Available via license: CC BY 3.0
Content may be subject to copyright.
ARTIGO
DOI: https://doi.org/10.21721/p2p.2019v6n1.p49-69
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons Attribution 3.0.
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
CRITÉRIOS PARA A CERTIFICAÇÃO DE PRODUTOS NA
REGULAMENTAÇÃO DO INMETRO
Roberta de Freitas Chamusca
Danielle Assafin Vieira Souza Silva
Cristiane Mascarenhas da Silva Sampaio
Raphael Carlos Santos Machado
______________________________
Resumo
O Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) utiliza, sistematicamente, a avaliação da
conformidade em sua regulamentação. Na certificação de produtos, processos e serviços, há sete tipos de esquemas
possíveis. No entanto, na inexistência de regras explícitas, observa-se, nos programas instituídos pelo Inmetro, a
preferência pelo tipo 1b, ou certificação de lote, e pelo tipo 5, o mais completo dos esquemas, no que se refere às
atividades de avaliação empregadas. A partir da revisão bibliográfica, este trabalho investigou como selecionar o
esquema adequado na certificação. Foi elaborada uma sistemática de apoio à decisão, baseando-se nas variáveis
relacionadas ao produto, processo produtivo, setor produtivo, mercado e canal de distribuição. A sistemática
potencialmente promove a melhoria da qualidade regulatória do Inmetro e o aumento da transparência, além de
constituir-se ferramenta útil para outros atores, do setor público ou privado, que sejam proprietários de esquemas
de certificação.
Palavras-chave: Regulamentação. Avaliação da conformidade. Certificação de produtos. Esquemas de
certificação. Inmetro.
CRITERIA FOR PRODUCT CERTIFICATION IN INMETRO REGULATION
ABSTRACT
Abstract
The Brazilian Institute of Metrology, Quality and Technology (Inmetro) systematically uses conformity
assessment in its regulation. In product, process, and service certification, there are seven types of possible
schemes. However, in the absence of explicit rules in Inmetro, there is a preference for type 1b, or batch
certification, and for type 5, which is the most complete scheme regarding the evaluation activities that are
employed. Based on a literature review, this work investigated how to select the appropriate scheme in
certification. A decision systematic was elaborated, based on the variables related to the product, production
process, productive sector, market and distribution channel. The framework potentially promotes the improvement
of Inmetro's regulatory quality and increases transparency, besides being a useful tool for other players, both in
public or private sector, who act as a certification scheme owner.
Keywords: Regulation. Conformity assessment. Product certification. Certification schemes. Inmetro.
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
50
1 INTRODUÇÃO
O Inmetro foi criado a partir da Lei nº 5.966/1973 e, desde o início da década de 80,
logo após a instituição do extinto Sistema Brasileiro de Certificação (atual Sistema Brasileiro
de Avaliação da Conformidade – SBAC), passou a estabelecer programas de avaliação da
conformidade (PAC). Até 2011, o Inmetro dependia da formalização do Conmetro sobre as
áreas que deveria ou poderia regulamentar (BRASIL, 1999). A Lei nº 12.545/2011 explicitou a
competência do Inmetro para elaborar e expedir regulamentos técnicos no campo da avaliação
da conformidade de produtos, processos e serviços, nas áreas que não constituam objeto da
competência de outros órgãos ou entidades da administração pública federal, no que se refere a
aspectos relacionados com segurança, prevenção de práticas enganosas de comércio, proteção
da vida e saúde humana, animal e vegetal, e meio ambiente (BRASIL, 2011).
No cumprimento da sua atividade de regulamentação, o Inmetro vem fazendo uso,
sistematicamente, da avaliação da conformidade para demonstrar o atendimento aos requisitos
técnicos estabelecidos. Os PAC estabelecidos pelo Inmetro, no âmbito do atual Sistema
Brasileiro de Avaliação da Conformidade (SBAC), compreendem um conjunto de documentos
que definem os requisitos a serem atendidos por um objeto e o passo a passo para sua avaliação
da conformidade, utilizando-se de diferentes mecanismos para a atestação da conformidade,
tais como a certificação, a declaração da conformidade do fornecedor (DF) e a inspeção. Outros
regulamentadores, como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o Conselho
Nacional de Trânsito (Contran), o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), o
Ministério da Agricultura e o recém extinto Ministério do Trabalho, dentre outros, também têm
se apoiado em programas estabelecidos pelo Inmetro para verificar o atendimento aos requisitos
de seus regulamentos expedidos.
A partir de dados extraídos do sítio do Inmetro, em fevereiro de 2019, contabilizamos
185 PAC publicados pelo Inmetro, seja por iniciativa própria ou por delegação de competência
de outros regulamentadores. Desse total, 140 adotam a certificação como forma de atestar a
conformidade de produtos, processos, serviços, pessoas ou sistemas de gestão, o que
corresponde a aproximadamente 76% dos PAC publicados. O histograma apresentado na
Figura 1 mostra a evolução dos programas publicados entre 2002 e 2018, evidenciando o
predomínio da certificação sobre os demais mecanismos de avaliação da conformidade.
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
51
Figura 1: PAC publicados entre 2002 e 2018, agrupados de acordo com o mecanismo de avaliação da conformidade
utilizado. Falar da etiquetagem.
Fonte: Elaboração própria (a partir de INMETRO, 2019).
No caso específico da certificação de produtos (que abrange também serviços e
processos), o Inmetro especifica sete modelos de certificação, baseados nos tipos de esquemas
de certificação descritos na norma ISO/IEC 17067 (ABNT, 2015), e que se diferenciam
essencialmente pela realização ou não de auditoria do Sistema de Gestão da Qualidade (SGQ)
do fabricante/prestador de serviço, pela existência ou não da Avaliação de Manutenção
(repetição periódica das atividades de avaliação da conformidade para manutenção da
certificação) e pelo tipo de atividade de avaliação da conformidade realizada na Avaliação de
Manutenção.
O Guia de Boas Práticas de Regulamentação (CONMETRO, 2007), preconiza que os
procedimentos de avaliação da conformidade adotados devem assegurar o mais elevado grau
de conformidade com a menor intervenção governamental possível e com os menores custos
para os regulamentadores e regulamentados. Não obstante essa diretriz, observa-se o
predomínio da aplicação do modelo de certificação 5, que pode ser considerado um dos mais
rigorosos em função das atividades de avaliação da conformidade que emprega (ensaios e/ou
inspeções, avaliação do processo produtivo e auditoria do SGQ).
A partir do levantamento das informações contidas nos programas de certificação de
produtos, processos e serviços publicados pelo Inmetro no período de 2001 a 2015, Chamusca,
Sampaio e Silva (2015), constataram que o modelo de certificação 5 é o mais adotado, tendo
sido referenciado em 110 dos 126 programas, o que corresponde a uma frequência de utilização
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
52
de 87%. O segundo modelo mais utilizado é o 7 (atual 1b), referenciado em 65 RAC, o que
corresponde a 52% dos programas de certificação de produtos, processos e serviços.
Se por um lado, a preponderância do modelo de certificação 5 sobre os demais modelos
pode ser vista como uma atitude conservadora e de fortalecimento da atividade de avaliação da
conformidade enquanto avaliação pré-mercado, por outro lado, corre-se o risco de criar custos
desnecessários para o setor regulado e, em última instância, para o consumidor final. A ausência
do estabelecimento de regras para a seleção dos modelos de certificação de produtos confere
subjetividade ao processo de desenvolvimento de PAC e compromete a harmonização nas
práticas de avaliação da conformidade.
A questão que se apresenta é como realizar a seleção de um ou mais tipos de esquemas
para a certificação de um dado produto, processo ou serviço? A contribuição deste trabalho
reside no fato de não apenas indicar as variáveis que influenciam a seleção dos tipos de
esquemas de certificação, o que já se acha na literatura, mas de reunir um conjunto de variáveis
e propor uma correlação com as características dos tipos de esquemas de certificação, de tal
maneira que seja possível definir qual tipo de esquema utilizar em função dos valores assumidos
pelas variáveis.
A seguir, na segunda seção, é apresentada a revisão bibliográfica. Para a seleção das
fontes bibliográficas foi adotado o processo sistemático proposto por Russo, Macedo-Soares e
Villas (2006). A busca de artigos relacionados ao tema de estudo foi realizada através do Portal
Capes. Além de artigos, foram selecionadas dissertações de mestrado e teses de doutorado. As
palavras-chave para a seleção dos textos foram utilizadas nos idiomas português e inglês, da
seguinte forma: avaliação da conformidade, conformity assessment, esquema de certificação,
modelo de certificação, certification scheme, certificação de produto, product certification. A
busca com palavras-chave em português gerou um baixo número de textos e, portanto, não
foram aplicados filtros adicionais. Já para o inglês, optou-se por utilizar um filtro temporal de
artigos publicados nos últimos 10 anos, além de um refinamento da busca por tópicos afins ao
tema de pesquisa, possibilitando a seleção total de nove artigos de interesse.
Esse reduzido número de publicações já era esperado, já que o tema abordado é ainda
explorado com timidez na área acadêmica. Sendo assim, recorreu-se também aos principais
fóruns que discutem a avaliação da conformidade, destacando-se o Comitê de Avaliação da
Conformidade da Organização Internacional para Normalização (ISO/CASCO) em âmbito
internacional e o Inmetro no plano nacional. As normas técnicas do ISO/CASCO, cuja maioria
é internalizada no Brasil pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), também
compuseram a base da pesquisa bibliográfica. A partir da aplicação das palavras-chave já
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
53
referidas, selecionou-se inicialmente 14 documentos. A revisão bibliográfica incluiu outras
referências, geralmente citadas nas obras primeiramente selecionadas, com destaque às
publicações da Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (APEC), da Comissão Europeia e da
Comissão Econômica das Nações Unidas para a Europa (UNECE).
A terceira seção dedica-se à descrição do método desta pesquisa. Em sequência, na
quarta parte do artigo, é apresentada a sistemática para a seleção dos tipos de esquemas de
certificação. A quinta seção, finalmente, traz as considerações finais, com conclusões sobre as
proposições de pesquisa e os desafios e possibilidades de aplicação da sistemática.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 AVALIAÇÃO DA CONFORMIDADE E CERTIFICAÇÃO DE PRODUTOS
A avaliação da conformidade é definida como a “demonstração de que os requisitos
especificados relativos a um produto, processo, sistema, pessoa ou organismo são atendidos.”
(ABNT, 2005b, p. 1). Os sistemas e esquemas de avaliação da conformidade devem ser
estabelecidos segundo o princípio da abordagem funcional definido pela ISO. Por ele, as
seguintes funções são englobadas: Seleção, Determinação, Análise, Atestação e, quando
aplicável, Supervisão. Quanto às formas de atestação, há a de primeira parte, ou declaração do
fornecedor, quando o próprio fornecedor do produto declara a conformidade, ou de terceira
parte, ou certificação, quando a atestação é realizada por um organismo independente do
fornecedor do objeto de avaliação da conformidade (ABNT, 2005b, 2015).
A certificação de produtos, processos e serviços recebe o termo genérico de
“certificação de produtos” (ABNT, 2015) e é conduzida por organismos de certificação de
produtos (OCP). É uma atividade que abrange países desenvolvidos e em desenvolvimento e
tem uma história muito mais longa do que a certificação de sistemas de gestão (ISO; UNIDO,
2010).
Em 1980, a ISO publicou um manual sobre os princípios e práticas de certificação,
motivada pela escassez de documentação existente sobre o tema na época. Considerando que
diversos países já realizavam certificações, mas de formas às vezes distintas, a ISO percebeu a
necessidade de harmonizar as práticas, sendo possível uma aceitação mútua dos sistemas de
certificação, eliminando barreiras desnecessárias ao comércio entre países (ISO, 1982). O
manual da ISO estabeleceu oito sistemas de certificação, com diferentes graus de confiança de
que os produtos atendiam a requisitos especificados, que foram desenvolvidos para serem
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
54
aplicados em circunstâncias variadas, como, por exemplo, para a certificação de diferentes tipos
de produtos, técnicas de fabricação ou necessidades de compradores (ISO, 1982).
Em 1992, a ISO fez um apanhado dos guias publicados pela organização na década
anterior e promoveu alterações nos sistemas de certificação. Uma delas foi a introdução do
conceito de supervisão, que tem como objetivo verificar se os produtos fabricados após a
certificação inicial continuam atendendo aos requisitos. Outra mudança se refere aos ensaios
de verificação nos sistemas de certificação 4 e 5 para conferir a continuidade da conformidade
da produção. Nas definições de 1980, os ensaios eram feitos a partir da coleta de amostras na
fábrica e no comércio ao mesmo tempo. Em função dos elevados custos associados à atividade,
os ensaios passaram, então, a ser realizados em amostras coletadas na fábrica e/ou no comércio,
sendo possível alternar os locais de coleta das amostras (ISO, 1992).
Somente no ano de 2004, a ISO publicou um guia para a certificação de produtos, o
ISO/IEC Guia 67, que sistematizou ainda mais o processo de certificação de produtos, não
apenas definindo os sistemas de certificação, mas também introduzindo as etapas funcionais
básicas que deveriam compor todos os esquemas de certificação. Em 2013, o Guia 67 deu lugar
à norma ISO/IEC 17067, cuja internalização pela ABNT foi concluída em 2015. A norma
introduziu diretrizes para o estabelecimento e operação de esquemas de certificação de produtos
e enfatizou a abordagem funcional para a certificação, segmentando-a nas funções de seleção,
determinação, análise crítica, decisão e atestação (ABNT, 2015).
Os tipos de esquemas de certificação de produtos estabelecidos pela norma ISO/IEC
17067 estão resumidos no Quadro 1 a seguir.
Quadro 1. Tipos de esquemas de certificação de produtos estabelecidos pela ISO.
Tipo de
esquema
Características
1a
Uma ou mais amostras do produto são submetidas às atividades de determinação. Um Certificado
de Conformidade é emitido para o tipo de produto. Itens de produção subsequentes não são
abrangidos pela atestação do OCP.
1b
Envolve a certificação de todo um lote de produtos. A proporção a ser ensaiada pode incluir
ensaio de todas as unidades do lote ou de parte dele. Em caso de conformidade, todos os itens do
lote estão certificados e podem ter uma marca de conformidade afixada.
2
A parte da supervisão envolve a retirada periódica de amostras do produto do mercado. Esse
esquema pode identificar o impacto do canal de distribuição sobre a conformidade, mas os
recursos que ele requer podem ser extensos. Quando não conformidades significativas forem
encontradas, as medidas corretivas podem ser limitadas, uma vez que o produto já foi distribuído
para o mercado.
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
55
Tipo de
esquema
Características
3
A supervisão envolve a retirada periódica de amostras do produto do ponto de produção e inclui
a avaliação periódica do processo de produção. Não fornece qualquer indicação do impacto que
o canal de distribuição desempenha sobre a conformidade. Quando graves não conformidades
forem encontradas, pode haver oportunidade de resolvê-las antes de ocorrer a distribuição
generalizada ao mercado.
4
A supervisão permite a escolha entre a retirada periódica de amostras do produto do ponto de
produção, ou do mercado, ou ambos, e inclui a avaliação periódica do processo de produção.
Pode indicar o impacto do canal de distribuição sobre a conformidade e fornece um mecanismo
de pré-mercado para identificar e resolver graves não conformidades. Duplicações significativas
de esforços podem ocorrer para produtos cuja conformidade não é afetada durante o processo de
distribuição.
5
A supervisão permite a escolha entre a retirada periódica de amostras do produto do ponto de
produção, ou do mercado, ou ambos, e inclui a avaliação periódica do processo de produção ou
auditoria do Sistema de Gestão (SG), ou ambos. A extensão pela qual as quatro atividades de
supervisão são conduzidas pode ser variada para uma determinada situação, conforme definido
no esquema. Se a supervisão incluir a auditoria do SG, uma auditoria inicial do SG será
necessária.
6
Aplica-se, principalmente, à certificação de processos e serviços. Em algumas situações, os
elementos tangíveis de um serviço podem suportar a evidência de conformidade. Convém que a
parte de supervisão desse esquema inclua auditorias periódicas do SG e a avaliação periódica do
serviço ou processo.
Fonte: Elaboração própria (com base em ABNT, 2015).
2.2 USO DA AVALIAÇÃO DA CONFORMIDADE NA REGULAMENTAÇÃO TÉCNICA
Segundo a UNECE (2012), a avaliação da conformidade pode ser considerada uma
ferramenta de mitigação de riscos para fins regulatórios, na medida em que previne que
produtos não conformes sejam colocados no mercado. A avaliação da conformidade inserida
em um contexto de regulamentação pode ser considerada, portanto, como uma ferramenta de
controle de pré-mercado.
Na medida em que os regulamentadores frequentemente exigem a demonstração de que
produtos e processos produtivos atendem aos requisitos mínimos para assegurar a proteção à
saúde, à segurança e ao meio ambiente, a avaliação da conformidade surge como uma
ferramenta para evidenciar a observância aos requisitos estabelecidos em regulamentos
técnicos. No entanto, embora a avaliação da conformidade possa ser útil, ela também pode
causar prejuízos se conduzida de forma inapropriada (APEC, 2013).
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
56
Assim, um grande desafio dos regulamentadores reside na escolha entre os
procedimentos de avaliação da conformidade, principalmente na opção entre a adoção da
avaliação da conformidade de primeira ou de terceira parte. Sob esse aspecto, a Rede para
Metrologia, Acreditação e Normalização de Países em Desenvolvimento (DCMAS) recomenda
que os procedimentos de avaliação da conformidade sejam escolhidos com base na avaliação
dos riscos de um produto ou processo específico (DCMAS, 2010). Portanto, é razoável esperar
que os regulamentadores optem pelo uso da DF (avaliação da conformidade de primeira parte)
para produtos de baixo risco e adotem a certificação ou inspeção de terceira parte para produtos
mais complexos e com elevado grau de risco (UNECE, 2012).
Segundo a ISO ([201-]), alguns aspectos-chave devem ser levados em consideração ao
fazer uso da avaliação da conformidade na atividade de regulamentação. Entre eles, incluem-
se o uso da abordagem funcional no estabelecimento de esquemas de avaliação da
conformidade, a consideração sobre os custos e investimentos associados aos procedimentos de
avaliação da conformidade e a necessidade de existência de recursos competentes (organismos
de avaliação da conformidade e especialistas) para conduzir as atividades de avaliação da
conformidade. As boas práticas regulatórias, o risco e as atividades de acompanhamento
também são considerados pela ISO fatores-chave para a associação da avaliação da
conformidade à regulamentação (ISO, [201-]).
Em análise comparativa entre a União Europeia, países da APEC e o Brasil sobre as
estratégias e os fatores que influenciam a escolha do procedimento de avaliação da
conformidade, verificou-se que, enquanto o continente europeu adota a declaração do
fornecedor como a forma de atestação da conformidade, o Brasil e os países da APEC utilizam
atestação tanto de 1ª parte (DF) como a de 3ª parte. Os três elementos de análise consideram o
risco como fator que influi na escolha do procedimento de avaliação da conformidade, bem
como o tipo ou as características do produto, sem esclarecer, no entanto, como esses fatores
influenciam as decisões sobre as regras da avaliação da conformidade. O Quadro 2 resume a
análise comparativa realizada.
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
57
Quadro 2: Fatores que influenciam as estratégias de avaliação da conformidade.
Diretrizes do ISO/CASCO (ISO, [201-]) para uso da avaliação da conformidade na atividade de
regulamentação
- Uso da abordagem funcional descrita nas normas de avaliação da conformidade;
- Disponibilidade de expertise para a condução das atividades de avaliação da conformidade;
- Natureza dos riscos que se pretende mitigar com o uso da avaliação da conformidade;
- Complexidade dos procedimentos de avaliação da conformidade, seus benefícios decorrentes e seus custos
associados;
- Condução de atividades de acompanhamento no mercado, que incluem a Supervisão e a Fiscalização.
Região/País
União Europeia
Países da APEC
Brasil (SBAC)
Estratégias de
avaliação da
conformidade
Atestação de 1ª parte
(DF).
- Sistemas híbridos de
certificação voluntária e
compulsória;
- Sistemas que utilizam tanto a
atestação de 1ª parte (DF)
como a de 3ª parte.
- Certificação;
- Inspeção;
- DF.
Fatores que
influenciam a
escolha do
procedimento
de avaliação da
conformidade
- Nível de risco
envolvido e grau de
segurança requerido;
- Tipo de produto;
- Métodos de produção;
- Infraestrutura
econômica do setor
produtivo.
- Risco;
- Setor regulamentado;
- Tipo de produto.
- Características do produto;
- Risco do produto;
- Infraestrutura de avaliação
da conformidade existente;
- Dificuldade de
acompanhamento no
mercado;
- Características do setor
produtivo (ex.: tecnologia,
presença de micro e
pequenas empresas).
Fonte: Elaboração própria (com base em APEC,2013; Conmetro, 2007; Inmetro, 2015a; ISO [201-]; EU, 2008).
2.3 METODOLOGIAS EXISTENTES PARA A SELEÇÃO DE ESQUEMAS DE
AVALIAÇÃO DA CONFORMIDADE
Na investigação de metodologias utilizadas para a seleção de esquemas de avaliação da
conformidade, destaca-se o procedimento elaborado para compras públicas de produtos e
serviços de tecnologia da informação e comunicação (TIC) acessíveis, desenvolvido pelo
Comitê Europeu de Normalização (CEN, 2008), bem como a sistemática aplicável à avaliação
da conformidade de objetos que compõem a infraestrutura do setor de gás brasileiro (FOSSA,
2012), que se baseia no método original proposto por CEN (2008). Ambos têm em comum o
uso da abordagem funcional da ISO/CASCO. Desta forma, eles decompõem cada função de
avaliação da conformidade em uma ou mais “dimensões”.
As “dimensões” são associadas a “critérios”, que são derivados de “elementos”.
Enquanto CEN (2008), estabelece critérios para cinco elementos distintos (produto, mercado,
usuário, órgão da administração pública responsável pela aquisição do produto e processo de
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
58
compras públicas), Fossa (2012), considera apenas quatro elementos relacionados ao setor de
gás, quais sejam o produto, o mercado, o usuário e o comprador do produto. Para cada cenário
particular de um objeto de avaliação da conformidade, os “critérios” assumem valores
específicos, que influenciam os valores recomendados para as dimensões e impacta na escolha
do esquema de avaliação da conformidade a ser adotado.
Há, ainda, a proposta específica para seleção de sistemas de certificação de produtos
elaborada por Barbulio Filho (2012). O autor dá ênfase às características do processo produtivo
para a seleção dos sistemas de certificação. Essas características abrangem a capabilidade do
processo, o seu grau de automação, o seu nível de controle, as ferramentas da qualidade
empregadas pelo fabricante no controle do processo e as formas de controle das matérias-
primas.
Aliás, a influência do processo produtivo na escolha dos procedimentos de avaliação da
conformidade é percebida em várias aplicações nos diversos países. No Canadá, a avaliação da
conformidade de terceira parte é adotada em setores que não tem tradição de alta qualidade
(APEC, 2013). Para o CONMETRO (2007), pode ser desejável que os fornecedores disponham
de sistemas de gestão para assegurar o fornecimento de produtos e serviços em conformidade
com os requisitos regulamentares e a velocidade do aperfeiçoamento tecnológico do setor é um
fator a ser considerado na escolha dos procedimentos de avaliação da conformidade.
Na União Europeia, a seleção dos módulos de avaliação da conformidade deve
considerar os métodos de produção (CE, 2015), abrandando as regras de avaliação da
conformidade para produtos artesanais ou fabricados sob encomenda e para pequenas
produções em série (UE, 2008). Para a ISO (1982), os sistemas de certificação foram
desenvolvidos com o propósito de serem aplicados em circunstâncias variadas, levando-se em
consideração as diferentes técnicas de fabricação (ISO, 1982). A proposta de Barbulio Filho
(2012), nesse sentido, tem o mérito de explicitar como se dá a influência das características dos
processos produtivos na escolha dos procedimentos de avaliação da conformidade, o que não
havia sido feito de forma tão evidente nas referências destacadas acima.
Conforme o método de pesquisa apresentado na sessão que se segue, a identificação das
variáveis utilizadas na sistemática proposta por este trabalho foi possível graças à revisão
bibliográfica e sua estruturação foi também fundamentada na abordagem funcional utilizada
nos métodos para seleção de esquemas de avaliação da conformidade propostos por CEN
(2008) e Fossa (2012).
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
59
3 MÉTODO
A pesquisa foi estruturada em três fases. Primeiramente, na revisão bibliográfica, foram
estabelecidos os seguintes três objetivos: i) buscar os conceitos relativos à avaliação da
conformidade, certificação de produtos, regulação e regulamentação; ii) identificar estratégias
de uso da avaliação da conformidade por diferentes regulamentadores; e iii) identificar métodos
existentes para a seleção de esquemas de avaliação da conformidade. Para isso, foi utilizada a
sistemática proposta por Russo, Macedo-Soares e Villas (2006), descrita anteriormente.
Já na fase de análise, inicialmente, o método proposto por CEN (2008), para a seleção
de esquemas de avaliação da conformidade foi customizado para a seleção dos tipos de
esquemas de certificação de produtos a partir da decomposição, em dimensões, das funções de
avaliação da conformidade relativas à certificação de produtos e da valoração dessas dimensões.
Em seguida, foi feita a identificação das variáveis que influenciam a seleção dos tipos de
esquemas, bem como a correlação entre as variáveis e os tipos de esquemas. A identificação
das variáveis e sua associação com as dimensões das funções de certificação também é resultado
da leitura interpretativa do referencial teórico adotado.
Por fim, a terceira fase da pesquisa se concentrou na estruturação do passo a passo para
a seleção dos tipos de esquemas de certificação de produtos, que é o resultado principal deste
trabalho.
4 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS
4.1 VARIÁVEIS QUE INFLUENCIAM A SELEÇÃO DO TIPO DE ESQUEMA DE
CERTIFICAÇÃO
Foram identificadas 12 variáveis que influenciam a seleção do tipo de esquema de
certificação, dependentes dos elementos “produto “setor produtivo”, “mercado”, processo
produtivo” e “canal de distribuição”, conforme demonstra a
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
61
Figura 1: Variáveis para a seleção do tipo de esquema.
Fonte: Elaboração própria, 2016.
Adotando-se como referência o modelo CEN, foram atribuídos valores para as variáveis
e as mesmas foram associadas às funções e dimensões para certificação de produtos. A função
Supervisão e suas dimensões Existência, Atividades de Avaliação da Conformidade e Ponto de
Coleta foram tidas como as mais relevantes para a seleção dos tipos de esquemas de
certificação. O
Quadro 3 resume as variáveis, os valores a elas atribuídos e a forma como deve
influenciar a seleção do tipo de esquema de certificação.
Quadro 3: Variáveis, valores e influência na seleção dos tipos de certificação
Variável
Valores atribuídos
Como influencia?
Tipo de produto
Produto; processo;
serviço.
Se processo ou serviço, o tipo de esquema deve ser o 6.
Risco do produto
Baixo; moderado;
crítico.
Relaciona-se ao rigor do processo de avaliação da conformidade.
Origem do
produto
Nacional; importado
Não determina a escolha do tipo de esquema de certificação, no
entanto, na existência de produtos importados, é sempre válido
considerar a adoção do tipo de esquema 1b como uma opção para
certificação.
Grau de controle
do processo
Baixo; médio; alto.
Quanto mais controlado for o processo, menores são as chances de
fabricação de produtos fora das especificações e, assim, a
avaliação da conformidade pode ser menos rigorosa.
Tecnologia do
processo
Baixa; média; alta
automação.
Considerando ainda que um dos benefícios da automação é a
redução da variabilidade, a auditoria no SG e a avaliação da
processo produtivo podem ser dispensadas quão maior for a
automação, podendo restringir apenas em ensaios e/ou inspeções
do produto. Baixas tecnologias, por sua vez, podem até mesmo
requerer a avaliação lote a lote (1b).
Tipo de processo
Processos de baixo
volume e alta
variedade; processos
de volume e
variedade medianos;
Para os casos de processos de baixo volume e alta variedade, pode
ser aplicável o esquema de certificação de tipo, que não contempla
a etapa de Supervisão. Para os processos de volume e variedade
medianos e para os processos de alto volume e baixa variedade
empregam-se, em princípio, os tipos de esquemas que
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
62
Variável
Valores atribuídos
Como influencia?
processos de alto
volume e baixa
variedade.
contemplem a etapa de Supervisão, de forma que produtos
fabricados regularmente sejam avaliados de forma periódica.
Sazonalidade da
produção
Sim (exemplo: ovos
de páscoa e artigos de
carnaval); não.
Caso a produção seja sazonal, recomenda-se a adoção de um tipo
de esquema de certificação que não inclua a função Supervisão
(esquemas tipo 1a ou 1b). Do contrário, é provável que as
atividades de avaliação da conformidade não possam ser
executadas em função da suspensão temporária da produção.
Porte do
fabricante
Microempresa;
pequena empresa;
média/ grande
empresa
O porte do fabricante é considerado um fator ponderador, não
estando associado à nenhuma função de avaliação da
conformidade ou dimensão. O tipo de esquema é selecionado em
função dos valores das diversas variáveis relacionadas ao produto,
ao processo produtivo, ao mercado e ao canal de distribuição.
Após, caso o fabricante solicitante da certificação se enquadre
como MPE, deve ser avaliada a conveniência de realizar a
substituição do tipo de esquema selecionado por outro menos
rigoroso.
Porte do
fabricante
Microempresa;
pequena empresa;
média ou grande
empresa
O porte do fabricante é considerado um fator ponderador, não
estando associado à nenhuma função de avaliação da
conformidade ou dimensão. O tipo de esquema é selecionado em
função dos valores das diversas variáveis relacionadas ao produto,
ao processo produtivo, ao mercado e ao canal de distribuição.
Após, caso o fabricante solicitante da certificação se enquadre
como MPE, deve ser avaliada a conveniência de realizar a
substituição do tipo de esquema selecionado por outro menos
rigoroso.
Homogeneidade
do setor
Sim, para um setor
homogêneo; não,
para um setor
heterogêneo.
A não homogeneidade do setor pode acarretar no emprego de mais
de um tipo de esquema de certificação de produto dentro de um
mesmo esquema de certificação para dar conta das diferentes
possibilidades de fornecimento de produtos, mas não influencia na
seleção do tipo de esquema de certificação.
Abrangência do
produto no
mercado
Local; regional;
nacional.
Afeta o ponto de coleta da amostra na etapa da Supervisão,
podendo ser na fábrica e/ou no mercado. Para um produto de
abrangência nacional, por exemplo, recomenda-se a utilização de
um tipo de esquema que inclua auditoria do SG, avaliação do
processo produtivo, além da realização de ensaios ou inspeções do
produto coletado ao menos na fábrica (esquema tipo 5). A
proposta visa a fortalecer ainda mais a avaliação pré-mercado de
forma a evitar a distribuição generalizada de produtos não
conformes para o mercado.
Infraestrutura
para fiscalização
Baixa; média; Alta.
O acompanhamento no mercado deve estar em equilíbrio com o
processo de avaliação da conformidade e esse equilíbrio depende
da disponibilidade de recursos, da natureza do mercado que está
sendo regulado, da eficácia dos procedimentos de avaliação da
conformidade e da infraestrutura para fiscalização. Porém, não
influencia na seleção do tipo de esquema, sendo apenas fator
ponderador.
Impacto da
distribuição na
conformidade do
produto
Sim; não.
Quando a distribuição impacta na conformidade do produto, deve
ser selecionado um tipo de esquema de certificação que inclua a
coleta de amostras no mercado para a realização de ensaios e/ou
inspeções.
Fonte: Elaboração própria, 2016.
A existência da Supervisão depende dos valores das variáveis tipo de produto, risco do
produto, grau de controle do processo, tecnologia do processo, tipo de processo e sazonalidade
da produção. As atividades de avaliação da conformidade conduzidas na etapa de Supervisão
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
63
dependem dos valores assumidos pelas variáveis tipo de produto, risco do produto, grau de
controle do processo, tecnologia do processo e abrangência do produto no mercado. O ponto
de coleta das amostras para a realização de ensaios e/ou inspeções na etapa de Supervisão é
influenciado pelas variáveis risco do produto, abrangência do produto no mercado e impacto
do canal de distribuição na conformidade do produto.
As variáveis origem do produto, porte do fabricante, homogeneidade do setor e
infraestrutura para fiscalização não foram diretamente associadas a nenhuma função de
avaliação da conformidade, ainda que impactem na seleção dos tipos de esquemas de
certificação. No que se refere à origem do produto, em havendo produtos importados no setor
regulamentado, o esquema de certificação tipo 1b deve ser considerado como uma das opções
de escolha pelo solicitante da certificação. Para o caso de setores não homogêneos, cujos
fabricantes apresentem diferentes características de processos produtivos, por exemplo, pode
ser necessária a utilização de mais de um tipo de esquema de certificação. Na existência de
micro e pequenas empresas (MPE), os procedimentos de certificação podem ser aliviados, mas
a infraestrutura para fiscalização deve ser capaz de compensar no pós-mercado a diminuição de
rigor da avaliação pré-mercado. Assim, o porte dos fabricantes e a infraestrutura para
fiscalização são encarados como fatores ponderadores para o aumento ou diminuição de rigor
dos procedimentos de certificação.
4.2 SISTEMÁTICA PARA A SELEÇÃO DOS TIPOS DE ESQUEMA DE
CERTIFICAÇÃO DE PRODUTOS
A sistemática proposta é composta por três etapas. A Etapa 1, denominada
“Caracterização do objeto da certificação”, consiste no enquadramento do objeto em uma das
três categorias atribuídas ao tipo de produto, quais sejam: produto, processo ou serviço. Caso o
objeto seja um produto propriamente dito, segue-se para a Etapa 2. Caso o objeto seja um
processo ou serviço, sua certificação deverá ser realizada de acordo com o esquema tipo 6, o
que significa dizer que a certificação será baseada na realização de auditorias do SG e na
avaliação do processo ou serviço. Caso o processo ou serviço resulte em algum elemento
tangível, este elemento pode ser alvo de atividades de ensaio e/ou inspeção. Ou seja, o grau de
intangibilidade do processo ou serviço é utilizado para definir se, além da auditoria do SG e da
avaliação do processo/serviço, cabe a realização de outras atividades de determinação, como
ensaio e/ou inspeção.
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
64
A Etapa 2, “Caracterização do Cenário, é específica para os objetos enquadrados na
Etapa 1 como “produtos”. O objetivo desta etapa é selecionar, dentre os tipos de esquemas 1a,
1b, 2, 3, 4 e 5, o que melhor se adéqua à certificação de um produto específico, considerando o
contexto particular em que está inserido. Deve ser considerada nesta etapa a homogeneidade do
setor a partir da verificação da existência ou inexistência de diferenças entre os fabricantes.
Caso o setor não seja homogêneo, deve-se proceder a análise de dois ou mais cenários, de forma
a abranger todas as diferenças identificadas, com o propósito de definir se mais de um tipo de
esquema de certificação deve ser indicado para adoção.
Na análise de cada cenário é feita a comparação dos valores de sete variáveis
(sazonalidade da produção, tipo de processo, grau de controle do processo, tecnologia do
processo, risco do produto, abrangência do produto no mercado e impacto na conformidade do
produto) com as características dos tipos de esquemas de certificação. O Quadro 4 estabelece a
relação os valores possíveis de cada variável e os tipos de esquema de certificação a serem
escolhidos. Estas relações são resultado da correlação das variáveis com as funções e dimensões
de cada tipo de esquema de certificação.
Quadro 4: Valores das variáveis para cada tipo de esquema de certificação.
Variáveis
Tipo de esquema de certificação
1a
1b
2
3
4
5
Sazonalidade da
produção
Sim / Não
Sim / Não
Não
Não
Não
Não
Tipo de processo
Baixo
volume e
alta
variedade
Médio ou
alto
volume e
variedade
mediana
ou baixa
Médio ou
alto
volume e
variedade
mediana
ou baixa
Médio ou
alto
volume e
variedade
mediana
ou baixa
Médio ou
alto
volume e
variedade
mediana
ou baixa
Médio ou
alto
volume e
variedade
mediana ou
baixa
Grau de controle do
processo
---
Baixo
Alto
Médio
Médio
Baixo
Tecnologia do processo
---
Baixa
Alta
Média
Média
Baixa
Risco do produto
Baixo
(P baixa e
C baixa)
Crítico
(P alta e C
alta)
Baixo
(P média e
C baixa)
Baixo
(P baixa e
C média)
Moderado
Crítico
(P média
ou C
média)
Abrangência do produto
no mercado
---
---
Local
Regional
Regional
Nacional
Impacto (do canal) na
conformidade do produto
---
---
Sim
Não
Sim / Não
Sim / Não
Fonte: Elaboração própria, 2016.
É possível que os valores das variáveis não resultem em uma combinação perfeita com
um único tipo de esquema de certificação. Dessa forma, uma das possibilidades de decisão é
eleger o tipo de esquema que apresentar o maior número de correlações positivas. Em caso de
um “quase empate” entre dois tipos de esquemas de certificação, uma alternativa pode ser
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
65
selecionar o tipo de esquema que apresente correlação com variáveis consideradas pelo
regulamentador como as mais críticas (por exemplo, risco do produto), ao invés de
simplesmente adotar o tipo de esquema com o maior número de correlações positivas. Outra
possibilidade de ação é conduzir uma Análise de Impacto Regulatório (AIR), considerando as
mais de uma opção de tipos de esquemas para cada cenário, de forma a selecionar o tipo de
esquema com menor impacto.
Ainda na Etapa 2, outra variável que deve ser considerada é a origem do produto. Caso
haja produtos importados, o esquema de certificação de lote (tipo 1b) deve ser considerado
como uma das opções de uso.
Finalmente, chega-se na Etapa 3, “Ponderação”. Somente duas variáveis são
consideradas como fatores de ponderação para a escolha do tipo de esquema para a certificação
de um produto: o porte do fabricante e a infraestrutura para fiscalização. Na existência de MPE,
é recomendável que os procedimentos de certificação sejam aliviados. Assim, o regulamentador
deve avaliar se é apropriado adotar um tipo de esquema de certificação menos rigoroso do que
o selecionado na Etapa 2. É essencial que essa decisão também esteja fundamentada pela análise
do nível de infraestrutura para fiscalização, de forma a manter o desejável equilíbrio entre
controle pré-mercado e pós-mercado. Não obstante o risco de o produto ter sido considerado na
etapa anterior, ele deve ser novamente analisado para a tomada de decisão.
Alguns critérios balizadores para essa tomada de decisão devem ser seguidos. Para
a substituição de um tipo de esquema que contemple a etapa de Supervisão por um tipo de
esquema que não abranja essa função (esquema tipo 1a), recomenda-se a associação de um
esquema de DF à certificação de “tipo”. Nesse caso, é possível estender o uso da marca de
conformidade para os produtos fabricados após a certificação de tipo (1a), com base na própria
declaração do fornecedor. Para a substituição de um tipo de esquema que contemple a
auditoria do SG e/ou a avaliação do processo produtivo por um tipo de esquema que
compreenda apenas ensaios e/ou inspeções (esquema tipo 2), convém que seja reduzido o
intervalo entre as Supervisões. Já para produtos de risco moderado ou crítico, a substituição de
um tipo de esquema por outro menos rigoroso requer o fortalecimento das ações de fiscalização.
Para o caso específico de processos e serviços, a “Ponderação” pode impactar
especialmente a definição da frequência da Supervisão. A ponderação deve considerar o risco
do processo ou serviço, o porte do fornecedor e a infraestrutura para fiscalização. Os seguintes
critérios balizadores devem ser assumidos. Quando o risco do processo for moderado ou crítico,
o fornecedor não se enquadrar nas condições de MPE e a infraestrutura para fiscalização for
baixa, recomenda-se intervalos curtos entre as Supervisões. Já quando o risco do processo for
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
66
moderado ou crítico, o fornecedor se enquadrar nas condições de MPE e a infraestrutura para
fiscalização for média ou alta, pode-se optar por exigir apenas a avaliação do processo ou
serviço, sem exigir a realização de auditorias periódicas.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados obtidos podem ser utilizados por outros agentes regulamentadores de
diferentes órgãos além do Inmetro que decidam fazer uso da certificação no apoio às suas
atividades de regulamentação. Até mesmo os OCP, no estabelecimento de seus esquemas
próprios de certificação de produtos, processos e serviços, poderão se apoiar na sistemática com
poucos ajustes a serem feitos. A aplicação da sistemática proposta proporciona maior
sistematização no estabelecimento de requisitos de avaliação da conformidade para a
certificação de produtos, processos e serviços, conferindo melhoria da qualidade regulatória.
Adicionalmente, confere maior transparência à atividade de regulamentação técnica,
promovendo também participação mais efetiva das partes interessadas e impactadas. A
aplicação, pelo Inmetro uo por outro regulamentador, da sistemática guarda alguns pontos de
atenção, descritos a seguir.
Para setores com moderado ou alto grau de competição, que abrangem um grande
número de fabricantes ou importadores, é possível que sejam identificados distintos cenários,
com empresas que se diferenciem nos seus processos produtivos e na forma como os seus
produtos são distribuídos para o mercado. É fundamental, portanto, que seja feito um
mapeamento robusto do setor regulamentado antes de iniciar o desenvolvimento de um
programa de avaliação da conformidade. Sugere-se que a análise de cenários e a definição dos
valores de cada variável seja feita na fase de Análise de Impacto Regulatório (AIR), etapa
anterior ao processo de desenvolvimento do regulamento. Essa sugestão vai ao encontro das
diretrizes da ISO, que preconiza o uso da AIR na análise das opções de uso da avaliação da
conformidade na atividade de regulamentação.
A aplicação do método requer também que, para o caso em que se disponibiliza mais de
um tipo de esquema de certificação, sejam declarados os critérios de acesso a cada um deles.
Resgata-se aqui a diretriz do Conmetro para que os regulamentadores definam claramente o
grau de liberdade de escolha entre os procedimentos de avaliação da conformidade nos casos
em que mais de um procedimento é utilizado em um regulamento. Dessa forma, diante de
cenários diversos, cabe ao regulamentador definir, de forma objetiva, as condições que devem
ser atendidas pelo solicitante da certificação para acessar um ou outro tipo de esquema de
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
67
certificação que componha o esquema de certificação de um determinado objeto, cabendo aos
Organismos de Certificação de Produtos (OCP), no processo de certificação, verificar se as
condições de acesso ao tipo de esquema são de fato atendidas.
Não obstante os desafios para sua aplicação, a aplicação da sistemática para seleção de
tipos de esquemas de certificação será útil ao Inmetro e poderá contribuir para a melhoria da
qualidade do seu processo regulatório. É com muita satisfação que se anuncia que os critérios
propostos nesta pesquisa já foram utilizados pelo Inmetro na Análise de Impacto Regulatório e
estão sendo internalizados na norma interna de desenvolvimento e aperfeiçoamento de medidas
regulatórias.
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
68
REFERENCIAS
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO/IEC 17067: Avaliação
da conformidade – Fundamentos para certificação de produtos e diretrizes de esquemas para
certificação de produtos. Rio de Janeiro: ABNT, 2015.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO/IEC 17065: Avaliação
da conformidade – Requisitos para organismos de certificação de produtos, processos e
serviços. Rio de Janeiro: ABNT, 2013.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. ISO/IEC GUIA 67: Avaliação
de conformidade – Fundamentos de certificação de produtos. Rio de Janeiro: ABNT, 2005a.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO/IEC 17000: Avaliação
da conformidade – Vocabulário e princípios gerais. Rio de Janeiro: ABNT, 2005b.
ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM
ADMINISTRAÇÃO, 30., 2006, Salvador. Disponível em:
http://www.anpad.org.br/enanpad/2006/dwn/enanpad2006-adid-0069.pdf. Acesso em: 10 fev.
2015.
ASIA-PACIFIC ECONOMIC COOPERATION. Good regulatory practices for conformity
assessment in APEC member economies. APEC, 2013. Disponível em:
http://publications.apec.org/publication-detail.php?pub_id=1473. Acesso em: 06 out. 2015.
ASIA-PACIFIC ECONOMIC COOPERATION. Good practice guide on regulatory
reform. APEC, 2010. Disponível em:
http://publications.apec.org/googlesearch.php?cx=012092251120059988616%3Atcuzscmwdt
a&cof=FORID%3A11&q=regulation&sa=. Acesso em: 23 set. 2015.
BARBULIO FILHO, Arnaldo. Aplicação da ISO 17067: Workshop. 2012.
BRASIL. Lei no 12.545, de 14 de dezembro de 2011. Dispõe sobre o fundo de financiamento
à exportação (FFEX), altera o art. 1o da lei no 12.096, de 24 de novembro de 2009, e as leis nº
10.683, de 28 de maio de 2003, 11.529, de 22 de outubro de 2007, 5.966, de 11 de dezembro
de 1973, e 9.933, de 20 de dezembro de 1999; e dá outras providências. 2011. Disponível em:
http://www.inmetro.gov.br/legislacao. Acesso em: 16 jun. 2015.
BRASIL. Lei no 9.933, de 20 de dezembro de 1999. Dispõe sobre as competências do
Conmetro e do Inmetro, institui a taxa de serviços metrológicos, e dá outras providências.
1999. Disponível em: http://www.inmetro.gov.br/legislacao. Acesso em: 16 jun. 2015.
CHAMUSCA, Roberta F.; SAMPAIO, Cristiane M. S.; SILVA, Danielle A. V. S.
Certificação como apoio à regulamentação de produtos, processos e serviços: o caso do
Inmetro. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE REGULAÇÃO, 9., 2015, Brasília.
COMISSÃO EUROPEIA. Guia azul relativo à aplicação da legislação da UE em matéria
de produtos. Ed. 1.1. CE, 2015. Disponível em:
http://ec.europa.eu/DocsRoom/documents/11502. Acesso em: 18 set. 2015.
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
69
COMITÊ EUROPEU DE NORMALIZAÇÃO. CEN/BT WG 185 Project Team Final draft
report. Genova: AENOR, 2018. (Project team final report for approval: European
accessibility requirements for public procurement of products and services in the ICT domain
- European Commission Mandate M 376, Phase 1. 2008). Disponível em:
http://www.econformance.eu/documents/BTWG185_N30_PT_Final_Report_for_Approval.p
df. Acesso em: 29 jan. 2016.
CONSELHO NACIONAL DE METROLOGIA, NORMALIZAÇÃO E QUALIDADE
INDUSTRIAL Guia de boas práticas de regulamentação. Brasília: CONMETRO, 2007.
Disponível em: http://www.inmetro.gov.br/qualidade/guiaRegulamentacao.asp. Acesso em:
21 jan. 2015.
DCMAS. Building corresponding technical infrastructures to support sustainable
development and trade in developing countries and countries in transition: Background
paper. 2010. Disponível em: http://www.dcmas.net. Acesso em: 21 jan. 2015.
FOSSA, Alberto J. Contribuições para a modelagem do sistema de avaliação da
conformidade na construção da infraestrutura predial para distribuição e uso
residencial de gases combustíveis. 2012. 275 f. Tese (Doutorado em Energia) - Universidade
de São Paulo, São Paulo, 2014.
GIL, Antonio C. Como elaborar projetos de pesquisa. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2010.
INSTITUTO NACIONAL DE METROLOGIA, QUALIDADE E TECNOLOGIA.
Avaliação da conformidade. 6. ed. Rio de Janeiro: INMETRO, 2015a. Disponível em:
http://www.inmetro.gov.br/inovacao/publicacoes/acpq.pdf. Acesso em: 29 jan. 2016.
INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION. Using ISO/CASCO
standards in regulations. Geneva: ISO, [201-]. Disponível em:
https://www.iso.org/sites/cascoregulators/documents/casco-regulators-fulltext.pdf. Acesso
em: 29 jun. 2015.
INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION. Certification and
related activities: assessment and verification of conformity to standards and technical
specifications. Geneva: ISO, 1992.
INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION. Certificación:
princípios y práctica. Madrid: IRANOR, 1982.
INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION; UNITED NATIONS
INDUSTRIAL DEVELOPMENT ORGANIZATION. Building trust: the conformity
assessment toolbox. Genebra: ISO; Viena: UNIDO, 2010. Disponível em:
http://www.iso.org/iso/home/store/publication_item.htm?pid=PUB100230. Acesso em: 17
maio 2014.
LODGE, Martin; WEGRICH, Kai. O enraizamento da regulação de qualidade: fazer as
perguntas difíceis é a resposta. In: PROENÇA, Jadir P.; COSTA, Patrícia V.;
MONTAGNER, Paula (org.). Desafios da regulação no Brasil. Brasília: ENAP, 2009.
p. 17-37. Disponível em: http://www.regulacao.gov.br/acompanhe-o-pro-reg/livros/desafios-
da-regulacao-no-brasil.pdf/view. Acesso em: 26 set. 2015.
ARTIGO
P2P & INOVAÇÃO, Rio de Janeiro, v. 6 n. 1, p.49-69, Set.2019/Fev. 2020.
70
RUSSO, Giuseppe M.; MACEDO-SOARES, T. Diana L. A.; VILLAS, Marcos V.
Importância da hierarquização das revistas científicas: resultados de uma investigação
empírica no Brasil e proposta de um método de pesquisa bibliográfica. In: ENCONTRO DA
UNIÃO EUROPEIA (UE). Decisão no 768/2008/CE, de 9 de julho de 2008, relativa a um
quadro comum para a comercialização de produtos. Disponível em: http://eur-
lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2008:218:0082:0128:pt:PDF. Acesso em:
18 set. 2015.
UNITED NATIONS ECONOMIC COMMISSION FOR EUROPE (UNECE). Risk
management in regulatory frameworks: towards a better management of risks. United
Nations: New York and Geneva, 2012. Disponível em:
http://www.unece.org/trade/wp6/welcome.html. Acesso em: 21 jan. 2015.
UNITED STATE. European Commission. New legislative framework. Belgica: EU, [201-].
Disponível em: http://ec.europa.eu/growth/single-market/goods/new-legislative-framework.
Acesso em: 30 out. 2015.