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VOL. 22, Nº 1, JAN.-ABR. 2020
Apresentação do dossiê temático
“Plataformas digitais, economia e poder“
Jonas Valente
Doutor em Sociologia pela Universidade de Brasí-
lia (UnB) - Brasil. Editor adjunto da Revista Eptic.
Pesquisador do Laboratório de Políticas de Co-
municação (LaPCom) da UnB.
Contato: jonasvalente@gmail.com
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O presente dossiê se debruça sobre uma temática de atenção crescente:
as plataformas digitais. Já é corrente, em trabalhos sobre o fenômeno, des-
tacar sua relevância econômica, vericada, por exemplo, pela presença de
companhias deste tipo no topo das listas de marcas com maior valor de
mercado. Esses atores sociais também adquiriram importância na esfera
política, amplicada, sobretudo, pelas polêmicas vistas nos últimos anos
envolvendo o papel deles na amplicação de ltros, de desinformação e de
discursos extremos e de ódio, sendo plataformas como o Facebook apon-
tadas como centrais na denição de eleições diversas, do centro à perife-
ria do sistema capitalista, incluindo o pleito de 2018 no Brasil. Com este
dossiê, a Revista Eptic propõe o aprofundamento da análise de diferentes
problemas relacionados às plataformas sob a lente da Economia Política da
Comunicação, Informação e Cultura (EPC), ainda inicial se comparado à re-
levância do tema. O esforço soma-se, assim, ao movimento que vem sendo
promovido em diversas disciplinas e abordagens na tentativa de compre-
ender o tempo presente, destacadamente sobre o papel das plataformas
na economia, na política, nas comunicações, no mundo do trabalho e em
outras esferas.
Esse crescimento de atenção multidisciplinar se esboça na formulação da
terminologia e na caracterização das plataformas. A emergência da pro-
blemática pode ser vista nas nomenclaturas diversas e seu caráter inter-
disciplinar, bem como na escolha de focos distintos. Entre os vernáculos
adotados, estão intermediários de Internet (MaCKINNON, HICKOK, BAR &
LIM, 2014), intermediários digitais (JIN, 2015), matchmakers (EVANS e SCH-
MALENSEE, 2016), plataformas tecnológicas (GAWER, 2014), plataformas de
agregação e intercomunicações (ALLEN E FLORES, 2013), plataformas online
(HELBERG, PIERSON & POELL, 2018; ABÍLIO, 2017), plataformas sociodigitais
(DANTAS, este volume), plataformas (GILLESPIE, 2010) ou, o que adotamos
no presente dossiê, plataformas digitais (CAMMAERTS E MANSELL, 2020;
ANDERSSON SCHWARTZ, 2017; HERSCOVICI, 2019; VALENTE, 2019a)1.
Os estudos variam entre abordagens focadas na dimensão econômica
(EVANS e SCHMALENSEE, 2016), na administração (GAWKER, 2014), na po-
lítica (HANDS, 2013; JIN, 2015), nas relações de trabalho (SCHOLZ, 2016;
DeGRYSE, 2016; VAN DOORN, 2017, SLEE, 2015) ou em miradas mais am-
plas (SRNICEK, 2016; COULDRY E MEJIAS, 2019; VAN DIJCK, 2013; GILLESPIE,
2010; PASQUALE; 2016). O campo da Economia Política da Comunicação
também vem examinando o fenômeno (ZALLO, 2013; BOLAÑO e VIEIRA,
2014; DANTAS, este volume; FUCHS, 2017; MOSCO, 2017; WINSECK, 2017).
Da mesma forma, as denições variam. Gillespie (2016) classica as pla-
taformas como “[…] sites e serviços que hospedam expressão pública, ar-
mazenam-na e utilizam-na na nuvem, organizam acesso a ela por meio de
busca e recomendação e a instalam em dispositivos móveis (s/p)”. A des-
peito da diversidade de expressões deste fenômeno, segundo o autor o
elemento em comum entre corporações tão díspares como AirBnB, Apple
1. Não será possível, nos
limites desta apresenta-
ção, discutir cada uma
destas contribuições,
bem como as demais
apontadas ao longo do
texto. O objetivo é combi-
nar um panorama inicial
da literatura com aspec-
tos chave para o entendi-
mento crítico do objeto.
80
Store e Kickstarter é a organização do conteúdo criado por terceiros para
distribuição e acesso por outras pessoas. Esses agentes buscam propagar
um “mito da imparcialidade”, anunciando-se como espaços abertos à ação
dos indivíduos. Helberg, Pierson & Poell (2018, p. 1), em um sentido mais
abrangente, entendem as plataformas como “arquiteturas sociotécnicas
que permitem e dirigem interações e comunicações entre usuários por
meio da coleta, processamento e circulação de dados de usuários”2. An-
dersson Schwarz (2017) demarca o conceito como sistemas que controlam,
interagem e acumulam. Estes solidicam mercados, funcionam como redes
sociais de trocas e conformam arranjos materiais de “atividade rastreável”.
Como apresentado em trabalho anterior (VALENTE, 2019), as plataformas
digitais podem ser compreendidas como agentes ou sistemas tecnológicos,
nos termos de Hughes (1987), nos quais ocorrem atividades sobre uma base
tecnológica, comandados por proprietários3, mas das quais participam ou-
tros agentes (produtores, intermediários, usuários), cujos controle e gestão
jogam papel organizador chave e nos quais operam lógicas econômicas,
práticas culturais e normas diversas (regulatórias e internas), a partir das
quais esses sistemas promovem uma mediação ativa na realização dessas
interações e transações.
As plataformas digitais possuem como principal ativo a facilitação do aces-
so entre diferentes agentes posicionados em distintos lados, conectando
usuários, vendedores, anunciantes e trabalhadores, entre outros, em diver-
sos arranjos econômicos e institucionais. Um segundo elemento constitu-
tivo é o exercício do papel de mediação ativa entre os diversos lados. Em
que pese uma construção pelas plataformas de uma autorreferência para
armar-se como espaços de facilitação desinteressados, essas empresas
estabelecem as regras do jogo, as lógicas por meio das quais as interações
e transações acontecem e os limites destas. Assim, as plataformas digitais
não são sistemas neutros. Ao contrário, buscam expandir sua mediação ati-
va para cada vez mais esferas, de modo a controlar os dados, uxos de in-
formações, interações e transações operados pelas distintas modalidades
de usuários que participam do ecossistema que modela. Em outras pala-
vras, as plataformas digitais são agentes que funcionam como mediadores
ativos de interações, comunicações e transações entre indivíduos e organi-
zações operando sobre uma base tecnológica digital conectada, especial-
mente no âmbito da Internet, provendo serviços calcados nessas conexões,
fortemente lastreados na coleta e processamento de dados e marcados
por efeitos de rede.
A perspectiva econômica sobre o objeto vem sendo trabalhada por diver-
sos enquadramentos. Uma literatura, de tradição na administração e na
ciência da informação, foca em um aporte mais descritivo das dinâmicas
materiais desses agentes, no que vem sendo chamado de “economia de
plataforma” (KENNEY e ZYSMANN, 2016, p. 62), “um termo mais neutro que
abrange um número crescente de atividades viabilizadas digitalmente em
2. Tradução própria: “so-
cio-technical architectu-
res that enable and steer
interaction and commu-
nication between users
through the collection,
processing, and circula-
tion of user data”.
3. Uma empresa, como
no caso do Google, ou co-
operativas, como a plata-
forma de comércio euro-
peia Fairmondo.
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negócios, política e interação social”4. Parker, Van Alstyne e Choudary (2016)
discutem as dinâmicas econômicas desses agentes, na forma de “negócio
de plataforma”. Outras visões expandem o impacto econômico para o con-
junto da sociedade, apontando a emergência de um “capitalismo de plata-
forma”. Em uma perspectiva mais crítica, Srnicek (2016) propõe esta ideia
em um cenário no qual países ricos e de renda média são crescentemente
dominados por plataformas, pontuadas pelo autor como um novo modelo
de negócio com capacidade de extrair e controlar grandes quantidades de
dados.
Van Dijck, Poell e De Wall (2018) argumentam pela existência de uma “so-
ciedade de plataforma” (platform society). Nesta, esses agentes estão inex-
tricavelmente ligados às estruturas sociais, inltrando-se em instituições e
produzindo as suas novas formas. Reconhece-se, nessa perspectiva, tratar-
-se de constructos não-neutros, compostos por valores e normas em suas
arquiteturas. A sociedade de plataforma seria, assim, formada no nível mi-
cro por “plataformas online”, arquiteturas digitais voltadas a organizar inte-
rações entre usuários. Uma combinação dessas estruturas compõe o que
os autores chamam, no nível médio, de “ecossistemas de plataformas”, res-
ponsáveis por uma infraestrutura núcleo central para os uxos de dados.
A ampliação parece-nos dispensável, uma vez que não chega ao âmago da
lógica de funcionamento do sistema e identica uma tendência geral do
sistema, de concentração e centralização do capital. Observando o setor
de origem da maior parte delas, Mosco (2017) arma que essas compa-
nhias, especialmente as cinco maiores (Apple, Google, Amazon, Microsoft
e Facebook), comandam o que chama de “próxima Internet”, marcada pela
mercantilização das instituições, corpos e consciências.
Parte dessas interpretações vai em sentido semelhante à preocupação de
armar a totalidade social e analisar os fenômenos situados dentro das
dinâmicas gerais de desenvolvimento capitalista. Como ressalta Bolaño
(2016; este volume), a EPC instiga a compreensão dos processos de me-
diação social envolvendo a informação, a comunicação e a cultura, obser-
vados dentro das relações sociais de produção. O olhar sobre as platafor-
mas, portanto, não pode ser limitado, mas, ao contrário, precisa captar o
ascenso desses agentes dentro do contexto atual do capitalismo. Assim
como a EPC vem examinando a evolução da Indústria Cultural no âmbito
do desenvolvimento geral do capitalismo, particularmente do capitalismo
em sua fase monopolista, agora a emergência das plataformas se posiciona
dentro de mudanças estruturais do sistema, discutidas desde os anos 1970
por autores que viriam a desenvolver e conformar tal perspectiva teórico-
-metodológica.
Nas últimas décadas, a fase atual do sistema, o neoliberalismo, passou por
uma mutação marcada pela restruturação produtiva e pela dominância -
nanceira (CHESNAIS, 2016; SAAD-FILHO, 2015). A informação, a comunica-
ção a cultura e suas tecnologias ganharam importância, dando resposta às
4. Tradução própria:
“more neutral term that
encompasses a growing
number of digitally ena-
bled activities in business,
politics, and social inte-
raction”.
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necessidades do capital de encontrar um novo regime de acumulação após
a crise dos anos 1970 (LOPES, 2007; BOLÃNO, MASTRINI, SIERRA, 2005). Ao
fazer isso, foram também transformadas, na forma da reconguração de
seus mercados (MARTINS, 2018), como frequentemente debatido por este
periódico nas duas últimas décadas. Este movimento, que esboçou novas
ondas de crescimento no centro do capitalismo e nos chamados países
emergentes, foi interrompido pela crise de 2007-8, que evidenciou a ins-
tabilidade do regime de acumulação (HUSSON; LOUÇÃ, 2013). Essa crise,
não apenas do sistema nanceiro, mas do conjunto do sistema (DUMÉNIL
e LEVY, 2014), colocou novos desaos à reprodução do capital, que buscou
aprofundar a restruturação produtiva, a dominância nanceira e outros
mecanismos de exploração e espoliação.
Neste movimento, buscou apoio em um novo paradigma tecnológico, as-
sentado no desenvolvimento das Tecnologias da Informação e Comunica-
ção (TICs) marcado por três frentes. A primeira é a produção e coleta mas-
siva de dados, chamada na literatura de Big Data (ANDREJEVIC, 2013) ou
daticação (VAN DIJCK, 2014). Mais do que releva a expressão comum de
classicar os dados como “novo petróleo”, esses registros são ativos muito
complexos e valiosos ao capital, uma vez que não são nitos e seu acúmulo
não tem apenas uma dimensão econômica, mas de controle social, mo-
dulação de comportamentos e vigilância (CLARKE, 1988; ALLMER, 2013). A
segunda frente está vinculada ao processamento inteligente dessas infor-
mações e dos bens e serviços não só no ambiente virtual como no conjun-
to da sociedade. Estes se dão por meio de algoritmos (GILLESPIE, 2014) e
sistemas de inteligência articial (DYER-WITHEFORD; KJØSEN; STEINHOFF,
2019). A terceira frente envolve os serviços e aplicações expandindo-se por
toda a atividade social na forma de aplicativos, automatizando decisões e
modulando comportamentos5 (SILVEIRA, 2019).
Ao armar o paradigma tecnológico, contudo, não compreendemos este
processo de forma determinista, mas, a partir da tradição marxiana da
compreensão da contradição entre forças produtivas e relações sociais de
produção e da teoria crítica da tecnologia (FEENBERG, 2002), como uma
relação dialética entre as determinações gerais do sistema e os sistemas
tecnológicos, naquilo que chamamos (VALENTE, 2019a) de “regulação tec-
nológica”6. A tecnologia é regulada por vetores sociais, mas também possui
vetores próprios de construção, capazes de moldar as relações sociais nas
esferas econômica, política e cultural. Neste novo paradigma, a tecnologia
se imbrica com a informação e assume esta forma, em seu suporte digital,
sendo inuenciada pelos processos de comunicação. Neste sentido, o pa-
radigma das TICs se espraia para o conjunto dos processos sociais. Preferi-
mos aqui debater este novo paradigma reconhecendo e enfatizando essa
abrangência, pois nos parece uma mirada mais profícua do que observar
este processo apenas como digitalização ou daticação, como parte dos au-
tores de matriz crítica faz. Estes dois processos são fundamentais ao novo
5. “A modulação é um
processo de controle da
visualização de conte-
údos, sejam discursos,
imagens ou sons. As pla-
taformas não criam dis-
cursos, mas contam com
sistemas de algoritmos
que distribuem os dis-
cursos criados pelos seus
usuários, sejam corpora-
ções ou pessoas. Assim,
os discursos são contro-
lados e vistos, principal-
mente, por e para quem
obedece aos critérios
constituintes das políti-
cas de interação desses
espaços virtuais. Para en-
gendrar o processo de
modulação não é preci-
so criar um discurso, uma
imagem ou uma fala,
apenas é necessário en-
contrá-los e destiná-los a
segmentos da rede ou a
grupos especícos, con-
forme critérios de impac-
to e objetivos previamen-
te denidos” (SILVEIRA,
2019, p. 21).
6. “A Regulação Tecnoló-
gica é o marco pelo qual
a tecnologia é entendida
como uma esfera de ati-
vidades sociais sob o ca-
pitalismo na qual se dão
práticas de construção de
artefatos e sistemas do-
tados de propriedades
funcionais e contextuais,
construídos a partir veto-
res sociais, forjados por
dinâmicas próprias de
denição de problemas
e apontamento de solu-
ções e com efeitos sobre
a sua reprodução e sobre
o restante da sociedade,
a partir de um constan-
te processo de regulação
dinâmica, cujo resultado
assume em geral a forma
de mercadoria em con-
corrência no mercado”
(VALENTE, 2019a, p. 84).
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paradigma, mas nenhum deles é o motor ou é vetor único dessas transfor-
mações.
As plataformas são agentes centrais da evolução deste novo paradigma
e do espraiamento dele para as demais esferas sociais. Elas conseguem
perpassar as três frentes, sendo agentes de ponta em todas elas, seja na
coleta de dados massivos, na constituição de sistemas de processamento
inteligente ou na oferta de aplicações e serviços a uma ampla base de usu-
ários. Seus modelos de negócio são calcados no aprofundamento dessas
ações, uma vez que necessitam de informações de seus usuários seja para
a veiculação de publicidade segmentada, seja para a disponibilização de
conteúdos e serviços personalizados. Na disputa da chamada “economia
da atenção”, a coleta e o processamento de dados são essenciais à concor-
rência deste novo modelo.
Essa lógica de funcionamento, contudo, não é somente uma inovação das
próprias plataformas. Responde, como pontuado anteriormente, às de-
mandas de um capitalismo que busca há mais de dez anos se recuperar de
uma crise sistêmica, mas que patina com índices fracos de produtividade,
taxas mínimas de crescimento e ampliação da desigualdade. Se o topo da
pirâmide foi bem-sucedido em sua estratégia de retomada dos lucros, o
regime de acumulação não conseguiu gerar um ciclo expansivo geral ou as-
segurar uma dinâmica distributiva semelhante aos anos pré-crise. Em meio
a uma concorrência mais acirrada e diculdade de realização em diversos
setores, o novo paradigma é apontado como saída para a geração de valor
pelos capitais individuais e promoção do crescimento das nações.
As plataformas otimizam a coordenação entre oferta e demanda, seja na
esfera da circulação no tocante à realização de mercadorias e nas nanças,
seja no âmbito da produção na compra e venda de força-de-trabalho. Em
vez da lógica linear de aquisição de meios de produção e força-de-trabalho
para a fabricação de mercadorias a serem trocadas por dinheiro no mer-
cado, as plataformas se constituem como mercados multilados (ROCHET e
TIROLE, 2003), como já referido, tendo como seu principal ativo e estrutura-
dor de seu modelo de negócios a conexão entre pontos entre vários lados.
Com isso, trazem em si a promessa de aceleração do tempo de rotação do
capital, atuando em um dos desaos basilares do sistema indicados por
Marx: o da anulação do espaço pelo tempo. Podem promover tal cone-
xão no comércio eletrônico (Amazon), na oferta de bens culturais e apps
(Apple), na utilização de softwares (Microsoft), no acesso a conteúdos onli-
ne (Google), nas interações sociais (Facebook) ou até mesmo nas nanças
(PayPal), com modelos de negócio assentados em geral na publicidade, na
assinatura, na taxação ou na combinação destes.
Ao agregar números de usuários na casa dos bilhões, amplas bases de da-
dos e sistemas tecnológicos sosticados, as plataformas potencializam sua
capacidade de conexão entre lados partindo do domínio de mercado em
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nichos especícos e do controle de segmentos da Internet diversicando
suas atividades no fenômeno que chamamos de “monopólios digitais”7. O
Google produz carros automáticos e soluções em saúde, a Microsoft co-
mercializa consoles de videogames, o Facebook vende aparelhos de reali-
dade virtual e aumentada, a Amazon possui serviços de agenciamento de
emprego. Neste último caso, a companhia já extrapolou suas atividades
inclusive para além de serviços baseados em informação, ao adquirir a ca-
deia estadunidense de supermercados Whole Foods. Esses agentes logram
disseminar não somente seus negócios, mas a própria lógica de platafor-
ma para os mais variados setores, naquilo que autores chamam de “plata-
formização” (HELMOND, 2015), processo retratado em diversos artigos do
presente dossiê.
Produção e circulação
Na esfera da produção, núcleo das preocupações da EPC, as plataformas
vêm ensejando mudanças importantes. No âmbito do campo, o tema vem
merecendo atenção. As sistematizações realizadas e apresentadas neste
dossiê por Seto, Grohmann e Dantas e Raulino aportam um panorama
interessante acerca da problemática, razão pela qual dispensamos reto-
mar uma apresentação das contribuições. Vale, contudo, ressaltar o debate
aberto no campo acerca da exploração de mais-valia nas plataformas e do
papel das audiências. Alguns autores rejeitam a produção de valor no am-
biente virtual (DURAND, 2018), enquanto outros percebem-na circunscre-
vendo-a aos trabalhadores das plataformas (BOLAÑO, 2012). Outra corren-
te, partindo da noção de mercadoria-audiência de Smythe (1977), aponta
a presença de trabalho produtivo entre os usuários dessas plataformas,
como Terranova (2013), Fuchs (2014) e Dantas e Raulino (este volume), em-
bora com análises particulares. Terranova fala em uma “dupla exploração”,
tanto dos assalariados quanto dos usuários. Para Fuchs, há um “trabalho
cognitivo digital” no ato de criar e publicar conteúdos. Dantas e Raulino ar-
mam essa exploração do trabalho audiência valendo-se de uma interpreta-
ção da noção marxista de “levar o produto ao mercado” como trabalho pro-
dutivo, em referência à atividade de transporte analisada por Marx.
Embora não seja o objeto da presente abertura entrar neste debate, é im-
portante ponderar que a ideia de um trabalho da audiência é passível de
questionamento se considerada a perspectiva de trabalho produtivo de
Marx como aquele que gera capital. A geração de valor no interior das pla-
taformas não estaria nos conteúdos publicados, mas na captura de dados
e na mobilização de atenção viabilizadas pelos algoritmos e sistemas inteli-
gentes desenvolvidos por equipes que vão dos engenheiros aos responsá-
veis por vendas, passando também por tarefas auxiliares como moderado-
res de conteúdo, inclusive muitos subcontratados em relações precárias. A
mercadoria-audiência pode ser explicada em seu caráter dúplice apontado
7. Os monopólíos digi-
tais são denidos como
“um fenômeno pelo qual
grandes plataformas digi-
tais partem de um poder
de mercado conquistado
em determinados nichos,
aproveitam condições
(como um grande núme-
ro de usuários, atuação
global e sua base tecno-
lógica), empreendem es-
tratégias (como contro-
le de um ecossistema de
agentes e negócios, incor-
poração de concorren-
tes) para uma diversicar
suas atividades em no-
vos segmentos, operando
uma mediação expansiva
sobre novas práticas so-
ciais e amplicando seu
poder de mercado tanto
nos segmentos originais
como nos novos” (VALEN-
TE, 2019a, p. 196).
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por Bolaño (2000), embora nas plataformas digitais estas tenham uma ati-
tude ativa no tocante à produção de conteúdo, e não “passiva” como na
televisão. Os conteúdos e interações não consistiriam em trabalho, mas em
matéria-prima, uma vez que não geram capital e não possuem valor-de-
-troca8. A monetização do acesso às audiências aos anunciantes em si não
implica classicar estas como realizadoras de trabalho.
Nos limites desta abertura, não será possível aprofundar o debate, mas,
para além das diferenças de abordagem, destacamos a relevância da emer-
gência dessa preocupação, tendo em vista a crescente exploração de traba-
lhadores contratados pelas plataformas até as diversas formas de media-
ção do trabalho pelas plataformas, como no fenômeno denominado por
alguns autores de uberização do trabalho (FONTES, 2017; ABILIO, 2017).
Alertamos, entretanto, que essa chave de leitura pode ser restritiva, uma
vez que os modelos de mediação do trabalho pelas plataformas são diver-
sos e vão muito além do constituído no âmbito do Uber. O trabalho hu-
mano desenvolvido tanto nas plataformas quanto mediado por elas tem
impactos importantes nas relações sociais de produção capitalistas e é me-
recedor de um aprofundamento para a compreensão de suas dinâmicas.
Já na esfera da circulação, a concorrência estabelecida pelas plataformas
vem ensejando uma série de contribuições de caráter crítico. Se autores já
apontavam as tendências concentradoras da Internet (McCHESNEY, 2013),
o crescimento desses agentes e de seu poder de mercado fomenta o sur-
gimento de reexões acerca dos aspectos especícos relativos às estrutu-
ras de mercado e à concorrência envolvendo as plataformas digitais. Uma
parte desta literatura joga luz sobre a concentração neste setor. Moazed e
Johnson (2016) cunham o termo “monopólios modernos”. Stucke e Grunes
(2017) consideram que os agentes com capacidade de coletar e tratar da-
dos em larga escala se transformam, em alguns casos, em “datopólios”. Di-
versos autores apontam os problemas de práticas anticompetitivas dessas
companhias, como Edelmann (2015). Como indicado anteriormente, avalia-
mos parte desses agentes como monopólios digitais.
Dois aspectos são centrais na constituição dessa dominância. O primeiro
é a lógica de efeito de rede desses agentes. Nela, quanto maior o número
de usuários dentro de uma rede, mais atrativa ela se tornará. Os efeitos
podem ser diretos ou indiretos, bem como positivos ou negativos (EVANS
e SCHMALENSEE, 2016). A presença de um grande número de pessoas no
Facebook atrai novos usuários. A reunião dessa grande base e os episó-
dios na plataforma também geraram efeitos de rede negativos nos últimos
anos, com movimentos pontuais de migração para outras redes. Contudo,
essa mudança em geral ocorreu para o Instagram, também controlado pela
corporação, ilustrando as formas de controle dos monopólios digitais.
Um segundo elemento crucial é o uso dos dados como vantagem compe-
titiva. Ao controlá-los, essas companhias conhecem não só seus usuários,
8. Há, todavia, formas
mistas ou especícas que
merecem olhar particu-
lar. É o caso da forma de
engajamento de progra-
madores em plataformas
de soluções tecnológicas
como a Tensorow do
Google ou Azurre da Mi-
crosoft. A cobrança pelo
impulsionamento de con-
teúdo também deman-
da um olhar mais detido,
uma vez que consiste em
uma taxação, em mode-
lo marcado mais por uma
lógica de renda, tema
para outros trabalhos.
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mas outros indivíduos por meio de práticas de rastreamento, como a ins-
talação de cookies. Esses registros permitem não somente a predição dos
comportamentos dos consumidores mas, como já dito, a sua modulação.
As plataformas utilizam os dados para buscar personalizar a experiência
das pessoas no seu interior, bem como potencializar a comercialização de
novos produtos, como o favorecimento do Google de seus serviços nos re-
sultados de busca (como vídeos do Youtube, preços no Google Shopping
ou voos do Google Flights). Para além disso, a coleta de dados abre espaço
para um conhecimento profundo do mercado e dos concorrentes. O Face-
book decidiu adquirir o WhatsApp pelo monitoramento realizado por uma
startup também comprada pela companhia que indicou o potencial do apli-
cativo de mensagens.
Como apontamos em outra ocasião (2019b), a análise da participação de
mercado das principais plataformas sinaliza um predomínio em estruturas
monopolistas ou olipolistas. No ranking Alexa de sites mais acessados, a
Alphabet/Google aparece com os dois primeiros domínios (Google.com e
Youtube.com), o Facebook possui três portais (Facebook.com e Instagram.
com), a Microsoft com um (Live.com) e a Amazon com um (Amazom.com).
Os aplicativos do Facebook aparecem no topo da lista, com quatro entre os
10 primeiros apps no mais notório relatório do mercado (APP ANNIE, 2019).
Enquanto os segmentos de websites e aplicativos possuem um montante
maior de produtos, o de sistemas operacionais e o de navegadores é bas-
tante reduzido. Quando observado a área como um todo, o Android (39,6%)
superou a liderança histórica do Windows (35,8%). Os dois são seguidos
pelo IOS (13,8%)9. Já se tomados os sub-segmentos móvel e desktops, os
respectivos domínios cam evidentes, com o Android atingindo 76%10. Nos
navegadores, o Chrome (Google) lidera (63,9%), seguido pelo Safari (Apple)
(15,15%). A exceção é o Mozilla, embora com percentual bastante diminuto
(4,6%)11. As redes sociais digitais são encabeçadas pelos serviços do Face-
book: a RSD de próprio nome (2,38 milhão), o Messenger (1,7 bilhão) e o
Whatsapp (1,5 bilhão). Em seguida vêm redes de conglomerados chineses,
como WeChat, QQ e Qzone. O item seguinte na lista é outra rede controla-
da pelo Facebook, o Instagram.
A especicidade do crescimento do poder de mercado desses agentes co-
loca uma série de questionamentos acerca das limitações do ferramental
tanto teórico quanto prático das análises concorrenciais e antitruste para
lidar com este fenômeno. Khan (2017), ao analisar o que chama de “paraxo-
do do antitruste” da Amazon, indica a necessidade de renovação dos recur-
sos conceituais e administrativos para esses agentes, tendo em vista a limi-
tação de categorias como a capacidade de alteração dos preços. Becerra e
Mastrini (2019), assim como Wu (2018) indicam a limitação da abordagem
tradicional antitruste e criticam a concepção hegemônica estadunidense,
marcada pela legitimação da concentração por meio da ideia de “bem-estar
do consumidor”. Tal problematização faz parte das preocupações da EPC.
9. Informação dis-
ponível em: <http://
gs.statcounter.com/os-
-market-share>. Acesso
em: 22 jul. 2019.
10. Informação dis-
ponível em: <http://
gs.statcounter.com/os-
-market-share/mobile/
worldwide>. Acesso em:
22 jul. 2019.
11. Informação dis-
ponível em: <http://
gs.statcounter.com/brow-
ser-market-share>. Aces-
so em: 22 jul. 2019.
87
Se historicamente essa tradição se ocupou de discutir os mercados de in-
formação e comunicação e formas de evitar a concentração neles, dialo-
gando, para tanto, também com o instrumental da microeconomia hete-
rodoxa, faz-se necessário agora jogar luz também sobre a conformação da
economia das plataformas também no âmbito da concorrência.
Esse esforço não é simples. A natureza multilados das plataformas e seu
espraiamento por diversos segmentos, para além, portanto, de um ramo
especíco, dicultam a primeira tarefa da análise de estruturas de merca-
do: a própria circunscrição do mercado. O Google ao mesmo tempo disputa
o mercado de buscadores com o Bing da Microsoft, o de publicidade online
com o Facebook, o de comércio eletrônico com a Amazon e o de aparelhos
e sistemas operacionais com a Apple, sem falar no de audiovisual online,
por meio do Youtube, com produtoras tradicionais e com as novas empre-
sas do tipo Netix. Uma análise crítica da concorrência demanda um en-
quadramento amplo dessa dinâmica das plataformas, buscando combinar
o exame mais geral desses agentes com segmentos especícos onde pro-
veem serviços12. As estratégias das plataformas de expansão, integração,
aquisição e diversicação de atividades (VALENTE, 2019a) são adotadas de
maneiras cada vez mais agressivos pelos monopólios digitais. A plataformi-
zação em diversos setores também coloca o desao de observar segmen-
tos especícos onde as plataformas atuam e o impacto dessa presença.
Discurso e alternativas
A diferença entre a EPC e o campo da economia dos meios de comunicação
é exatamente não trabalhar apenas o aspecto econômico, mas se debruçar
sobre as práticas relacionadas à informação, comunicação e cultura, na in-
terseção entre as dimensões material e discursiva de modo a averiguar as
estruturas de mediação social. Ao levar esse ângulo para as plataformas,
a economia política deve mirar também a forma como essas medeiam a
produção e circulação de conteúdos. Wu (2018) defende que a concentra-
ção de propriedade no âmbito das plataformas contribui para um cenário
econômico instável que abre espaço para forças políticas de extrema-direi-
ta e com projetos fascistas ou totalitários, como vem crescendo em diver-
sos países, como no Brasil. Martins (2020) discute essa relação ao apontar
como a diculdade de retomada do sistema em um novo ciclo expansivo
cria problemas que amplicam a desigualdade, gerando a necessidade de
controle das resistências e dissidências, processo que tem nas plataformas
um ator relevante pela capacidade de promoção de soluções de oposição a
essas reações bem como de vigilância dos agentes deste tipo de discurso e
ação contra hegemônicas.
Diante das demandas de reprodução ideológica do sistema em meio as
suas diculdades de retomada do ciclo expansivo, as plataformas impul-
sionam a lógica de santicação do capital por meio da promoção de uma
12. Para entender a atua-
ção da Amazon, é preciso
avaliá-la no segmento de
comércio eletrônico. Mas
somente isso pode res-
tringir a compreensão de
suas estratégias, que per-
passam diversos outros
mercados.
88
cultura individualista e de fortalecimento das dinâmicas de controle social,
agora posto à vista em esforço diuturno de ranqueamento social por meio
da construção de reputações. Com a exposição constante, a face e o com-
portamento dos indivíduos nas plataformas passam a ser reproduzidos
dentro dos moldes de normalização do sistema, uma vez que informações
e publicações tornam-se rastros disponíveis para empregadores, colegas
de trabalho, conhecidos, vizinhos, familiares e autoridades. Ao mesmo tem-
po, o indivíduo tem atividades cada vez mais privadas diretamente media-
das pelas plataformas, em uma privatização da experiência social conecta-
da que tem sido utilizada para reforçar marcas do tempo presente, como
o individualismo e mesmo o empreendedorismo. Flichy (2006) introduz a
ideia de um “individualismo conectado”, formado na relação do binômio
individualização/presença em rede.
Assim como o modelo de Indústria Cultural de Bolaño (2000) argumenta
pelo papel desta na mediação dos interesses do Estado e do capital, as
plataformas são novas estruturas de mediação robustas e que se torna-
ram palco privilegiado da reprodução dos interesses do sistema, bem
como da disputa entre classes e frações de classe. Seu modelo e negócio
calcado na captura de atenção e estímulo ao engajamento para produção
de dados potencializa conteúdos extremos, como já mostraram diversos
trabalhos,como o de Tufecki (2018) no caso do Youtube. A personalização
do uxo informativo privilegia publicações que conrmam os pontos de
vista dos usuários e esconde visões divergentes, naquilo que Pariser (2011)
chamou de “ltro bolha”. Morozov (2018) aponta que a demanda por pro-
dução e tratamento incessantes de dados não se pauta por uma ética. Ao
contrário, o modelo de capitalismo ‘dadocêntrico’, adotado pelo Vale do Si-
lício, busca converter todos os aspectos da existência cotidiana em ativo
rentável” (2018, p. 33)13.
Esse modo de funcionamento também abre espaço para a intensicação
da desinformação, prática antiga mas que atinge um novo patamar com
alta velocidade de disseminação, alcance de grande número de pessoas.
O baixo custo da fabricação de mensagens enganosas, aliado ao ambiente
propício de difusão nas plataformas e da capacidade de direcionamento
das mensagens, formam uma combinação explosiva que vem sendo utiliza-
da em escala industrial e por agentes em todo o mundo. O impacto em pro-
cessos políticos no centro do capitalismo, como a eleição de Donald Trump
e o Brexit, trouxe o problema para o centro das atenções não somente
de pesquisadores e organizações da sociedade civil como de autoridades,
tornando-se tema de iniciativas de regulação em todo o mundo (VALENTE,
2019c).
No caso do jornalismo, esses agentes operam para se tornar os grandes
mediadores da circulação de notícias, em uma arquitetura centralizada na
qual as regras globais ignoram valores históricos, culturais e de contexto,
como indicam Jurno e D’Andrea em texto que integra este dossiê. Isso por-
13. “O modelo de negó-
cios da Big Tech funciona
de tal maneira que dei-
xa de ser relevante se as
mensagens dissemina-
das são verdadeiras ou
falsas. Tudo o que impor-
ta é se elas viralizam (ou
seja, se geram números
recordes de cliques e cur-
tidas), uma vez que é pela
análise de nossos cliques
e curtidas, depurados
em retratos sintéticos
de nossa personalidade,
que essas empresas pro-
duzem seus enormes lu-
cros. Verdade é o que
gera mais visualizações.
Sob a ótica das platafor-
mas digitais, as fake news
são apenas as notícias
mais lucrativas. (MORO-
ZOV, 2018, p. 11).
89
que a circulação de conteúdos é monetizada por meio de seus modelos
de negócio, sejam o mais comum, calcado em publicidade, ou alternativos,
como a cobrança por impulsionamento de publicações. Investigando essas
transformações, Silva, Sansevrino, Santos e Mesquita também apresentam
neste volume uma interessante sistematização sobre os impactos da pla-
taformização do jornalismo em aspectos como o modelo de negócio das
empresas, os valores-notícia e o processo de produção, crescentemente
forjados pelo novo paradigma da daticação, do processamento inteligente
e das decisões automatizadas e seviços “appicados”.
Outro elemento constitutivo da tradição da crítica da Economia Política
da Comunicação é a formulação acerca das alternativas às relações de ex-
ploração e opressão no âmbito do seu objeto de estudo. No tocante às
plataformas, a ascensão dos prejuízos relacionados a esses agentes, como
alguns mencionados neste texto, vem ensejando uma preocupação cres-
cente. Em resposta a este cenário, diversos autores entram na discussão
da necessidade de uma regulação que combata a concentração econômica
e política destes agentes.
Um dos eixos envolve a “quebra” das grandes plataformas, obrigando-as a
se desfazer de aquisições, proposta emergindo tanto entre pesquisadores
do tema quanto em autoridades regulatórias (HUGUES, 2019; CMA, 2019).
Companhias como o Facebook, por exemplo, deveriam se desfazer de pro-
dutos adquiridos, como o Whatsapp e o Instagram. Já o Google deveria se
desvencilhar de negócios que reforçam seu domínio de mercado, como a
plataforma de vídeo Youtube ou o sistema operacional Android. Como for-
mulação recente, não foram apresentadas até o momento desta publica-
ção propostas bem-acabadas. Entendemos que um caminho para construir
um modelo de desmonopolização das plataformas deve passar por impedir
controle de serviços que reforcem seu poder de mercado e que tenham ca-
ráter de “pontos de controle” da experiência online (como os mecanismos
de busca, os sistemas operacionais e navegadores, por exemplo). Outro
grupo de proposições prevê a taxação das plataformas, que poderia, por
exemplo nanciar iniciativas de jornalismo independente (PICKARD, 2018).
Na dimensão tecnológica, autores questionam aspectos das arquiteturas
técnicas destas plataformas, como algoritmos e sistemas de inteligência
articial, como a opacidade e falta de transparência (com a defesa de um
direito à explicação, por exemplo) (PASQUALE, 2015; O´NEILL, 2016), a dis-
criminação (NOBLE, 2018; EUBANKS, 2018) e os riscos da ação automati-
zada (INTRONA, 2015). Parte das abordagens visa abordar os artefatos ou
sistemas tecnológicos, seja na mirada da “governança algorítmica” (DONE-
DA e ALMEIDA, 2018) ou da regulação dos sistemas de inteligência articial
(VILLANI, 2018, APC, 2019).
No tocante à circulação de conteúdos, multiplicam-se propostas de regu-
lação das plataformas visando garantir maior transparência e direitos dos
90
usuários. É o caso do documento de múltiplas organizações da sociedade
civil latinoamericanas (OBSERVACOM et AL., 2019), que advoga por regras
mais claras e favoráveis aos usuários relacionadas aos termos de serviço, à
gestão de publicações (como nas práticas de retirada ou limitação de alcan-
ce) e das contas e no devido processo dentro das plataformas. O tema da
desinformação também vem provocando uma leva de estratégias e propo-
sições desde organizações da sociedade civil (INTERVOZES, 2019) a pesqui-
sadores e governos (DE COCK BUNNING et AL., 2018).
Artigos do dossiê
Três artigos focam-se no vivo debate dentro da Economia Política da Co-
municação acerca do trabalho nas plataformas digitais e nas formas de
exploração presentes nestes ambientes. Grohmann reete sobre o proces-
so de plataformização do trabalho. O autor problematiza esse processo a
partir da articulação com a datacação da sociedade impulsionada pelas
plataformas, a nanceirização e a reprodução da racionalidade neoliberal.
Ancorado em autores como Srnieck (2016), Van Dijck, Poell e De Wall (2018),
Couldry e Mejias (2019), pontua a ascensão das plataformas como agentes
chave da articulação entre a captura de dados e seu processamento por
meio de algoritmos. Estas exportam essa lógica para o trabalho, em uma
expansão para além da dinâmica do Uber (referência utilizada por muitos
autores neste debate) e que se manifesta especicamente nos territórios,
com diferenças entre o centro e a periferia do sistema. Os algoritmos as-
sumem condição central na mediação desses processos de trabalho, como
capital xo das plataformas e gerando a reprodução da racionalidade ne-
oliberal em novas congurações das relações trabalhistas. O autor conclui
apresentando exemplos de resistências forjadas desde os próprios traba-
lhadores e introduzindo possibilidades de alternativas como indicativos
também para trabalhos futuros.
Seto traz uma revisão de literatura abarcando algumas das contribuições à
discussão. O autor mapeia as visões a partir de alguns elementos demar-
cadores, como a produção ou não de valor nas plataformas e os agentes
da exploração de mais-valor (se os trabalhadores dessas empresas ou tam-
bém os usuários que navegam em seus ambientes gerando dados e rastros
digitais que serão processados para a oferta de anúncios direcionados).
Seto problematiza uma visão unicada das plataformas, sugerindo uma
percepção de múltiplas lógicas de acumulação no interior desses espaços,
que deveriam ser analisadas “caso-a-caso”. A partir de uma leitura “pers-
pectivista” de Marx, o autor pormenoriza algumas relações, oferecendo
soluções distintas. Formas mais tradicionais de expropriação estariam pre-
sentes em caso de atividades remuneradas nas plataformas, mesmo que
informalmente (como nas fazendas de clique). Para a captura e extração de
atenção, interação e dados propõe uma mirada de espoliação, a partir do
91
diálogo com Havey (2008), do “intelecto geral”, retomando formulação de
Marx nos Grundrisse.
Dantas e Raulino abordam a polêmica da audiência nas plataformas di-
gitais, tomando como exemplo o Facebook e o YouTube. Após um exa-
me crítico de contribuições sobre o tema de base marxiana (como Fuchs
[2013], Rigi e Prey [2015] e Caraway [2011]), eles partem de uma leitura
do Livro II de O Capital de Marx (1984) e espelhando-se na formulação de
Smythe (1977) para a mercadoria audiência, veem a ação das audiências
como trabalho produtivo. Introduzem uma explicação do modelo de negó-
cios dessas plataformas, cuja operação ocorre como “praças de mercado”,
referenciando-o no modelo de ciclo capitalista de Marx, desde o nancia-
mento pelo capital nanceiro às transações entre usuários compradores e
vendedores. Segundo os autores, as plataformas transportam informação
e seus usuários realizam trabalho e consumo produtivos, apropriados na
forma de renda informacional por meio da de algoritmos protegidos por
direitos de propriedade intelectual, na dinâmica de cercamento que os au-
tores classicam como “jardins murados”.
Outros três artigos abordam os impactos das plataformas em práticas dis-
cursivas, do jornalismo à comunicação política. Silva, Sansevrino, Santos e
Mesquita debatem o impacto das plataformas no jornalismo, tendo como
corte essencial as alterações produzidas nos modelos de negócio dessa
prática. Este movimento faria parte da própria plataformização da Internet,
constituindo-se em três frentes principais: na perda da autoridade do jorna-
lista como fonte principal da informação, na dependência das plataformas
para obter alcance na distribuição e na perda de parcela na divisão do bolo
publicitário. Neste novo cenário, valores tradicionais do jornalismo foram
alterados, com alcance em detrimento da qualidade, novos valores-notícia
como “compartilhabilidade” e o emprego de mais recursos audiovisuais.
Faz parte também dessa transformação a ruptura das práticas jornalísticas
tradicionais, com maior protagonismo da daticação em novas expressões
como jornalismo de dados, jornalismo robô, jornalismo colaborativo, bem
como a adequação às plataformas, como nas práticas de SEO para sites ou
no ajuste de conteúdos para formatos denidos por esses agentes.
Jurno e D´Andrea detalham um aspecto do impacto das plataformas sobre
o jornalismo, ao escrutinar a evolução do recurso Instant Articles do Face-
book em uma mirada referenciada nos Estudos de Plataforma, ramo dos
Estudos de Ciência e Tecnologia. A ferramenta foi criada em 2015 como
uma interface de carregamento de notícias, criando um modelo de negó-
cios em que veículos de mídia poderiam lucrar com anúncios, dos quais
uma parte dos recursos seria repassada ao Facebook. Para além dos resul-
tados conitantes entre os participantes, nos anos seguintes a plataforma
provocou tensão com os grupos de mídia ao mudar critérios do feed de
notícias, provocando uma queda do alcance das publicações desses agen-
tes. Segundo os autores, os IA sinalizaram uma tentativa do FB de se tornar
92
uma “plataforma infraestrutural” (VAN DIJCK; POELL; DE WAAL, 2018). Já os
grupos de mídia se viram em uma posição de difícil recusa ao rmamento
de parcerias com o FB, uma vez que a audiência da plataforma é signica-
tiva e as formas de circulação de conteúdos dependiam dos feeds de notí-
cia. Mas, como mostraram os autores, integrantes da indústria jornalística
perceberam os riscos dessa dependência e falta de controle no ambiente
da rede social.
No artigo “A mediação de vídeos pelo YouTube: política conectiva na co-
municação de um partido e de dois movimentos sociais”, Medrado, Vale e
Cabral discutem a mediação exercida pela maior plataforma audiovisual
do mundo, o Youtube, tomando como objeto os vínculos formados na re-
comendação a partir de três vídeos: um do Partido Socialismo e Liberdade
(PSOL), um do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) e um da
Articulação Indígena dos Povos Brasileiros (APIB). Os objetos foram esco-
lhidos em razão do uso da plataforma como forma de aproximação entre a
legenda e os movimentos sociais diante da chapa Guilherme Boulos e Sônia
Guajajara, lideranças de cada uma das redes, como candidatos, respecti-
vamente, a presidente e vice-presidente nas eleições de 2018. Partido do
conceito de “política conectiva” para reetir sobre a articulação entre esses
atores socais, os autores examinam e problematizam as recomendações
propostas pela plataforma.
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