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Ano 14 - Volume 25 - Número 1 - Janeiro – Junho - 2018
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VALLADARES-TORRES, A. C. A. Arteterapias criativas com mulher dependente de múltiplas drogas – um estudo
de caso. Rev Científica Arteterapia Cores da Vida. v.25, n.1, p.26-37, Jan./Jun. 2018a. Disponível em:
http://www.abcaarteterapia.com
3 – ARTETERAPIAS CRIATIVAS COM MULHER DEPENDENTE DE MÚLTIPLAS DROGAS – UM ESTUDO DE
CASO
Ana Cláudia Afonso Valladares-Torres
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Resumo: Introdução - Com a reforma psiquiátrica, a lógica de cuidados humanizados se modificou e exigiu novas
formas de intervenção criativas e inovadoras nos cuidados voltados aos usuários dos serviços de saúde mental, a
fim de auxiliar na reabilitação psicossocial do sujeito. Objetivo - Avaliar a eficácia da interseção da arte, da música
e a dança/movimento em um processo de Arteterapias criativas com uma mulher dependente de múltiplas drogas
e usuária de um Centro de Atenção Psicossocial álcool e outras drogas do Distrito Federal. Método - Trata-se de
um estudo de caso único, descritivo e exploratório, de caráter qualitativo. Para a coleta de dados, foram utilizados
os seguintes instrumentos: (a) Questionário com dados sociodemográficos, clínicos e psiquiátricos, (b)
“Termômetro das Emoções”, (c) Questão Aberta (qualitativa) e (d) Inventário Estruturado de Saída (quantitativo).
Resultados - A participante do caso relatou que as intervenções de Arteterapias criativas davam apoio a ela,
melhoraram o seu estado de ânimo, houve libertação catártica de temas emocionais, aumento da autopercepção e
da autoestima, e favoreceram o relaxamento, a vitalidade e a confiança em si mesma. Observou-se a ênfase na
cor rosa/vermelho e na cor verde, traçados fortes, lentos, rápidos, fracos e traços com avanços, recuos e
interrompidos, igualmente, surgiram fragmentos de linhas. Também houve alterações positivas na paz interior, na
alegria e na compreensão. Conclusão - Sugere-se a replicação desta pesquisa no futuro com número maior de
pessoas, sessões de Arteterapias criativas em longo prazo e em vários contextos da saúde mental.
Palavras-chave: Arteterapia, Arteterapias criativas, Arteterapias expressivas, Terapia pela arte, Transtornos
relacionados ao uso de substâncias, Saúde da mulher, Enfermagem psiquiátrica, Saúde mental, Processo de
cuidar em saúde, Práticas integrativas e complementares de assistência à saúde.
Creative art therapies with multiple drug dependent women - a case study
Abstract: Introduction - With the psychiatric reform, the logic of humanized care has changed and required new
forms of creative and innovative intervention in the care directed to the users of mental health services, in order to
assist in the psychosocial rehabilitation of the subject. Objective - To evaluate the effectiveness of the intersection
of art, music and dance / movement in a process of creative Arteterapias with a woman dependent on multiple
drugs and user of a Psychosocial Care Center alcohol and other drugs of the Federal District. Method - This is a
unique, descriptive and exploratory case study of a qualitative nature. The following instruments were used to
collect data: (a) Questionnaire with sociodemographic, clinical and psychiatric data, (b) "Thermometer of
Emotions", (c) Open Question (qualitative) and (d) Structured Output Inventory quantitative). Results - The
participant of the case reported that the interventions of creative Arteterapias supported her, improved her mood,
cathartic release of emotional issues, increased self-perception and self-esteem, and favored relaxation, vitality
and confidence in yourself. There was an emphasis on pink / red and green color, strong, slow, fast, weak traces
and traces with advancements, retreats and interruptions, also fragments of lines appeared. There have also been
positive changes in inner peace, joy and understanding. Conclusion - It is suggested the replication of this research
in the future with a larger number of people, creative sessions in the long term and in various contexts of mental
health.
Keywords: Art therapy, Creative arts therapy, Expressive Arts therapy, Substance-Related Disorders, Women's
Health, Psychiatric Nursing, Mental health, Health care process, Integrative and complementary health care
practices, Integrative systematic.
Arteterapias creativas con mujer dependiente de múltiples drogas - un estudio de caso
Resumen: Con la reforma psiquiátrica, la lógica de cuidados humanizados se modificó y exigió nuevas formas de
intervención creativas e innovadoras en los cuidados dirigidos a los usuarios de los servicios de salud mental, a fin
1
Arteterapeuta nº 001/0301-ABCA, Doutora em Enfermagem Psiquiátrica e Profª Adjunto da Universidade de Brasília (UnB), Brasília-DF, Brasil.
E-mail: aclaudiaval@unb.br
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de auxiliar en la rehabilitación psicosocial del sujeto. Objetivo - Evaluar la eficacia de la intersección del arte, la
música y la danza / movimiento en un proceso de Arteterapias creativas con una mujer dependiente de múltiples
drogas y usuaria de un Centro de Atención Psicosocial alcohol y otras drogas del Distrito Federal. Método - Se
trata de un estudio de caso único, descriptivo y exploratorio, de carácter cualitativo. (A) Cuestionario con datos
sociodemográficos, clínicos y psiquiátricos, (b) "Termómetro de las Emociones", (c) Cuestión Abierta (cualitativa) y
(d) Inventario Estructurado de Salida (c) cuantitativa). Resultados - La participante del caso relató que las
intervenciones de Arteterapias creativas daban apoyo a ella, mejoraron su estado de ánimo, hubo liberación
catártica de temas emocionales, aumento de la autopercepción y de la autoestima, y favorecieron la relajación, la
vitalidad y la confianza en sí mismo. Se observó el énfasis en el color rosa / rojo y en el color verde, trazados
fuertes, lentos, rápidos, débiles y rasgos con avances, retrocesos e interrumpidos, igualmente, surgieron
fragmentos de líneas. También hubo cambios positivos en la paz interior, la alegría y la comprensión. Conclusión -
Se sugiere la replicación de esta investigación en el futuro con número mayor de personas, sesiones de
Arteterapias creativas a largo plazo y en varios contextos de la salud mental.
Palavras-clave: Arteterapia, Arteterapias creativas, Arteterapias expresivas, Terapia con arte, Trastornos
Relacionados con Sustancias, Salud de la mujer, Enfermería Psiquiátrica, Salud mental, Proceso de atención de la
salud, Prácticas de salud complementarias y de integración.
Introdução
As Arteterapias criativas são o uso planejado e integrado de várias atividades de arte — como as artes
plásticas, a dança ou movimento, a música e o teatro — desenvolvidas com objetivos distintos e coordenadas por
um arteterapeuta qualificado. Podem ser aplicadas a um indivíduo ou a um grupo, concentrando-se em uma
variedade de necessidades, que incluemo necessidades físicas, de comunicação, psicossociais, cognitivas ou
emocionais. São desenvolvidas em vários contextos, como hospitais, centros de reabilitação, instalações de
cuidados residenciais, saúde mental, serviços de assistência social, instituições de ensino ou creches. As
Arteterapias criativas integram a experiência artística com as teorias e práticas da da Psicologia, da Psicoterapia e
da Psiquiatria como uma forma integrada de intervenção terapêutica. Trabalho que focaliza a experiência vivida no
processo terapêutico, além do produto final (IACAT, 2018).
Na Arteterapia, é enfatizado o uso da criatividade, a fim de incentivar a expressão das emoções e
sentimentos e aliviar os sintomas de estresse, de ansiedade, de depressão e melhora da qualidade de vida de
usuários participantes (VALLADARES, 2004; 2008; VALLADARES-TORRES, 2015).
Com a reforma psiquiátrica, a lógica de cuidados humanizados se modificou e exigiu novas formas de
intervenção criativas e inovadoras nos cuidados voltados aos usuários nos serviços de saúde mental, em especial
dentro dos Centros de Atenção Psicossocial álcool e outras drogas (CAPS-ad), a fim de auxiliar na reabilitação
psicossocial do sujeito e o despertar da sua autonomia (VALLADARES et al., 2008; LIMA et al., 2009;
VALLADARES, 2011; VALLADARES-TORRES, 2012, 2013a; 2013b; 2017).
A dependência de drogas é um transtorno mental crônico que gera um grande impacto na vida do sujeito e
exige um cuidado amplo e complexo e que facilite o vínculo terapêutico, visto que a adesão ao serviço é baixa. Na
assistência aos dependentes de drogas, é importante a incorporação de atitudes humanizadas que possam
oferecer atitudes de empatia, disponibilidade, respeito às diferenças, generosidade, tolerância, cooperação,
acolhimento e vínculo, assim como a busca da produção de novas subjetividades por meio de atividades criativas,
lúdicas e atrativas (SNPD, 2014a; VALLADARES-TORRES, 2017).
Verifica-se que, na literatura científica vigente, existe uma carência de pesquisas aplicadas a dependentes
de drogas e, em especial, com uso de intervenções que envolvam as Arteterapias criativas.
Assim, este estudo objetivou de avaliar a eficácia da interseção da arte, da música e a dança/movimento
num processo de Arteterapias criativas por uma mulher dependente de múltiplas drogas e usuária de um Centro
de Atenção Psicossocial álcool e outras drogas do Distrito Federal.
Método
Desenho do estudo
Trata-se de um estudo de caso único, descritivo e exploratório, de caráter qualitativo. Como exigido para
projetos de estudo de caso, uma ampla variedade de evidências ou dados foram utilizadas, fim de convergir para
um único ponto (YIN, 2014). Utilizou-se a fundamentação teórica da Psicologia Analítica de C. G. Jung.
Local do estudo e do participante
Participou deste estudo uma mulher adulta dependente de múltiplas drogas usuária de um CAPS-ad III do
Distrito Federal. Os CAPS-ad III funcionam de forma ininterrupta e são serviços estratégicos para coordenar e
amplificar as ações em saúde mental (SNPD, 2014b). Para assegurar o anonimato, definiu-se denominá-la de
participante-caso.
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Instrumentos de Coleta de Dados
Para a coleta de dados foram utilizados diversos instrumentos:
O primeiro foi um Questionário com dados sociodemográficos, clínicos e psiquiátricos, elaborado pela
pesquisadora, composto pelas variáveis: idade, gênero, situação conjugal, número de filhos, grupo étnico, estado
de procedência, trabalho e renda, escolaridade, religião, coabitação, drogas de dependência, início da
dependência das substâncias psicoativas, histórico psiquiátrico, co-morbidades, tentativa ou ideação suicida,
encaminhamento ao serviço, tempo de tratamento e terapia medicamentosa.
O segundo foi o“Termômetro das Emoções” — modelo de Vergara (2010) — que é uma escala tipo Likert e
autoaplicável, cuja intensidade varia de 1 a 10, sendo 1-menos intenso e 10-mais intenso. A escala de Likert é um
tipo de escala de resposta psicométrica, cujas categorias de resposta servem para capturar a intensidade dos
sentimentos dos participantes (LLAURADÓ, 2016). O “Termômetro das Emoções” avaliou o nível emocional dos
participantes, como: tristeza, alegria, carinho, compreensão, raiva, medo e paz interior (VERGARA, 2010). O
instrumento consistiu de um quadro, com os sentimentos nela listados, de cores diferentes. A seguir, no Quadro 1,
segue o modelo “Termômetro das Emoções” utilizado no estudo.
Quadro 1 - Modelo do “Termômetro das Emoções” utilizado para avaliar e mensurar os sentimentos da
participante-caso, antes e depois de cada intervenção de Arteterapias criativas
Nº
Sentimentos
1
Menos
2
3
4
5
6
7
8
9
10
Mais
1
Tristeza
2
Alegria
3
Raiva
4
Medo
5
Paz interior
6
Carinho
7
C
Co
om
mp
pr
re
ee
en
ns
sã
ão
o
O terceiro instrumento foi uma Questão Aberta (qualitativa) – elaborada pela pesquisadora — composta pela
pergunta: “O que essa dinâmica (de Arteterapias criativas) representou para você durante o seu tratamento?” Foi
utilizada no estudo ao final de cada intervenção de Arteterapias criativas.
O quarto foi um Inventário Estruturado de Saída (quantitativo) — modelo adaptado de Vergara (2010) —
composto por dez itens, que avaliou os efeitos gerados pelas intervenções de Arteterapias criativas, cuja
intensidade variou de sim, em parte, neutro, não e alguma observação. Esse Inventário foi respondido pela
participante-caso ao final das intervenções de Arteterapias criativas. Segue o modelo do Inventário Estruturado de
Saída no Quadro 2.
Quadro 2 - Modelo do Inventário Estruturado de Saída (quantitativo), modelo adaptado de Vergara (2010),
utilizado no estudo ao final de cada intervenção de Arteterapias criativas
Nº
Questões
Sim
Em
parte
Neutro
Não
Obs
1
Diminuição da dor
2
Maior relaxamento
3
Melhora do estado de ânimo
4
Libertação catártica de temas emocionais
5
Deixa fluir o processo criativo
6
Maior vitalidade
7
Maior confiança em si mesmo
8
Maior autonomia - Melhora a sensação de poder
9
Aumenta a autopercepção e autoestima
10
Maior aceitação da dependência de drogas
Procedimentos
Foi realizada uma pequena entrevista com a participante-caso, de forma individual, a fim de preencher os
dados sociodemográficos, clínicos e psiquiátricos, e para complementar a coleta desses dados utilizou-se a busca
ativa no seu prontuário. Antes de iniciar cada intervenção de Arteterapias criativas aplicou-se o “Termômetro das
Emoções” e logo após o término da mesma, aplicou-se novamente o mesmo instrumento, para realizar uma
análise comparativa entre os dois momentos. Posteriormente, aplicou-se a Questão Aberta (qualitativa) e, em
seguida, o Inventário Estruturado de Saída (quantitativo).
Foram realizadas quatro intervenções grupais e semanais de Arteterapias criativas, com duração
aproximada de duas horas cada, no período de abril e maio de 2017. Do grupo trabalhado, selecionou-se uma
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participante-caso, que serviu de exemplo, por ter participado ativamente das quatro intervenções de Arteterapias
criativas e que havia respondido a todos os instrumentos de coleta de dados e realizado todos os desenhos
propostos.
Cada intervenção de Arteterapias criativas incluiu atividades de aquecimento, desenvolvimento e
fechamento da intervenção e foi composta, obrigatoriamente, pelas três modalidades de artes em cada encontro,
a saber: atividades com música, dança/expressão corporal e elaboração de um produto final pelas artes plásticas.
Para tanto, foram utilizados os materiais: instrumentos de dança, óleo essencial de arnica, violão, computador e
som, giz pastel, canetinhas hidrográficas, lápis preto e borracha, giz de cera, lápis de cor e papel sulfite A4. Os
objetivos gerais das intervenções de Arteterapias criativas incluíram potencializar e valorizar o processo criativo,
facilitar a livre expressão e a catarse das emoções e favorecer os laços afetivos e sociais.
O Quadro 3 apresenta o número da intervenção, as modalidades de arte desenvolvidas em cada
intervenção e seus objetivos terapêuticos correspondentes.
Quadro 3 – Descrição das intervenções de Arteterapias criativas, segundo participantes, modalidades de arte e
objetivos terapêuticos. Brasília, DF, Brasil, 2018;
Nº
Modalidade de Artes
Objetivos terapêuticos
Dança ou expressão
corporal
Música
Artes plásticas
1ª
Movimentos corporais
utilizando instrumentos
de dança: fita, leque em
tecido e retalhos de
tecidos. Houve variação
de velocidade do ritmo
do som, de lento a
agitado, assim como da
leveza a agressão de
movimentos
Escutar o som ao vivo e
instrumental de violão
(solo de violão)
Foi solicitado que os
participantes
escolhessem uma cor de
giz pastel e
desenhassem de olhos
fechados enquanto
ouviam o som das
músicas (desenho cego).
Houve variação de
velocidade do ritmo do
som, de lento a agitado
Aquecimento do trabalho
terapêutico.
Capacidade de expansão,
vivência lúdica e sensorial.
Capacidade de imaginar novo
sentido para a realidade existente.
Explorar o cotidiano.
Trabalhar a maleabilidade e
limites do corpo.
2ª
Brincadeiras e
movimentos de ativação
corporal e de respiração
profunda;
Massagem nas mãos
efetuada por outro
participante com auxílio
de óleo essencial de
arnica
Ouvir técnicas de
meditação com música
de fundo baseadas no
poder das cores:
vermelha, laranja e
amarela
Representar
graficamente as imagens
da visualização criativa
para concretização de
metas emocionais e
materiais sobre papel
branco A4
Aumentar o repertório artístico.
Promover o relaxamento psíquico.
Vivência lúdica e sensorial
3ª
Relaxamento criativo
com foco na respiração
consciente.
Representar por meio da
expressão corporal e
teatral as emoções:
tristeza, alegria, carinho,
compreensão, raiva,
medo e paz interior.
Atividade realizada em
duplas e depois exposta
para o grupo todo. Para
finalizar a sessão, houve
uma dinâmica sobre
sonhos, onde cada um
escreveu seu sonho em
um papel colocado
dentro de um balão, e
em seguida, os
participantes tinham que
cuidar para esse balão
que representava o
sonho, não cair, não se
perder, nem estourar.
Representar as emoções
anteriores por meio de
sons;
Ler e cantar uma música
em conjunto ao final da
intervenção
Representar as emoções
anteriores, com o uso de
materiais gráficos sobre
papel branco A5 e traços
em forma de linhas.
Percepção objetiva cromática e
das emoções.
Estimular a criatividade artística e
visual.
Aumentar o repertório imagético e
plástico.
4ª
Cada participante
Escutar o som ao vivo e
Representar
Reflexão da composição de uma
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recebeu massagem nas
mãos com óleo, sendo
trabalhado nesse
momento o afeto.
Assistir a apresentação
solo de dança clássica
por uma bailarina;
Prática de respiração
profunda
instrumental de violão
(solo de violão);
Ouvir técnicas de
meditação com música
de fundo baseadas no
poder das cores: verde,
azul e violeta
plasticamente as
imagens da visualização
criativa para
concretização de metas
emocionais e materiais
sobre papel branco A4
nova realidade.
Esclarecimento pessoal.
Estimular a comunicação verbal e
a integração do grupo de pares.
Análise dos dados
As questões geradas pelo questionário contendo os dados sociodemográficos, clínicos e psiquiátricos,
bem como pela Questão Aberta, foram apresentadas de forma descritiva e exploratória (qualitativa). Já os dados
emitidos pelo Inventário Estruturado de Saída e pelo “Termômetro das Emoções” foram expostos de forma
descritiva (quantitativa). Entretanto, as respostas do “Termômetro das Emoções”, também foram analisadas de
forma comparativa, antes e após cada intervenção de Arteterapias criativas.
Realizou-se, igualmente, uma análise compreensiva das quatro imagens produzidas pela participante-caso
durante as intervenções de Arteterapias criativas, e analisou-se de acordo com o enfoque da Psicologia Analítica
de Jung (FINCHER, 1991), com o apoio de dicionário dos símbolos (CHEVALIER; GHEERBRANT, 2017) e dos
pressupostos do autor de desenhos projetivos (RETONDO, 2000).
Cuidados éticos
Esse estudo é um subprojeto da pesquisa da Universidade de Brasília (UnB), intitulada: “A Arteterapia
como dispositivo terapêutico nas toxicomanias”, que foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Fundação
de Ensino e Pesquisa em Ciências da Saúde (CEP/FEPECS), sob o parecer n. 1.057.324 e CAAE nº
44625915400005553 de 11 de maio de 2015. A participante-caso leu e assinou o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE), bem como autorizou o uso das imagens, sendo assegurando a ela o anonimato das imagens.
Resultados
A participante-caso era do gênero feminino, 32 anos, natural de Brasília, solteira, homossexual, sem filhos,
autodeclarada parda, Ensino Médio completo, estava sem vínculo empregatício e dependia da renda da irmã no
momento da entrevista, evangélica praticante e morava com a irmã, cunhado e sobrinha. Era dependente de
múltiplas drogas (álcool, cocaína e maconha) há quatro anos e aderiu ao projeto terapêutico do CAPS-ad há dois
meses.
Veio encaminhada ao CAPS-ad pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e pelo Poder Judiciário da
União, decorrente do uso de cannabis individual. No momento da entrevista, estava em uso de clomipramina
(antidepressivo). Referiu ideação suicida há dois meses, entretanto negou tentativa de suicídio prévia ou co-
morbidades físicas e psiquiátricas. Também negou internações ou outros tratamentos psiquiátricos prévios. Tinha
percepção do problema e sentia a necessidade de mudar seu comportamento, entretanto, no momento, sentia
muito dificuldade de mudança.
Em relação à Questão Aberta, relatou após a primeira intervenção de Arteterapias criativas, que a mesma
incentiva o processo terapêutico, na segunda, alegou que a intervenção de Arteterapias criativas estava dando
mais força!, na terceira, era um suporte e, finalmente, após a quarta intervenção de Arteterapias criativas disse
que a mesma ajudava a dar esperança.
As imagens da atividade artística produzidas pela participante-caso nas quatro intervenções de
Arteterapias criativas e os dados detalhados resultantes do “Termômetro das Emoções” e do Inventário
Estruturado de Saída são expostos a seguir no Quadro 4.
Quadro 4 – Apresentação das imagens e resultados decorrentes do “Termômetro das Emoções” e do Inventário
Estruturado de Saída da participante-caso durante as quatro intervenções de Arteterapias criativas. Brasília, DF,
Brasil, 2018. (N=1);
Categoria/Intervenções
1ª
intervenção
2ª intervenção
3ª intervenção
4ª
intervenção
Imagem Plástica
Título da Imagem
“Dois ônibus
em forma de
“Espiral de
energia-
“Tristeza”-“Alegria”-“Raiva”-
“Medo”-“Paz interior”-“Carinho”-
“Troco da paz”
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raios-fé
sobrenatural”
Furação”
“Compreensão”
“Termômetro das
Emoções”
(quantitativo)
Sem
alterações:
tristeza, raiva,
medo e
carinho.
Com
alterações
positivas:
alegria (+1
ponto), paz
interior (+2
pontos) e
compreensão
(+2 pontos)
Sem
alterações:
tristeza, raiva,
medo e
carinho.
Com alterações
positivas:
alegria (+1
ponto), paz
interior (+1
ponto), carinho
(+1 ponto) e
compreensão
(+1 ponto)
Sem alterações em todas as
categorias
Sem
alterações:
tristeza, raiva,
medo, carinho
e
compreensão.
Com
alterações
positivas:
alegria (+2
pontos) e paz
interior (+2
pontos)
Inventário Estruturado
de Saída (quantitativo)
Positivo em
todas as
categorias
(diminuição da
dor, melhora
do estado de
ânimo e da
sensação de
poder,
libertação
catártica de
temas
emocionais,
deixa fluir o
processo
criativo,
aumenta a
autopercepção
e autoestima,
e maior
relaxamento,
vitalidade,
confiança em
si mesmo e
autonomia e
aceitação da
dependência
de drogas)
Positivo nas
categorias:
diminuição da
dor, melhora do
estado de
ânimo e da
sensação de
poder,
libertação
catártica de
temas
emocionais,
deixa fluir o
processo
criativo,
aumenta a
autopercepção
e autoestima, e
maior
relaxamento,
vitalidade,
confiança em si
mesmo e
autonomia.
Não houve
melhora na
aceitação da
dependência
Positivo nas categorias: melhora
do estado de ânimo e da
sensação de poder, libertação
catártica de temas emocionais,
deixa fluir o processo criativo,
aumenta a autopercepção e
autoestima, e maior relaxamento,
vitalidade e aceitação da
dependência de drogas.
Alegou ser neutra a diminuição da
dor e a maior autonomia
Positivo nas
categorias:
diminuição da
dor, melhora
do estado de
ânimo,
libertação
catártica de
temas
emocionais,
aumenta a
autopercepção
e autoestima,
e maior
relaxamento,
vitalidade,
confiança em
si mesmo e
autonomia e
aceitação da
dependência
de drogas.
Alegou ser
neutra a
criatividade e
maior
sensação de
poder
Fonte: Banco de dados da pesquisa
Por meio das intervenções de Arteterapias criativas, a participante-caso expôs movimentos intensos nas
atividades corporais e cantou alto e ativamente as canções. Nas atividades plásticas, manteve-se concentrada e
em silêncio. Isto é, a participante-caso soltou suas energias e tensões tanto no trabalho corporal como no musical
e, ao mesmo tempo, tranquilizou-se ao desenvolver as atividades plásticas.
Em relação às imagens de arte produzidas no processo arteterapêutico criativo, observou-se a ênfase nas
cores rosa, vermelho e verde, traçados fortes, lentos, rápidos, fracos e traços com avanços, recuos e
interrompidos, igualmente, surgiram fragmentos de linhas.
O número dois-dualidade também apareceu de forma marcante nas imagens. No desenho da primeira
intervenção, apareceram: duas cores (verde e preto), dois movimentos e dois ônibus. No desenho da segunda
intervenção surgiram duas cores (rosa/vermelho e amarelo) e duas espirais, uma em sentido horário e outra em
sentido anti-horário. Das imagens produzidas na terceira intervenção emergiram cores frias e, ao mesmo tempo,
cores quentes. E, finalmente, na última intervenção, despontou um círculo com conteúdos tanto internos, como
externos.
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A participante-caso expressou verbalmente as vantagens e as desvantagens do seu uso abusivo de
substâncias psicoativas, o esforço da redução do consumo delas e os problemas desencadeados pela
dependência, contudo expôs a possibilidade de mudança e de se reverter algumas situações de vida — como
reatar o vínculo com o futebol, com o trabalho e a renda e com pessoas queridas distantes.
Sobre o “Termômetro das Emoções”, na soma total das quatro intervenções de Arteterapias criativas e de
forma comparativa, houve alterações positivas na paz interior (+5 pontos), alegria (+4 ponto) e compreensão (+3
pontos). Sem alterações a tristeza, raiva, medo e carinho.
No Inventário Estruturado de Saída, nas quatro intervenções de Arteterapias criativas houve alterações
positivas nos aspectos: melhora do estado de ânimo, libertação catártica de temas emocionais, aumento da
autopercepção e autoestima, e maior relaxamento, vitalidade, confiança em si mesma.
Discussão
Pôde-se constatar que os primeiros momentos das intervenções de Arteterapias criativas foram de
preparação do processo terapêutico propriamente dito, atividades com corpo, respiração, meditação e música que
permitiram ativar o distanciamento mental e físico dos problemas e o estímulo à criatividade, para, em seguida,
constelar a imagem artística final. Assim, o conjunto integrativo — dança ou movimentos corporais, música e artes
plásticas — auxiliou a participante-caso a entrar em contato com seus sentimentos, afetos e sensações e a se
expressar por meio das diversas modalidades de artes.
Cada intervenção de Arteterapias criativas repercutiu uma forma diferente na participante-caso em relação
aos itens avaliados. Entretanto, as atividades, de modo geral, facilitaram que a participante-caso tomasse
consciência desses sentimentos e/ou sensações, promovesse o diálogo com esses sentimentos e encontrarasse
novas maneiras de lidar com eles. Juntar as modalidades de arte diversas e variadas estimulou diversas áreas
psíquicas da participante-caso.
Em relação às imagens de arte produzidas no processo arteterapêutico criativo, observou-se a ênfase na
cor rosa/vermelho e verde, e, conforme Fincher (1991) e Chevalier e Gheerbrant (2017) a cor rosa é a cor
feminina, recebe conotação de sensualidade, de emoção, de juventude e está associada com o corpo físico, em
razão de doenças ou tensões. Para os autores, a cor verde simboliza a renovação cíclica do mundo natural, bem
como o princípio de crescimento natural e saudável e a capacidade de nutrir os seres vivos. Continuando Fincher
(1991), a mistura das duas cores (vermelho e rosa/vermelho) pode indicar conflito, uma contradição de emoções
intensas.
O número dois exprime um estágio de diferenciação, que estabelece os opostos, corresponde ao início de
toda confusão, dissensão e antagonismo. O número dois anuncia tensão, separação e conflito, não obstante, é a
conexão saudável que indica o retorno da harmonia (FINCHER, 1991).
A espiral no sentido horário simboliza algo que se move para a consciência ou para a manifestação —
representado no desenho pela cor amarela, já no sentido anti-horário – cor rosa/vermelho indica involução de
energia que retorna para o centro, ou para o inconsciente (FINCHER, 1991).
Os traçados com variedade na pressão podem indicar flexibilidade, capacidade de adaptação ou labilidade
de humor, instabilidade e impulsividade. Traços com avanços e recuos podem simbolizar emotividade, ansiedade,
falta de confiança em si mesmo e hesitação diante de novas situações de vida. E os traços interrompidos também
podem expressar angústia, insegurança ou agressividade controlada e oposição (RETONDO, 2000). A
fragmentação de linhas pode sugerir um período de medo, de confusão, de perda de significado e de
desorientação, isto é, um mundo que se desintegra (FINCHER, 1991).
A participante-caso era dependente de múltiplas drogas e, há apenas dois meses, aderiu ao projeto
terapêutico do CAPS-ad e veio, inicialmente, encaminhada ao CAPS-ad pelo Tribunal de Justiça do Distrito
Federal e pelo Poder Judiciário da União. Seria esperado que ela pudesse estar vivendo uma fase conflitiva,
repleta de tensões, instabilidade, ansiedade, angústia, insegurança, medo, confusão, desorientação, contradição
de opostos e antagonismo. Características que foram enunciadas pelos trabalhos plásticos produzidos pela
participante-caso e que refletem seu momento de vida atual, visto que os desenhos foram marcados pelas
peculiaridades: contraste de cores (rosa/vermelho e verde), traçados destoantes (fortes, lentos, rápidos, fracos),
traços díspares (com avanços, com recuos e interrompidos), a presença marcante do número dois-dualidade e a
espiral em dois sentidos.
Esses atributos corroboram o Estágio de contemplação (PROCHASKA; DICLEMENTE; NORCROSS,
1992) pelo qual a participante-caso estava passando, que se configura pela ambivalência de sentimentos, uma
vez que ela conseguia perceber tanto os aspectos positivos, quanto os negativos em relação à sua dependência
de drogas, além da consciência em relação ao seu tratamento e da possibilidade transformação da sua vida, mas,
ao mesmo tempo, percebia a sua dificuldade de mudança. Aspectos que também foram expressos na sua
verbalização (vantagens e as desvantagens do seu uso abusivo de substâncias psicoativas) e nos seus
movimentos corporais (soltou suas energias e tensões e, simultaneamente, tranquilizou-se com as atividades
plásticas). E que caracterizam, de certa forma, a possibilidade de restauração da psique e um preparo natural para
outro Estágio de mudança (preparação) de Prochaska, DiClemente e Norcross (1992) .
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A partir da Questão Aberta, a participante-caso verbalizou e enfatizou que o processo de Arteterapias
criativas significava uma forma de suporte e apoio, nesse momento de sua vida, provavelmente porque o referido
processo possibilitou com que ela pudesse expressar, por meio do corpo, das artes plásticas e da música suas
angústias, suas ansiedades, suas frustrações e seus medos e, ao expressar esses sentimentos, foi-lhe
proporcionada a possibilidade de elaborá-los para que a mudança pudesse ocorrer. A participante-caso se
encontrava no Estagio de contemplação e ainda visualizava dificuldade na mudança.
Sobre as respostas do “Termômetro das Emoções”, as intervenções de Arteterapias criativas trouxeram
paz interior, alegria e compreensão. Aspectos que corroboram as respostas da Questão Aberta, que enfatizam
que as Arteterapias criativas funcionam como uma terapia de suporte e de apoio para a participante-caso. Mesmo
que tenha havido mudança nos sentimentos negativos (tristeza, raiva e medo), pressupõe-se que, no processo
arteterapêutico criativo, estimularam-se, sobretudo, os aspectos positivos. Afinal, o tempo de terapia foi curto, de
apenas quatro semanas.
Essa condição se sustentou pelas respostas do Inventário Estruturado de Saída, em que a participante-
caso alegou que as intervenções de Arteterapias criativas melhoraram o seu estado de ânimo, houve libertação
catártica de temas emocionais, aumento da autopercepção e da autoestima e maior relaxamento, vitalidade e
confiança em si mesma, mesmo num curto espaço de tempo, já enfatizado anteriormente.
A dependência de drogas gera sentimentos de raiva, de medo, de ansiedade e de tristeza. Todavia
possibilitar a expressão desses sentimentos faz parte do processo terapêutico, para que os participantes possam
extravasar e elaborar seus traumas, aceitar suas limitações, simultaneamente, potencializar suas qualidades e
trazer à tona emoções positivas como amor, compreensão, alegria, paz de espírito. Complementa Gabriel (2013),
ao descrever que o processo arteterapêutico desenvolve a expressão e imaginação espontaneamente dos
participantes, favorece descarregar tensões, exteriorizar alegrias, temores e fantasias, proporcionando-lhes
autoconhecimento e permite expor aspectos secretos, conflitos e favorece a autonomia do sujeito, bem como a
compreensão de si mesmo e do outro.
Foi possível encorajar a participante-caso a se sentir mais autoconfiante e autônoma em seus projetos de
vida, partindo de um ambiente terapêutico seguro no CAPS-ad, para se conectar posteriormente, de forma mais
autônoma e autoconfiante, ao seu mundo externo. Fator importante, visto que os dependentes de drogas ficam
frequentemente alienados em uma sociedade repleta de preconceitos. As evidências do estudo também apontam
que desenvolver uma escuta qualificada às emoções e aos aspectos inconscientes é fundamental para a
reabilitação psicossocial. Colagrande (2015) já havia verificado, em seu estudo, que a possibilidade de dar forma e
vazão aos conteúdos inconscientes libera uma grande carga de energia que estava bloqueada e permite novas
perspectivas e mudanças concretas na vida do participante.
Por essa razão, alguns participantes de intervenções de Arteterapia relataram impactos positivos da arte
em sua recuperação, em especial, devido à incorporação de atividades inovadoras, lúdicas e criativas
(VALLADARES-TORRES, 2013a; 2017). Alguns trabalhos que descreveram os benefícios das Arteterapias
criativas, realizados por pelos autores Treder-Wolff (1990), Bradt e Goodill (2013), Dieterich-Hartwell e Koch
(2017), Gerge e Pedersen (2017), Qiu et al. (2017), Reilly et al. (2017), Thaler et al. (2017), Darewych e Bowers
(2018) e Levy et al. (2018 e que reforçam os resultados desta pesquisa serão apresentados a seguir.
Os achados da pesquisa de Bradt e Goodill (2013) reforçam os benefícios das intervenções das
Arteterapias criativas que funcionam como um adjuvante na remissão de sintomas negativos, no tratamento e na
reabilitação de pessoas, sejam essas dependentes de drogas ou com outros transtornos ou patologias. A literatura
mostra que as Arteterapias criativas, tais como dança/movimento corporal, música, artes plásticas, poesia,
dramaterapia, são cada vez mais utilizadas para auxiliar no cuidado de pessoas com câncer, por exemplo, e em
sua recuperação.
Igualmente, o estudo de Treder-Wolff (1990) apontou a importância do processo criativo da musicoterapia
com pacientes dependentes de drogas ambulatoriais em um programa de tratamento de abuso de substâncias. O
autor constatou que quebrar o ciclo viciante para identificar e explorar os afetos é um processo de educação e de
comunicação interpessoal, mas que pode ser efetivado por meio de exercícios de música que facilitam a
expressão emocional dos participantes.
As artes tornam-se cada vez mais ferramentas clínicas para promover a saúde e o bem-estar psicológico
dos indivíduos. O artigo de Darewych e Bowers (2018) apresentou os efeitos positivos das intervenções artísticas
sobre a criatividade, a imaginação, a reflexão sobre a vida, a obtenção de insights sobre as forças das emoções e
da espiritualidade por meio de casos clínicos. Isso acontece porque, desde os tempos antigos, as artes têm sido
usadas por humanos em todo o mundo como métodos de cura e veículos de comunicação.
De acordo com a literatura, as Arteterapias criativas com sua atenção à linguagem pré-verbal — música,
imagens, dança, jogo de papéis e movimento — são capazes de atingir os indivíduos por meio dos sentidos e
promover a integração sucessiva, que pode levar à transformação e à mudança terapêutica. Um artigo forneceu
exemplos clínicos e de pesquisa enfatizando o papel das Arteterapias criativas em prol do fortalecimento
emocional de indivíduos refugiados em seu processo de transformação, em um espaço seguro e tranquilizador.
Para os autores, trabalhar com Dançaterapia e a terapia do movimento pode promover a experiência do corpo
como um lar e, portanto, proporcionar um local de partida seguro, a partir do qual se regula a excitação, aumenta
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a intercepção e simular processos relacionados a trauma e recursos. Já ouvir, tocar e cantar música da cultura
doméstica podem ajudar os indivíduos a manterem sua individualidade cultural e pessoal. E, finalmente, a criação
por meio de desenhos, pinturas ou escultura em torno de temas casas e ambientes do passado pode ajudar os
refugiados a manter sua identidade por meio da arte, criar espaços seguros para o futuro e ajuda a olhar para
frente, reter recursos e recuperar o controle (DIETERICH-HARTWELL; KOCH, 2017).
Os programas de artes são cada vez mais reconhecidos pela sua capacidade de melhorar os cuidados de
saúde e promover os resultados da saúde, como melhoria da qualidade de vida, aumento da motivação e níveis
reduzidos de depressão e ansiedade (LEVY et al., 2018). Outras pesquisas, da mesma forma, sugerem que as
Arteterapias criativas podem produzir melhorias em curto prazo em autoconceito, humor e bem-estar percebido
em várias populações de pacientes (THALER et al., 2017).
Gerge e Pedersen (2017) apresentaram um estudo sobre o uso das Arteterapias criativas para ajudar os
clientes a superarem o trauma e o estresse. Levy et al. (2018) demostrou o efeito positivos da prática clínica das
Arteterapias criativas para melhorar o acesso a cuidados de saúde mental e a reabilitação de veteranos rurais.
Para Qiu et al. (2017), as Arteterapias criativas podem promover a interconexão entre o corpo e a mente e, após,
ao desenvolver um programa de Arteterapias criativas voltado para detentos com esquizofrenia, observaram
diminuição de sintomas de ansiedade, da depressão, da raiva e dos sintomas psiquiátricos negativos e melhor
conformidade com as regras, socialização com os pares, conformidade com os medicamentos e padrões de sono
regular após dezesseis sessões semanais de terapia.
Os achados de Reilly et al. (2017) sugerem que as Arteterapias criativas proporcionam um lugar seguro e
dinâmico para as mulheres com câncer de mama refletirem sobre suas mudanças pessoais profundas e relatar as
perdas após as adversidades. Um programa de Arteterapias criativas aplicado a mulheres com distúrbios
alimentares mostrou os benefícios em relação à autoexpressão, à criatividade e à melhora do humor em curto
prazo (THALER et al., 2017).
Outros artigos, conjuntamente, agora em forma de estudos de caso, enfatizaram os aspectos positivos das
Arteterapias criativas e confirmaram os achados desta pesquisa e foram descritos pelos autores Ahessy (2017);
Ko (20170; Luna (20170; Corredor Bautista (2018).
Estudo de caso desenvolvido por Luna (2017) sobre mulheres que viveram violência doméstica superada
pela Arteterapia, concluiu que o método terapêutico gerou efeito catártico e funcionou como uma possibilidade de
cura, isto é, de lidar com uma situação desvantajosa e sair dela, em determinado momento de vida.
O estudo de caso apresentado por Ko (2017) sobre uma mulher coreana sobrevivente de violência
doméstica residente nos EUA e que utilizou a dança/movimento terapia em mais de dez sessões, percebeu que a
utilização do espaço foi um elemento proeminente na criação da dança. A mulher, no processo terapêutico, ao se
mover para trás e para frente, representou simbolicamente as lembranças de abuso do passado e reforçou o
desejo de avançar, respectivamente.
Sessões de musicoterapia individual desenvolvidas com uma mulher idosa portadora de doença de
Alzheimer por dezoito meses oportunizou fortalecer e validar sua identidade, da mesma forma como expressar
verbalmente as emoções e refletir sobre a experiência da doença (AHESSY, 2017).
Outra pesquisa qualitativa de estudo de caso único, com enfoque na teoria psicanalítica, foi realizada com
um paciente de vinte anos com problemas de ansiedade e em busca do autoconhecimento. O paciente passou por
um processo psicológico por um ano, incorporou técnicas que envolveram aspectos simbólicos, artísticos e lúdicos
e levou em consideração aspectos técnicos como: enquadramento, transferência-contratransferência,
interpretação e associação livre. Os resultados mostraram que essas técnicas geravam mobilização positiva
psíquica no paciente (CORREDOR BAUTISTA, 2018).
Considerações Finais
Neste artigo, foi apresentado um estudo de caso de Arteterapias criativas de curto prazo voltado para uma
mulher dependente de múltiplas drogas e usuária de um CAPS-ad. O estudo conseguiu avaliar de forma
qualiquantitativa a interseção da arte, da música e da dança/movimento. O estudo de caso favoreceu um enfoque
mais complexo, no qual se buscaram várias evidências convergentes sobre o caso pesquisado. Assim, a utilização
de várias fontes de coleta de dados foi importante para validar a eficácia das atividades usando Arteterapias
criativas.
Os instrumentos usados na pesquisa serviram de guia para uma exploração de dados qualiquantitativos
no contexto das Arteterapias criativas. A participante-caso, ao responder o “Termômetro das Emoções”, permitiu
avaliar as suas mudanças no humor e os sentimentos antes de após as intervenções. Já o Inventário Estruturado
de Saída e a Questão Aberta possibilitaram verificar a eficácia das intervenções desenvolvidas pelas Arteterapias
criativas de forma quanti e qualitativa.
Além disso, o estudo destacou as aplicações de terapias não verbais, como as Arteterapias criativas para
ajudar pacientes que têm mais dificuldade de expressar-se por meio de terapias verbais tradicionais, bem como, a
integração de várias modalidades de artes nas terapias aplicadas a uma mulher dependência de múltiplas drogas.
As Arteterapias criativas multimodais foram ferramentas terapêuticas importantes que possibilitaram à
participante-caso percorrer mais livremente os cainhos entre o desenho, a dança ou a expressão corporal e a
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música integradas e ajudaram-na a explorar seus conteúdos emocionais. As atividades de Arteterapias criativas
significaram brincar, cantar, dançar, desenhar, colorir, assistir espetáculos de arte (dança e música), respirar ou
ouvir música para interagir, comunicar com outras pessoas no grupo e a criar vínculos. Dessa forma, as atividades
facilitaram a descontração, a distração, a movimentação da participante-caso e, igualmente, o acessar emoções,
sentimentos, memórias e sonhos que são muito difíceis de expressar em palavras.
Sugere-se a replicação dessa pesquisa no futuro com número maior de pessoas, sessões de Arteterapias
criativas em longo prazo e em vários contextos da saúde mental.
Colaboradores
Gestão e servidores do CAPS-ad III e alunos de pesquisa.
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