em 2013, como polo de
educação noturna, primeira desse tipo na
-
com o objetivo de implementar políticas pú-
a estudantes trabalhadores. Nessa perspec-
tiva, propôs a reorganização do processo de
-
de conhecimentos, articulados aos saberes
práticos da vida e que atendam aos interes-
ses dos estudantes” (Bahia, 2013, p.2).
pesquisado, uma política curricular da EJA,
qualitativa, considerando-se mais apropria-
sociais.
-
lizamos entrevistas semiestruturadas com
-
-
-
108
na condição de instrumento teórico-meto-
dológico, que permitiu a troca dialógica en-
tre os participantes, ao mesmo tempo que
utilizamos como dispositivos entrevista se-
-
mativas e análise documental. A análise das
-
ca análise de conteúdo.
O processo de implantação da política cur-
Diante de uma realidade de 417 municípios,
que contava com um quantitativo de 15.000
novo currículo atingiu apenas 30% dos do-
multiplicadores da política curricular para
os seus respectivos lócus de ensino.
-
denadores e gestores que atuavam na EJA,
no diz respeito à preparação teórico-meto-
da nova proposta curricular, bem como a
-
das as escolas conseguiram organizar mo-
-
negativamente na implantação do novo
currículo.
-
calizar a implantação imediata para toda a
rede Estadual de ensino contradisse a su-
-
EJA da Proposta e a concepção da EJA assu-
-
à implementação da Proposta, não atendeu
a todos os educadores e gestores da EJA, o
escolas” (Urpia, 2009, p.90).
requisitassem orientações e atendimento
representação de cada município, porque
não dava para trazer todo mundo”; dessa
-
ção “[...] em 2008, em 2009 e em 2010, [...],
-
re, 2016, p. 121).
-
anos subsequentes ocorreram poucos mo-
vimentos de mudanças no currículo da EJA
nas escolas.
Nos anos subsequentes, a partir de 2013,
-
Ana Célia Dantas Tanure; Graça dos Santos Costa
Revista Internacional de Educação de Jovens e Adultos, v. 03, n. 05, p. 98-115, jan./jun. 2020 109
-
-
-
atuavam na EJA.
-
-
que estão nessa modalidade estão com-
plementando sua carga horária do ensino
seriado diurno no turno noturno. Mesmo
-
do ela, “as mudanças estão acontecendo, as
pessoas estão em busca, e participam mais
dos eventos, das reuniões [...] digo, os pro-
-
posta, em estudar, a buscar um caminho
para que aconteça essa aprendizagem desse
-
guinte, desses 12, 5 não são mais, temos 5
novos [...]”.
Todo esse panorama sobre o processo
de implantação da Política de EJA – Apren-
dizagem ao Longo da Vida da Bahia impacta
dessa política curricular nas salas de aula da
EJA nas escolas estaduais da Bahia. Deduzi-
-
quer processo de construção e implantação
de políticas educacionais não pode prescin-
são construtores e mediadores dessas polí-
ticas em sala de aula. Por certo, se o currí-
-
sores são sujeitos ativos desse currículo. No
caso da política curricular da EJA da Bahia,
construída com participação popular, não
-
mia e o envolvimento deles na construção
do currículo.
-
mensais, de maio a junho de 2016, tivemos
a oportunidade de levantar representa-
EJA – Aprendizagem ao Longo da Vida. A
só instrumento. Busca estabelecer relações
-
tente e articulá-lo a outros conhecimentos
-
-
-
vo da política curricular da EJA e construção
partir da utilização de questionários diag-
nósticos, respondidos inicialmente pelos
-
-
sores em suas concepções e outro espaço
para realizar estudos sobre a política curri-
110
Tabela 1
1
própria política
da EJA em seus
princípios,
diretrizes e
currículo.
Ampliar os conhecimentos
sobre a Política e o currículo
da EJA.
Possibilitar o reconhecimento
da EJA enquanto direito.
e as características dos
estudantes da EJA.
Estabelecer
vínculo com
colaboradores.
Levantar as
representações
sociais dos
a política e o
currículo da EJA.
Estabelecer
vínculo
investigativo.
Levantar as
representações
sociais dos
a política e o
currículo da EJA.
2
curricular da EJA.
Levantar as
representações
sociais dos
o currículo e a
EJA.
Analisar as
representações
sociais dos
o currículo e a
EJA.
3
Planejamento
com Artes
Laborais
planejamento coletivo na
EJA.
Discutir a ementa da
disciplina Artes e Atividades
Laborais.
Levantar as
representações
sociais dos
o planejamento
na EJA.
Analisar as
representações
sociais dos
o ato de planejar
na EJA.
Nesses encontros, elencamos como te-
mas: conhecer a política da EJA em seus
princípios, diretrizes e currículo; o proces-
so de planejamento coletivo e a disciplina
Artes Laborais, disciplina que surgiu junto
-
ALGUNS RESULTADOS
-
rículo e a EJA evidenciaram um distancia-
mento entre o currículo prescrito da EJA e a
quase ausente transposição dele para a prá-
-
ainda estou achando, ainda considero que o
currículo em si, ele está ótimo, mas a apro-
priação dele, o entendimento dele, ele tem
não conseguem entender”. Esse desconhe-
Essas acepções apontam o desconheci-
mento de parte do grupo sobre o currículo
da EJA. Esse currículo bem idealizado teori-
-
sível de ser desenvolvido na realidade. Esse
desconhecimento do currículo tensiona os
-
guirem equalizá-lo pedagogicamente no
cotidiano escolar, reproduzindo o currículo
aplicado no diurno (Arroyo, 2013).
-
-
Ana Célia Dantas Tanure; Graça dos Santos Costa
Revista Internacional de Educação de Jovens e Adultos, v. 03, n. 05, p. 98-115, jan./jun. 2020 111
volvimento de um currículo para a EJA que
transpor esse currículo desejado para as
da EJA, para a maioria, ainda representava
-
te do reconhecimento das singularidades
dos estudantes da EJA, pesquisavam e mo-
Apesar do currículo da EJA ser visto
-
valorizar o sujeito crítico, o cidadão. Ou,
“Um currículo voltado para atender aos
preparando-os para a vida, para o mercado
de trabalho, para a compreensão enquanto
sujeito cidadão construtor dessa sociedade
-
cipatória e inclusiva”. Esses princípios reve-
do sujeito crítico, cidadão, protagonismo,
cidadã, emancipatória e inclusiva, que tam-
parte do currículo da EJA, são dimensões
-
vas que proporcionem uma visão crítica da
realidade social, no processo dialógico de
-
nhecimento dos estudantes como sujeitos
cognoscentes e pontos de partida da cons-
-
-
do para atender, principalmente, aos tem-
pos humanos dos sujeitos a que ele se des-
tina, prevalece a concepção desse ser um
currículo distante de ser implementado
-
de aprendizagem, tema gerador, não conse-
guimos consolidar isso, essa programação
-
-
da, mas eu tinha colocado antes assim, na
teoria, porque a gente ainda não atingiu a
prática. Na verdade, a gente ainda não se
sentiu EJA, sabe?”.
Esse distanciamento entre a política cur-
ricular e a transposição desse currículo para
-
da, pela desarticulação de espaços de estudo
e planejamento na escola sobre a EJA e pela
invisibilidade do estudante da EJA na cons-
-
na seleção dos conhecimentos a serem en-
sinados na escola e na projeção de sucesso
relação aos estudantes da EJA, que já viven-
-
ções, essas representações se tornam mais
-
cientes dos conhecimentos valorizados pela
112
escola e pelos currículos tradicionalmente
instituídos, que impõem um modelo social-
mente aceito.
Esse modelo historicamente construído
-
to crítico, cidadão, permanece nas diretrizes
-
dania, conclamado na educação como um de
-
retrizes educacionais, assume distintas con-
cepções e questionamentos sobre a sua pos-
sibilidade de conquista ou garantia, tanto
que “a relação educação-cidadania, direito
ao conhecimento crítico e cidadania repo-
litizou os currículos, o material didático, a
-
-
sores a necessidade de compreensão dos
seus princípios como prerrogativa de ação
e implementação. As mudanças estruturais
Nacional do ensino seriado representam um
campo de tensões, reveladas nos discursos
189) ajuda na compreensão sobre o papel
prescrito e ao currículo vivido. Apesar de
o currículo prescrito representar um lega-
do de “capital cultural” declarado legítimo
-
legítimo. No caso em estudo, o desconheci-
da EJA, vigente na Rede Estadual da Bahia,
pelo grupo docente, requer investimentos
-
do no cotidiano escolar.
5. ALGUMAS CONCLUSÕES...
diante de um histórico esvaziado de políti-
cas educacionais que deem conta da espe-
-
sos dentro do espaço escolar e da recente
conquista de ser reconhecida como uma
modalidade da educação básica de direito à
-
lar da EJA tensiona um território de sujeitos
históricos, encharcados de vivências, direi-
tos e necessidades, por vezes negados em
Para atender a essa modalidade na Bah-
ia, a Secretaria de Educação implantou a
Política de EJA- BA, Aprendizagem ao Longo
da Vida nas escolas a partir de 2009. Essa
embasada em práticas pedagógicas emanci-
e, principalmente, no respeito à diversida-
Educação de Jovens e Adultos.
-
res. Apesar do processo de construção cole-
etc.), encontros de escuta e democratização
na construção do currículo, a pesquisa evi-
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sores multiplicadores não deram conta de
toda a demanda de docentes atuantes da
de acompanhamentos via e-mail para tirar
dúvidas; b) O atraso na entrega dos instru-
mentos de registros e diários às escolas di-
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Ana Célia Dantas Tanure; Graça dos Santos Costa
Revista Internacional de Educação de Jovens e Adultos, v. 03, n. 05, p. 98-115, jan./jun. 2020 113
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Os resultados evidenciados pelas entre-
proposta curricular tem base crítica e está
a reconhece distante da realidade do ensi-
no na EJA. Apesar do reconhecimento des-
sa proposta curricular como uma política
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constitui distante das práticas desenvolvi-
das nas salas de aula.
A proposta curricular demanda com-
preensão dos sujeitos da EJA, valorizando
maior tempo por parte dos docentes para
acompanhamento do percurso da aprendi-
participativa e democrática. No entanto, os
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ção do sentimento de pertença à modali-
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realidades.
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que, para trabalhar com currículo de tal
natureza, seriam necessários melhores re-
cursos e condições de trabalho, como, por
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nejamento, estudo, produção e revisão de
material didático adequado à modalidade.
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nhecimento da proposta currículo da EJA; a
ampliação da carga de planejamento e tra-
uma visão mais individualizada do aluno; a
incapacidade de lidar com estudantes com
problemas de ordem social; a não garantia
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mação docente contínua na EJA.
Novos programas curriculares, para se-
da parte teórica com bases emacipatórias
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e humanos, material didático adequado
dos docentes. São necessários investimen-
parte dos estudantes, docentes, coordena-
sujeitos envolvidos no processo educativo
da EJA. Esta realidade, que ora se apresenta
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cada vez mais autoria e autonomia no seu
pedagógica cada vez mais inclusiva na EJA.
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Recebido em: 22/07/2020
Aprovado em: 20/08/2020