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Direitos fundamentais do
contribuinte e interpretação
tributária: Conceito e aplicação do
princípio in dubio contra
sacrificium
FUNDAMENTAL RIGHTS OF TAXPAYERS AND TAX
INTERPRETATION: CONCEPT AND APPLICATION OF
THE PRINCIPLE IN IN DUBIO CONTRA SACRIFICIUM
Paulo A. Caliendo V. da Silveira*
Resumo: O presente artigo trata dos métodos de interpretação
em Direito Tributário, bem como da passagem do cânone in
dubio contra fiscum para uma formulação atualizada, conforme
os direitos fundamentais, sob a forma de in dubio contra
sacrificium.
Palavras-chaves: Interpretação Tributária; In dubio contra
sacrificium; Interpretação Sistemática.
Abstract: This paper deals with the methods of interpretation
in Tax Law, as well as the passage of the canon in dubio contra
fiscum for an updated formulation according to the theory of
fundamental rights, in the form of in dubio contra sacrificium.
Keywords: Legal Tax Interpretation; In dubio contra sacrificium;
Systematic Interpretation.
DOI: 10.5433/2178-8189.2014v18n1p181
* Professor Titular na PUCRS,
onde compõe o corpo per-
manente do Mestrado e Dou-
torado, lecionando na Disci-
plina de Direito Tributário, e
de diversos cursos de Pós-
Graduação no país. Doutor
em Direito Tributário pela
PUC/SP e Mestre em Direito
dos Negócios pela Faculdade
de Direito da UFRGS. Autor
do livro “Direito Tributário
e Análise Econômica do Di-
reito”, publicado pela edito-
ra Elsevier. Conselheiro do
CARF. E-mail: p.caliendo
@terra.com.br
SCIENTIA IURIS, Londrina, v.18, n.1, p.181-216, jul.2014 | DOI: 10.5433/2178-8189.2014v18n1p181
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INTRODUÇÃO
A teoria da interpretação é diferente para cada modo de pensar jurídico,
produzindo diferenças claras nos seus resultados concretos e nas soluções
práticas para os dilemas jurídicos. A interpretação tópico-sistemática é capaz
de dotar o intérprete de uma gama vasta e sofisticada de instrumentos de análise,
que lhe dão prevalência sobre os modelos anteriores. A proposta do presente
artigo é responder ao questionamento sobre a existência de um posicionamento
interpretativo geral, que oriente a compreensão e construção de sentido das
normas tributárias.
1 DA INTERPRETAÇÃO JURÍDICA NO PENSAMENTO
SISTEMÁTICO
O pensamento sistemático irá permitir uma interpretação tópico-
sistemática, organizando a possibilidade de soluções decorrentes de
considerações e conexões valorativas, do caso concreto e à referência necessária
com o sistema jurídico.
A interpretação sistemática é um caso de interpretação constitucional e
decorre da existência do Estado Democrático de Direito (Estado Constitucional),
que por sua vez representa uma evolução institucional importante perante o
Estado de Direito. A passagem do Estado de Direito para o Estado Constitucional
constitui uma mudança de paradigmas1:
i) no Estado de Direito prevalece o princípio da segurança jurídica e do
consenso; enquanto que no Estado Constitucional ocorre a prevalência do
equilíbrio entre o consenso e o conflito. O Estado Constitucional deve prever
dois grandes princípios: a preservação do pluralismo de valores e seu confronto
leal;
ii) o Estado de Direito tenta preservar um modelo de coesão social (noção
de vida boa identificada com o burguês, pater famílias e comerciante); no Estado
Constitucional não há conceito de vida boa, não existem modelos fechados de
vida. Os direitos fundamentais é que constituem o substrato do ethos social;
iii) o Estado de Direito representa uma situação ideal (ficção) de indivíduos
atomizados ou de uma estrutura social homogênea; o Estado Constitucional,
1Sobre o tema veja-se Zagrebelsky, Gustavo. Il diritto mite: legge, diritti, giustizia. Torino : Einaudi,
1992.
PAULO A. CALIENDO V. DA SILVEIRA
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por sua vez, representa o claro reconhecimento de uma base fática plural e
conflituosa;
iv) o modelo hermenêutico típico no Estado de Direito é o raciocínio
subsuntivo da regra (silogismo legal) do Direito, consagrado na Jurisprudência
de conceitos; o modelo do Estado Constitucional é a concreção de valores,
onde existe uma dogmática fluída, na aplicação de princípios e valores
(Jurisprudência de valores);
v) no Estado de Direito apresenta-se uma homogeneidade do Estado
legislativo, em que o ordenamento jurídico aparece como dado; por sua vez, no
Estado Constitucional aparece a heterogeneidade do ordenamento jurídico como
problema. Se no primeiro caso a lei é pacificadora de conflitos sociais; no segundo
caso, a lei representa um compromisso entre valores pluralistas. Ela não é mais
produto neutro. Os princípios correm o risco de se tornarem um recurso de
esvaziamento semântico de soluções substanciais, pela inexistência de regras e
compromissos. Fim da “beleza” lógica defendida pelos normativistas.
É com base nestes fundamentos que se sustenta a natureza valorativa
da resolução de conflitos2 no ordenamento jurídico constitucional3.
Uma interpretação sistemática objetiva antes de mais nada, na elaboração
de uma nova dogmática, aberta e flexível, atenta aos desafios de nosso tempo.
2 DA INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA NO DIREITO
TRIBUTÁRIO
Considerando que o sistema jurídico é um todo ordenado de princípios,
regras e valores, cabe destacar o papel de relevo desempenhado pelos princípios
em uma teoria sistemática do Direito Tributário. Dentre os diversos aspectos
podemos destacar que:
- as normas de comportamento, tais como as regras, teriam os seus
fundamentos normativos derivados direta ou indiretamente dos princípios.
- os princípios possuem uma prevalência sistêmica em relação às regras
em função de sua relevância.;
- os princípios possuem um conteúdo axiológico claro e, portanto, seriam
detentores dos valores normativos de um sistema jurídico;
2Sobre o assunto veja-se STEINMETZ, Wilson Antônio. Colisão de Direitos Fundamentais e Princípio da
Proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.
3Para uma completa verificação da proteção dos Direitos Fundamentais veja-se a obra de SARLET,
Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006.
(Edição desatualizada).
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DIREITOS FUNDAMENTAIS DO CONTRIBUINTE E INTERPRETAÇÃO TRIBUTÁRIA: CONCEITO E APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO
IN DUBIO CONTRA SACRIFICIUM
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- os princípios são detentores de “forma jurídica e conteúdo moral”(
VIGO, 2005, p. 152). Eles teriam o sentido de racionalidade prática, desta forma
eles representariam uma forma de superação da tese positivista da separação
entre o direito e a moral.
Desse modo, as regras apresentam uma densificação de princípios,
carregadas d valores. Assim, se houver o conflito entre uma norma de conduta
descrita (regra) e uma norma que fundamenta condutas necessárias (princípios),
o conflito irá ser deslocado para o fundamento (princípio) da regra sobre uma
conduta e a norma de fundamento de condutas necessárias (princípio). Se esses
fundamentos ou princípios ainda estiverem no mesmo nível ou não se possa
solucionar o seu conflito, então caberá ao intérprete verificar os fundamentos
dos fundamentos, ou seja, os valores normativos que o ordenamento jurídico
tenta proteger por meio de normas jurídicas. Assim, caberá ao intérprete proceder
a escolhas axiológicas com base no sistema constitucional4.
Determina o Capítulo IV do CTN, relativo à “Interpretação e Integração
da Legislação Tributária” que: “Art. 107. A legislação tributária será
interpretada conforme o disposto neste Capítulo”.
Este dispositivo tem sido muito criticado pela doutrina nacional, visto que
não esgota ou encerra todos os métodos hermenêuticos, não supera ou dissolve
os mecanismos abertos de interpretação em uma sociedade democrática
(Judiciário, Executivo e Legislativo), nem tampouco resolve os problemas
hermenêuticos de conflitos interpretativos. Sua inutilidade não prejudica, contudo,
o texto do CTN.
Não podemos concordar, entretanto, que não exista uma especificidade
na interpretação tributária. Por óbvio que a interpretação jurídica é um modo de
interpretação particular. Assim mesmo considerando que não existe uma
interpretação para cada área do conhecimento jurídico, não se pode afirmar
absolutamente que a interpretação no Direito Tributário deve ter os mesmos
princípios que a interpretação no Direito Civil, no Direito Penal, etc., é algo
totalmente diverso. Cremos que os princípios públicos que regem a justa
repartição de encargos públicos exige um modelo argumentativo distinto. A
4Leciona Juarez Freitas com propriedade que: “Mais: a antinomia entre as regras oculta,
necessariamente, uma antinomia ente princípios. Estes ostentam validade formal e não são mais
deveis do que aquelas. A diferença reside em que as regras apresentam função hermenêutica
instrumental, isto é, devem servir à realização dos princípios. Aliás, a tarefa da hierarquização, no
uso dos silogismos dialéticos, culmina justamente na positivação do princípio como superior”;
ver em: FREITAS, Juarez. A melhor interpretação constitucional “versus” a única resposta correta. In:
AFONSO DA SILVA, Virgílio (Org.) Interpretação Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2005, pg. 318.
PAULO A. CALIENDO V. DA SILVEIRA
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aplicação da justiça geral e particular no Direito Tributário é distinta da sua
aplicação nas relações privadas. Os fins específicos são diversos (justiça fiscal,
neutralidade fiscal-concorrencial e liberdade fiscal – agrupar adjetivos; evitar
repetição de palavras), bem como os meios utilizados pelo sistema tributário,
logo as normas interpretativas devem ser adequadas a produção coerente de
normas jurídicas que melhor permitam esta combinação de meios e fins públicos.
A presença de um capítulo sobre normas de interpretação deve ocorrer
somente para firmar cânones de interpretação sobre questões controversas,
tais como: interpretação econômica, a questão da tipicidade, da boa-fé, da
proporcionalidade, etc. Não se cogita de um código que pretenda superar a
doutrina e a atividade jurisprudencial, mas de uma norma que estabeleça os
limites e diretrizes de uma interpretação legal aberta. No entender de Ricardo
Lobo Tôrres: “os princípios de interpretação não se convertem em normas
nem têm caráter obrigatório: são diretivas ou topoi” (Cf. Tôrres, 2000, p.
59.).
Podemos encontrar também no direito estrangeiro a presença de
dispositivos sobre a interpretação, tal como na Ley General Tributaria na
Espanha5. Outros, contudo, preferiram evitar tal utilização, especialmente pela
dificuldade de trazer em um corpo normativo uma dogmática da hermenêutica.
Os princípios tributários recebem principalmente da doutrina constitucional
diretrizes para a coerente interpretação do Sistema Constitucional Tributário,
de tal modo a permitir uma sintonia com as demais fontes. Tal postura revela-
se inequivocamente adequada, visto que impede um isolamento dogmático da
interpretação tributária, que deve necessariamente dialogar com os dispositivos
da Ordem Econômica e da Ordem Social previstos na CF/88. A tributação não
é um fim em si mesmo, nem seus meios de financiamento são isolados de sua
finalidade: o financiamento dos direitos fundamentais. A norma tributária
representa de modo densificado uma escolha democrática: os bens e as liberdades
públicas a serem financiadas e os meios escolhidos para a justa repartição dos
encargos públicos.
São exemplos de princípios de interpretação constitucional que terão um
papel relevante: da unidade da Constituição, da concordância prática, da força
5“SECCIÓN III. INTERPRETACIÓN, CALIFICACIÓN E INTEGRACIÓN. Artículo 12. Interpretación
de las normas tributarias. 1. Las normas tributarias se interpretarán con arreglo a lo dispuesto en
el apartado 1 del artículo 3 del Código Civil. 2. En tanto no se definan por la normativa tributaria,
los términos empleados en sus normas se entenderán conforme a su sentido jurídico, técnico o
usual, según proceda”.
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DIREITOS FUNDAMENTAIS DO CONTRIBUINTE E INTERPRETAÇÃO TRIBUTÁRIA: CONCEITO E APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO
IN DUBIO CONTRA SACRIFICIUM
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normativa da Constituição e da interpretação conforme a Constituição, dentre
outros tantos.
3 DA PASSAGEM DO “IN DUBIO CONTRA FISCUM” PARA “IN
DUBIO CONTRA SACRIFICIUM”
A teoria geral da interpretação tributária irá presenciar a passagem do
“in dubio contra fiscum” para o cânone interpretativo “in dubio contra
sacrificium”, conforme os argumentos que veremos a seguir.
3.1 In dubio contra fiscum
O critério de interpretação in dubio contra fiscum não se confunde
com uma regra geral de interpretação aplicável a todos os momentos
interpretativos, mas tão somente para os casos onde existem mais de uma
interpretação possível, que conduzem a resultados diversos para os contribuintes,
sendo um deles menos favorável ao mesmo. Para Martínez seria “uma regra
de decisão de fato incerto na aplicação da lei” (MARTÍNEZ, 1983, p.131).
Preferimos entender que se trata de critério dirigido à solução de dilemas na
interpretação, ou seja, à situação interpretativa que exige a escolha entre duas
alternativas antagônicas ou contraditórias.
A sua origem no famoso texto de Herennius Modestino no Digesto (“Liber
Singulis De Praescriptionibus”), em que afirmou que: “non puto delinquere eum,
qui in dubiis quaestionibus contra fiscum facile respionderit” (“não se pode
afirmar que comete delito, aquele que em caso de dúvida adota uma interpretação
favorável ao contribuinte”)6. Outra redação famosa deste brocardo, com idêntico
sentido é: “In dubio, magis contra fiscum est respondendum” (“na dúvida deve-
se decidir contra o fisco”). Cabe lembrar que no mundo antigo o imposto tem
sua origem na ideia de sujeição política onde o devedor tinha o poder de vida e
de morte sobre o vencido e os dominados. Tributo neste período tem o forte e
trágico significado de vassalagem, sendo claramente o oposto da liberdade e
notadamente odioso.
O critério aparece em um contexto onde qualquer oposição à vontade do
imperador podia ser entendida como afronta, oposição, rebelião e naturalmente
como crime contra o Império. A relativização das duras regras fiscais imperiais
foi alcançada somente por corajosa interpretação dos jurisconsultos.
6D., de jure fisci, 49,14, 10.
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O critério interpretativo in dúbio contra fiscum não se identifica
imediatamente com o critério da “odiosa restrigenda”, ou seja, na necessária
interpretação restritiva das normas de caráter odioso, dentre as quais se destacam
normas fiscais (MARTÍNEZ, 1983, p.129). Igualmente se destaca que não se
afirma a aplicação de uma interpretação favorável ao contribuinte ou restritiva
diretamente em função de sua natureza “odiosa”. Como bem ressalta Pedro
Martínez a regra de Modestino surge após a Constituição de Caracala de 212,
ou seja, em um período em que houve um alargamento do direito de cidade a
todos os habitantes do império. Assim, não teria o tributo nesta época uma
vinculação à sujeição odiosa ou “nota captivitatis”, que excluía participação
cidadã ativa na comunidade política. Assim, não se poderia alegar a restrição
do critério somente aos períodos de opressão ditatorial, nem tampouco ressalte-
se que a carga fiscal romana era considerada extorsiva no período.
O Direito Português irá aceitar, contudo, a identificação da tributação
como norma odiosa, assim conforme antiga jurisprudência do Paço: “gabella
sempre est odiosa et ideo restrigenda” (MARTÍNEZ, , 1983, p.129). Mesmo no
auge do absolutismo real português testemunha o Desembargador do Paço
Bermudes e Torres que: “he muito conforme com a Real intenção de Vossa
Magestade, que vemos continuamente praticada a exemplo não só do
Imperador Trajano, e de Filippe Prudente mas do Senhor Rey D. João II
que com aquela integridade de animo, que bem testemunha a
incorruptibilidade do seu corpo, louvava aos Ministros que aconselhando,
ou votando, attendião, em dúvida, mais à utilidade dos Vassalos, do que
às conveniências do Patrimônio Real, trazendo sempre na lembrança, e
melhor na execução, a sentença que lemos do jurisconsulto Modestino na
L. Non puto 10 f.f de Jur. Fisci” (LIMA, 1983, p.129).
Cabe, contudo, relativizar a noção de ausência absoluta de regras públicas
entre os antigos. A grande invenção7 da “tecnologia” pública do mecanismo
societário (urbs civitas) irá surgir justamente neste período, especialmente com
a novel criação da República romana. O regime republicano romano irá distinguir
três funções específicas (“ipsum Romulum traditur populum in triginta partes
divisse).
Inicialmente existe uma distinção entre legislação e governo, dado que a
lex é a manifestação do próprio populus8. O governo é considerada a
7Cf. LOBRANO, Giovanni. A teoria da respublica (fundada sobre a ‘sociedade’ e não sobre a pessoa
jurídica’) no Corpus Júris Civilis de Justiniano (Digesto 1.2-4). Revista Seqüência, n. 59, p. 13-41,
dez. 2009.
8D, 1.2.2 Pomp.
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DIREITOS FUNDAMENTAIS DO CONTRIBUINTE E INTERPRETAÇÃO TRIBUTÁRIA: CONCEITO E APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO
IN DUBIO CONTRA SACRIFICIUM
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manifestação específica do rex-magistratus (et quindem initio civitatis
nostrae populus sine lege certa, sine jure certo primu agere instituit,
omniaque manu a regibus gubernabantur, em D.1.2.2.). A natureza dos
poderes é distinta, enquanto o povo edita comandos gerais por meio da lei, o
titular do “imperium” edita comandos individuais.
Outro elemento característico é a atribuição da legislação a um corpo
distinto de pessoas, sendo que a história de Roma apresenta uma evolução em
que o poder de “imperium” torna-se gradativamente pequeno e o poder da
“Lex” consideravelmente amplo (IHERING, 1999, p. 259). Somente em períodos
de contingências ou perigos, onde a República se une em torno de um ditador é
que se reestabelece o formato original. Torna-se claro aqui, portanto, da falsa
noção de que o critério in dúbio contra fisco tenha surgido em uma época de
ausência de poder legislativo ou popular, aparecendo somente nos séc. XVIII e
XIX em função do papel da legislação como representante da vontade popular.
Por fim, caberia à atividade integradora dos juristas em proceder a uma unidade
sistemática da pluralidade de leis sob um ius civile comum.
Bartolo de Sassoferrato (1314-1357), professor de Direito em Pisa, irá
novamente reafirmar o entendimento de que o poder de tributar (collectas),
mediante a criação de rendas públicas (vectigalia) ou tributos (census) pertencia
ao Rei, bem como o produto da sua arrecadação. A noção de fiscalidade
encontra-se diretamente relacionada à ideia de obediência. Tal entendimento
relaciona-se diretamente ao grave e histórico problema da resistência ou
descumprimento aos comandos do soberano, especialmente em face à passagem
de muitos regimes republicanos das cidades italianas para o despotismo
oligárquico ou individual. Bártolo irá escrever justamente em uma época em o
fenômeno da tirania se espalhava pela Itália. No livro De regiminis civitatis
ressaltaria que “hoje toda a Itália é plena de tiranos” (hodie Italia est tota
plena tyrannis), em uma das primeiras obras sobre o direito público e da
responsabilização do soberano.
A defesa do critério in dúbio contra fisco irá permanecer nos séculos
XVI e XVII com base na interpretação contratual de que as cláusulas contratuais
ambíguas devem ser interpretadas contra o redator do texto, com base no critério
“contra stipulatorem”, oriundo do Direito Romano e previsto no Code Civil
da França, em seu art. 1162, que determinava que: “Em caso de dúvida a
convenção se interpreta contra aquele que a estipulou e a favor de quem
surge a obrigação contratada” (“Dans le doute, la convention s’interprète
contre celui qui a stipulé et en faveur de celui qui a contracté l’obligation”).
PAULO A. CALIENDO V. DA SILVEIRA
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Este mesmo preceito foi incorporado como máxima interpretativa do
Direito Contratual em diversos países (UK, EUA, Canadá, Índia, Bélgica,
Espanha9, Itália10 e outros países), sob a forma do critério “contra proferentem”,
ou seja, no sentido de que uma cláusula contratual ambígua deve ser interpretada
contra o seu proponente, em um caso de disputa contratual.
Tal critério aparece no Capítulo 4 dos Princípios da Unidroit para os
contratos comerciais internacionais (“Principles for international commercial
contracts”). Determina o art. 4.6 que: (contra proferentem rule) “Se os termos
de um contrato proposto por uma das partes não é suficientemente claro,
deve ser preferível a interpretação contra a parte proponente” (“If contract
terms supplied by one party are unclear, an interpretation against that
party is preferred”). Os fundamentos para esta interpretação decorrem do
fato de que a parte que propõe a cláusula deve suportar os riscos pela falta de
clareza da formulação realizada (“Such a party should bear the risk of
possible lack of clarity of the formulation chosen”). Esta regra trata de
alocar o ônus da prova para a parte que originalmente propôs a cláusula e no
caso de conflito contratual exige o seu cumprimento, de tal modo que não tire
vantagem indevida desta. Os Princípios da Unidroit ressaltam, contudo, que
esta cláusula deve ser analisada em suas circunstâncias, de tal modo que quanto
mais as partes se envolveram em negociações menor é a sua força absoluta.
Esta cláusula passou a ser utilizada na proteção do consumidor em diversas
leis e códigos nacionais. No caso brasileiro este critério interpretativo tornou-se
princípio contratual no art. 47 do CDC que impõe: “Art. 47. As cláusulas
contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao
consumidor”.
Outra versão do critério in dubio contra fiscum aparece reformulado
sob a construção in dubio pro libertate, como decorrência do reconhecimento
do direito fundamental à liberdade como um dos mais relevantes pilares da
ordem constitucional. Na Constituição alemã (Grundgesetz) aparece claramente
este sentido no art. 2 (2) que determina: “A liberdade da Pessoa é inviolável”
(“… Die Freiheit der Person ist unverletzlich….”). No mesmo sentido
determina a CF/88 que: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção
de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
9Codigo Civil Espanhol: “Art. 1288. La interpretación de las cláusulas oscuras de un contrato no
deberá favorecer a la parte que hubiese ocasionado la oscuridad”.
10 “Art. 1370 Interpretazione contro l’autore della clausola.Le clausole inserite nelle condizioni
generali di contratto (1341) o in moduli o formulari (1342) predisposti da uno dei contraenti
s’interpretano, nel dubbio, a favore dell’altro”.
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DIREITOS FUNDAMENTAIS DO CONTRIBUINTE E INTERPRETAÇÃO TRIBUTÁRIA: CONCEITO E APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO
IN DUBIO CONTRA SACRIFICIUM
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residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)”.
Para esta tese o Estado deve assegurar a liberdade do cidadão e “(...)
não pode retirar essa liberdade com a simples aplicação do princípio da
igualdade”. Ressalte-se assim que o reconhecimento de que os direitos
fundamentais possui um duplo sentido, tanto de proibição de intervenção (direito
de defesa), como também como direito de proteção. Deve-se, cuidar, contudo,
que não se trata de uma restrição ou limitação em sentido estrito dos direitos
fundamentais.
Em alguns sistemas constitucionais, tais como a Bélgica11, o critério é
identificado e derivado do princípio da legalidade (legality), de tal modo que
somente a lei poderá instituir obrigações tributárias materiais, sendo vedada à
administração tributária e ao judiciário expandir o sentido da norma de modo a
aumentar a carga fiscal do contribuinte. Não há como identificar, em nosso
entender, diretamente este critério com o princípio da legalidade, mesmo que os
seus sentidos se aproximem quanto à finalidade pretendida.
A moderna doutrina tributária e o constitucionalismo contemporâneo
fundaram algumas indagações cruciais ao embate com o dogma trazido pela
tradição anterior de interpretação conforme o célebre brocardo de Modestino.
Novas compreensões foram introduzidas no sentido de relativizá-lo, tais como:
i. nem sempre ser contra fiscum é pro libertate;
ii. nem sempre ser contra fiscum é pro livre iniciativa ou individualismo
e;
iii. nem sempre contra fiscum é a favor da capacidade contributiva.
Vejamos, pois, o caso de um contribuinte que sofre com a concorrência
desleal por parte de concorrente que sistematicamente faz uso de esquemas
societários ou tributários maliciosos, artificiosos, vazios de sentido econômico e
adquire por força da má-fé vantagem econômica sem substrato na eficiência
negocial. Neste caso, a ação do fisco contrária a estas ações não seria em
favor de todos os demais contribuintes? Não seria apenas em prol do fisco, mas
de cada um dos demais contribuintes em mesma situação? Não haveria aqui
uma defesa do fisco da manutenção da manutenção do equilíbrio de direitos
fundamentais em um plano horizontal (contribuinte-contribuinte), de caráter
nitidamente isonômico?
11 Art.170 da Constituição da Bélgica, “(...) § 1. Taxes to the benefit of the State can only be
introduced by a law”.
PAULO A. CALIENDO V. DA SILVEIRA
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Estas e outras questões serão objeto de questionamento e defesa de um
novo ponto de vista radicalmente distinto: in dubio pro fiscum.
3.2 In dubio pro fiscum
Originalmente parece o critério n dúbio pro fisco parecia ser apenas a
defesa do poder sobre os vencidos ou os dominados, contudo, logo surgiram
vozes alegando ser esta uma forma de defesa da igualdade.
Tais sentimentos tornaram-se ainda mais vivos com a identificação do
fisco como uma forma de financiamento do Estado Democrático e Social.
Este critério não aparece identificado pelos autores como sendo um critério
enunciado nos textos legais romanos, nem tampouco como tendo sido adotado
como modelo de interpretação geral. Identifica-se em passagem do Código
Justiniano um critério favorável ao fisco (“de sententiis adversus Fiscus
latis retractantis”)12.
Contudo, alguns autores identificam indícios desta tese em Roma, dado
que a expressão fisco detinha um duplo significado de um lado aparecia como
a receita destinada ao tesouro privado do Imperador (fiscus Caesaris), de
outro, aparecia como o conjunto de receitas públicas (aerarium populi romani)
de competência do Senado Romano. Cabe ressaltar que no Direito Romano o
Direito Tributário não detinha, um tratamento autônomo como disciplina de direito
público, sendo que não existia claramente a noção da fiscalidade como fonte de
financiamento do bem-comum.
A história do Direito Tributário irá apresentar essa dualidade de valores
em choque, de um lado o interesse geral representado pelo fisco e de outro o
particular representado pelo contribuinte. Some-se a isto o fato de que existia a
percepção de que o poder exercido em suas diversas formas (monarquia,
república ou aristocracia) buscava de algum modo o bem comum, o interesse
geral e público e iremos entender a razão pela qual o critério irá ressurgir de
modo avassalador com o aumento da cidadania, dos espaços de representação
e do voto substituindo a vassalagem13.
O critério in dúbio pro fisco é igualmente apresentado como um modo
de combate ao comportamento fraudulento por parte do contribuinte (in fraudem
legis agree), ou seja, em quem sem infringir as palavras da lei, contorna o seu
propósito (qui salvis verbis legis sententiam ejus circumvenit, Dig. 1.3.29).
12 Código Justiniano I, IX.
13 Cf. MARTÍNEZ, Pedro Soares. Manual de Direito Fiscal. Coimbra: Almedina, 1983, p.133.
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DIREITOS FUNDAMENTAIS DO CONTRIBUINTE E INTERPRETAÇÃO TRIBUTÁRIA: CONCEITO E APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO
IN DUBIO CONTRA SACRIFICIUM
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O critério aparece como uma forma de superação do excessivo formalismo,
que prejudica a igualdade na distribuição encargos14.
A defesa do critério seria igualmente uma fundamentação em prol dos
interesses gerais de todos os indivíduos como um todo e de cada contribuinte
mediatamente.
Estes argumentos, contudo, foram igualmente postos em cheque pela
doutrina, dado que se assentam em alguns pressupostos questionáveis. Existe
um salto lógico entre a afirmação de que o Estado busca o bem-comum, de que
a fiscalidade financia os meios para alcançar estes fins e o entendimento de
que sempre a intepretação pro fiscum representa uma solução justa. Não existe
um axioma que diga que a justiça geral deve ser sempre preferível a justiça
particular. Pelo contrário, em alguns casos a justiça particular possui maior
valoração do que a aplicação da justiça geral.
De outro lado, o sistema é repleto de situações onde o interesse geral
somente se sobrepõe ao interesse particular como exceção, onde o sacrifício
individual mereça a justa reparação, tal como no caso da desapropriação15, na
requisição administrativa, na vedação de confisco16, na proibição de privilégios
para empresas públicas e sociedades de economia mista17, na garantia do mínimo
patrimonial (bem de família), no princípio preservação da empresa, nas normas
protetivas aos usuários de serviços públicos concedidos, permissionados ou
delegados18.
Entender que existe uma cláusula geral pro fisco com base em um
princípio pétreo da supremacia do interesse público com eficácia plena e
14 “L’opinione secondo cui una rigida interpretazione della legge meglio tutela il contribuente ha
peraltro condotto, specie in Italia e in Francia, a un eccessivo irrigidimento del formalismo, che
a sua volta si è risolto nel considerare legali gli stessi interventi elusivi”, POMPEO, Valeria. La frode
alla legge nel diritto interno e l’uniformazione europea della disciplina dei contratti. Tesi di
Dottorato. Scuola Dottorale Internazionale di Diritto ed Economia “Tullio Ascarelli”. Dottorato
di Ricerca in “Diritto privato per l’Europa” – Diritto Civile, XXII ciclo Università degli Studi
Roma.
15 “Art. 5 º. XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou
utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro,
ressalvados os casos previstos nesta Constituição;”.
16 “Art. 150 (...)IV - utilizar tributo com efeito de confisco;”.
17 “Art. 173, § 1º , (...) II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive
quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários; (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 19, de 1998) e § 2º - As empresas públicas e as sociedades de economia mista
não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado”.
18 “Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão
ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. Parágrafo único. A
lei disporá sobre:I - o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos,
o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade,
fiscalização e rescisão da concessão ou permissão; II - os direitos dos usuários”.
PAULO A. CALIENDO V. DA SILVEIRA
SCIENTIA IURIS, Londrina, v.18, n.1, p.181-216, jul.2014 | DOI: 10.5433/2178-8189.2014v18n1p181
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irresistível seria admitir um sistema constitucional que não existe: o Estado
Total. Nesse caso toda a sociedade voltar-se-ia para a realização dos interesses
gerais, cada interesse particular estaria subordinado aos desejos públicos
selecionados pelo corpo administrativo e dirigente. Haveria uma absorção de
todos os patrimônios pela esfera pública e cada interesse particular somente
seria legitimado se não entrasse em confronto com a vontade geral.
Pelo contrário, não há em nosso sistema nenhuma valoração absoluta da
preferência econômica ou social pela intervenção do Estado na economia, de
tal modo que inexiste uma absorção da esfera econômica privada pela estatal,
pelo contrário esta esfera acaba sendo preterida em diversos casos pela atuação
privada em setores de interesse geral mediante concessão ou delegação
(telefonia, energia, transportes, água e saneamento, entre outros) ou pela atuação
social complementar (imunidades às entidades sociais e educacionais).
Igualmente há vedação constitucional expressa à atuação econômica direta do
Estado na economia, ressalvados os casos de relevante interesse coletivo ou
segurança nacional19.
O pior argumento, contudo, é o de natureza realista que afirma que o
sistema tem adotado uma interpretação pro fiscum na maioria dos julgados e,
portanto, trata-se da interpretação oficial dos intérpretes da constituição, com
vigência real. Tal argumento teria o mesmo sentido que afirmar que o
descumprimento sistemático de valores, princípios e regras juridicizou o ilícito,
tornando valor o desvalor, lícito o ilícito e substitui a interpretação jurídica pela
interpretação política do poder, que com sua força irresistível sufoca o jurídico.
Neste caso não estaríamos mais tratando do “Direito” Tributário e nem de um
Estado submetido ao Direito. Assim, não olharíamos mais o dever-ser, nos
contentando com o ser das vontades volúveis do poder de sujeitar. Não
precisaríamos mais estudar o Direito, mas estudar como titular-se com a outorga
para decidir sem reservas.
3.3 In dubio pro lege
Outro critério utilizado é in dúbio pro lege como uma forma de
superação do clássico impasse entre a defesa do critério in dúbio pro fiscum
e do in dubio contra fiscum. Este é oriundo da opção pelo brocardo latino
19 “Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade
econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança
nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei”.
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DIREITOS FUNDAMENTAIS DO CONTRIBUINTE E INTERPRETAÇÃO TRIBUTÁRIA: CONCEITO E APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO
IN DUBIO CONTRA SACRIFICIUM
194
“ut res magis valeat quam pereat”, que determina que quando uma norma
não é suficientemente clara deve ser buscado o sentido que preserve a sua
utilidade, de tal modo que é melhor a sua utilização (valeat) do que
simplesmente ignorá-la (pereat). Trata-se de uma norma com sentido
valorativo neutro, que não explicita exatamente qual o valor ou finalidades a
serem buscadas, devendo ser apreciadas caso a caso na interpretação útil
da norma. O efeito prático é estabelecer um comando de autorização para o
intérprete aplicar no caso concreto a sua axiologia, as suas preferências e
ideologias, em um modelo decisionista tão ao gosto do positivismo. Os critérios
uniformes são substituídos pela decisão individual do intérprete, como se o
sistema não elegesse previamente quais os valores, e não apenas as normas,
que devem ser respeitados.
3.4 In dubio contra sacrificium
Em nosso entender o critério que melhor evoca o sentido constitucional é
in dubio contra sacrificium, no sentido que a exigência de sacrifício particular
não pode ser deduzido de preceitos tácitos. Todo sacrifício decorre de uma
norma expressa do ordenamento, sob pena de se traduzir em arbítrio, abuso ou
confisco.
Este critério evoca o problema da restrição constitucional de direitos
fundamentais, visto que a tributação sempre significará uma retirada de patrimônio
do contribuinte em prol das tarefas públicas. Para Jorge Reis Novais: “no
texto constitucional ou na literatura especializada são correntes as
referências a ’restrições’, ‘limites’ ou ‘leis restritivas’ de direitos
fundamentais para significar uma idéia comum de afectação ou
intervenção estatal no domínio dos direitos fundamentais com algum sentido
desvantajoso para os interesses da liberdade” (NOVAIS, , p. 155). Tem-se
entendido que há três limites aos direitos fundamentais: i) os imanentes que
excluem certos modos de seu exercício; ii) os que resultam de colisões, ou seja,
de limitações recíprocas e iii) os decorrentes de leis restritivas na salvaguarda
dos valores constitucionais (PEREIRA, 2006).
As limitações imanentes dos direitos fundamentais são aquelas que
excluem certos modos de seu exercício. Esta teoria parte do entendimento de
que os direitos fundamentais possuem um conteúdo mínimo, que não pode ser
violado, sob pena de ofensa direta ao direito fundamental. Encontraremos na
Constituição alemã: “em nenhuma hipótese um direito fundamental poderá
PAULO A. CALIENDO V. DA SILVEIRA
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ser afetado em sua essência”20. Ao assim se admitir pressupõe-se igualmente
que os direitos fundamentais não podem uma estrutura e limites e não são
absolutos. Assim, o direito fundamental à liberdade à auto-organização dos
negócios privados do contribuinte não autoriza que atue em fraude a lei.
Situações diversas decorrem quando as limitações resultam de colisões,
ou seja, de limitações recíprocas e os decorrentes de valores e princípios
constitucionais. O texto constitucional brasileiro apresenta um caráter
nitidamente complexo, visto que sendo fruto de um esforço político de base
ampla na superação do regime autoritário, contemplou um amplo espectro
ideológico na eleição de seus valores fundamentais: individualismo, Estado Social,
liberdade, igualdade, entre outros. Estes se apresentam axiologicamente no
mesmo plano normativo, fazendo com que os métodos tradicionais de
interpretação (hierárquico, cronológico e especialidade) não funcionem
adequadamente. Como solução exige-se a ponderação como método
complementar na busca da unidade constitucional. Assim, por exemplo, permite-
se igualmente o direito fundamental à liberdade à auto-organização dos negócios
privados desde que o contribuinte não ofenda outros princípios constitucionais,
tais como a livre concorrência. O abuso de direito do contribuinte é vedado se
praticar a uma ofensa a outros princípios constitucionais, a serem verificados
no caso (PEREIRA, 2006, p. 289). Podemos citar como exemplo o caso American
Virginia, em que o contribuinte se utilizava sistemática e dolosamente da
inadimplência como mecanismo anticoncorrencial.
Podemos citar como exemplo de lei restritiva na salvaguarda dos
valores constitucionais. (o que?) Vigora de modo geral a eficácia imediata
dos direitos fundamentais (aplicabilidade imediata), conforme o art. 5°, § 1° do
texto Constitucional (“As normas definidoras dos direitos e garantias
fundamentais têm aplicação imediata”). Em determinados casos o texto
constitucional expressamente instituiu reservas ou restrições, tais como no caso
das imunidades das instituições de educação e de assistência social, sem fins
lucrativos, que devem atender os requisitos da lei (art. 150, inc. VI, alínea c da
CF/88).
A interpretação in dubio pro fisco se caracterizaria em nossa opinião
em uma restrição a direito fundamental não expressamente autorizada pelo
texto constitucional e não prevista em nenhum dos casos anteriores. Esta
renúncia tem sido aceita no direito comparado em relação aos direitos da
20 “Art. 19. (2) In keinem Falle darf ein Grundrecht in seinem Wesensgehalt angetastet werden”.
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DIREITOS FUNDAMENTAIS DO CONTRIBUINTE E INTERPRETAÇÃO TRIBUTÁRIA: CONCEITO E APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO
IN DUBIO CONTRA SACRIFICIUM
196
comunidade, ordem pública e vedação de abuso de direito, contudo a sua
admissão deve ser realizada sob severos limites, sob pena de ofender o conteúdo
essencial do direito, a prerrogativa de estabelecer restrições concedida ao
legislativo e a prevalência a priori dos interesses individuais.
Cabe ressaltar a pertinência do texto de Reis Novais: “daí resulta esse
atributo de entricheiramento (Nino) dos bens jusfundamentalmente
protegidos contramedidas restritivas que visem o benefício de outros de
entidades supra individuais ou do interesse geral. Desde que estas medidas
afectem desfavoravelmente o âmbito nuclear da liberdade individual, ou
seja, a área de autonomia exigida pelo princípio da dignidade da pessoa
humana, o sacrifício imposto, mesmo que o seja a uma só pessoa e mesmo
que tenha como contrapartida, numa perspectiva utilitarista, o incremento
significativo das utilidades da sociedade no seu conjunto é inadimissível”
(NOVAIS, p. 604).
No mesmo sentido expressa Ingo Sarlet (SARLET, 2012, p. 411) de que:
“A idéia fundamental desse requisito é a de que existem conteúdos
invioláveis dos direitos fundamentais que se reconduzem a posições mínimas
indisponíveis às intervenções dos poderes estatais”.
Entendemos, desse modo, que a atribuição de sacrifício aos contribuintes
deva ser realizada nos limites expressos do ordenamento e somente em situações
excepcionais muito claras.
4 APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO IN DUBIO CONTRA
SACRIFICIUM E FIGURAS AFINS
A aplicação princípio do in dubio contra sacrificium pode ser
vislumbrado em uma multiplicidade de situações interpretativas ou de integração
normativa dentre as quais podemos vislumbrar os casos abaixo para análise.
4.1 Vedação de analogia gravosa ou desfavorável ao contribuinte.
Determina o art. 108, § 1° do CTN que “o emprego da analogia não
poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei”. O texto funda
claramente a vedação da analogia gravosa no princípio legalidade, mas
igualmente poderíamos citar o princípio do in dubio contra sacrificium como
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limite material ao surgimento de imposições decorrentes de raciocínio analógico.
Desse modo, podemos admitir que em Direito Tributário nacional somente se
permite o recurso à analogia in favorem.
Vejamos detalhadamente o conceito de analogia e a sua relação com
outros conceitos.
A analogia pode ser entendida como o meio de integração jurídica onde
em razão da presença de indeterminação normativa determinado caso é
disciplinado com fundamento em tratamento semelhante utilizado para caso
similar.
Inicialmente cabe observar que a etimologia da palavra analogia decorre
do grego e significa proporção, sendo “ana” implicando “de acordo” e “logia”
como “estudo”, melhor dizendo trata-se de uma relação entre coisas que
possuem um traço comum. Os latinos, especialmente Cícero e Boécio,
traduziram como proporção, mas a versão grega de semelhança prevaleceu no
pensamento jusfilosófico.
É em Aristóteles que o termo terá as suas primeiras conceituações ou
como um caso da metafísica (analogia entis) ou como um procedimento de
raciocínio por semelhança. Como um caso da metafísica significa um nível
intermediário entre o Um e a Multiplicidade, ou seja, entre o Criador e Criatura
no pensamento medieval tomista. O problema filosófico aqui era como encontrar
uma elemento de diálogo entre os múltiplos gêneros e a unidade do Ser. De
outro lado, o problema em termos de raciocínio será outro e partirá da noção de
relação. A analogia será considerada como “a regra baseada nas coisas que
guardam relação semelhante, diferente da regra que se baseia nos atributos
que pertencem de igual maneira” (ARISTÓTELES, 1987, p. 150). A analogia
não implica em uma relação de pertinência, mas de comparação entre atributos.
Para Aristóteles a analogia é uma relação de quatro membros (“analogia
é uma igualdade de relações que supõe, pelo menos, quatro termos”), em
sentido geométrico podemos representar da seguinte forma a/b = c/d, assim A
está para B, do mesmo modo que C está para D. Não se tratam de termos
idênticos, mas que possuem uma relação de semelhança. Transferindo esse
entendimento para as regras de raciocínio poderíamos dizer que se trata de um
juízo por semelhança e não pode inclusão de classes por identidade. Assim o
analogia entre a forma de um pé de mesa e a pata de um animal, tratam de
seres diferentes mas como funções ou formas símiles.
O raciocínio por analogia possui grande importância na filosofia e nas
ciências, pois permitiu a construção de conhecimento partindo de um objeto
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DIREITOS FUNDAMENTAIS DO CONTRIBUINTE E INTERPRETAÇÃO TRIBUTÁRIA: CONCEITO E APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO
IN DUBIO CONTRA SACRIFICIUM
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conhecido para compreender um objeto em estudo ainda não conhecido21.
Conquistava-se assim um instrumental para além da experiência capaz de
formular modelos provisórios, probabilísticos ou testáveis.
A analogia jurídica foi entendida originalmente como um caso distinto
da interpretação extensiva. No caso da interpretação extensiva existe um
texto normativo, contudo, a aplicação normativa ocorre em uma situação de
incerteza jurídica. O texto normativo não impõe uma aplicação inequívoca,
torna-se necessário realizar um procedimento de correção para que o sentido
do texto normativo (voluntas legis) seja compreendido conforme o seu sentido
jurídico (animus) e não meramente pelo sentido literal (verba). A
interpretação extensiva seria uma forma de ajuste entre o sentido normativo
e uma aplicação conforme um sentido jurídico coerente com este. Como
exemplo de interpretação extensiva podemos citar o caso do julgamento pelo
STJ da lista de serviços bancários, onde decidiu-se que apesar da Lei
Complementar nº 56/87 ser taxativa na enumeração dos serviços, admitia
uma interpretação extensiva dos seus itens, abarcando todas as espécies do
gênero tributado. Assim, deveria prevalecer não a denominação prevista na
Lei ou utilizada pelo banco, mas a natureza jurídica do serviço prestado pelo
mesmo (RESENDE FILHO, 2002, p. 170).
A interpretação extensiva prevê três elementos: i) presença de dispositivo
normativo; ii) indeterminação aplicativa quanto ao conteúdo ou alcance dos
casos abrangidos pelo texto normativo e iii) necessidade de correção, ou seja,
ajuste entre o sentido normativo do texto e o sentido jurídico pretendido pela
norma.
A analogia originalmente foi pensada como um caso diverso da
interpretação extensiva. Para a doutrina clássica na analogia ocorre em um
contexto de indeterminação normativa que exige a aplicação de um raciocínio
por semelhança para casos similares (argumentum a simili). A analogia era
conhecida dos romanos que propugnavam: ubi eadem ratio ibi idem jus, ou
seja, “onde houver o mesmo fundamento haverá o mesmo direito ou ubi
eadem legis ratio ibi eadem dispositio “onde impera a mesma razão deve
prevalecer a mesma decisão”.
A analogia possui os seguintes elementos: i) indeterminação normativa
com ausência ou indefinição do texto normativo aplicável; ii) aplicação por
meio de raciocínio por semelhança pela utilização casos semelhantes para
21 RESENDE FILHO, E. P. . Pierre Aubenque e a Idéia da Analogia do Ser Aristotélica. O Que nos Faz
Pensar, v. 15, p. 169-183, 2002, p. 170.
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resolver casos similares e iii) permissão normativa para a correção por
analogia, ou seja, não pode existir vedação legal ao uso da analogia.
Mais recentemente a doutrina jusfilosófica passou a questionar a distinção
entre a analogia e a interpretação extensiva. Emilio Betti será um dos primeiros
e mais importantes doutrinadores a questionarem tal situação alegando que os
dois procedimentos interpretativos se equivalem, na medida que a interpretação
extensiva ultrapassa o mero propósito de clarificação normativa, possuindo uma
força criativa. A interpretação extensiva possuiria mais do que uma mera força
cognoscente ou simples conhecimento dos casos de aplicação da norma, mas
também uma força prescritiva, ou seja, produtora de normas jurídicas
(JUSTO,1988, p. 253).
Não há como negar que tanto a interpretação extensiva, quanto a analogia
possuem força criativa, contudo, o ponto de partida de cada uma delas é diverso.
Não há como reduzir a analogia a interpretatio. No primeiro caso existe um
texto normativo, mas a indeterminação está na abrangência ou sentido dos
casos previstos na norma; enquanto que na analogia há inexistência ou
indeterminação texto normativo aplicável, sendo necessário a solução por recurso
a um procedimento por semelhança.
A analogia tem sido distinguida em analogia legis e analogia juris22.
Na primeira espécie face a inexistência de uma norma diretamente aplicável
ao caso a solucionar, procura-se uma norma que possua um sentido (ratio) de
regência a casos semelhantes. Assim, pesquisa-se uma norma cuja hipótese
tipifica caso similar. Não ocorre, contudo, a subsunção de um caso análogo a
hipótese de uma norma que rege casos semelhantes, mas a adoção de uma
solução com base na ratio daquela norma. Assim, se uma norma de processo
administrativo federal prevê o prazo de 30 dias para a prática de determinados
atos, então em face inexistência de lei estadual expressa sobre matéria e presente
um caso semelhante poder-se-ia utilizar a lei federal como modelo para solução
estadual. Nesse, caso não houve subsunção do fato jurídico estadual a uma
hipótese normativa federal, mas o uso por analogia daquela norma para fins de
resolução do problema.
Na analogia juris diversamente extrai-se de um conjunto de normas o
sentido capaz de resolver o caso sub judice. Geralmente esta operação tem
22 Há controvérsias nesta distinção. De um lado, Miguel Reale e Paulo Nader entendem não existir a
analogia juris, sendo esta mera aplicação dos princípios, de outro, temos Rubens Limongi França
que entende ser distinta a aplicação direta dos princípios e a sua aplicação indireta por meio de
analogia.
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DIREITOS FUNDAMENTAIS DO CONTRIBUINTE E INTERPRETAÇÃO TRIBUTÁRIA: CONCEITO E APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO
IN DUBIO CONTRA SACRIFICIUM
200
sido entendida com a realização de algumas etapas: i) identificação das normas
aplicáveis a casos semelhantes; ii) determinação por indução dos princípios
gerais e iii) aplicação do princípio geral para a solução do caso. Nesse caso,
verifica-se a construção por analogia de uma norma principiológica que se
existisse resolveria o caso. Esse raciocínio teria tal formulação: se existisse
uma norma jurídica que subsumisse o caso em questão, esta teria tal hipótese
normativa à semelhança dos casos similarmente tratados por tais normas
expressas com ratio semelhantes.
A doutrina opta por denominar a operação de uma aplicação por recurso
à interpretação principiológica. Novamente não cremos que se deva entender
a analogia como um caso da interpretatio. A distinção entre os dois casos
ainda parece ser útil. O procedimento lógico-argumentativo é diverso em cada
caso, mesmo que o resultado originado seja semelhante a produção de uma
norma para solucionar um caso perante uma situação de indeterminação, seja
esta textual ou normativa.
A analogia poderia em princípio ser utilizada de maneira gravosa ou
favorável ao contribuinte. Em nosso sistema jurídico não há permissão legal
para a analogia gravosa e para criação de tributos por meio da analogia. Nesse
ponto, segue o Direito Tributário o modelo adotado em Direito Penal brasileiro,
onde inexiste a possibilidade de aplicação de norma penal incriminadora por
meio de analogia in malam partem, mas tão somente in bonam parte. Em
Direito Penal este entendimento decorre diretamente do art. 3º do Código Penal
(CP) que determina: “Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há
pena sem prévia cominação legal”.
Igualmente em Direito Tributário não há a possibilidade de surgimento
de tributos por analogia, mas cremos que mais do que isso deva existir em
nosso sistema o uso restrito da analogia em favor do contribuinte (analogia in
favorem). Assim, salvo em casos de quebra direta da isonomia, da neutralidade
concorrencial e da capacidade contributiva, a analogia deve ser evitada para
agravar a situação do contribuinte em matéria tributária, seja quanto as
obrigações principais ou quanto os deveres formais ou de colaboração com o
fisco. A analogia in malam partem não pode ser fundamento para exigência
de deveres formais não previstos em lei ou de cooperação adicional com o
fisco para além do sentido legal.
Um exemplo interessante de aplicação de analogia em matéria tributária
encontra-se na decisão que afastou a exigência do IOF em operações de
contracorrente realizadas entre empresas do mesmo grupo econômico, com o
PAULO A. CALIENDO V. DA SILVEIRA
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argumento de que essas operações não podem ser equiparadas imediatamente
a operações de mútuo. Desse modo, essa decisão afastou o Ato Declaratório
nº 07/99, que equiparou os contratos de mútuo e os de contracorrente, com
base no entendimento de que o texto do artigo 13 da Lei nº 9.779 não dispunha
expressamente sobre as operações de conta-corrente23.
A analogia igualmente se diferencia do argumento a contrario sensu.
Enquanto o primeiro é um argumento por semelhança o outro é por exclusão ou
negação. O argumento a contrario sensu é um tipo de interpretação inversa.
Assim, por exemplo no princípio da legalidade decorre que aquilo que não é
proibido é permitido (AMADO, 2001, p. 05). Cabe notar que a utilização do
argumento a contrario sensu não possui expressa previsão legal, sendo um
caso geral de interpretação inversa, mas que deve ser utilizado com bastante
cuidado.
A estrutura lógica deste argumento exige a presença de duas proposições
de mesmo gênero, que o valor lógico do contrário de uma proposição seja o seu
inverso. Assim, o contrario de verdadeiro deve ser falso e vice-versa. Se eu
digo A é verdadeiro, então não A será falso. Cabe recordar que nem toda
hipótese impõe diretamente um resultado direto, visto que a inversa de uma
proposição falsa pode ser igualmente falsa e não verdadeira. Não basta serem
as proposições referentes ao mesmo gênero, devem também ser da mesma
espécie. Se afirmo “todos os tributos são impostos” esta afirmação é falsa,
bem com o seu contrário “nenhum tributo é imposto”, visto que existe a
categoria alguns.
Conforme a lógica silogística são proposições contrárias quando se diz
que “Todo S é P” e “Nenhum S é P” ou “Alguns S são P” e “Alguns S não
são P”. Assim deve-se atentar se o argumento se refere a uma proposição
universal (Todo ou Nenhum S é P); particular (Alguns S são/não são P) ou
singular (Este S é/não é P). Alerta Aristóteles que duas proposições que não
podem ser verdadeiras ao mesmo tempo, por exemplo “todos os homens são
mortais” e “nenhum homem é mortal”.
O uso do raciocínio a contrario exige regras especiais de lógica para
que não redunde em um argumento falso. Legitima-se argumentação a contrario
sensu sempre que impliquem em um raciocínio a favor do contribuinte, de tal
modo que o princípio da legalidade afasta tanto a argumentação a simile e a
contrario desfavoráveis ao contribuinte.
23 Acórdão nº 3101001.094, 1ª Câmara, 1ª Turma, CARF.
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DIREITOS FUNDAMENTAIS DO CONTRIBUINTE E INTERPRETAÇÃO TRIBUTÁRIA: CONCEITO E APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO
IN DUBIO CONTRA SACRIFICIUM
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4.2 Equidade
O conceito de equidade está longe de ser unívoco, sendo fortemente
influenciado por múltiplos sentidos. Aparece no art. 108 do CTN de modo
expresso e é exigido quando os demais métodos de interpretação e integração
forem insuficientes. Assim determina:
Art. 108. Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para
aplicar a legislação tributária utilizará sucessivamente, na ordem indicada:
(...)
IV - a eqüidade.
(...)
§ 2º O emprego da eqüidade não poderá resultar na dispensa do pagamento
de tributo devido.
Não há, contudo, um conceito legal para equidade, sendo que doutrina
diverge bastante sobre o seu sentido (CANARIS, 1983). Igualmente no Direito
nacional não existe uma regra clara. A antiga LICC, de 1917, dispunha em seu
artigo 5º que:
Art. 5º - Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige
e às exigências do bem comum.
Este artigo tem sido citado pela doutrina civilista com a base para a
equidade em nosso sistema. Esta tem sido entendida como ideia de “justiça
do caso concreto”, tratamento isonômico (igualdade), moderação, conduta
virtuosa, critério ético de decisão, justiça na decisão, julgamento benevolente,
justiça natural, sentido de justiça, decisão preponderante pela ius contra a lex,
entre tantos outros (ARAÚJO, 2013, p. 13419).
Cabe realizar duas distinções, de um lado o julgamento por equidade
difere do uso de juízos de equidade. No primeiro caso a equidade é um critério
direto de deliberação para a integração normativa, no outro reflete um juízo que
deve permear todas as decisões ou interpretações normativas: a ideia de justiça,
de bem comum, de solução ética e virtuosa. Nesse caso o julgamento ocorre
com base em dispositivos, normas ou critérios interpretativos, mas sempre
possuindo por horizonte a noção de justo (ius).
A equidade pressupõe igualmente a situação de confronto entre o justo
(ius) e o legal (lex). Para longe da noção de equidade como prevalência da
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ordem natural sobre a ordem positiva, podemos pensa-lo como um critério de
correção normativa. A equidade seria uma espécie de redução ou extensão
axiológica, ou seja, frente a uma grave incongruência entre os valores que uma
norma pretende proteger e sua aplicação a um caso concreto a equidade
funcionaria como um corretivo impedindo uma aplicação que em si gerasse
uma solução inadmissível com o conjunto de valores protegidos pelo ordenamento
jurídico, tais como tratamentos discriminatórios injustificados, ofensa à dignidade
da pessoa humana por normas que pretensamente deveriam protege-la, soluções
contrárias à boa-fé ou ao bem comum.
A equidade possuiria os seguintes elementos: i) dispositivo normativo a
ser aplicado; ii) situação de fato a ser regulada; iii) cotejo entre o estado de
coisas a ser protegido pela norma e o resultado concreto a ser atingido pela
aplicação da norma; iv) apreciação ou juízo de desconformidade entre os
valores a serem protegidos pela norma e o efeito concreto da aplicação da
norma v) utilização de meio de correção por afastamento da norma e aplicação
de uma solução conforme ao pretendido no espírito da norma ou do
ordenamento.
Cabe observar que não precisa existir uma norma ao caso concreto,
sendo suficiente a possibilidade de existência de um caso concreto que exija a
aplicação normativa. A situação a ser regulada é um caso concreto que irá
exigir uma solução, que poderá estar prevista na norma ou mesmo decorrer de
sua situação única e não prevista em alguma norma específica (justiça do
caso concreto).
Tal situação ocorre especialmente em situações de mudanças sociais
onde não existe ainda norma clara para regular a situação, por exemplo
tratamento da clonagem ou computação nas nuvens. Um exemplo de
julgamento por equidade está na aplicação da taxa Selic às execuções fiscais,
visto que os pedidos de compensações e ressarcimentos são corrigidos por
estes índices. A utilização da equidade deve ser realizada em último caso,
como defesa em ultima ratio contra uma aplicação injusta. A equidade se
trata da última linha de defesa dos direitos fundamentais e da dignidade da
pessoa humana e assim não é a primeira linha de defesa ou um salvo conduto
para o afastamento de leis e regras jurídicas com base em argumentos
genéricos de igualdade. As regras buscam sempre cumprir com o desiderato
de realizar a justiça, a igualdade e o respeito aos fundamentos da Constituição,
salvo contrário submetem-se ao juízo de inconstitucionalidade e são extirpadas
do sistema, se permanecem é porque respondem aos requisitos mínimos de
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pertinência. Afastar uma regra com base em argumentos genéricos de
equidade é tão grave como afastar um princípio.
Somente quando o caso é tão excepcional que o arcabouço normativo
falha, inexistem princípios jurídicos, argumentos a símile ou presença de
critérios interpretativos frágeis é que a equidade pode ser levantada como
último bastião contra a injustiça, discriminação ou julgamento malevolente.
A noção geral de equidade é justamente de atuar como uma forma de
atenuação na aplicação estrita de uma norma, de tal modo que a sua aplicação
geraria um efeito injusto ou mesmo contrário a própria finalidade da norma.
Sua utilização visa evitar aplicações esquemáticas da norma jurídica, bem
como permitir a sua aplicação adequada às peculiaridades do caso concreto.
Aqui a idéia de equidade é comparada ao mito da “régua de Lesbos”, que
seria flexível e se adaptaria ao caso concreto. Esta era feita de metal e podia
se adaptar a forma da pedra, permitindo a medição de blocos de granito.
Em sentido diverso entende Ricardo Lôbo Tôrres que a equidade em
Direito nacional possui natureza de conceito indeterminado, ou seja, como
sede material para a interpretação e valoração e não como instrumento de
correção normativa (TÔRRES, p. 134). Cremos, contudo, que o sentido
esboçado pelo texto é justamente como norma integradora com sentido de
correção normativa e assim está expresso no texto legal como última ratio
ou como última linha de defesa dos direitos fundamentais do contribuinte. Seu
limite é a vedação à dispensa do pagamento de tributo devido, contudo,
nada impediria a dispensa de exigência de obrigação acessória indevida no
caso concreto.
Somente a lei pode proceder a dispensa do pagamento de um tributo
sendo que nesse caso
Art. 172. A lei pode autorizar a autoridade administrativa a conceder, por
despacho fundamentado, remissão total ou parcial do crédito tributário,
atendendo:
I - à situação econômica do sujeito passivo;
II - ao erro ou ignorância excusáveis do sujeito passivo, quanto a matéria de
fato;
III - à diminuta importância do crédito tributário;
IV - a considerações de eqüidade, em relação com as características pessoais
ou materiais do caso;
V - a condições peculiares a determinada região do território da entidade
tributante”.
PAULO A. CALIENDO V. DA SILVEIRA
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Nesse caso a discricionariedade para agir não decorre da vontade da
administração fiscal, mas dos propósitos previstos na própria norma legal, que
já explicita os fins e os meios a serem alcançados, deixando ao administrador o
juízo de adequação entre a finalidade da norma e a situação concreta. Nesse
caso vislumbra-se a situação que a cobrança de tributo é instrumento de injustiça
e desigualdade material. A equidade surge nesse caso como correção legal de
determinada situação de injustiça, em que exigir a cobrança do tributo implicaria
ofender ao sentido de bem comum e não realizaria a igualdade. Cabe lembrar
que a própria lei de dispensa fiscal deve obedecer aos princípios da isonomia,
da capacidade contributiva, proporcionalidade e responsabilidade fiscal.
Sua importância dogmática tem sentido cada vez mais reduzida em função
da utilização mais adequada e tecnicamente mais apropriada do uso do juízo de
proporcionalidade sobre a correta relação entre os meios a serem aplicados e
os fins jurídicos pretendidos. Sua permanência manifesta-se no Direito Penal
Tributário sob a forma in dubio pro reo e no Direito Tributário como um todo
como in dubio contra sacrifium.
4.3 Interpretação benéfica
O uso de interpretação benéfica aparece diretamente no art. 112 do
CTN que determina a sua aplicação nos casos de sanções tributárias, da seguinte
forma:
Art. 112. A lei tributária que define infrações, ou lhe comina penalidades,
interpreta-se da maneira mais favorável ao acusado, em caso de dúvida
quanto:
I - à capitulação legal do fato;
II - à natureza ou às circunstâncias materiais do fato, ou à natureza ou extensão
dos seus efeitos;
III - à autoria, imputabilidade, ou punibilidade;
IV - à natureza da penalidade aplicável, ou à sua graduação.
Esse dispositivo se aplica unicamente em casos de dúvida sobre a
aplicação da lei, não havendo a presença desta não há como se afastar a
aplicação normativa sob pena de ofensa ao princípio da legalidade e da isonomia
tributária. A dúvida difere da ausência de norma ou da lacuna, ela pressupõe a
existência de uma norma, contudo, o seu sentido é polissêmico, ambíguo, poroso
ou obscuro. Essas dúvidas ocorrem em virtude de um mal uso de conceitos
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polissêmicos. Todas as palavras são polissêmicas, contudo, o falta de adequação
entre a extensão, compreensão e sentido destas podem gerar problemas sérios
de entendimento. A ambiguidade ocorre quando a palavra possui mais de um
sentido e estes forem antinômicos não permitindo indicar com clareza qual o
sentido adequando para a utilização no caso concreto; a vaguidade ocorre
quando a palavra denotar um conjunto extenso de significações, dificultando a
sua compreensão atual, visto que a aplicação impõe um resultado diverso da
aplicação de outro sentido possível. A obscuridade implica na ausência de um
sentido útil a ser aplicado.
A deve ser fundada, ou seja, deve estar um dos três casos de vícios de
sentido, decorrentes de uma polissemia disfuncional (CORDEIRO, 2001. p.
1176-1177), ou seja, do mal uso de palavras com sentido aberto ou muito amplo.
Esta deve ser entendida como uma patologia semântica a ser tratada com um
terapia analítica capaz de reconstruir um sentido sistemático. Tal situação ocorre
especialmente no uso de conceitos indeterminados, cláusulas abertas ou tipos
abertos, que geram clara dúvida sobre a conduta a ser seguida pelo contribuinte.
Em especial tal situação ocorre nos casos em que o contribuinte deve proceder
ao lançamento por homologação, tentando determinar o sentido de normas que
nem sempre são muito claras.
Um exemplo de aplicação desta está no entendimento que seja estendido
à concordata o disposto no art. 23 do Decreto-Lei nº 7.661/45, o qual prevê a
exclusão da multa moratória aos casos de falência.24
Não há incompatibilidade entre o art. 112 e o art. 136 do CTN como
inicialmente poderia parecer, nem tampouco uma antinomia entre o conceito de
responsabilidade objetiva (art. 136) e de responsabilidade subjetiva (art.112). O
texto do CTN determina que a responsabilidade por infrações é objetiva e
independe da intenção do agente ou do responsável, contudo, essa regra não
pode ser aplicada de modo esquemático em qualquer situação de tal modo que
quando essa aplicação se der na presença de dúvidas razoáveis quanto a
capitulação legal do fato, natureza ou circunstâncias materiais do fato, autoria,
imputabilidade ou natureza da penalidade aplicável então deve ser afastada a
regra geral de responsabilidade objetiva e se aplicar uma norma corretiva do
rigor legal desarrazoado.
24 EMENTA: EMPRESA EM REGIME DE CONCORDATA. MULTA. INAPLICABILIDADE DO ART.
23 DA LEI 7661/45. Inaplicável à concordatária o preceito do art. 23 da Lei de Falências (Lei
7661/45), por tratar-se de situação jurídica distinta. Não incide no regime concordatário, a
interpretação mais favorável, constante no inc. II do art. 112 do CTN, por inexistir, no caso,
dúvida a ensejar sua aplicação. (TRF4, EIAC 96.04.06039-2, Primeira Seção, Relator Vilson
Darós, DJ 22/03/2000).
PAULO A. CALIENDO V. DA SILVEIRA
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4.4 Incidência normativa dos direitos fundamentais
A doutrina dos direitos fundamentais modificou fortemente o debate
constitucional, abrangendo diversas inquietações teóricas sobre pontos
absolutamente instigantes, tais como: qual o núcleo essencial dos direitos
fundamentais? Qual a sua eficácia e estrutura normativa? Como se relacionam
com os princípios formais e de competência? Serão princípios, regras, valores
objetivos ou outro gênero? Existe sopesamento ou balanceamento entre direitos
em colisão? Todas as questões tem sido amplamente debatidas no moderno
debate constitucional (SILVA, 2005). O Direito Tributário ainda não se apropriou
completamente dos avanços interpretativos, contudo, esta tarefa se torna ainda
mais urgente em função da necessidade de instrumentos teóricos que auxiliem
quando o intérprete é exigido a tomar posição perante normas com diretrizes
opostas.
Um exemplo esta na utilização da redução teleológica, em que se
produz uma redução de sentido de um dispositivo por ele ser muito amplo ou
da extensão teleológica onde se amplia o sentido de um dispositivo por eles
ser muito restrito em relação a sua finalidade. Os dois casos exigem a análise
dos seguintes elementos: i) dispositivo normativo a ser interpretado; ii) sentidos
possíveis em sua interpretação e iii) análise da finalidade do dispositivo.
Decorre dessa análise o pressuposto de prevalência da finalidade sobre o
sentido, de tal modo que um sentido muito amplo em relação a uma finalidade
prevista implicará em uma redução interpretativa e no caso inverso uma
ampliação de sentido.
Vejamos, por exemplo, a extensão do conceito de imunidade (norma
negativa de competência) dos livros. Entender que a palavra livro signifique
somente a obra produzida em papel e encadernada seria ignorar séculos de
história onde este foi produzido sem a presença de prensas ou papel. Seria
equivocado pensar que esta imunidade não abrange os livros eletrônicos, somente
porque não são encadernados, sendo necessária uma ampliação teleológica em
função da finalidade a ser protegida: os valores constitucionais da liberdade de
informação, a promoção da cultura e da educação.
Verifica-se como por óbvio que o elemento nuclear nessa técnica
interpretativa está na identificação e delimitação da finalidade normativa que
ordena o dispositivo e seu sentido. A presença Cartas Constitucionais muito
amplas, ambíguas, porosas e vagas torna essa tarefa interpretativa muito mais
difícil. Exigir um texto constitucional exato ou muito preciso seria uma
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inadequação técnica, visto que ofenderia a sua natureza de carta de compromisso
social e político, típico de sociedades plurais.
Deixar ao sabor do intérprete do momento escolher a melhor resposta
ou melhor finalidade gera insegurança e injustiça. As finalidades mais amplas
da norma tais como o bem-comum, o interesse social ou o interesse público não
podem fundamentar diretamente restrições não expressamente autorizadas de
direitos fundamentais, sob pena de ofensa direta ao princípio da legalidade e
segurança jurídica.
4.5 Restrições não autorizadas a direitos fundamentais: análise lógico-
normativa
Os direitos fundamentais possuem limites e um conteúdo essencial e
é justamente sobre a determinação dos limites imanentes que tem surgido a
principal linha teórica de autorização à restrições não-autorizadas aos direitos
fundamentais, inclusive dos contribuintes. O primeiro argumento tem sido
alegado por meio da chamada “cláusula da comunidade” (NOVAES, 2003,
p. 448), no sentido que os direitos fundamentais individuais derivam da
comunidade e portanto havendo confronto entre eles deve prevalecer o
bem jurídico superior, ou seja, aquele que protege a existência de todos
outros: a comunidade. O problema desse argumento está em desconsiderar
que se todos os direitos e bens jurídicos decorrem da comunidade, todas as
situações concretas tornam-se precárias, pois sempre poderão a qualquer
momento serem afastadas em prol do bem maior da comunidade. O próprio
sistema constitucional limita esta saída ao determinar que é protegida a
coisa julgada, o direito adquirido e o ato jurídico perfeito. Igualmente deve
ser respeitado o princípio da boa-fé e da segurança jurídica.
Dessa forma, a cláusula da comunidade não pode ser utilizada como
uma autorização genérica de limitação ou correção no exercício de direitos
fundamentais, nem como uma autorização genérica ao poder discricionário
para agir ou como norma ampliativa de competência (limite da estrita
legalidade e da cobrança vinculada), tampouco como uma finalidade imediata
a ser perseguida a todo momento para interpretação do sentido de dispositivos
normativos. A busca dos interesses da comunidade está pressuposta em
todas as normas do sistema, sendo que a própria defesa dos direitos
individuais é tida como uma das finalidades máximas da comunidade.
PAULO A. CALIENDO V. DA SILVEIRA
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Recorda Jorge Reis Novaes que se alega como limitação não
expressamente autorizada o argumento do direito dos outros. Assim, os direitos
fundamentais para existirem devem respeitar logicamente os direitos de outros
indivíduos, sob pena dessa violação implicar em ofensa ao sistema geral de
direitos. Novamente aqui cabe meditar no sentido que toda a aceitação de
direitos individuais implica em certa medida em uma restrição aos direitos de
outrem, veja-se o direito de propriedade que limita diretamente os interesses
de terceiros, se configurando como oponível erga omnes. A possibilidade de
existirem direitos excludentes aos interesses de terceiros ou da comunidade é
a própria base dos direitos da propriedade protegidos constitucionalmente.
Desse modo, somente quando o direito dos outros estiver claramente delimitado
é que ele pode ser oponível a um direito igualmente delimitado. Como exemplo
poderíamos citar o direito de vizinhança. Em matéria tributária os direitos do
fisco ou da sociedade não podem se impor ao direito do contribuinte assentados
sob clamores gerais.
Por último, cabe analisar o caso de restrições com base em leis gerais,
conceitos indeterminados, cláusulas abertas ou standards de conduta
(NOVAES, 2003, p. 460). Tem sido alegado que as leis gerais possuem
eficácia a ser observada pelos direitos fundamentais especialmente quando
existir a proibição por parte de uma lei geral. O problema da restrição não
expressamente autorizada de direitos fundamentais por leis gerais poderia
ocorrer em situações diversas: i) quando o texto da lei diretamente proíbe
determinada conduta ou restringe direito de forma genérica, sem determinar
seus limites precisos; ii) quando o texto da lei não proíbe mas restringe
abstratamente o exercício do direito; iii) quando o texto da lei estabelece
condições para o exercício de um direito fundamental.
As leis gerais podem e devem delimitar os direitos fundamentais com
base na ordem pública (saúde, segurança, etc.), bem como determinar
requisitos para a realização de direitos fundamentais. A própria existência
das taxas de fiscalização ou de polícia determinam que esta atividade é
constitucionalmente prevista e deve ser financiada por quem tenha interesse
em seu exercício, contudo, as próprias leis gerais devem estar submetidas ao
controle de vedação de proteção excessiva e insuficiente, bem como ao
princípio da proporcionalidade.
Os conceitos indeterminados, cláusulas abertas ou standards de
conduta igualmente devem estar sujeitos a controle e não podem proibir, limitar
ou restringir direitos claramente definidos.
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Como bem ressalta Ingo Sarlet: “a garantia de proteção do núcleo
essencial dos direitos fundamentais aponta para a parcela de conteúdo
de um direito sem a qual ele perde a sua mínima eficácia, deixando, com
isso, de ser reconhecível como direito fundamental” (SARLET, 2012, p.
411).
4.6 Normas anti-elisivas, anti-abusivas, anti-evasivas e similares.
As normas anti-elisivas, anti-abusivas, anti-evasivas são outra classe
de restrições não-expressamente autorizadas destinadas a combater condutas
consideradas inadmissíveis. Tratam-se vedações fundadas em uma finalidades
meritórias, visto que a evasão significa uma distribuição desigual (assimétrica)
do dever de contribuir com tributos em uma sociedade democrática. A evasão
implica em ofensa à moralidade tributária; ao princípio da livre concorrência e
ao princípio da igualdade na aplicação da norma tributária.
A evasão fiscal ofende o princípio constitucional da livre concorrência25,
visto que opõe os contribuintes em situações diversas de competitividade,
beneficiando os contribuintes que se eximem ao cumprimento de seus deveres
e penalizando, no mercado, aqueles que se esforçam em estar em dia com seus
deveres. A isonomia é igualmente prejudicada, na medida em somente parte
dos contribuintes irá cumprir um ônus que deveria ser divida entre todos.
Cabe, contudo, diferenciar condutas absolutamente diversas: os casos
de fraude e de abuso. A fraude caracteriza-se como uma forma de
descumprimento direto as normas jurídico-tributárias, por sua vez o abuso
representa um descumprimento indireto da norma jurídica.
A evasão é a conduta de má-fé do contribuinte, por ação ou omissão, de
descumprimento direto, total ou parcialmente, das obrigações ou deveres
tributários26. Configura-se um caso de descumprimento direto, visto que a
conduta decorre de fuga ao dever fiscal surgido pela ocorrência do fato gerador.
Concretizando-se o fato gerador não há como se furtar ao cumprimento da
obrigação tributária.
A elisão por sua vez em sido considerada a conduta do sujeito passivo
em planejar seus negócios privados de modo produzir o menor impacto fiscal,
25 Artigo 170, inciso IV da CF/88: “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do
trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme
os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) IV - livre concorrência;”.
26 Veja-se, de modo similar, TÔRRES, Heleno. Direito Tributário e Direito Privado. SP: Revista dos
Tribunais, 2003, p. 179. Esta obra constitui-se no mais significativo estudo sobre o tema.
PAULO A. CALIENDO V. DA SILVEIRA
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ausente a presença de fraude ou de abuso. A elisão é o planejamento lícito de
negócios, realizada conforme os princípios constitucionais que orientam a livre
iniciativa e a livre concorrência, com o objetivo de obter o menor impacto
fiscal.
O conceito de elusão tributária emerge, assim, como um modo
particularmente relevante de compreensão de condutas ilícitas por manejo da
ocorrência do fato gerador, ocultando, dificultando ou impedindo a sua ocorrência
de modo ilegítimo.
A elusão se distingue da evasão pelos seguintes motivos:
a) Modo de descumprimento: a evasão se constitui no descumprimento
direto da norma tributária, enquanto que a elusão é o descumprimento indireto
da norma;
b) Natureza dos atos negociais: a evasão é decorrente da prática de
atos vedados pelo ordenamento (ex.: deixar de emitir nota fiscal); enquanto que
a elusão é justamente a prática de atos permitidos pelo ordenamento que
conduzem a resultados ilícitos;
c) Momento da conduta: a evasão é o descumprimento do dever
tributário após a ocorrência do fato gerador; enquanto que a elusão é o
descumprimento independente do momento cronológico do fato gerador, podendo
ser praticada antes mesmo de sua ocorrência;
d) Natureza da violação: a evasão ocorre pela ofensa ao comando
normativo (fazer ou não-fazer algo), enquanto que a elusão é o manejo de
formas que oculta o verdadeiro conteúdo da operação.
e) Quanto à causa negocial: na evasão a causa do negócio jurídico é
ilícita, enquanto que na elusão a ausência de causa deve ser depreendida da
verificação da cadeia negocial envolvida. Vistos individualmente cada negócio
ou ato jurídico contém uma presunção de licitude, na forma e conteúdo, somente
a análise ordenada dos atos e de seu coerência negocial é que permite verificar
a inexistência de causa.
O conteúdo da elusão é a manipulação artificiosa da estrutura negocial,
ou seja, trata-se da alteração dos vínculos estruturais entre os elementos básicos
do negócio jurídico. Dado que o critério cronológico (momento de ocorrência
do fato gerador) não é suficiente para indicar a presença da elusão e permitir a
sua distinção da elisão, torna-se necessário buscar-se novos critérios de análise.
Considerando os mais recentes estudos sobre o tema, encontra-se no defeito
de estrutura dos negócios jurídicos o elemento capaz de permitir a adequada
análise do fenômeno da elisão e elusão.
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O novo Código Civil irá conceituá-lo como sendo o exercício inadmissível
de um direito, pela sua realização desconforme aos limites impostos pelo Direito,
quanto aos seus fins econômicos e sociais.27
O Direito Tributário brasileiro não prevê a existência de uma cláusula
anti-abuso, de tal modo que o seu combate somente pode ocorrer por meio de
expressa previsão legal, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade. Veja-se
por exemplo o caso do abuso de formas que não possui vedação expressa no
direito tributário, mas encontra seu fundamento nos princípios que regem o
sistema quanto à vedação à fraude à lei28. Caberia questionar se pode-se
desconstituir um determinado negócio com base simplesmente em princípios,
cremos que não. Não é possível que ocorra tal restrição com base em vagas
alegações de ausência de propósito negocial ou de ausência de substância
econômica.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente texto pretendeu demonstrar a relevância e importância da
interpretação sistemática no Direito Tributário, bem como da prevalência de
um cânone interpretativo fundado na noção de que havendo dúvida não devem
ser criados sacrifícios injustificados e desnecessários ao patrimônio do contribuinte
(in dubio contra sacrificium). Salvo em situações de clara excepcionalidade
expressa é que devem se justificar novos encargos ao contribuinte, sob pena de
ofensa direta ao núcleo de sua proteção em nome de um genérico direito da
sociedade.
Um sacrifício particular não pode ser deduzido de preceitos tácitos. Todo
sacrifício decorre de uma norma expressa do ordenamento, sob pena de se
traduzir em arbítrio, abuso ou confisco.
A interpretação in dubio pro fisco se caracteriza como uma restrição
a direito fundamental não expressamente autorizada pelo texto constitucional.
Esta renúncia tem sido aceita no direito comparado em relação aos direitos
27 “Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente
os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.
28 No Processo Administrativo Federal nº 13921.000246/94-21, perante a Segunda Câmara do Conselho
de Contribuintes, “IPI - Isenção para carro a álcool (Táxi) - O descumprimento de preceito
isentivo, durante o período determinado pela lei concessiva, enseja a perda do benefício fiscal e
conseqüente exigência do imposto exonerado, acrescido dos consectários legais, calculados a partir
do fato gerador (Lei nº 8.199/91 e IN/SRF nº 57/91). Contrato de Arrendamento particular é
vestimenta do guarda-roupa do Direito Civil e não pode ser argüido em benefício do contribuinte,
se o mesmo foi utilizado como abuso de forma para fruição indevida do tributo exonerado. Recurso
negado” (grifos nossos).
PAULO A. CALIENDO V. DA SILVEIRA
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da comunidade, ordem pública e vedação de abuso de direito, contudo a sua
admissão deve ser realizada sob severos limites, sob pena de ofender o conteúdo
essencial do direito, a prerrogativa de estabelecer restrições concedida ao
legislativo e a prevalência a priori dos interesses individuais.
Entendemos, desse modo, que a atribuição de sacrifício aos contribuintes
deva ser realizada nos limites expressos do ordenamento e somente em
situações excepcionais muito claras.
No Direito Tributário não há a possibilidade de surgimento de tributos
por analogia, salvo se for em favor do contribuinte (analogia in favorem).
Assim, salvo em casos de quebra direta da isonomia, da neutralidade
concorrencial e da capacidade contributiva, a analogia deve ser evitada para
agravar a situação do contribuinte em matéria tributária, seja quanto as
obrigações principais ou quanto os deveres formais ou de colaboração com o
fisco. A analogia in malam partem não pode ser fundamento para exigência
de deveres formais não previstos em lei ou de cooperação adicional com o
fisco para além do sentido legal.
Cabe ressaltar o uso de interpretação benéfica prevista no art. 112
do CTN, aplicável nos casos de sanções tributárias, como um exemplo de
interpretação sistemática contra sacrificium. Os conceitos indeterminados,
cláusulas abertas ou standards de conduta igualmente devem estar sujeitos
a controle e não podem proibir, limitar ou restringir direitos claramente
definidos.
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Paulo: Malheiros, 2005.
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição,
6a Edição, 2004, São Paulo: Saraiva.
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Paulo: Saraiva, 1953.
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metodológica). São Paulo: Saraiva, 1984.
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DIREITOS FUNDAMENTAIS DO CONTRIBUINTE E INTERPRETAÇÃO TRIBUTÁRIA: CONCEITO E APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO
IN DUBIO CONTRA SACRIFICIUM
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BUJANDA, Sainz de F. Estúdio Preliminar In Giannini, A.D.
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Artigo recebido em: 19/06/2014
Aprovado para publicação em: 19/07/2014
Como citar: SILVEIRA, Paulo A. Caliendo V. Direitos fundamentais do
contribuinte e interpretação tributária: Conceito e aplicação do princípio
in dubio contra sacrificium. Scientia Iuris, Londrina, v.18, n.1, p.181-216,
jul.2014. DOI: 10.5433/2178-8189.2014v18n1p181.
PAULO A. CALIENDO V. DA SILVEIRA
SCIENTIA IURIS, Londrina, v.18, n.1, p.181-216, jul.2014 | DOI: 10.5433/2178-8189.2014v18n1p181