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Combate à COVID-19 sob o federalismo bolsonarista: um caso de descoordenação intergovernamental

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Abstract

Este artigo analisa como o federalismo brasileiro tem afetado o combate à COVID-19. Tendo por base uma análise histórico-institucional do caso brasileiro, busca-se compreender como o modelo federativo construído pelo governo Bolsonaro influenciou as respostas ao combate da pandemia no país, bem como os resultados do confronto de dois modelos federativos nesse processo. De um lado, o ideário e as estruturas institucionais da Constituição de 1988 com características cooperativas e forte coordenação federal. De outro, o federalismo bolsonarista baseia-se numa visão dualista de relações intergovernamentais, com menor participação da União na redução de desigualdades territoriais e no apoio a governos subnacionais, além da postura centralizadora e hierárquica nas questões de impacto nacional. O estudo mostra que o federalismo bolsonarista aumentou o conflito com governos subnacionais e tem descoordenado políticas públicas de enfrentamento à pandemia. Conclui-se que as crises sanitária e federativa caminham juntas e trazem à tona uma questão chave: a importância da coordenação governamental nas políticas públicas de enfrentamento à pandemia.
REVISTA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA | Rio d e Jan ei ro 54(4):663-677, jul. - ago. 2020
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ISSN: 1982-3134
Combate à COVID-19 sob o federalismo bolsonarista: um caso
de descoordenação intergovernamental
Fernando Luiz Abrucio ¹
Eduardo José Grin ¹
Cibele Franzese ¹
Catarina Ianni Segatto ²
Claúdio Gonçalves Couto ¹
¹ Fundação Getulio Vargas / Escola de Administração de Empresas de São Paulo, São Paulo / SP – Brasil
² Universidade Federal do ABC / Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas, São Bernardo / SP – Brasil
Este artigo analisa como o federalismo brasileiro tem afetado o combate à COVID-19. Tendo por base uma análise
histórico-institucional do caso brasileiro, busca-se compreender como o modelo federativo construído pelo governo
Bolsonaro inuenciou as respostas ao combate da pandemia no país, bem como os resultados do confronto de dois
modelos federativos nesse processo. De um lado, o ideário e as estruturas institucionais da Constituição de 1988
com características cooperativas e forte coordenação federal. De outro, o federalismo bolsonarista baseia-se numa
visão dualista de relações intergovernamentais, com menor participação da União na redução de desigualdades
territoriais e no apoio a governos subnacionais, além da postura centralizadora e hierárquica nas questões de impacto
nacional. O estudo mostra que o federalismo bolsonarista aumentou o conito com governos subnacionais e tem
descoordenado políticas públicas de enfrentamento à pandemia. Conclui-se que as crises sanitária e federativa
caminham juntas e trazem à tona uma questão chave: a importância da coordenação governamental nas políticas
públicas de enfrentamento à pandemia.
Palavras-chave: COVID-19; federalismo; relações intergovernamentais; políticas públicas; governo Bolsonaro.
Lucha contra la COVID-19 bajo el federalismo bolsonarista: un caso de descoordinación
intergubernamental
Este artículo analiza cómo el federalismo brasileño ha afectado la lucha contra la COVID-19. A partir de un
análisis histórico-institucional del caso brasileño, buscamos comprender cómo el modelo federativo construido
por el gobierno de Bolsonaro inuyó en las respuestas para combatir la pandemia en el país, así como los
resultados de la confrontación de dos modelos federativos en este proceso. Por un lado, el ideario y las estructuras
institucionales de la Constitución de 1988 con características cooperativas y una fuerte coordinación federal. Por
otro, el federalismo bolsonarista que se basa en una visión dualista de las relaciones intergubernamentales, con
menos participación del Gobierno Federal en la reducción de las desigualdades territoriales y en el apoyo a los
gobiernos subnacionales, además de la postura centralizadora y jerárquica en materias de impacto nacional. El
estudio muestra que el federalismo bolsonarista ha aumentado el conicto con los gobiernos subnacionales y ha
descoordinado las políticas públicas de combate a la pandemia. Se concluye que las crisis sanitaria y federativa
van juntas y plantean una cuestión clave: la importancia de la coordinación gubernamental en la implementación
de políticas públicas de enfrentamiento a la pandemia y sus efectos sociales y económicos.
Palabras clave: COVID-19; federalismo; relaciones intergubernamentales; políticas públicas; gobierno Bolsonaro.
DOI: http://dx.doi.org/10.1590/0034-761220200354
Artigo recebido em 01 maio 2020 e aceito em 24 jul. 2020.
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Combating COVID-19 under Bolsonaro’s federalism: a case of intergovernmental incoordination
is article analyzes how federalism has aected policy responses to the COVID-19 pandemic in Brazil. rough
historical-institutional analysis, the study examines how the model of federalism adopted by President Bolsonaros
government inuenced policy responses to the pandemic in the country. In addition, the research points out the
existence of two models of federalism in the case analyzed, addressing the outcomes of the confrontation between
them. e rst model refers to ideas and institutional structures that have emerged since the 1988 Brazilian Federal
Constitution with cooperative features and strong federal coordination. e second, named “Bolsonaros federalism,
is based on a dualistic view of intergovernmental relations with little participation of the federal government in
reducing territorial inequalities and supporting subnational governments, while centralizing issues of national
importance and adopting a hierarchical stance. e study shows that Bolsonaro’s government increased the conict
with subnational governments and jeopardized the coordination of policy responses to the COVID-19 pandemic.
We conclude that healthcare and federative crises go together and raise a key question: what is the importance of
governmental coordination to implement policies to respond to the pandemic and its social and economic eects?
Keywords: COVID-19; federalism; intergovernmental relations; public policies; Bolsonaros government.
1. INTRODUÇÃO
O combate à atual pandemia tem sido afetado por diversos fatores. Um deles é o efeito da interligação
entre atores políticos e o funcionamento institucional das políticas públicas. Neste campo, um aspecto
recorrente na crise epidemiológica é a dimensão da territorial politics (Broscheck, Petersohn, & Toubeau,
2017), que afeta federações e países com mecanismos federalizados (Baldi, 1999; Swenden, 2006).
O efeito da territorial politics ocorre em vários países, como Estados Unidos, Itália, Espanha,
Alemanha, Índia, México e Brasil. Nestes países as relações de conito e cooperação entre a esfera
nacional e os governos subnacionais moldaram em boa medida políticas recentes de Saúde pública
contra a COVID-19. Em algumas dessas experiências, soluções federativas bem-sucedidas explicam
parte do êxito no combate à pandemia, como no caso alemão (Pleitgen, 2020). Nos casos norte-
americano e brasileiro, ao contrário, houve diculdades na luta contra a COVID-19, especialmente
por conitos e descoordenação intergovernamental.
Este artigo analisa como o federalismo afetou o combate à COVID-19 no Brasil sob a presidência de
Bolsonaro. Busca-se mostrar que as relações intergovernamentais já estavam em processo de mudança
antes desta crise, porém seus efeitos se intensicaram durante a pandemia, quando a necessidade
de um papel coordenador da União cou mais evidente. Isso porque crises sanitárias exigem forte
coordenação governamental, sobretudo em países federativos, como mostra o trabalho de Paquet e
Schertzer (2020), por meio do conceito de complex intergovernamental problem. Por esta razão, vem
surgindo uma literatura que analisa como a questão territorial afeta as políticas de combate ao novo
coronavírus (Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico [OCDE], 2020; Ramirez
de la Cruz, Grin, Sanabria‐Pulido, Cravacuore, & Orellana, 2020; Tulich, Rizzi, & McGaughey, 2020).
O marco analítico apoia-se na relação entre atores, instituições, políticas públicas e federalismo
(Pierson, 1995; Benz & Broschek, 2013). Baseando-se nesse parâmetro geral, a análise da
coordenação federativa no Governo Bolsonaro aponta que, no combate à COVID-19 no Brasil, houve
um confronto de dois modelos federativos. De um lado, o ideário e as estruturas da Constituição
de 1988 (CF/88), baseados em características cooperativas e forte coordenação federal. De outro,
a concepção bolsonarista de federalismo, norteada por uma visão fortemente centralizadora e
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hierárquica sobre questões com impacto nacional e dualista em relações intergovernamentais, o
que diminui a participação da União na redução de desigualdades territoriais e na ajuda a governos
subnacionais.
Do exposto, três questões chave emergem: quais as propostas e as efetivas mudanças do federalismo
sob Bolsonaro que foram intensicadas pela pandemia? Diante disso, quais as continuidades federativas
e novas estratégias adotadas por governos subnacionais – especialmente estados – que fazem diferença
no jogo federativo? Por m, qual o impacto dessas relações intergovernamentais sobre as políticas
públicas contra a COVID-19? Este último ponto é a principal contribuição do artigo ao campo da
Administração Pública.
2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Este estudo baseia-se numa análise qualitativa e histórico-institucional que lida com duas
temporalidades. A primeira refere-se aos trinta anos de relações intergovernamentais pós-1988 e
tem como ponto de partida a sistematização da literatura já consolidada sobre o tema. A outra diz
respeito ao processo em curso, no qual se busca mudar o padrão de distribuição do poder territorial
nas políticas públicas e sua concretização especíca no combate à COVID-19. Para compreender
esse fenômeno inconcluso, selecionamos ideários e eventos críticos (Capoccia & Kelemen, 2007)
representativos da tentativa bolsonarista de alterar o federalismo brasileiro, bem como as reações a
este modelo.
A discussão sobre a COVID-19 como evento crítico é a “linha de chegada” de uma análise segundo
a qual o governo Bolsonaro tem buscado, desde o início, mudar relações intergovernamentais, processo
que na pandemia tem sua forma mais intensa. Em termos contrafactuais: inexistindo a pandemia, não
existiria esse confronto? Nossa resposta é não, pois ele já vem ocorrendo desde 2019, foi escalando o
nível de enfrentamento e, com o surgimento da pandemia, esse acelera um processo em curso. Dada
a complexidade do fenômeno sanitário, as consequências negativas do padrão intergovernamental
bolsonarista se ampliam.
Realizou-se uma análise histórico-narrativa para embasar a leitura longitudinal, pois só é possível
discutir o federalismo bolsonarista em contraste com o desenho institucional pós-1988, baseado no
modelo cooperativo. Na análise da coordenação federativa durante a pandemia, optou-se pelo uso do
process tracing, método qualitativo capaz de reconstruir uma sequência de eventos ainda em andamento
(Beach & Pederson, 2013). Assim, a narrativa de “falas conjunturais” e documentos constituem o
recurso possível e necessário para analisar um fenômeno em curso, pois permite compreender o jogo
federativo adotado pelos entes subnacionais e pelo governo federal.
Nessa linha, realizou-se uma análise documental (legislação e declarações de representantes do
governo federal, de estados, municípios, do Congresso Nacional, Judiciário) e da cobertura da mídia,
acompanhando os passos do governo Bolsonaro desde seu início, com um recorte especial para os
primeiros meses da pandemia (fevereiro a junho de 2020). A referência aos conteúdos abordados
na imprensa perderia fôlego analítico e capacidade explicativa sem a referência histórico-narrativa
apresentada no Quadro 1, que apresenta a trajetória de medidas do governo federal antes e durante
a pandemia. Todas as iniciativas são guiadas por uma mesma lógica de revisão do federalismo
cooperativo derivado da CF/1988.
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QUADRO 1 EVENTOS CRÍTICOS NA TRAJETÓRIA DO FEDERALISMO BOLSONARISTA
(ATÉ JUNHO DE 2020)
Pré-pandemia Criação do Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares.
Renovação do Fundeb (PEC 15/15).
Mudanças nos programas federais de Educação.
Mudanças no Suas (extinção do Ministério, alterações no BPC).
Criação do Consórcio do Nordeste.
PEC do pacto federativo (PEC 188/2019).
Demanda presidencial para zerar ICMS sobre combustíveis.
Securitização das dívidas estaduais.
Fundo de Segurança Pública.
Mudança na composição do Conselho Nacional da Amazônia Legal sem representantes dos governos
subnacionais.
Durante a pandemia Criação do Comitê de Crise da COVID-19 sem representação subnacional.
Recursos do SUS não chegam aos estados.
Decisão de inconstitucionalidade sobre a Medida Provisória 926/2020.
Ações judiciais no Supremo Tribunal Federal (STF) de estados.
Promulgada PEC do Orçamento de Guerra (EC 106/2020).
Adiamento do ENEM.
Medidas originárias da PEC do Orçamento de Guerra.
Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus (LC 173/2020).
Mudança na metodologia de informações sobre a COVID-19 fornecidas pelo Ministério da Saúde.
Fonte: Elaborado pelos autores.
3. MODELOS DE FEDERALISMO E COORDENAÇÃO INTERGOVERNAMENTAL
No estudo das políticas públicas no federalismo, a coordenação intergovernamental é fundamental,
pois não é fácil compatibilizar a convivência entre autonomia e interdependência, que marca as
federações e seu processo decisório (Pierson, 1995). Aqui, há dois tipos ideais em confronto: os
modelos dual e cooperativo.
No federalismo dual, supõe-se que cada ente possua autonomia constitucional estrita sobre
diferentes áreas para impedir a centralização do poder (Loughlin, Kincaid, & Sweden, 2013). Seu
pressuposto é que governos locais gastam mais ecientemente, são mais accountable para suas
populações e políticas públicas, respondem melhor a particularidades locais. A coordenação federativa
seria contingente, circunstancial e, no limite, desnecessária, por ser prejudicial à eciência decisória
e à alocação de recursos.
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Hoje, o caso paradigmático de federalismo dual são os EUA. Após décadas de crescimento
de um modelo mais colaborativo (1930 a 1980), o presidente Reagan mudou a rota federativa,
descentralizando funções dos estados (devolution powers), bem como reduzindo a participação da
União no apoio e na articulação federativa. Esse padrão dualista tornou-se hegemônico, gerando
aumento da desigualdade e da competição interestadual (Kettl, 2020).
No modelo cooperativo, a autoridade compartilhada combina autonomia subnacional com
coordenação nacional. Sua disseminação ocorreu com a expansão do Welfare State após a Segunda
Guerra Mundial (Obinger, Leibfried, & Castles, 2005). Para garantir direitos universais, federações
combinaram processos centralizados (como financiamento, normatização e indução) com
implementação descentralizada e autônoma de políticas públicas. Assim, o modelo cooperativo não
contrapõe centralização e descentralização, trata-as como combinação e não como oposição (Broschek,
Petersohn, & Toubeau, 2017).
Em vez de dualismo, o que se exige é coordenação para compartilhar objetivos, de modo a reduzir
duplicação, sobreposição e desigualdades territoriais. Esse processo envolve muitas vezes formas
de participação e proteção dos governos subnacionais perante decisões federais, especialmente
mediante fóruns intergovernamentais que minimizam e/ou impedem ações unilaterais atuando como
federal safeguards(Schnabel, 2015). A crise da COVID-19 evidenciou a importância da coordenação
intergovernamental para combater a pandemia (OCDE, 2020; Tulich, Rizzi, & McGaughey, 2020).
Porém, nos Estados Unidos, o governo Trump radicalizou o modelo dualista ao responsabilizar
totalmente os estados, ou disputar protagonismo com eles. O avanço da doença foi avassalador. Essa
atuação suscitou a ideia do “federalismo darwinista”, que coloca entes uns contra os outros (Cook &
Diamond, 2020; Geltzer, 2020). Neste contexto, uma liderança nacional é essencial porque, conforme
disse o governador de Nova York, Andrew Cuomo, “state boundaries mean very little to the vírus.
No Brasil, o enfrentamento à COVID-19 evidencia o confronto dessas duas concepções de
federalismo. Opõem-se o modelo cooperativo, construído a partir da CF/88, e o projeto bolsonarista,
similar ao dualismo trumpista, baseado no sloganMais Brasil, Menos Brasília, isto é, menos ação
da União em políticas públicas.
4. O FEDERALISMO BRASILEIRO PÓS-1988: COMBINAÇÃO DE COORDENAÇÃO E AUTONOMIA
A Federação brasileira, originariamente, inspirou-se no dualismo norte-americano. O desenho
constitucional de 1891 propunha grande autonomia estadual, pouca intervenção da União e ausência
de coordenação federativa (Abrucio, 1998). Com a chegada de Vargas ao poder, iniciou-se uma
trajetória de grande transformação do federalismo, quando o papel da União cresceu continuamente,
especialmente nos períodos autoritários do Estado Novo e do Regime Militar (Arretche, 2012). Esta
centralização de poder enfraqueceu o federalismo e não redundou em cooperação, dado que os
governos subnacionais foram afastados das principais decisões políticas e de políticas públicas.
A redemocratização alterou o modelo federativo anterior, dando maior autonomia política,
administrativa e nanceira a estados e municípios. Contudo, essa descentralização foi contrabalançada
por políticas nacionais em prol da expansão de políticas públicas e do combate à desigualdade.
Assim, coube à União importante papel de coordenação federativa, mediante normatização, indução
e nanciamento (Abrucio, 2005; Arretche, 2012). A implementação cou a cargo dos governos
subnacionais, tornando-os centrais na expansão das políticas de welfare (Grin & Abrucio, 2018).
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O arranjo federativo pós-1988 exigiu equilibrar objetivos nacionais de welfare com sua
implementação descentralizada e autônoma. Para tanto, a criação de sistemas de políticas públicas
garantiu também a participação dos governos subnacionais no processo decisório federativo (Franzese,
2010). A cooperação federativa originada da CF/88 avançou incrementalmente, mas não teve trajetórias
nem resultados similares em todas as áreas. Neste processo, todos os presidentes dialogaram com
estados e municípios para fortalecer o pacto federativo e expandir políticas sociais.
Na área da Saúde, o caso mais paradigmático, o Sistema Único de Saúde (SUS), foi construído
na década de 1990. O modelo apoiou-se em diretrizes nacionais relacionadas a normatização
e redistribuição de recursos, implementação descentralizada e espaços institucionalizados de
participação social e negociação intergovernamental (Franzese & Abrucio, 2013). O SUS inspirou a
construção do Sistema Único de Assistência Social (Suas) em 2005, também ancorado na participação
social, redistribuição de recursos, fóruns federativos e serviços descentralizados e hierarquizados
(Bichir, Simoni, & Pereira, 2020).
Na Educação Básica, a CF/88 criou o conceito de regime de colaboração para lidar com a dualidade
de provisão dos serviços e baixa cooperação intergovernamental (Abrucio, 2010). Mas a coordenação
intergovernamental não ocorreu de imediato porque o apoio da União a governos subnacionais só
ganhou força a partir de 1996, quando se estabeleceram parâmetros mínimos nacionais, redistribuição
de recursos, monitoramento e avaliação de resultados (Segatto & Abrucio, 2018). Todavia, a falta de
fóruns federativos formais resultou num sistema de articulação mais frágil comparativamente ao
da Saúde e da Assistência Social. Ainda assim, todas as gestões federais conversaram com a União
Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e o Conselho dos Secretários Estaduais
de Educação (Consed).
A Federação brasileira ainda tem problemas de fragmentação, sobreposição, competição e
fragilidade de cooperação em alguns setores e no plano territorial (Grin & Abrucio, 2017). Só
que, mesmo com esses problemas, ela vinha avançando no reforço da coordenação e cooperação
intergovernamentais na provisão das políticas públicas. Esta transformação incremental e incompleta
do federalismo brasileiro foi contestada pelo presidente Bolsonaro, que, desde a posse, visa instaurar
um federalismo dualista similar ao vigente nos EUA. A eclosão da pandemia escancarou a proposta
bolsonarista e exacerbou conitos entre União e municípios e, principalmente, estados, aumentando
a descoordenação intergovernamental.
5. O SENTIDO DO FEDERALISMO BOLSONARISTA: MARCHA E CONTRAMARCHA
Bolsonaro foi eleito presidente com um discurso contra o sistema político e a “velha política. Como
parlamentar colocou-se contra a redemocratização do país ao constantemente defender o regime
militar, mesmo após eleito (Campos, 2019). Seu governo tem como principal adversário os ideais da
CF/88, principalmente a expansão da atividade governamental gerada pelo crescimento dos direitos
de cidadania e os checks and balances reforçados pelo novo arcabouço constitucional. Seu projeto
neopopulista defende uma democracia sem mediações ou scalização institucional das relações entre
governante e povo (Urbinati, 2019).
O federalismo cooperativo, central na CF-88, também foi atingido pela visão bolsonarista com
o slogan “Mais Brasil, Menos Brasília. Aparentemente vinculado à transferência de poder a quem o
deve ter de direito, esse bordão alicerça uma visão de Estado que combina ultraliberalismo econômico
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com antiliberalismo político. O primeiro propõe redução drástica da intervenção governamental,
secundarizando até mesmo a desigualdade; o segundo busca debilitar controles institucionais em
nome de um presidencialismo imperial, aliado a uma postura schmittiana da política, que considera
opositores inimigos a serem destruídos (Schmitt, 1992).
Baseado nesses fundamentos, Bolsonaro atuou segundo a lógica de um tripé federativo. O primeiro
suporte diz respeito à divisão rígida de funções entre níveis de governo. Responsabilidades deveriam
ser repassadas a estados e municípios concomitantemente à diminuição drástica de participação da
União no nanciamento e apoio à redução das desigualdades territoriais. O pressuposto é de que
estados e municípios são mais ecientes nas decisões de alocação de recursos, assim a União deveria
intervir minimamente. O resultado seria aumentar a desigualdade entre governos subnacionais na
provisão de serviços.
O segundo pilar reforça o dualismo pelo lado da concentração autocrática nas mãos da União
em decisões que afetam entes subnacionais. Há pouquíssimo espaço para diálogo, negociação ou
participação subnacional em programas federais. Os exemplos são vários, mas o pior ocorre em
relação à região amazônica: o conselho criado para cuidar desta questão excluiu governadores da
região da estrutura de governança.
A concepção de federalismo bolsonarista também contempla, como último pilar, o confronto
intergovernamental e a luta constante contra adversários reais ou imaginados. Mobiliza a lógica de
guerra para atiçar seu eleitorado e marcar posição antissistema. Os maiores inimigos são as instituições
e suas lideranças, pois sua visão do presidencialismo repudia a negociação institucional e os checks
and balances do Estado brasileiro, entre os quais está o federalismo.
Seguindo essa lógica política, Bolsonaro confrontou a Federação por dois motivos. Primeiro, a
recusa dos entes subnacionais a políticas do bolsonarismo. Como estados e municípios são os principais
responsáveis pela implementação na área social, podem mudar o rumo das decisões tomadas em
Brasília. Soma-se a isso a disputa da Presidência com prefeitos e, sobretudo, governadores, vistos
como atores que podem mobilizar a opinião pública, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal
Federal (STF) em disputas federativas, além de poderem se tornar competidores ou aliados dos maiores
adversários eleitorais do presidente. Ao longo da pandemia, esse confronto federativo disseminou-se
e os governos subnacionais produziram cartas de repúdio a decisões do governo federal.
A combinação de lógica federativa compartimentalizada, autocrática e confrontadora evidenciou-
se com a pandemia. Porém eventos críticos anteriores já realçavam essa lógica do federalismo
bolsonarista em quatro importantes agendas. A primeira delas ocorre no campo das políticas públicas,
nas quais se tentou desmantelar a dinâmica cooperativa formal e informal. Um exemplo contundente
foi na educação, visto que o MEC desconsiderou posições dos entes subnacionais em temas como
expansão das escolas cívico-militares, alfabetização ou ações em relação à COVID-19. Como resposta,
prefeitos e governadores tomaram decisões desprezando propostas do governo federal.
Esse tipo de conito federativo também ocorreu em outros setores. Na política ambiental
da Amazônia, os governadores foram rechaçados. Na segurança pública, o Ministério da Justiça
abandonou o Sistema Único de Segurança Pública (Susp), reduzindo a cooperação com estados (Lima
& Bueno, 2020). Na experiência mais dramática, o combate à pandemia da COVID-19, chocaram-se
o modelo bolsonarista e o SUS.
O segundo evento crítico concerne à agenda legislativa, particularmente à “PEC do pacto
federativo” (PEC 188, 2019). Ela se orienta pela tríade “desobrigar, desindexar e desvincular”, e busca
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exibilizar o orçamento devolvendo ao Congresso Nacional o protagonismo sobre decisões alocativas
dos entes federativos. No entanto, a concepção de “Mais Brasil, Menos Brasília” reduz a importância
da coordenação federativa e tende a ampliar a desigualdade regional. Trata-se de uma nova agenda,
em que a junção entre federalismo e nação perde propósito.
Um terceiro evento crítico consistiu na mudança no posicionamento do STF ao julgar conitos
de competência entre União e governos subnacionais. Historicamente, a tendência é decidir em favor
da União (Halberstam, 2008). Canello (2017) aponta que, da CF/88 até 2015, de 920 processos sobre
conitos intergovernamentais, 81% foram favoráveis à União e 13% favoráveis aos estados. Com
Bolsonaro, entretanto, o STF tem decidido claramente em favor dos entes subnacionais. Na mais
importante dessas decisões, o Supremo decidiu que União, estados e municípios têm competência
concorrente para atuar em questões sanitárias e podem estabelecer medidas restritivas para combater
a pandemia sem aval do governo federal.
Por m, como elemento marcante de reação ao federalismo bolsonarista, o Fórum de Governadores
e o Consórcio do Nordeste fortaleceram a cooperação horizontal e supriram lacunas deixadas pela
União. A crise gerada pela pandemia da COVID-19 evidenciou a necessidade de maior colaboração
e transformou essas arenas em contrapontos às iniciativas presidenciais, sobretudo porque os
governadores foram mais aderentes ao isolamento social, em contraposição à omissão presidencial.
6. COMBATE À COVID-19 E FEDERALISMO BOLSONARISTA: PARADIGMA DE DESCOORDENAÇÃO
INTERGOVERNAMENTAL
No combate à COVID-19, a lógica federativa bolsonarista ganhou feição mais dramática,
pois a pandemia é um complex intergovernmental problem, exige ainda mais coordenação
intergovernamental que políticas corriqueiras. Em vez de mudar de rota, o presidente Bolsonaro
radicalizou sua proposta federativa. O modelo compartimentalizado, autocrático e de confronto se
robusteceu, enquanto governos subnacionais, especialmente governadores, reagiram rearmando
a cooperação e a ativação do SUS como paradigma de governança sanitária. Contudo imperou a
lógica de reduzir a coordenação federal.
O primeiro ponto a destacar é a divergência entre presidente da República e o Ministério da Saúde,
culminando na exoneração do ministro Henrique Mandetta. Após o início da crise, o então titular
da pasta imbuiu-se do papel de dirigente do SUS, enaltecendo-o. Demitido, escreveu o seguinte tuíte:
Acabo de ouvir do Presidente Jair Bolsonaro o aviso da minha demissão do Ministério da Saúde.
Quero agradecer a oportunidade que me foi dada, de ser gerente do nosso SUS, de pôr de pé
o projeto de melhoria da saúde dos brasileiros e de planejar o enfrentamento da pandemia do
coronavírus, o grande desao que o nosso sistema de saúde está por enfrentar [...]” (Grifo nosso).
O elogio de Mandetta ao SUS, por duas vezes, é signicativo, pois o ex-ministro provém do
setor privado da Saúde. Isso mostra como a polarização no governo pode ser vista não apenas em
torno da dicotomia isolamento social versus retomada da economia, mas como resiliência dos
arranjos institucionais criados com a CF/88 versus a nova dinâmica bolsonarista de federalismo. Na
polarização entre Bolsonaro e Mandetta, evidenciaram-se duas visões de federalismo: a da CF/88,
representada no SUS, e a nova visão, que combina devolution powers e autocratismo ao lidar com
demandas subnacionais.
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Houve resiliência institucional, pois arranjos federativos ainda pesam, embora atualmente
funcionem de maneira menos pactuada. O presidente do Conselho Estadual dos Secretários de Saúde
(Conass) tem sido apartado das decisões do Ministério da Saúde. O protagonismo de Mandetta e
o isolamento de seu sucessor, Nelson Teich, foram absolutos em um sistema baseado na pactuação
intergovernamental. No início da pandemia, governadores e prefeitos armaram que recursos não
chegavam, algo anormal para o SUS, considerando a longa trajetória de funcionamento da transferência
fundo a fundo (Bertoni, 2020). A desarticulação federativa piorou com a chegada do ministro Teich.
O representante do Conass, principal estrutura do SUS de diálogo e negociação federativa, sequer
foi convidado a participar de sua posse (Conass, 2020).
A descoordenação intergovernamental no enfrentamento da COVID-19 aumentou com o
conito entre presidente e governadores, o que cou explícito na decisão sobre o estabelecimento do
isolamento social. Nesta questão, três fatores conuíram: 1) opção do projeto federativo bolsonarista
pelos devolution powers; 2) arcabouço de regras da CF/88 e seu blend de cooperação e autonomia;
3) legado prévio de políticas públicas. Numa federação como a brasileira, com seu sistema político
altamente consensual, tal discussão chegou ao STF.
Quanto à opção pelos devolution powers, Bolsonaro se desobrigou da ação de combate à COVID-19
e demorou a se pronunciar sobre o vírus. Desde o início preocupado com a economia, minimizou a
gravidade da situação ao ver superdimensionado o poder destruidor do vírus (Vasconcelos, 2020).
No caso de federações, essa omissão pode gerar preempção de políticas públicas: ação subnacional
pioneira em determinada área que provocaria diculdades de posterior ação federal em virtude
da institucionalização da política no tempo (Pierson, 1995). Foi exatamente o que ocorreu na
determinação do isolamento social, que acabou liderada pelos governadores.
A ação dos estados aumentou o tom de confronto no discurso do presidente, que disse “tem
certos governadores que estão tomando medidas extremas, que não competem a eles, como
fechar aeroportos, rodovias, shoppings e feiras. E segue provocativamente numa entrevista coletiva:
Tem um governo de Estado que só faltou declarar independência. Como reação, os governadores
criticaram fortemente a postura centralizadora e sem diálogo do governo federal em documentos
assinados quase unanimemente (Soares, 2020).
Optando pelo confronto, Bolsonaro ameaçou exibilizar as medidas de isolamento adotadas
pelos governadores, mas foi desautorizado pelo STF em medida cautelar proposta pela Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB). A decisão baseou-se nas competências compartilhadas em Saúde (artigo 23
da CF/88), presentes no federalismo cooperativo subjacente à Constituição.
Quanto ao legado da política pública, a pandemia contrapôs dois modelos de federalismo. A
Saúde é a área que melhor representa o arranjo institucional desejado pela CF/88 na articulação entre
política pública e federalismo: cooperação, transferência de recursos fundo a fundo, universalização
da atenção e gratuidade. Este legado é posto à prova pelo projeto bolsonarista de federalismo.
O Comitê de Crise da COVID-19, sem representação estadual e municipal, ilustra essa concepção
de um federalismo dualista radicalizado com comando centralizado. Ao mesmo tempo, a reação
dos governadores para sustentar suas iniciativas e defender o SUS é positiva para o federalismo. A
pandemia acelerou e desnudou um jogo federativo que já estava em curso, cuja disputa organiza-se
em torno dos modelos dualista e cooperativo.
O exemplo que melhor ilustra essa situação é a edição da LC 173 (2020), que “estabelece o Programa
Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus. O principal ponto da lei é exibilizar alguns limites da
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Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), acrescidos àqueles já exibilizados pelo próprio art. 65 da LRF
para calamidade pública, e estabelecer critérios de distribuição de R$ 60 bilhões em transferências
federais para estados e municípios (40% por taxa de incidência da doença e 60% por população). Dois
pontos chamam atenção: a lei é de 27 de maio e apresenta um dispositivo que menciona impedimento
ao auxílio pelo município ou estado que não renunciar à ação ajuizada contra a União solicitando
auxílio nanceiro relacionado ao coronavírus.
A data impressiona, pois apenas no nal de maio a União decidiu organizar a distribuição de
recursos. A demora se explica, pois foi necessário, primeiro, viabilizar a possibilidade de recursos
extras – o que foi feito com a aprovação da Emenda Constitucional 106, de 07 de maio de 2020, a
qual instituiu o chamado “orçamento de guerra. Fazê-lo por lei é outra surpresa, pois o SUS costuma
decidir por meio de fóruns federativos compostos por membros do Executivo.
As Comissões Intergestores, desde a década de 1990, decidem sobre a distribuição de recursos
por meio das normas operacionais básicas, emitidas pelo Ministério da Saúde. A aprovação por lei
mostra o protagonismo do Congresso Nacional, uma vez que estados e municípios têm conseguido
melhor comunicação no cenário atual. Outro ponto sobre as ações judiciais é que este fato revela não
apenas a forma hierárquica com que a União enxerga as relações intergovernamentais, mas também
evidencia como os repasses fundo a fundo do SUS realmente não estavam funcionando na lógica
bolsonarista de devolution powers.
A redução conjuntural do papel da União aumentou a descoordenação intergovernamental e a
desigualdade entre estados e municípios. O conito intergovernamental dicultou a tomada de decisões
nacionais, como normas sobre isolamento social, distribuição de recursos e equipamentos médicos.
Nessa situação, o Consórcio do Nordeste e estados como São Paulo e Maranhão tomaram decisões que
geram competição horizontal e vertical por escassos insumos para o combate à COVID-19. Mesmo
no que se refere a outras políticas, como a econômica e a educacional, não ocorreram articulações
federativas para atuar contra a pandemia.
7. CONCLUSÃO
O federalismo brasileiro mudou substancialmente nas últimas décadas. O nal do Regime Militar e
a CF/88 permitiram assentar as bases de uma federação democrática, descentralizada, participativa
e mais cooperativa, que alteraram o padrão anterior autoritário e centralizado.
Porém, o caminho aberto pela lógica federativa bolsonarista desequilibrou os pilares da engenharia
institucional que emergiram após 1988, com sua aposta num modelo dualista, autocrático e de
confronto intergovernamental. As disputas entre o presidente e os governadores relacionadas à
autoridade para determinar o isolamento social, por exemplo, evidenciam essa questão.
Como decorrência do projeto federalista bolsonarista, os efeitos negativos no combate à COVID-19
revelaram-se signicativos. O ápice desse processo ocorreu quando o Ministério da Saúde acusou
os estados de mentirem sobre o número de mortos pela pandemia, deixando de informar com a
periodicidade anterior o número de vítimas e infectados, colocando sob suspeição todo o modelo
cooperativo do SUS.
O confronto e a descoordenação intergovernamentais, provocados pela falta de liderança da União,
geraram desperdício de recursos, sobreposição de ações, redução dos ganhos de escala oriundos
da coordenação federativa e prejuízos à garantia dos direitos sociais construída ao longo dos anos.
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O fato é que esse desarranjo federativo foi uma das principais causas para os péssimos resultados
alcançados em relação ao número de doentes e de mortos. São dados que colocam o país numa posição
desconfortável no cenário internacional.
Entretanto, um cenário diferente pode emergir da crise sanitária: o aprendizado sobre a
importância do federalismo cooperativo no país, não só no funcionamento cotidiano das políticas
públicas, mas, sobretudo, nos momentos em que predominam situações de complex intergovernmental
problem. O período pós-pandemia deve gerar situações muito complexas em termos de crise social
e econômica, tendendo a reforçar ainda mais a importância da cooperação intergovernamental na
Saúde, além de outras áreas, como Educação e Assistência Social, mobilizando-as na reconstrução
da sociedade brasileira.
Se o país realmente aprenderá que preservar um federalismo cooperativo é essencial para evitar
novos fracassos, ainda é uma questão em aberto. Mas o exemplo da descoordenação intergovernamental
no enfrentamento da COVID-19 cará registrado como uma triste página de nossa história.
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Fernando Luiz Abrucio
https://orcid.org/0000-0002-3883-9915
Doutor em Ciência Política; Professor na Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação
Getulio Vargas (FGV EAESP). E-mail: fernando.abrucio@fgv.br
Eduardo Jose Grin
https://orcid.org/0000-0002-0488-8487
Doutor em Administração Pública e Governo; Professor na Escola de Administração de Empresas de São Paulo
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Cibele Franzese
https://orcid.org/0000-0001-7441-2831
Doutora em Administração Pública e Governo; Professora na Escola de Administração de Empresas de São
Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV EAESP). E-mail: cibele.franzese@fgv.br
Catarina Ianni Segatto
https://orcid.org/0000-0002-5094-8225
Doutora em Administração Pública e Governo; Professora visitante no Programa de Pós-Graduação em Políticas
Públicas da Universidade Federal do ABC (UFABC). E-mail: catarina.segatto@gmail.com
Cláudio Gonçalves Couto
https://orcid.org/0000-0003-0153-1877
Doutor em Ciência Política; Professor na Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação
Getulio Vargas (FGV EAESP). E-mail: claudio.couto@fgv.br
... A crise sanitária resultante da pandemia de Covid-19 no Brasil intensificou as necessidades de aperfeiçoamento das formas de comunicação governamental, particularmente sobre o setor público de saúde 1,17,18 e ampliou as tensões para o exercício das funções do Sistema Único de Saúde (SUS) 19,20 . ...
... O Ministério da Saúde e as Secretarias de Saúde são as autoridades sanitárias em cada uma das três esferas de poder do país, compartilhando a autonomia e as responsabilidades da gestão do sistema. A crise desencadeada pela Covid-19 expôs conflitos no contexto das relações intergovernamentais e entre os representantes dos três poderes do Estado brasileiro 19,20,21 . O cenário de conflitos, disputas e descoordenação 19 subsequente à declaração do período de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional - ESPIN 22 ampliou as tensões e expectativas sobre a ação dos níveis subnacionais no enfrentamento da crise 19,20,21,23 . ...
... A crise desencadeada pela Covid-19 expôs conflitos no contexto das relações intergovernamentais e entre os representantes dos três poderes do Estado brasileiro 19,20,21 . O cenário de conflitos, disputas e descoordenação 19 subsequente à declaração do período de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional - ESPIN 22 ampliou as tensões e expectativas sobre a ação dos níveis subnacionais no enfrentamento da crise 19,20,21,23 . ...
Article
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O artigo apresenta os resultados de estudo sobre Comunicação Digital Governamental (CDG) no Brasil, realizado mediante visita aos sítios eletrônicos das Secretarias Estaduais de Saúde (SES) durante o primeiro ano da crise causada pela pandemia de Covid-19. Trata-se de estudo exploratório, transversal, com abordagem qualitativa e coleta de dados em ambiente digital, cujos objetivos consistiram em analisar os sítios eletrônicos das SES e estimular o debate sobre o papel que ocupam na governança do Sistema Único de Saúde (SUS). Os resultados revelaram heterogeneidade das informações sobre os fóruns de governança estadual do SUS (Comissões Intergestores Bipartite e Conselhos Estaduais de Saúde); diversidade nas informações sobre a Covid-19 e nos dados relativos às receitas e despesas governamentais do setor saúde. Foram identificadas experiências residuais de conteúdos em línguas diferentes do português, raras situações de prestação de serviços por telessaúde e ausência de espaços de interação direta entre os cidadãos e as equipes das SES. Espera-se que o momento de mudanças causado pela Covid-19 represente uma oportunidade de debate e inovação das práticas de CDG adotadas por estas instâncias gestoras do SUS
... Esta análise não inclui a Política Nacional de Alfabetização (PNA), também do governo federal (2019-2022), e os programas dela derivados, pois o regime de colaboração dessa política é apresentado em seus documentos normativos apenas como uma das intenções do MEC perante as possíveis adesões dos municípios ao programa. Há ausência de um pacto federativo, é mais um caso de "descoordenação intergovernamental" (Abrucio et al., 2020). Isso porque a própria Portaria do Ministério da Educação, nº 280, de 19/02/2020, que regulamenta o programa reporta-se diretamente aos municípios, sem menção aos estados, reduz a colaboração dos municípios a aspectos logísticos de transporte e espaço físico, prestação de informação ao MEC para monitorar o programa e delega aos municípios o estabelecimento de redes locais para "multiplicação dos conteúdos de cursos de formação continuada" (Brasil, 2020b). ...
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Este estudo analisa o papel da União e as complexidades (substantiva, estratégica e institucional) que caracterizam a governança de redes de duas políticas nacionais de alfabetização formuladas nos últimos dez anos no Brasil: ) Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (Pnaic) e o recente Compromisso Nacional Criança Alfabetizada. Realiza-se o mapeamento dos atores visíveis, as arenas, as regras formais e os recursos disponíveis. O intuito da análise comparada é refletir sobre a governança de redes nessas políticas, considerando a ausência de uma instância de coordenação federativa no campo educacional que opere na formulação e implementação dessas políticas. Como resultado, observa-se que o papel da União nas políticas em questão oscila entre um modelo de governança hierárquica e um modelo de governança multinível e novos elementos são inaugurados na configuração das arenas na política mais recente.
... Além das graves ameaças ao sistema social mundial (Peci, 2020), a situação tornou o contexto das políticas públicas ainda mais complexo. No Brasil, além dos conflitos distributivos e morais (Peci, 2020), a pandemia foi agravada pelo modelo dualista, autocrático e de confronto criado pela lógica federativa bolsonarista, que levou à inexistência de uma organização nacional (Abrucio, et al., 2020), exigindo medidas ágeis, firmes e eficientes num curto espaço de tempo, num contexto imprevisível (Silva & Sena, 2022). ...
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Introdução: O isolamento social restringiu as vivências lazer, exigindo o uso de tecnologias da informação e comunicação no fomento de atividades físicas de lazer no contexto da moradia. Objetivos: Identificar as Instituições Federais de Ensino Superior que fomentaram atividades físicas de lazer durante a pandemia; analisar os tipos de atividades físicas promovidas, as tecnologias da informação e comunicação utilizadas e suas relações com as dimensões da educação midiática. Metodologia: Trata-se de estudo documental, longitudinal retrospectivo, com análise quali-quantitativa de relatórios produzidos. Resultados: The 51 institutions that took part in the survey carried out by ANDIFES carried out 4,005 actions and benefited 44.52 million people. Only 29.41% (15) of the institutions developed actions, corresponding to 0.69% (29) of the total number of actions carried out. The most common types of materials were leaflets/guides/manuals (39.98%) and videos (28.57%) available on the website (31.09%) and YouTube (21.40%). Among leisure-time physical activities, muscle strengthening (32.00%) and stretching (20.00%) predominated. Discussão: As alternativas promovidas pelas tecnologías de informação indican a urgência na formação de profissionais de Educação Física capacitados para lidar com o uso dessas ferramentas, haja vista as divulgades enfrantadas. Em que pese uma alternativa, importante se faz que intervenções no ámbito do lazer superem a vertente funcionalista. Conclusões: Conclui-se que as tecnologias da informação e comunicação figuraram como ferramentas metodológicas que oportunizaram as atividades físicas de lazer em projetos de extensão durante a pandemia, embora limitadas as dimensões metodológica e produtiva da educação midiática e aquelas mais leves.
... Generally, these speeches did not result in concrete government action in line with what was being said, and this for two reasons. Firstly, because pressure from public opinion and other political agents compelled the government to take a different course-as in the case of vaccination against Covid-19, which began against Bolsonaro's express wishes, and he had to give in to pressure (Abrucio et al., 2020). ...
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This paper examines the governance model of President Jair Bolsonaro, which is distinguished by a movement-government approach that gives precedence to ideological agendas and social mobilization over the formulation and implementation of public policies. The tenure of President Jair Bolsonaro is characterized by a consistent disregard for effective governance principles, with a focus on the dismantling of long-standing policies and state bureaucracy. The paper elucidates the interrelationship between ideology and public policy, underscoring the cultural war as a central aspect of Bolsonaro's governance. Furthermore , the paper examines the coexistence of two extremist perspectives within the government: the neoliberal agenda of reducing the state apparatus and the anti-systemic objective of destroying the institutional structure established by the 1988 Constitution. The analysis illuminates the distinctive features of Bolsonaro's model, contrasting it with other populist movements globally, and examines the implications for public administration and policy continuity in Brazil.
... The fact is in line with the limitation evidenced of Leite et al. [33]: the difficulty in implementing information regarding the performance of laboratories trained to face SARS-CoV-2 in the Regions of the Americas. Furthermore, some countries such as the United States and Brazil faced some difficulties in combating the Covid-19 pandemic due to political conflicts and intergovernmental [34] conflicts, as well as the federal government's lack of leadership in implementing actions aimed at fighting mitigating the disease among the three federative entities [35]. ...
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This study aims to analyze the diagnostic readiness to Covid-19 and the genomic surveillance of SARS-CoV-2 in Brasília, the capital of Brazil. This is a retrospective, cross-sectional study, with data from: cases/deaths—Ministry of Health; RT-PCR analyses Brasília Central Public Health Laboratory (LACEN); genomics—Global Initiative on Sharing All Influenza Data (GISAID). It was found that in March 2021, with the Gamma variant was predominant, RT-PCR diagnostic tests administered by LACEN reached their peak, followed by a reduction, possibly due to the start of vaccination. New peaks were observed in September 2021 and January 2022. The average time for releasing RT-PCR results was reduced from eight days (July 2020), to around eight hours in 2023. The participation of private laboratories was evident in sequencing the SARS-CoV-2 variants of concern in Brasília (n = 1,897). LACEN sequenced 50% of the samples received (571). A decrease in the incidence of cases and deaths due to Covid-19 was noted in the years 2022 to 2023, following the national trend. LACEN maintained RT-PCR diagnostic tests administered satisfactorily throughout the period. Regarding the genomic surveillance of SARS-CoV-2, the vast majority of samples were sequenced by private laboratories when compared to the public laboratory.
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O sistema de saúde público do Pará enfrentou desafios estruturais e operacionais, seja na rede hospitalar concentrada nos centros urbanos, deficiência de leitos de UTI em regiões remotas ou mesmo a falta de equipamentos modernos e deficiência na manutenção de unidades de saúde. Assim, objetivou compilar de forma sistemática as principais normas jurídicas de saúde pública estadual que regulamentaram o processo de combate à pandemia da COVID-19 no estado. Trata-se de um estudo exploratório de base documental, que utilizou normas que tratassem direta ou indiretamente o combate à pandemia, entre 2020 a 2022. Foi registrado desde o início da pandemia, 625.518 diagnosticados e 17.091 óbitos relacionados ao coronavírus e ao menos. Apesar dos esforços coletivos, medidas de prevenção sanitária e de isolamento se mostraram pouco efetivas tanto da parte dos governos como de empresas e na sociedade, e fez com que a pandemia da COVID-19, associada a fatores demográficos e à mobilidade/fluxos no território, se instalasse em todo território. Foi possível inferir direta e indiretamente a atuação da gestão no combate à doença, e como legado, forçou a modernização da gestão pública e mostrou a importância de uma governança eficiente e preparado para crises nos mais diferentes aspectos.
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This database provides a comprehensive overview of the health regulations issued by the state governments of Brazil over the COVID-19 pandemic. For this compilation, we gathered and analyzed the regulatory frameworks of health policies developed by Brazil’s 27 states from February 2020 to October 2021, covering the first three waves of COVID-19 in the country. As a result, we have an original dataset of Subnational Regulation data, comprising over 4,000 norms related to COVID-19 in the field of health. This database aims to contribute to the understanding of state responses to the pandemic, considering the federative configuration and the autonomy of local authorities. state governments; federalism; COVID-19; healthcare policies; public policies
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This database provides a comprehensive overview of the health regulations issued by the state governments of Brazil over the COVID-19 pandemic. For this compilation, we gathered and analyzed the regulatory frameworks of health policies developed by Brazil’s 27 states from February 2020 to October 2021, covering the first three waves of COVID-19 in the country. As a result, we have an original dataset of Subnational Regulation data, comprising over 4,000 norms related to COVID-19 in the field of health. This database aims to contribute to the understanding of state responses to the pandemic, considering the federative configuration and the autonomy of local authorities. state governments; federalism; COVID-19; healthcare policies; public policies
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This chapter delves into the nuances of the Brazilian far-right’s discourse within the global transnationalization of far-right groups, movements, and political parties. It argues that while Brazil imports certain behaviors and discourses from the organized far-right in other regions, it simultaneously infuses these repertoires with local characteristics tailored to specific contexts. Four peculiarities of the Brazilian far-right’s reconstruction and reinterpretation of enemies within the local context are identified: (a) regional xenophobia in contrast to global migration trends; (b) heightened use of hate speech targeted at Lula da Silva and the Brazilian Workers’ Party (PT), surpassing the generic critique of communism; (c) undermining the significance of COVID-19 pandemic health recommendations; and (d) engagement in attacks against the press and the strategic use of journalistic discourse.
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Este artigo objetiva analisar as normativas formuladas pelo governo cearense para organizar a rede de ensino durante a pandemia do novo coronavírus, com foco no Programa Aprendizagem na Idade Certa (Mais Paic). A partir da literatura sobre coordenação e cooperação interfederativa, realiza um levantamento bibliográfico e uma análise documental dos decretos e outros materiais publicados pelo governo estadual. A análise documental selecionou 100 decretos e 11 normatizações orientadoras à ação dos municípios, de março de 2020 a abril de 2022. Dos decretos, 80 tratavam da educação. Os materiais foram analisados por: período de promulgação e implicações sobre a educação. O Programa é uma política organizada pela Secretaria da Educação (Seduc) do Ceará que visa o regime de colaboração entre municípios e o estado na educação; neste contexto, o governo promulgou normativas que visavam dar norte aos secretários municipais de educação, gestores e professores durante a pandemia. O governo cearense e a Seduc promoveram orientações e formações às equipes da Educação, com uma série de transformações no desenho do Programa, buscando garantir a aprendizagem dos alunos e auxiliando os agentes implementadores. Desta forma coordenou a política educacional e colaborou com os municípios na pandemia.
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This article addresses institutional and managerial changes of Brazilian municipalities in the context of the new constitutional order that strengthened their autonomy as federative entity and the decentralization of public policies. The municipal governments started to demand a greater level of administrative management when assuming their new responsibilities. This work shows how these requirements include the management of financial areas, human resource, IT and organizational topics. It is argued that the decentralization of policies and municipal autonomy set by the 1988 Federal Constitution were not followed by an increase in the State capacities required for the new attributions. The decentralization assumes the explanatory function of an independent variable and the modernization of State capacities is the dependent variable. A quantitative research is carried out based on descriptive statistics, in a longitudinal analysis, with the objective of capturing the effect of the independent variable in almost 30 years. The paper concludes that the capacities of Brazilian municipalities did not advance to the challenges arising from the decentralization of policies initiated after 1988. In the four central areas of management there are significant challenges to qualify the municipal management. This is more evident in municipalities with a population up to 50 thousand inhabitants in which several indicators show a worse situation compared to the largest. Considering decentralization as independent variable, its effect over the modernization of municipal administrations has been reduced, which in practice affects the autonomy of this federative entity defined in the Federal Constitution. This is a relevant consideration since the Brazilian federation chose to expand municipal attributions in the field of public policies over the last 30 years. Still, efforts to provide conditions to this purpose at the municipal level have not been very successful.
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The COVID‐19 pandemic has created a crisis that is challenging national and local governments to innovate in their response to novel problems. Despite similarities to the challenges confronted in developed countries, Latin American governments face these problems amplified by structural obstacles such as social inequalities. These countries need to respond with capacities and resources often limited by spoils systems, as well as social and political polarization. In this context, we provide an overview of some innovative practices happening in Argentina, Brazil, Chile, Colombia, and México. In particular, we concentrate on some salient collaborative efforts in the region. To draw some lessons from these practices, we focus on the formal and informal institutions that facilitate or obstruct collaborations across jurisdictions. Moreover, we discuss our findings in terms of transaction costs for collaboration identified in these experiences.
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COVID-19 as a Complex Intergovernmental Problem - Mireille Paquet, Robert Schertzer
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Sistemas nacionais de políticas públicas definem os macroparâmetros para a implementação, com potencial para induzir agendas, disseminar capacidades institucionais e gerar certa convergência nos padrões de provisão no nível subnacional. Neste artigo, testamos se tais efeitos de coordenação ocorrem mesmo em uma área recentemente estruturada como política pública: a assistência social. À luz dos instrumentos de coordenação definidos pelo Sistema Único de Assistência Social (Suas), o presente trabalho tem um duplo objetivo. Primeiramente, analisamos os níveis gerais de implementação dos serviços de proteção básica ofertados pelas unidades do Centro de Referência de Assistência Social (Cras), unidades mais capilares para prestação dos serviços, verificando se os parâmetros nacionais incrementaram o nível geral de implementação e reduziram desigualdades. Em segundo lugar, verificamos se capacidades institucionais locais estão relacionadas com a implementação. Avançamos empiricamente, em relação à literatura disponível, ao construir indicadores originais para mensurar a implementação dos serviços; com base em dados do Censo Suas do período entre 2011 e 2016, elaboramos indicadores para caracterizar a provisão de serviços e benefícios, assim como os recursos humanos e a estrutura física das unidades do Cras. Os resultados indicam que, de fato, houve incremento nos níveis de implementação ao longo do tempo, com tendência à convergência entre esses equipamentos em todo o Brasil e entre regiões e municípios de diversos portes. Uma parte dessa variação é explicada pelas capacidades locais. Embora positiva, essa associação é fraca, o que ressalta a importância de estudos sobre os contextos de implementação e a governança multinível.
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Resumo A literatura sobre federalismo aponta que a coordenação do governo federal tem papel central para garantir maior consistência às políticas sociais dos governos subnacionais. Este artigo buscou compreender o papel das relações intergovernamentais nas políticas municipais de educação. Apesar de a Constituição Federal determinar a colaboração entre os entes federados, há diferentes modelos de relacionamento entre estados e municípios na política educacional. Esta pesquisa comparou quatro estados - Ceará, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Pará - com modelos distintos de relacionamento com o objetivo de identificar seus resultados nas políticas municipais. A análise de questionários e entrevistas semiestruturadas mostra que o tipo de cooperação tem implicações na capacidade institucional e financeira, na coordenação das políticas municipais e na implementação de políticas federais.
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El artículo aborda los cambios institucionales y gerenciales de los municipios brasileños en el contexto de la nueva orden constitucional que fortaleció su autonomía como ente federal y la descentralización de políticas públicas. Los gobiernos municipales pasaron a demandar un nivel mayor de organización administrativa al asumir nuevas responsabilidades. El trabajo muestra como eso alcanza a la gestión de las áreas financieras, de personal, de tecnología de información y de organización administrativa. Se argumenta que la descentralización de políticas y la autonomía municipal consignadas en la Constitución Federal de 1988 no fueron seguidas del incremento de las capacidades estatales necesarias para las nuevas atribuciones asumidas. La descentralización asume la función explicativa de variable independiente y la modernización de las capacidades estatales es la variable dependiente. Se realiza un estudio cuantitativo apoyado en estadísticas descriptivas, en un análisis longitudinal, teniendo como objetivo captar el efecto de la variable independiente en casi 30 años. Se concluye que las capacidades de los municipios brasileños no avanzaron para responder a los desafíos provenientes de la descentralización de políticas iniciadas después de 1988. En las cuatro áreas centrales de la gestión existen desafíos significativos para calificar la gestión municipal. Esta es una realidad más pronunciada en los municipios con población de hasta 50 mil habitantes en los cuales varios indicadores muestran una situación peor en comparación con los más grandes. Considerando la descentralización como variable independiente, su efecto sobre la modernización de las administraciones municipales ha sido reducido, lo que, en la práctica, afecta la autonomía de este ente federativo definido en la Constitución Federal. Esta es una consideración importante, pues la Federación brasileña eligió ampliar las competencias municipales en el campo de las políticas públicas a lo largo de estos 30 años. Todavía no han sido muy exitosos los esfuerzos para proveer condiciones con esta finalidad en el nivel municipal.
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Resumen El artículo analiza la evolución del consorcio intermunicipal en Brasil bajo el institucionalismo histórico. El estudio se realizó por medio de una revisión de la literatura, análisis documental y estadísticas descriptivas. El argumento teórico es que antecedentes críticos informan las coyunturas críticas, que, a su vez, explican trayectorias posteriores generadoras de path dependence. Empíricamente, se utilizó esa formulación para analizar cómo la descentralización de políticas públicas iniciada, en Brasil, en 1988, fue un antecedente crítico esencial. Las diferentes dimensiones asociadas al modelo descentralizador estuvieron asociadas a la coyuntura crítica de cambios institucionales que culminó con la aprobación de la Ley de los Consorcios Públicos el 2005. La nueva legislación, a su vez, influyó en la ampliación del asociativismo intermunicipal desde esa fecha y creó una dependencia de la trayectoria que indica un crecimiento por esa forma de acción colectiva. Se consideró la nueva legislación como variable que, ceteris paribus, asume capacidad explicativa del asociativismo intermunicipal. Se concluyó que esa variable distintiva solo puede comprenderse bajo la descentralización centrífuga y del diseño de las relaciones intergubernamentales creadas después de la nueva Constitución en 1988. Sin esa visión de sus antecedentes no se explican los resultados del asociativismo intermunicipal después del 2005. Palabras Clave: Consorcios intermunicipales, asociativismo intermunicipal, institucionalismo histórico, dependencia de la trayectoria, Brasil.
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Almost all states are either federal or regionalized in some sense. It is difficult to find a state that is entirely unitary and the Routledge Handbook of Regionalism and Federalism necessarily takes in almost the entire world. Both federalism and regionalism have been subjects of a vast academic literature mainly from political science but sometimes also from history, economics, and geography. This cutting edge examination seeks to evaluate the two types of state organization from the perspective of political science producing a work that is analytical rather than simply descriptive. The Handbook presents some of the latest theoretical reflections on regionalism and federalism and then moves on to discuss cases of both regionalism and federalism in key countries chosen from the world's macro-regions. Assembling this wide range of case studies allows the book to present a general picture of current trends in territorial governance. The final chapters then examine failed federations such as Czechoslovakia and examples of transnational regionalism - the EU, NAFTA and the African Union. Covering evolving forms of federalism and regionalism in all parts of the world and featuring a comprehensive range of case studies by leading international scholars this work will be an essential reference source for all students and scholars of international politics, comparative politics and international relations. © 2013 selection and editorial matter John Loughlin, John Kincaid and Wilfried Swenden. All rights reserved.