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2019 Borba; Andrade; Selles Este é um artigo de acesso aberto distribuído sob os termos da Licença Creative Commons
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citação dos autores e da fonte original e sob a mesma licença.
ENSINO DE CIÊNCIAS E BIOLOGIA E O CENÁRIO DE RESTAURAÇÃO CONSERVADORA
NO BRASIL: INQUIETAÇÕES E REFLEXÕES
Rodrigo Cerqueira do Nascimento Borba
i
Maria Carolina Pires de Andrade
ii
Sandra Escovedo Selles
iii
Resumo: O presente artigo aciona o conceito de restauração conservadora elaborado por Michael Apple
(2001; 2015; 2017) para refletir sobre os rumos das políticas curriculares que interpelam as disciplinas
escolares Ciências e Biologia na atualidade. Aproximando-nos de tensões que são fruto das históricas
disputas entre o público e o privado na educação brasileira, debatemos incursões recentes do
conservadorismo sobre os currículos dessas disciplinas. Assim, apresentamos e discutimos tentativas de
constrangimento ao ensino de determinadas temáticas que são atravessadas por controvérsias
socioculturais: evolução biológica; corpo humano, saúde e diferença; diversidade étnico-racial. Por fim,
também sinalizamos severas ameaças aos princípios democráticos que regem a educação do país.
Palavras-chave: Ensino de Ciências e Biologia; restauração conservadora; currículo; BNCC.
TEACHING OF SCIENCES AND BIOLOGY AND THE SCENARIO OF CONSERVATIVE
RESTORATION IN BRAZIL: REFLECTIONS AND REFLECTIONS
Abstract: This article discusses the concept of conservative restoration by Michael Apple (2001, 2015,
2017) to reflect on the paths of current curricular policies for the school subjects sciences and biology.
Taking into account that tensions are part of the historical disputes between the public and the private
sectors in the Brazilian education, the article debates recent incursions of conservatism on the curricula of
these school subjects. Thus, we present and discuss some conservative constraints to the teaching of
themes that are crossed by sociocultural controversies such as biological evolution; human body, health
and difference; ethnic-racial diversity. This paper also points out serious threats to the democratic
principles that rule the Brazilian education.
Keywords: Teaching Science and Biology; conservative restoration; curriculum; BNCC.
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Revista Interinstitucional Artes de Educar. Rio de Janeiro, V. 5 N. 2 – pag 144-162 (mai - ago 2019): “Laicidade e Educação em tempos
conservadores” - DOI:10.12957/riae.2019.44847 145
Introdução
Escrever sobre as políticas públicas educacionais pensando especificamente o campo do ensino de
Ciências e Biologia é algo que nada tem de trivial. Em primeiro lugar porque, como afirmam Marandino,
Selles e Ferreira (2009), existem muitas versões do que denominamos “ensino de Ciências e Biologia”.
Cada versão, histórica e concretamente inserida em diferentes cenários socioculturais, produz sentidos e
assume significados distintos, a depender também dos sujeitos e das instituições com que dialoga. Dessa
forma, compreendemos que, dentro e/ou fora dos contextos escolares, é cotidianamente engendrada,
disseminada e legitimada por uma variedade de conhecimentos e de práticas com diversas finalidades.
Em segundo lugar porque, como afirma Ferreira (2014, p. 187), os currículos são “construções
sócio-históricas que produzem e hegemonizam significados sobre quem somos e sobre aquilo que
sabemos” (FERREIRA, 2014, p. 187). Nesse sentido, os currículos nunca são neutros ou meras
prescrições; são condicionados epistemológica, política, social, econômica, ética e esteticamente. Assim,
ao refletir relações de poder, não são estáticos e imunes a debates e conflitos em torno das questões que
atravessam a sociedade e as ciências de referência (SELLES e FERREIRA, 2005). Tanto o currículo
quanto as disciplinas escolares são palco de disputas e negociações nos processos de seleção de conteúdos
e métodos de ensino, e são atravessados, portanto, por interesses de grupos sociais e de instituições
historicamente situadas (GOODSON, 1995; 1997).
Desafiador também é pensar e dissertar sobre o avanço do conservadorismo nas políticas públicas
educacionais, mormente a partir do polêmico impedimento da presidente Dilma Roussef em 2016, quando
foram trazidas novas complexidades ao já nada simples cenário social brasileiro. Desde então, uma
marcha desenvolvida em direção a uma intensa restauração conservadora (APPLE, 2001, p.69) tem nos
lançado em uma conjuntura de acirradas controvérsias e intrigantes contradições que alcançam várias
esferas do campo educacional, como o currículo, as avaliações e a profissão docente.
Michael Apple denomina restauração conservadora a uma disputa sobre o controle da escola. Por
um lado, atores e grupos sociais não somente alinhados com a ideologia da “economia de mercado” que
reduz a ação do estado, recomenda a privatização, a livre escolha e defende o emprego da metodologia
empresarial aos professores e alunos, exaltando a competição e produzindo rankings. Por outro lado, uma
frente neoconservadora que requer um estado forte para agir sobre o controle dos sujeitos, defendendo a
“liberdade”, desde que sejam reforçados os valores da família e da religião, sob o argumento de
recuperação moral da sociedade.
Nesse contexto maior de inquietações, refletir sobre a ações e os discursos que vêm impactando as
políticas que balizam o Ensino de Ciências e Biologia no país é algo que nos move. De nossa ótica, é
preciso indagar e compreender como os deslocamentos que serão operados nesse acirrado quadro de
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restauração conservadora (APPLE, 2001), isto é, nessa conjuntura em que neoliberais e
neoconservadores, com apoio de líderes religiosos alinhados ao campo ideológico da direita e de uma
classe média que defende regimes administrativos gerencialistas, vêm redefinindo políticas e práticas
sociais, culturais e educativas de acordo com seus vieses ideológicos – que atacam o caráter progressista
dos currículos escolares, aumentam a ingerência do âmbito privado sobre o público e alinham
peremptoriamente a Educação aos seus interesses particulares (APPLE, 2001; 2017)1.
Especialmente nesse momento econômico, político e social do país, é preciso estarmos vigilantes à
preservação dos princípios democráticos e atentos às narrativas que, produzidas por setores sociais que
gostariam de resgatar um passado idealizado e pouco matizado, apontam o conservadorismo e a
mercantilização como caminhos inevitáveis para as políticas curriculares brasileiras (APPLE, 2017). De
acordo com Apple (2017) é preciso ainda, a partir de um reposicionamento dos nossos loci de enunciação,
analisar as realidades sociais sob a perspectiva de quem sofre opressões por não integrar o bloco
hegemônico que dita ideologicamente discursos, práticas e processos institucionais. Além disso, de
acordo com o mesmo autor, é necessário localizar, interpretar e expor as relações e contradições de poder
para então enxergarmos a Educação como ato político e ético que precisa criticamente apontar
desigualdades, explorações e conflitos gerados por domínios e subordinações.
Neste texto, suscitamos uma reflexão sobre o avanço do conservadorismo e do reacionarismo, com
protagonismo de setores religiosos, especialmente sobre os currículos das disciplinas escolares Ciências e
Biologia, pensando seus ensinos no interior dessa conjuntura em que a dissolução das políticas públicas
educacionais democráticas é uma tônica. A análise gira em torno de definições da Base Nacional Comum
Curricular (BNCC) para essas disciplinas, no Ensino Fundamental II e no Ensino Médio. Argumentamos
que para construir uma versão do ensino de Ciências e Biologia que estabeleça diálogos e aproximações
significativas com as diferentes realidades que interpelam estudantes e escolas, contribuindo na resolução
de problemas socioeducativos e ambientais, é preciso aprofundar a reflexão sobre as inúmeras
consequências da impermanência da perspectiva laica nos sistemas educacionais.
Por isso, na primeira parte, trazemos à baila a histórica vulnerabilidade da laicidade na educação
brasileira, apontando como essa já fora fragilizada pela BNCC e como a mesma compromete o ensino de
Ciências e Biologia, principalmente no que tange à teoria da evolução. Na segunda, trazemos à tona uma
reflexão sobre os impactos da perspectiva mecanicista e fragmentada de compreensão do corpo humano
para a formação do alunado, mostrando como a mesma é aprodundada pela BNCC. Ainda nessa seção,
abordamos o ataque conservador no que concerne às questões de gênero e sexualidade. Na terceira,
focalizamos os debates sobre relações étnico-raciais que atravessam os cotidianos escolares, completando
a análise de um quadro de dimensões das realidades educacionais que foram progressivamente apagadas
tanto da BNCC em geral, quanto da sua parte especificamente destinada às Ciências da Natureza.
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Enfim, tecemos reflexões que visam contribuir para reafirmar uma educação pública, laica, plural
e democrática. Também sinalizamos que algumas ameaças relacionadas à fragilidade da laicidade do
Estado têm dificultado a concretização de práticas pedagógicas que possam enriquecer as experiências de
docentes e discentes junto às demandas em prol de justiça social e igualdade para todos e todas.
Evolução biológica: uma temática hipersensível ao conservadorismo
O fenômeno religioso traz embates e dilemas para dentro das escolas ao penetrar os diferentes
cotidianos escolares (ANDRADE e TEIXEIRA, 2014). Ao mesmo tempo, tem se reforçado discursos que
argumentam em prol da presença da religião nos currículos escolares como um dispositivo para a
remissão moral das juventudes ou um antídoto para a crise social, cada vez mais eloquente e atribuída por
alguns setores conservadores como consequência da “falta de Deus” na sociedade (CUNHA, 2014).
Por mais que reconheçamos que o diálogo com as diversas crenças e religiões nos espaços
escolares possa constituir oportunidades para a promoção e o estabelecimento de processos que culminem
em uma desejável superação de preconceitos e discriminações (ANDRADE e TEIXEIRA, 2014),
complexificar esse debate se faz necessário para não cairmos em algumas armadilhas discursivas que têm
fortalecido a ingerência do âmbito privado sobre público. Nesse sentido, urge observar que, por exemplo,
alianças entre grupos religiosos possibilitaram uma forte articulação em torno do Ensino Religioso nas
escolas públicas do Rio de Janeiro, com implicações para o ensino de Ciências e Biologia, conforme
indicam Selles, Dorvillé e Pontual (2016).
Tal mobilização acirrou a disputa pelo espaço público com defensores da laicidade e passou a
trazer para dentro das abordagens de Ensino Religioso elementos de confronto entre as perspectivas
criacionista e evolutiva, indo além das tradicionais discussões relacionadas à cidadania e à liberdade
religiosa (SELLES, DORVILLÉ e PONTUAL, 2016). De todo modo, é interessante ressaltar que por
mais que nossas discussões sejam inerentes à defesa da laicidade nas escolas públicas, Vieira e Falcão
(2012) demonstram como a compreensão da teoria evolutiva pode ser fortemente obstruída e dificultada
em escolas particulares que optam institucionalmente por ensinar e realçar o criacionismo. Os imbróglios
analisados pelas autoras são devidos a questões ideológicas relacionadas à religiosidade e não a
problemas ou obstáculos didático-pedagógicos. Assim, as autoras argumentam que o debate em torno da
necessidade da laicidade deve ser ampliado tendo em vista o confronto proposital entre ciência e religião
que é corriqueiramente construído nos espaços educacionais confessionais.
Feita essa observação, é importante salientar que o ensino de teoria evolutiva está sob constante
risco: seja por conta de projetos de lei como o de número 8.099/2014 (BRASIL, 2014), de autoria de um
deputado-pastor, que pretende obrigar o ensino do criacionismo em instituições educacionais públicas e
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privadas, inclusive com o mesmo status das teorias científicas; seja pelo constrangimento de organizações
como o “Escola Sem Partido”, que pressionam professores de Ciências e Biologia a não lecionarem ou a
superficializarem o trabalho com conteúdos ligados à evolução biológica, alegando que estudantes seriam
violados pela ação de docentes que se aproveitariam da liberdade de cátedra e da audiência cativa dos
alunos para incutirem valores contrários àqueles recebidos no âmbito familiar. Tem-se configurado
portanto, uma cultura de auditoria alavancada pelo crescente poder do senso comum direitista que aflige
e tenta intimidar o trabalho docente comprometido com a consolidação de uma educação cada vez mais
plural, inclusiva, socialmente situada e justa (APPLE, 2015; 2017).
Contudo, Teixeira (2016) pondera que durante sua pesquisa de doutoramento, relacionada à
investigação de como se dá o ensino e a aprendizagem da teoria evolutiva em colégios estaduais do Rio
de Janeiro, foram presenciados poucos conflitos explícitos entre docentes e discentes nas aulas sobre
evolução biológica. No entanto, conflitos “velados” e “intensos”, nas palavras do autor, puderam ser
apreendidos, principalmente diante da significativa presença de estudantes evangélicos pentecostais e
neopentecostais, que ofereceram maior resistência aos ensinamentos sobre evolução biológica.
Destacamos as considerações de Teixeira (2016) sobre o papel do professor que entram em
sintonia com a defesa da escola laica. Para ele, o trabalho docente deve mirar a diferenciação entre
conhecimentos religiosos e científicos para que os estudantes sejam estimulados a compreender as teorias
científicas sem se sentirem impelidos à negação de suas crenças pessoais. Afinal, se uma escola laica não
pode conviver com posturas dogmatizadas, nem nutrir a percepção de que existam verdades absolutas,
todo o esforço (e desafio) é o de promover uma cultura docente que aceite a diferença, mas que também
dela se fortaleça.
Estudos como os de Dorvillé e Selles (2016), também reforçam que práticas pedagógicas que
melhorem a compreensão de como se constituem e se realizam as atividades científicas são importantes
para que o ensino de evolução possa ser significativo e, além disso, consiga se contrapor às crescentes
pressões das comunidades evangélicas e adventistas para que o criacionismo seja ensinado em todas as
escolas do país. Tais atividades, também em sintonia com a laicidade, serviriam para a promoção do
respeito pelas diferentes formas de compreender o mundo e a vida, ao mesmo tempo em que
promoveriam estranhamentos e desabilitariam zonas de conforto a partir do diálogo com os
conhecimentos científicos. Por isso, uma escola laica não desqualifica as ideias religiosas ou as crenças
pessoais dos estudantes (TEIXEIRA e LEVINSON, 2018).
Contudo, é preciso mencionar que nenhum outro grupo organizado, exceto o formado pelas
denominações evangélicas supracitadas, vivenciou em tão curto período de tempo tamanho sucesso na
colonização e exploração de espaços e instâncias públicas e privadas de poder e decisão, obtendo
popularização e destaque no cenário político e social por mais que um certo “mal estar” possa ter sido
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gerado (CAVALIERE, 2007). A crescente influência do protestantismo conservador na educação
brasileira também desafia, impacta e interpela professores de Ciências e Biologia que enfrentam em suas
salas de aula interpretações criacionistas - comumente doutrinárias e fundamentalistas - oriundas do
literalismo bíblico protestante sobre a origem da vida e das espécies, divergentes das explicações
evolutivas (DORVILLÉ e SELLES, 2016; SELLES, DORVILLÉ e PONTUAL, 2017).
De acordo com Teixeira e Andrade (2014), apesar de professores de Ciências e Biologia
reconhecerem a importância da teoria evolutiva e de seu ensino, não há consenso quanto à anuência ou
não em relação ao ensino do criacionismo. Ademais, Dorvillé e Selles (2016) apontam que alguns
problemas na qualidade do ensino de evolução biológica também têm sido resultado do crescente número
de docentes vinculados a denominações cristãs que acreditam literalmente no relato bíblico para a criação
do universo e o surgimento da vida.
Nesses casos, evidentemente, não apenas os debates em torno da evolução biológica ficam
comprometidos, mas também os demais assuntos controversos que às vezes são suscitados nas aulas de
Ciências e Biologia, como questões ligadas a gênero e sexualidade, e acabam sendo constrangidos por
visões religiosas fundamentalistas demonstradas por alguns docentes. Por isso, mais uma vez, a defesa da
laicidade na educação se faz necessária. Afinal, cabe reconhecer que “há implicações educacionais na
leitura literal da Bíblia que não se circunscrevem ao privado, mas que afetam peremptoriamente o direito
de alunos de escolas públicas a uma formação que não censure ou limite a qualidade da abordagem dos
conteúdos biológicos” (DORVILLÉ e SELLES, 2016, p. 445).
Assim, a escola pode e deve ser um espaço que possibilite o contato dos alunos com diversos
modos de pensar, o que só é viável se não permitirmos que determinadas religiões sejam privilegiadas ou
pautem a cultura escolar, com suas tradições e particularidades. Portanto, o ensino de Ciências e Biologia
pode ser o espaço para que os estudantes, em sua variedade de trajetórias e identidades, complexifiquem
seus saberes e conhecimentos, ampliando as lentes com as quais podem enxergar e decifrar o mundo que
os rodeia e a sociedade que os condiciona.
A despeito de todas essas notáveis compreensões, a formulação das políticas públicas
educacionais no presente parece caminhar justamente no sentido contrário, como ilustra a reforma
curricular instituída pela BNCC. Antes de tratarmos especificamente do retrocesso que ela representa em
termos de conquistas democráticas recentes no âmbito do currículo, é preciso destacar que essa reforma,
embora tenha sido aprovada no governo de Michel Temer (MDB), foi proposta ainda no governo de
Dilma Rousseff (PT).
Em setembro de 2015, veio a público a primeira versão do documento, contendo direitos de
aprendizagem e objetos de conhecimentos para todas as etapas da Educação Básica, ano a ano, para cada
componente curricular. Nessa versão, conforme destaca Cunha (2016), cometeu-se a aberração
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epistemológica de inserir o Ensino Religioso como componente curricular da área de conhecimento de
Ciências Humanas – em total descaso, ainda, com dispositivos legais precedentes como as Diretrizes
Curriculares Gerais da Educação Básica (BRASIL, 2013) que preveem uma área de conhecimento
especificamente destinada ao Ensino Religioso. Na segunda versão do documento, divulgada em abril de
2016, esse “equívoco” foi revertido e uma área de conhecimento específica foi destinada ao Ensino
Religioso.
Após a deposição da presidente petista, algumas mudanças aconteceram na reforma curricular em
curso. Após a entrega do Ministério da Educação (MEC) à coalizão liberal-conservadora representada nas
figuras de Mendonça Filho e Maria Helena Guimarães de Castro (que fora integrante da equipe de Paulo
Renato Souza, ministro da Educação no governo de Fernando Henrique Cardoso), o Novo Ensino Médio
(NEM) foi aprovado via Medida Provisória em setembro de 2016 (BRASIL, 2016).
A terceira versão da BNCC – a primeira no governo Temer – definiu competências e habilidades
apenas para a Educação Infantil e para o Ensino Fundamental (BRASIL, 2017). Nessa, o Ensino
Religioso foi retirado, sob a alegação de que, conforme define Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (BRASIL, 1996), o mesmo deveria ser oferecido “no Ensino Fundamental nas escolas públicas
em caráter optativo, cabendo aos sistemas de ensino a sua regulamentação e definição de conteúdos"
(Art. 33, § 1º - grifo nosso), de modo que “não cabe à União estabelecer base comum para a área, sob
pena de interferir indevidamente em assuntos da alçada de outras esferas de governo da Federação”
(BRASIL, 2017a, p. 25).
Em que pese a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de autorizar o ensino confessional
religioso nas escolas públicas em setembro de 20172, continua não cabendo à União definir diretrizes para
área, o que evidencia quão contraditória e tensa é esta questão. Mesmo assim, o Ensino Religioso foi
inserido como área de conhecimento na versão da BNCC homologada, com competências e habilidades
específicas a serem desenvolvidas em cada ano do Ensino Fundamental em total descaso com os
dispositivos legais precedentes (ANDRADE e MOTTA, 2018).
À área de conhecimento Ensino Religioso está relacionada apenas um componente curricular, qual
seja, o Ensino Religioso:
A partir da década de 1980, as transformações socioculturais que provocaram mudanças
paradigmáticas no campo educacional também impactaram no Ensino Religioso. Em
função dos promulgados ideais de democracia, inclusão social e educação integral,
vários setores da sociedade civil passaram a reivindicar a abordagem do conhecimento
religioso e o reconhecimento da diversidade religiosa no âmbito dos currículos
escolares. A Constituição Federal de 1988 (artigo 210) e a LDB nº 9.394/1996 (artigo 33,
alterado pela Lei nº 9.475/1997) estabeleceram os princípios e os fundamentos que devem
alicerçar epistemologias e pedagogias do Ensino Religioso, cuja função educacional,
enquanto parte integrante da formação básica do cidadão, é assegurar o respeito à
diversidade cultural religiosa, sem proselitismos (BRASIL, 2017b, p. 433 – grifos
nossos).
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Para esse componente curricular nos anos finais do Ensino Fundamental são estipulados
determinados pressupostos, como “Contribuir para que os educandos construam seus sentidos pessoais de
vida a partir de valores, princípios éticos e da cidadania” (BRASIL, 2017b, p. 435). Com base nesses, são
estabelecidas Competências Específicas da área, como “Reconhecer e cuidar de si, do outro, da
coletividade e da natureza, enquanto expressão de valor da vida” e “Analisar as relações entre as tradições
religiosas e os campos da cultura, da política, da economia, da saúde, da ciência, da tecnologia e do meio
ambiente” (BRASIL, 2017b, p. 435).
As Unidades Temáticas desse componente curricular são (i) Identidades e Alteridades, (ii)
Manifestações Religiosas e Crenças Religiosas e (iii) Filosofias de Vida (BRASIL, 2017b, p. 437). A
cada uma delas são relacionados alguns objetivos de aprendizagem como “Liderança e direitos humanos”,
“Doutrinas religiosas” e “Princípios éticos e valores religiosos” (BRASIL, 2017b, p. 452). Aos objetivos
foram associadas determinadas habilidades a serem desenvolvidas pelo alunado, dentre as quais estão
“Identificar princípios éticos em diferentes tradições religiosas e filosofias de vida, discutindo como
podem influenciar condutas pessoais e práticas sociais”, “Exemplificar líderes religiosos que se
destacaram por suas contribuições à sociedade” (BRASIL, 2017b, p. 453) e, no último ano dessa etapa,
“Construir projetos de vida assentados em princípios e valores éticos” (BRASIL, 2017b, p.457).
Partindo de uma análise do documento legal, podemos encontrar pistas das finalidades da inserção
desse componente na BNCC que podem indicar prováveis colisões com os entendimentos vigentes no
campo do Ensino de Ciências e Biologia em relação às contribuições que ambas disciplinas escolares
podem oferecer:
No conjunto das crenças e doutrinas religiosas encontram-se ideias de imortalidade
(ancestralidade, reencarnação, ressurreição, transmigração, entre outras), que são
norteadoras do sentido da vida dos seus seguidores. Essas informações oferecem aos
sujeitos referenciais tanto para a vida terrena quanto para o pós-morte, cuja finalidade é
direcionar condutas individuais e sociais, por meio de códigos éticos e morais. Tais
códigos, em geral, definem o que é certo ou errado, permitido ou proibido. Esses
princípios éticos e morais atuam como balizadores de comportamento, tanto nos
ritos como na vida social (BRASIL, 2017, p. 438 – grifos nossos).
Assim, seguindo a lógica interna do documento, vemos que o Ensino Religioso também pretende
se consolidar como estratégico (DE CERTEAU, 1998) para a conformação de determinados tipos de
pensamentos, bem como para a formatação de certos hábitos e posturas de vida. Por outro lado, como
sinalizam Dorvillé e Selles (2016), ensinamos Ciências e Biologia também para que os alunos
desenvolvam um pensamento crítico capaz de problematizar, partindo de suas lógicas e pressupostos
próprios, até mesmo versões hegemônicas da própria atividade científica, que é situada historicamente.
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Tais disciplinas conseguiriam conversar produtivamente com outras que não partem dos mesmos
pressupostos?
Ao findar as considerações relativas ao ensino da teoria evolutiva, cabe afirmar que essa não é a
única temática tratadas nas disciplinas escolares Ciências e Biologia que tem sido alvejada pelo
enrijecimento da articulação de setores políticos e sociais comprometidos com ideologias não laicas,
como veremos adiante.
O direito ao reconhecimento da pluralidade nos/dos corpos humanos: uma questão posta
O fortalecimento do Ensino Religioso e a legitimação de sua confessionalidade na escola afeta a
seleção de conteúdos e métodos do ensino de Ciências e Biologia mais do que podemos imaginar. Isso
ocorre, segundo Selles, Dorvillé e Pontual (2016), porque os confrontos entre as ideias religiosas e
científicas passam a ser institucionalizados, como se fossem sustentadas por bases teóricas e
epistemológicas equivalentes, e extrapolam o domínio do debate individual, acarretando coerções sobre
os processos decisórios de professores de Ciências e Biologia no tratamento dos conteúdos disciplinares e
na produção cotidiana dos currículos escolares. Assim, o trato de assuntos que colidem com óticas
religiosas conservadoras tende a tornar-se facultativo e negligenciado, enquanto explicações e discussões
biológicas ou socioculturais tornam-se negadas.
Contrapondo-se a esse panorama, Apple (2017) defende que os currículos devem levar em
consideração as demandas daqueles que não são privilegiados pelos padrões hegemônicos de classe
social, de raça, de sexualidade e de gênero e se responsabilizar de modo ético e político para que haja uma
verdadeira transformação social que permita a inclusão de sujeitos que passam por processos de
desumanização dentro e fora da escola. Tal responsabilidade, a cargo de tantas disciplinas escolares,
parece recair fortemente no trabalho efetuado por inúmeros professores de Ciências e Biologia quando
abordam aspectos relativos às questões humanas.
Dentre as temáticas comumente debatidas quando ensinamos essas disciplinas e que acabam sendo
enfraquecidas ou silenciadas se encontram aquelas tradicionalmente encarregadas de trabalhar aspectos
do funcionamento do corpo humano e que tangenciam reflexões relacionadas a gênero, sexualidade, raça
e etnia. A propósito, de acordo com Aquino et al (2014), as discussões contemporâneas sobre cultura e
identidade acessam o ensino de Ciências e Biologia intermediadas pelo viés da saúde, fazendo com que
múltiplas indagações atravessem o corpo material de “carne e osso”. No entanto, o tema da sexualidade
humana é um saber cada vez mais negociado no ambiente escolar (BASTOS e ANDRADE, 2016).
Nesse sentido, para Bastos (2015) é importante que tais disciplinas escolares agreguem aos
conteúdos tradicionais uma discussão sobre a diversidade sexual que vá além dos padrões
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heteronormativos e traga uma perspectiva de cidadania científica, intercultural e plural para o ensino e a
aprendizagem das Ciências da Natureza. O autor argumenta que uma educação que não estabeleça um
profundo diálogo sobre a diversidade cultural, sobre a igualdade articulada com as diferenças relativas ao
gênero, às formas do corpo ou à afetividade e sobre a constante capacidade de mudança das classificações
sociais não pode ser considerada desejável. Para ele, as diferenças sexuais devem ser encaradas como
integrantes do conhecimento escolar e, portanto, evoca uma pedagogia da sexualidade para trazer
reflexões sobre a forma como as sexualidades são afirmadas ou silenciadas na escola, mesmo fazendo
parte das experiências humanas e escolares.
Bastos (2015) problematiza ainda a “natureza polêmica” da pluralidade sexual e os tabus –
fortemente fomentados pelos vieses religiosos - do ambiente escolar ao reconhecer os conhecimentos
como construções culturais, sociais e históricas, e estranhar naturalizações que materializam preconceitos
e normatizam pressupostos sobre esses temas. Com base nesse entendimento, defendemos a necessidade
de que o Ensino de Ciências e Biologia se comprometa com a discussão de dimensões sociais, políticas e
econômicas sobre ciência, tecnologia, cultura e sociedade.
Todavia, é preciso refletir sobre como travaremos essas discussões e concretizaremos essa
proposta frente ao cenário que se desenha, uma vez que a influência vigorosa de movimentos
neoconservadores tem insistido que em nossas aulas só deve haver a disseminação de um determinado
tipo de conhecimento, tido como “neutro”, da anatomia e da fisiologia humana, gerando uma pressão que
intensifica a exclusão de questões culturais que atravessam a constituição plural dos sujeitos, que são
biológicos, mas também sociais.
No que tange a essas compreensões, a versão aprovada da BNCC também representa um grande
retrocesso. Em 2015, à época da divulgação da primeira versão, Ricardo Fazetta, gerente de conteúdo do
movimento Todos Pela Educação (TPE), aliado a interesses empresariais na educação, elogiou, em nome
do TPE, o movimento do MEC de incluir na BNCC as discussões sobre gênero, afirmando que a inclusão
representava um avanço em direção ao combate do preconceito, mas que também geraria polêmica: “a
discussão vai ser boa e tem que acontecer. O que não pode é omitir de partida. Tem que retomar, discutir
e defender, mostrando os argumentos" (O GLOBO, G1, 2015, s./p.). Evidenciando as tensões e os
conflitos entre as duas frentes previamente mencionadas que disputam o controle sobre a escola, na
primeira versão divulgada no governo Temer houve supressão das questões de gênero em meio a uma
sequência de notícias que se sucederem na grande imprensa, tais como: “Bancada religiosa pediu a Temer
retirada de questão de gênero da Base”; “Governo Temer esvazia gênero na base curricular e mistura
tema com religião” (SALDAÑA, 2017); “Bancada evangélica celebra retirada de questão de gênero da
base curricular”3 e outros.
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Apesar da manifestação da Organização das Nações Unidas (ONU) e de diversos atores da
sociedade civil sobre a influência de ideias conservadoras na BNCC4, a versão aprovada não só manteve
esses retrocessos como avançou ainda mais ao retirar também as questões de sexualidade. O tema “Saúde
e Sexualidade”, até então listado entre os “Temas Contemporâneos”5, foi retirado da versão final,
aprovada em dezembro.
Outras mudanças também são relevantes, tais como a ocorrida em uma das habilidades previstas
para o componente curricular Ciências da Natureza. Na versão divulgada em abril de 2017, estava
previsto “Selecionar argumentos que evidenciem as múltiplas dimensões da sexualidade humana
(biológica, sociocultural, afetiva e ética) e a necessidade de respeitar, valorizar e acolher a diversidade de
indivíduos, sem preconceitos baseados nas diferenças de gênero” (BRASIL, 2017a, p.300). Na versão
final, a habilidade prevista é apenas “Selecionar argumentos que evidenciem as múltiplas dimensões da
sexualidade humana (biológica, sociocultural, afetiva e ética)” (BRASIL, 2017b, p. 347).
Em suma, apesar do bordão de que a “Base não é Currículo” ser incansavelmente repetida pelos
atores do MEC (2018), as disputas mencionadas anteriormente mostram a limitação desse entendimento
acerca do currículo, pois longe de ser uma listagem de conteúdos a serem seguidos na escola, significa
uma construção social em meio a embates e inúmeros conflitos. Assim, não estipular na BNCC que as
discussões sobre gênero e sexualidade sejam parte do conteúdo obrigatório da Educação Básica, além de
materializar o conflito de grupos pelo controle do currículo, retira parte do respaldo legal de docentes e
escolas que entendam a necessidade de abordar esse conteúdo, além de esvaziar as suas importância e
legitimidade.
Por isso, um caminho pavimentado por desafios e dilemas deverá ser trilhado por professores de
Ciências e Biologia comprometidos com a defesa da pluralidade de ideias, com a diversidade humana e
com a inclusão dos marginalizados sociais. Inclusive para que seja superada a hegemonia da abordagem
biomédica sobre corpo humano, que acompanha uma clássica visão de saúde higienista e de educação
comportamentalista nos currículos escolares de Ciências e Biologia (VILELA e SELLES, 2015).
Porém, cabe ressaltar que os modos como os conhecimentos científicos sobre o corpo humano são
trabalhados no contexto escolar, apesar de serem tidos como fragmentados, mecanicistas, reducionistas e
produtores de um discurso idealizado que não corresponde aos corpos reais (MACEDO, 2005), sofrem
transformações e configuram-se como conhecimentos escolares a partir de influências sociais diversas. A
produção histórica das disciplinas escolares se dá em um espaço de negociação entre os conhecimentos e
as tradições científicas, os saberes cotidianos, o modus operandi da escola e seus aspectos organizacionais
e didáticos, como elementos da própria cultura escolar, evidenciando o dinamismo da construção do
currículo.
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Por isso, o trabalho com abordagens sociais e culturais sobre o corpo e a saúde interpela, segundo
Vilela e Selles (2015), os discursos hegemônicos sobre o “corpo humano escolar” e as concepções sobre o
que é lícito e saudável. Assim, colocar certas tradições que têm habitado as salas de aulas em diálogo com
fatores sociais e culturais nos quais os estudantes estão imersos faz-se cada vez mais necessário diante do
reconhecimento de que o Ensino de Ciências e Biologia é atravessado por questões de ordens diversas
que tendem a ser ignoradas por docentes ou “apagadas” das escolas com o recrudescimento da
restauração conservadora (APPLE, 1994).
Etnia e raça: deslizamentos para operar branqueamentos nos currículos escolares
Assim como as investidas conservadoras contra o ensino da evolução biológica e o silenciamento
das questões de gênero e sexualidade que interpelam os conteúdos sobre o corpo humano, outro ponto que
precisa ser mencionado, mesmo que a limitação de nosso espaço nos prive de realizar uma discussão mais
pormenorizada como seria desejável, está relacionado às questões étnico-raciais. Especialmente a partir
dos anos 2000, tais questões vêm assumindo destaque para o Ensino de Ciências e Biologia. A
intensidade dos debates sociais atinge os cotidianos escolares e vem provocando processos de ruptura
epistemológica e curricular que trazem assuntos, sujeitos e práticas comumente marginalizadas e
discriminadas para as disciplinas Ciências e Biologia.
Aliás, Gomes (2012) ressalta que movimentos de descolonização dos currículos da educação
brasileira vêm exigindo mudanças nas representações e práticas sobre a África e os afro-brasileiros, além
de questionar lugares de poder ao indagar as relações entre direitos e privilégios presentes na cultura
política e educacional brasileira que alcança escolas e universidades. Assim, à educação para as relações
étnico-raciais se soma o desafio posto à educação escolar já abordado antes neste texto: estabelecer um
diálogo entre escola, currículo e realidade social para que reflitamos sobre culturas negadas e silenciadas
nos espaços escolares e nas instituições educacionais.
Não se pode ignorar que a discriminação racial, o racismo ambíguo brasileiro e o mito da
democracia racial são pontos que modulam a seletividade das instituições educacionais e propiciam
rituais pedagógicos a favor da discriminação racial. Contudo, a Lei 10.639/2003 (BRASIL, 2003) trouxe
uma oportunidade de diálogo intercultural para a construção de uma alternativa da história do mundo
(GOMES, 2012). Assim, para Verrangia e Silva (2010), o Ensino de Ciências pode promover a educação
das relações étnico-raciais quando a entende como direito humano fundamental e como pressuposto para
a formação para a cidadania.
A BNCC também reforça esses problemas, que vêm sendo sinalizados e tensionados desde a
primeira versão, de modo especial no componente curricular História. Sobre esse componente, à época da
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divulgação das duas primeiras versões, o então ministro da educação Aloizio Mercadante afirmou que
houve melhoras entre a primeira e a segunda versão, pois refez-se a ordem cronológica dos conteúdos,
evitou-se o “viés eurocêntrico e incorporou-se a valorização da África, o protagonismo das culturas
indígenas e afro-brasileiras, mas sem abrir mão dos processos históricos do Ocidente e do Brasil”
(RODRIGUES, 2016, s./p).
No entanto, sobre a mesma versão, a Associação Nacional de História (ANPUH) afirmou que,
embora tivessem sido consideradas algumas críticas, outras “foram obliteradas, sobretudo, aquelas
relacionadas a uma reflexão mais ampla acerca do conceito de eurocentrismo – notadamente presente
nesta segunda versão – e sobre a importância da tematização do tempo como um conceito
fundamental para o estudo e ensino da história” (ANPUH, 2016, s./p.), bem como que toda a Era Vargas
havia sido suprimida e que as definições do documento preservavam estereótipos construídos
na historiografia do século XIX.
Sobre as versões do governo Temer, Cruz (2017) salienta que embora o tema das relações étnicas
e raciais tenha ascendido no debate educacional brasileiro, e tenha sido mantido no âmbito dos Temas
Contemporâneos como “Educação das relações étnico-raciais e ensino de história e cultura afro-brasileira,
africana e indígena” (BRASIL, 2017b, p. 19), esses temas aparecem de forma residual em comparação
com outros temas especialmente na proposta dirigida ao ensino de história.
Tal debate não se circunscreve à disciplina escolar História, pois as temáticas raciais encontram-se
presentes nas disciplinas Ciências e Biologia há mais de um século, tanto reiterando os movimentos
eugênicos (SANTOS, 2013) quanto, mais recentemente, incorporando críticas ao racismo (LEVY,
SELLES e FERREIRA, 2008). Essas disciplinas certamente poderiam também ser comprometidas com a
reversão do viés eurocêntrico e dos preconceitos de raça, gênero e classe, pois há um rol de questões que
podem ser abordadas em aulas de Ciências e Biologia quando assumimos o compromisso de reverter o
paradigma cultural eurocentrado vigente. Nesse sentido, a promoção de debates sobre as relações étnico-
raciais nessas disciplinas permite a identificação das contribuições trazidas pelos negros para a construção
do Brasil e incentiva o reconhecimento da diversidade cultural afro-brasileira para que as atuais e futuras
gerações de afrodescendentes possam criar um novo campo imagético de si (BENVENUTO e AYRES,
2014).
Como pautaremos nossas práticas pedagógicas, enquanto professores de Ciências e Biologia, para
implementarmos essas contribuições para o fortalecimento da educação antirracista também é uma
questão difícil e complexa de ser respondida no panorama atual. Com grupos cristãos fundamentalistas
cada vez mais empoderados e articulados politicamente, tem sido cada vez recorrente encontrar relatos e
denúncias de discriminação e perseguição religiosa aos praticantes de cultos e credos de matriz africana.
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Porém, a escola tem que ser um local seguro para aqueles que não professam a fé de matriz
judaico-cristã ou não dissimulam suas experiências de cunho religioso divergentes da religiosidade tida
por padrão. Por isso, a laicidade é indispensável para a garantia da liberdade religiosa de todos que
circulam pelos espaços escolares e é condição para que Ciências e Biologia sejam disciplinas capazes de
abordar os debates étnico-raciais sem privilegiar visões hegemônicas a respeito do tema.
Considerações finais
A construção de uma educação pública, laica e plural é um processo que, por mais que apresente
contradições, é também requisito indubitável para que nossas escolas sejam espaços de inclusão
democrática e de reflexão sobre conhecimentos, saberes e tecnologias. O Ensino de Ciências e Biologia
tem muito a contribuir para a concretização desse projeto, mas tem sido cada vez mais desafiado por
questões sociopolíticas que lesam a autonomia do campo educacional e afetam os currículos nos
cotidianos escolares.
Neste texto, vislumbramos possibilidades de diálogos que enfatizam a perspectiva laica de
educação e argumentamos que a mesma é essencial para o trabalho em sala de aula com temáticas
contemporâneas para o ensino de Ciências e Biologia tidas como controversas. Nesse sentido,
focalizamos a importância da laicidade como uma espécie de “pré-requisito” para o ensino mais
produtivo da teoria evolutiva e como condição sine qua non para que a abordagem de discussões
relacionadas à identidade de gênero, sexualidade, corpo humano e saúde e relações étnico-raciais não
reproduzam e legitimem estereótipos e preconceitos.
Como demonstram Piccinini e Andrade (2018), a BNCC apresenta uma série de problemas no que
concerne ao encadeamento dos conteúdos do componente curricular Ciências da Natureza, que estão
relacionados à passagem da organização vertical dos conteúdos à organização horizontal6. O tema corpo
humano, por exemplo, que até então era abordado no oitavo ano do ensino fundamental, ao longo de todo
o ano, foi repartido ao longo de todos os anos do Ensino Fundamental II. Além disso, o trabalho com as
ideias evolucionistas básicas está previsto para o último ano do Ensino Fundamental, conquanto o Ensino
Religioso acompanha todos os anos dessa etapa. Já o entendimento do funcionamento do corpo humano
como um todo integrado, em viva e ativa relação com o ambiente, fica extremamente debilitado, posto
que o documento prevê tão somente a abordagem de dois dos vários e complexos sistemas que formam os
organismos humanos (BRASIL, 2017b, p. 342-349).
Por fim, empreendemos um movimento que almejou indicar como a produção da BNCC -
especialmente os documentos dirigidos às disciplinas escolares Ciências e Biologia - está atrelada ao
fortalecimento de discursos relacionados a grupos sociais conservadores e/ou ligados ao empresariado
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que têm disputado uma crescente ingerência do âmbito privado sobre o público. Tal influência, que
pretende promover apagamentos e silenciamentos de certas reflexões e debates nos espaços escolares, tem
provocado contradições e tensões político-sociais para a profissão docente, a formação de professores e os
currículos. Devemos, então, permanecer atentos a tais incursões, uma vez que as tentativas de
restauração conservadora (APPLE, 2001) nos sistemas educacionais brasileiros podem culminar em
graves ameaças aos princípios que garantem a oferta de educação pública, laica, gratuita, plural, de
qualidade, democrática e socialmente justa e referenciada.
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Notas:
i
Doutorando em Educação na Universidade Federal Fluminense (UFF). Mestre em Educação, licenciado e bacharel em
Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
ii
Mestranda em Educação na Universidade Federal da Rio de Janeiro (UFRJ). Licenciada em Ciências Biológicas pela UFRJ.
iii
Professora Titular do Programa de Pós-Graduação em Educação e da Faculdade de Educação da Universidade Federal
Fluminense (UFF). Doutora pelo Center For Science Education da University of East Anglia (UEA). Bolsista de Produtividade
(nível 1C) no CNPq e Cientista do Nosso Estado pela FAPERJ.
1 Embora a ideia de “aliança” seja formulada por Apple, cabe dizer que no Brasil, as agendas desses grupos nem sempre são
partilhadas integralmente. Entretanto, suas ações voltadas à educação se desenvolvem em uma rede convergente, conforme
documenta Edgar Miranda (2018), ainda que divirjam sobre alguns temas, como por exemplo, a inclusão do criacionismo em
aulas de Biologia e das temáticas de gênero na escola, essas evidenciadas pelo elogio de integrantes do movimento Todos pela
Educação (O GLOBO, G1, 2015, s./p.).
2 Mais informações podem ser encontradas na reportagem “STF decide que escolas públicas podem ter ensino confessional”.
Disponível em: <https://oglobo.globo.com/sociedade/educacao/stf-decide-que-escolas-publicas-podem-ter-ensino-
confessional-21878145>, acesso em 03 jan 2019.
3 Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/educacao/2017/04/1873511-bancada-evangelica-celebra-retirada-de-questao-
de-genero-de-base-curricular.shtml>.
4 Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2017-04/onu-alerta-para-impactos-do-projeto-escola-sem-
partido-na-educacao>. Acesso em 10 jun 2018.
5 Os temas contemporâneos definidos na BNCC devem ser incorporados aos currículos “preferencialmente de forma
transversal e integradora. (...). Na BNCC, essas temáticas são contempladas em habilidades dos componentes curriculares,
cabendo aos sistemas de ensino e escolas, de acordo com suas especificidades, tratá-las de forma contextualizada” (BRASIL,
2017b, p. 20). O tema “gênero e sexualidade” integrou as três versões anteriores.
6 Tradicionalmente, conteúdos da disciplina escolar Ciências intimamente afins são reunidos e trabalhados de modo integrado e
contínuo dentro de cada ano do Ensino Fundamental II. Assim, convencionou-se que, por exemplo, os conteúdos relacionados
ao funcionamento do corpo humano deveriam ser ensinados no 8º ano, enquanto o 7º ano se concentraria em trabalhar a
biodiversidade. No entanto, a BNCC pulverizou tais conteúdos, desarticulando-os e disseminando-os por diferentes anos e
descaracterizando os eixos temáticos de cada série.