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O ESTADO E AS POLÍTICAS LINGUÍSTICAS ADOTADAS COMO ESTRATÉGICAS NA FORMAÇÃO DA NAÇÃO BRASILEIRA A PARTIR DO SÉCULO XVI

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Abstract

O tema das línguas indígenas e sua relação com a formação daquilo que entendemos por Brasil têm sido tratado de forma periférica por grande parte das ciências humanas, à exceção dos estudos linguísticos voltados para pesquisas relacionadas aos povos indígenas. Essa periferização, por parte das demais áreas das ciências humanas, dos aspectos linguísticos relacionados à formação da sociedade brasileira encobre, em grande medida, a possibilidade de perceber quais foram as estratégias utilizadas por parte dos colonizadores na ocupação e manutenção do território brasileiro e, entre outras coisas, fortalece o mito do monolinguismo existente no Brasil. Segundo Cavalcanti (1999, p. 387), “Esse mito é eficaz para apagar as minorias, isto é, as nações indígenas, as comunidades imigrantes e, por extensão, as maiorias tratadas como minorias, ou seja, as comunidades falantes de variedades desprestigiadas do português”. Em linhas gerais, pode-se dizer que dois pilares foram essenciais na colonização brasileira: a catequização e a escolarização dos povos indígenas. Ambos ficaram, cuidadosa e estrategicamente, a cargo da Igreja Católica por meio de suas ordens religiosas, sobretudo a ordem jesuíta (NASCIMENTO, 2012; WITEZE JR.; NAZARENO, 2014).
O ESTADO E AS POLÍTICAS LINGUÍSTICAS ADOTADAS
COMO ESTRATÉGICAS NA FORMAÇÃO DA NAÇÃO
BRASILEIRA A PARTIR DO SÉCULO XVI
Elias Nazareno
A obra das Bandeiras paulistas não pode ser bem
compreendida em toda sua extensão, se não lhe
destacamos um pouco do esforço português, como
um empreendimento que encontra em si mesmo sua
explicação, apesar de que ainda não ouse desfazer-
se de seus vínculos com a metrópole europeia, e que,
desafiando a todas as leis e a todos os perigos, irá
dar ao Brasil sua atual silhueta geográfica. No é
mero acaso o que fez com que o primeiro gesto de
autonomia ocorrido na colônia, a aclamação de
Amador Bueno, se verificou justamente em São
Paulo, terra de pouco contato com Portugal e de
muita mestiçagem com forasteiros e indígenas, onde
ainda no século XVIII as crianças iam aprender o
português nos colégios como os de hoje aprendem o
latim.
(Raízes do Brasil, Sérgio Buarque de Holanda).
O Brasil foi, e continua sendo, considerado por parte da historiografia brasileira como
um país forjado a partir do universo de três culturas, por assim dizer, predominantes, as quais,
apesar das várias tentativas, autoritárias ou não, viveram quase sempre uma relação conflitiva
e de resultados bastante desastrosos para as assim chamadas minorias étnicas os indígenas e
os negros em detrimento da cultura branca e ocidental.
1
Em períodos recentes, políticas
1
Parte deste texto foi publicada originalmente como capítulo de livro, com o tulo “El Bilingüismo en la
construcción de la nación brasileña”. In: MOLINA, Fidel (Org.). Alternativas en educación intercultural. El
afirmativas têm tentado remediar, pelo menos em parte, os resultados da segregação racial no
País. Afinal, a Constituição de 1988, a exemplo de outras constituições latino-americanas,
admite, pela primeira vez na história, que o Brasil é um país plurilíngue e pluriétnico
(ARAÚJO; NAZARENO, 2013). O reconhecimento do caráter pluriétnico e plurilíngue da
sociedade brasileira revelou, obviamente, pelo menos em termos de políticas públicas, a
necessidade de reconhecimento das línguas indígenas como parte do patrimônio cultural
brasileiro. É bem verdade, entretanto, que, atualmente, como afirma Ruth Maria Fonini
Montserrat (2006, p. 138), “o Estado brasileiro não tem realmente uma política linguística
específica para as sociedades indígenas”. Ele tem, sim, no nível do discurso, uma potica de
educação escolar indígena, qualificada como “bilíngüe, intercultural, específica e
diferenciada”.
O tema das línguas indígenas e sua relação com a formação daquilo que entendemos
por Brasil têm sido tratado de forma periférica por grande parte das ciências humanas, à
exceção dos estudos linguísticos voltados para pesquisas relacionadas aos povos indígenas.
Essa periferização, por parte das demais áreas das ciências humanas, dos aspectos linguísticos
relacionados à formação da sociedade brasileira encobre, em grande medida, a possibilidade
de perceber quais foram as estratégias utilizadas por parte dos colonizadores na ocupação e
manutenção do território brasileiro e, entre outras coisas, fortalece o mito do monolinguismo
existente no Brasil. Segundo Cavalcanti (1999, p. 387), “Esse mito é eficaz para apagar as
minorias, isto é, as nações indígenas, as comunidades imigrantes e, por extensão, as maiorias
tratadas como minorias, ou seja, as comunidades falantes de variedades desprestigiadas do
português”.
Em linhas gerais, pode-se dizer que dois pilares foram essenciais na colonização
brasileira: a catequização e a escolarização dos povos indígenas. Ambos ficaram, cuidadosa e
estrategicamente, a cargo da Igreja Católica por meio de suas ordens religiosas, sobretudo a
ordem jesuíta (NASCIMENTO, 2012; WITEZE JR.; NAZARENO, 2014).
A companhia de Jesus (Societas Iesu ad maiorem Dei gloriam) foi fundada em 15 de
agosto de 1534, por sete estudantes
2
da Universidade de Paris, sob a liderança do basco
caso de América Latina: la educación intercultural y bilingue. Lleida - Barcelona: Editorial de París, 2008. p.
173-193.
2
São eles: o francês Pierre Favre, os espanhóis Francisco Xavier, Alfonso Salmerón, Diego Laynez e
Nicolau de Bobadilla e o português Simão Rodrigues. Em 1534, Loyola e seus seis companheiros fizeram o
chamado Voto de Montmartre, através do qual professavam pobreza e castidade, e decidiram peregrinar até
Jerusalém, onde passariam suas vidas a ajudar as almas; se o plano não tivesse sucesso, iriam a Roma e
ofereceriam seus serviços ao Papa para o que ele julgasse ser “da maior glória de Deus e o bem das almas”
(HOLLEER, 2006, p. 34).
nascido em Guipúzcoa, Iñigo López de Loyola (1491-1556), conhecido como Padre Inácio de
Loyola. A ordem foi reconhecida oficialmente pelo Papa Paulo III, em 27 de setembro de
1540, por meio da bula Regimini militantis ecclesiae. Na Formula, documento elaborado em
1540, a Companhia de Jesus afirma ser seu principal propósito a propagação da fé e o
progresso das almas na vida e doutrina cristã (HOLLER, 2006, p. 36). Reafirma também seu
compromisso com a lealdade à Igreja Católica:
Por esse motivo, tudo o que o atual Pontífice Romano e seus
sucessores ordenarem como pertinente ao progresso das almas e à
propagação da fé, e quiserem enviar-nos a qualquer país que seja, nós
seremos obrigados a obedecer-lhe, imediatamente e sem desculpa ou
tergiversação; aconteça de nos enviarem entre os Turcos, ou a outros
infiéis, existentes nas regiões a que chamamos Índias, ou junto aos
hereges, cismáticos ou fiéis. (FORMULA, 15403 apud HOLLER,
2006, p. 36).
Foi a essa ordem, rigidamente disciplinada, a quem o Rei D. João III destinou a missão
de trabalhar na consolidação da colonização do Brasil e que permaneceria de forma
ininterrupta entre os séculos XVI e XVII, tendo em vista a grande empresa colonial de
catequização e escolarização dos indígenas no Brasil. Dentre as estratégias elaboradas por ela
esteve o aprendizado das línguas indígenas para, em seguida, utilizá-las como correia de
transmissão dos valores cristãos ocidentais.
Em 1549, nove anos após a sua fundação oficial, desembarcaram na Bahia, liderados
por Manuel da Nóbrega e na companhia do primeiro governador-geral do Brasil, Tomé de
Souza, os primeiros jesuítas, “Padres Leonardo Nunes, Antônio Pires e João de Azpicuelta
Navarro e os irmãos Vicente Rodrigues e Diogo Jácome, que logo seriam ordenados.”
(HOLLER, 2006, p. 37).
O principal objetivo dos jesuítas no Brasil foi sua atuação em relação aos indígenas,
sobretudo para catequizá-los, ensinar o português e mudar hábitos rudes como a antropofagia
e a poligamia (HOLLER, 2006, p. 38). A realidade encontrada pelos jesuítas era, contudo,
extremamente complexa em termos culturais e linguísticos. Ademais, a aliança com os
indígenas era fundamental para a colonização. Como sobreviver num mundo no qual não são
conhecidas as plantas comestíveis e com propriedades medicinais, a madeira mais apropriada
para a travessia e navegação dos rios, etc.? Os conhecimentos indígenas foram sendo
paulatinamente apropriados e incorporados ao modo de vida do colonizador (HOLANDA,
2014).
No trabalho de catequização e educação empreendido por parte dos jesuítas, um dos
aspectos centrais para o êxito que obtiveram foi o domínio de parte das línguas indígenas e
sua utilização como instrumento de dominação. Cavalcanti (1999, p. 389) afirma que o Brasil
contava com cinco milhões de indígenas, falantes de pelo menos 1.300 línguas. Atualmente,
restam pouco mais de 170 línguas e algumas delas correm sérios riscos de desaparecimento.
Sendo assim, os jesuítas trataram de estabelecer meios de comunicação que facilitassem a
empresa colonizadora, dentre eles a urgente tarefa de homogeneizar (simplificar) esse
pluriverso linguístico. Ainda, tinham como objetivo estratégico o conhecimento, pelo menos,
de parte das línguas indígenas e muito mais intimidade com a “língua brasílica” ou línguas
gerais originárias do tronco linguístico Tupi. Fazia parte dessas estratégias a gramatização das
línguas indígenas, pois por meio delas poderiam acessar suas cosmovisões e, desse modo,
desconstruí-las mais hábil e facilmente (NASCIMENTO, 2012, p. 62). A “facilidade” no trato
com o Tupi se revelaria como extremamente ruinosa para a infinidade de outras línguas
indígenas existentes no Brasil.
De um espaço multiverso em termos culturais e linguísticos, os jesuítas e outras
ordens religiosas trataram de simplificar as coisas, impondo a lógica do civilizar
cristianizando e cristianizar civilizando (NASCIMENTO, 2012, p. 30).
Pode-se, então, caracterizar a atuação dos jesuítas como fruto de uma ou de várias
Políticas Linguísticas de Estado (CUNHA, 2008) que, como afirma Nascimento (2012, p. 56),
“buscaram e buscam ainda hoje, principalmente através da educação escolar, perpetuar
interesse colonizantes”. A viabilidade das Políticas Linguísticas do Estado português esteve
fortemente associada ao que Mariani (2004, p. 74) chamou de Colonização Linguística:
Quando trago como proposta teórica a questão da colonização
linguística, estou supondo que um processo colonizador, enquanto
acontecimento, não existe sem as línguas. Essa colonização linguística
é desencadeada no bojo do acontecimento lingüístico que um processo
colonizador convoca, qual seja, no ainda irrealizado linguageiro que
virá a se constituir como língua nacional, há um complexo e tenso
jogo entre memórias e apagamentos das imagens produzidas sobre as
línguas em circulação.
As políticas linguísticas revelam, então, que estão subordinadas às estruturas de poder
e subordinação, relacionadas aos interesses do Estado nacional (MAHER, 2006 apud
CUNHA, 2008). No Brasil, as línguas indígenas foram sendo submetidas aos interesses do
Estado e, quando muito, passado o período de proibição expressa do uso de outras línguas que
não fosse o português, imposto pelo Diretório dos Índios elaborado pelo Marques de Pombal
em 1755, foram submetidas a um bilinguismo de transição. Neste, as línguas indígenas seriam
utilizadas como meio para a apreensão da cultura da sociedade envolvente.
Terezinha Machado Maher (2006, p. 3) explica que se o bilinguismo
do falante “é considerado, não um atributo, mas um ‘problema’, o
objetivo [das instituições de ensino] será fazer o aluno abdicar de sua
língua materna e se tornar monolíngue” na língua dominante, no nosso
caso, a língua portuguesa. Essa é a perspectiva do Modelo
Assimilacionista de Submersão, que segundo Maher, foi “o modelo
adotado por algumas missões religiosas e órgãos do governo brasileiro
junto aos povos indígenas durantes anos a fio”. (CUNHA, 2008, p.
147).
Torna-se crucial entender como o bilinguismo, adotado como estratégia de assimilação
e integração dos povos indígenas ao Estado nacional, transformou-se em instrumento de luta e
resistência para os indígenas por meio da educação bilíngue e intercultural. As evidências que
comprovam tal resistência podem ser percebidas na existência no Brasil das mais de 274
línguas indígenas contemporaneamente (DUNCK-CINTRA; BARRETOS; NAZÁRIO,
2016).
Tratar o tema do bilinguismo na sociedade brasileira é, como em outros assuntos que
dizem respeito a sua formação, algo que envolve outras dimensões que se confundem em um
enorme quebra-cabeça, resultado do carácter multiétnico da sociedade brasileira. De acordo
com Mello (1999, p. 17), “o bilinguismo é um fenómeno que tem sido estudado segundo
várias perspectivas como, por exemplo, a social, a psicolinguística, a educacional, a política e
a econômica, entre outras”. Em nosso caso, trabalhamos com a dimensão sócio-histórica, pois,
como veremos, na formação da sociedade brasileira, o Estado foi protagonista, tanto no caso
do Estado português entre 1500 e 1822, quando, segundo Darcy Ribeiro (1995), o Brasil foi
encontrado, como no Estado brasileiro, principalmente a partir do momento em que
finalmente Portugal se deu conta da existência do Brasil, em 1532. A partir de então, o Estado
passa a determinar, seja direta ou indiretamente, a conformação social, política e econômica
do que viria a ser a nação brasileira.
Os estudos sobre o bilinguismo no Brasil foram, até meados dos anos 1980, pouco
explorados por parte da comunidade acadêmica, ainda mais quando pensamos nas
comunidades indígenas. De fato, a partir dos anos 1990, quando a academia pode dar-se conta
de sua importância, houve uma maior aproximação no sentido de investigá-lo. Como vimos
anteriormente, grande parte do interesse ocorre em função das demandas que surgem a partir
da promulgação da Constituição de 1988.
Atualmente, existem no Brasil cerca de vinte cursos de pós-graduação, mestrados e
doutorados na área de linguística que pesquisam o tema. Ademais, existe um enorme vazio
sobre as línguas de origem africana. Como veremos, os afrodescendentes foram e ainda são
invisibilizados, em grande parte pelo total desprezo que a suposta sociedade branca e o Estado
lhes destinavam e em parte por suas próprias estratégias de invisibilização, com as quais
lograram manter-se à margem e, ao mesmo tempo, entre a sociedade brasileira (NAZARENO;
ARAÚJO, 2013). Desse modo, apesar da riqueza linguística do Brasil, com outros povos de
origem europeia e asiática, fizemos um recorte por meio do qual tratamos o tema do
bilinguismo a partir da experiência vivenciada pelos indígenas. Para tanto, o presente capítulo
trata, historicamente, do contato entre diferentes culturas.
Como visto, o Brasil foi, até 1988, ano da promulgação de nossa última Constituição
3
,
pelo menos do ponto de vista oficial, um país monolíngue, apesar de contar com milhões de
pessoas bilíngues e multilíngues. Portanto, do momento em que foi “encontrado” pelos
portugueses até a transição democrática, no final dos anos 1980, o Estado trata o tema do
bilinguismo a partir de uma perspectiva de assimilação e integração daqueles que não adotam
a língua oficial, o português, como primeira língua.
Segundo Romaine (1995, p. 5), citado por Mello (2003), “o bilinguismo está a um
passo da extinção linguística”.
3
O Brasil, até o momento, teve sete Constituições: a do período imperial outorgada em 1824 pelo rei D.
Pedro I, a de 1889 com a Proclamação da República, a de 1934 com o fim da República Velha, a polaca de
1937 com o Estado Novo, período autoritário de Getúlio Vargas no poder, a de 1946 com a
redemocratização, em 1969 com um dos governos ditatoriais dos militares e finalmente a de 1988, com o fim
do processo de transição democrática.
Em muitos casos, esta afirmação é bastante pertinente, pois, em geral,
as situações de bilinguismo social são marcadas por relações
assimétricas de poder entre os grupos sociais que, por razões
socioeconômicas, étnicas y socioculturais, acabam atribuindo um
prestígio maior a uma língua em detrimento da outra. Assim, a língua
que detém mais prestígio passa a assumir as funções mais importantes
na comunidade é a língua oficial, a do poder público, da escola, a
dos meios de comunicação, das situações formais enquanto a língua
de prestígio menor assume papéis considerados secundários e de
menor importância política ou social é a língua da intimidade, da
casa, da interação com amigos, das situações informais. Essa
diferenciação funcional pode resultar, ao largo dos anos, no
deslocamento da ngua dominada em favor da língua dominante.
(MELLO, 2003, p. 235).
Segundo essa mesma autora, ao longo da história, a mudança ou o deslocamento de
uma língua em uma comunidade de fala bi-multilíngue tem sido caracterizada pela sequência
temporal monolinguismo → bilinguismo → monolinguismo. De fato, há um claro processo de
negociação entre as diferentes culturas, como pretendemos aclarar, que vai muito além das
relações de dominação meramente econômicas e políticas. Quando nos deparamos com a
realidade de alguns povos indígenas, como os Karajá, Javaé, Xavantes e muitos outros da
região Araguaia-Tocantins, nota-se que essa sequência temporal apresentada por Mello (2003)
não ocorre em ambientes que têm por base o bilinguismo intercultural.
Em contextos mais complexos como a realidade das comunidades indígenas , o
português é apropriado como língua intercultural sem que com isso, no entanto a língua
indígena deixe de ser a falada pela comunidade indígena (NASCIMENTO, 2012;
NAZARENO et al., 2017).
Por mais que houvesse sido tentado, ao longo da história do Brasil, extinguir as
línguas de alguns povos indígenas, o êxito ocorreu apenas em parte. Segundo Canclini (2009,
p. 347):
Hegemônico, subalterno: palavras pesadas, que nos ajudaram a
nomear divisões entre os homens, mas não a incluir os movimentos do
afeto, a participação em atividades solidárias ou cúmplices, em que
hegemônicos e subalternos necessitam um do outro.
Ainda de acordo com Canclini (2009, p. 2000),
Não há porque olhar essas transações como fenômenos exclusivos de
zonas de intensa interculturalidade. A dramatização ideológica das
relações sociais pode resultar em exaltar tanto aos opostos que ela
acaba por não ver os ritos que unem e comunicam; é una sociologia
dos stands, não do que se diz através delas, ou quando não existem.
(2009, p. 2000).
Como assinalamos ao princípio, coube ao Estado a tarefa de organizar e, por que não
dizer, criar o sentimento de nacionalidade entre os brasileiros, ou nem tão brasileiros assim:
O âmbito mais inclusivo onde a fórmula
território/população/identidade se expressa mais claramente é aquele
do Estado-Nação. Nele se cruzam controle econômico, político militar
e tecnologias de identificação definidoras dos agentes que
legitimamente têm acesso aos direitos e deveres internamente a una
vasta coletividade. É notório o caráter construído da nação, da
nacionalidade e do nacionalismo. Também é conhecido o processo
seletivo através do qual um determinado segmento (muitas vezes
étnica ou racialmente diferenciado) transforma, pelo exercício de sua
hegemonia, uma perspectiva particular em projeto e imagens
coletivas, em algo, em suma, que é definido como nação (Willians,
1989). O esforço homogeneizador do Estado-Nação e sua eficácia
podem ser compreendidos se consideramos a tremenda quantidade de
energia social, política, econômica, cultural e institucional,
historicamente aplicada na construção de uma hegemonia cuja
internalização naturalizada por grupos e indivíduos se apresenta
claramente em situações conflitivas limites como a mobilização para a
guerra. (RIBEIRO, 1998, p. 2 apud HABERMAS, 1996).
Em termos de fronteiras, o Brasil consolida a conformação de seu enorme território no
final do século XIX, tendo como uma de suas últimas ações expansionistas a conquista do
território onde hoje está situado o estado do Acre, na Amazônia, território que, até então, fazia
parte da Bolívia. Garantida a integridade territorial, coube ao Estado organizar a nação
brasileira.
4
O mais importante era criar una ideia de nação que fosse branca, ocidental e cristã.
Assim, aos indígenas foi destinada uma política de assimilação do início da
colonização até a Proclamação da República, em 1889, e de integração à sociedade nacional a
partir daí, sobretudo com a criação do Serviço de Proteção aos Índios e Localização de
Trabalhadores Nacionais (SPILTN), em 1910. Os indígenas deveriam ser incorporados ao
mercado de trabalho e, para tanto, receberiam, por parte do Estado, o treinamento adequado
para isso (PIN, 2014).
E quanto aos afrodescendentes? O que lhes caberia depois de mais ou menos trezentos
e cinquenta anos de escravidão? A resposta era clara e inequívoca: muito pouco ou quase
nada. O processo de branqueamento da sociedade brasileira, iniciado na segunda metade do
século XIX e aprofundado no início do século XX, podia, quando muito, contar com os
indígenas, mas nem de longe com os negros. Na realidade, os negros não foram esquecidos,
pois, para esquecer-se, de pensar-se neles primeiro; os negros foram apagados ou
invisibilizados da história. A escravidão havia sido uma mácula que teria de ser arrancada da
história do Brasil.
Nem mesmo com a Constituição de 1988 houve o reconhecimento oficial da existência
de diferentes etnias afrodescendentes. Houve, sim, o reconhecimento de comunidades
quilombolas. Ao contrário dos indígenas, que contaram com a desastrosa “atenção” do Estado
desde o início da colonização, aos afro-brasileiros restou apenas o exílio social. Entretanto, o
obscuro e desafiante paradoxo está justamente no fato de que, em parte, a atenção do Estado
em relação aos indígenas representou, em grande medida, sua desgraça, enquanto a
invisibilização dos negros representou não somente a garantia de sua existência, ainda que nos
interstícios da sociedade brasileira, mas também a permanência de suas manifestações
culturais de forma bastante viva nos espaços onde ninguém ou quase ninguém os incomodava,
ou seja, na dança, na música, na religião, na comida, e, inclusive, nas línguas ou no que restou
4
No século XIX o Monarca brasileiro D. Pedro II, com o objetivo de conferir uma ideia de nação ao
Brasil, a qual até então não existia na mentalidade do povo brasileiro, decretou a criação dos Institutos
Históricos e Geográficos de Brasil, em cada uma das regiões do País, para que elas oferecessem informações
sobre os mais diversos aspectos da vida de cada uma delas (GUIMARÃES, 1988).
delas. Isso apesar da repressão que sofreram e sofrem em algumas dessas manifestações,
sobretudo a religiosa.
A resistência dos povos afrodescendentes pode ser mais bem compreendida quando
analisamos as iniciativas que resultaram nos quilombos. À chegada dos primeiros escravos à
América, no século XVI, correspondem já as primeiras tentativas de fugas (NAZARENO;
ARAÚJO, 2013).
Passemos à análise histórica do amalgamento que constituirá a nação brasileira entre
brancos, negros e indígenas em termos linguísticos.
AS LÍNGUAS GERAIS
Segundo Teixeira (2006, p. 2),
[...] curiosamente foi Portugal quem iniciou o processo de percepção e
de implantação de uma comunicação globalizante. Muito além de
haver sido pioneiro ao fornecer a Europa a visão de um mundo em que
todas as partes começaram a estar em contato, a língua portuguesa foi
a primeira língua a ser usada globalmente, envolvendo lugares e povos
dispersos por todo o planeta, desde a Índia até ao Japão, em múltiplos
pontos da África e nos, então, mundos de América.
No Brasil, o carácter hegemonizador e homogeneizador do português só se faria notar
algum tempo depois, quando os interesses econômicos da Coroa falaram mais alto, mais
precisamente em 1532, com a fundação da cidade de São Vicente, em São Paulo, em pleno
domínio dos povos Tupi, e com a chegada do enviado do Rei Martim Afonso de Souza.
Portugal, por medo de intervenções de outros países, sobretudo da França, começa
oficialmente, nesse período, o processo colonizador. Desse processo surgiu o que passou a ser
conhecido e chamado de Línguas Gerais. Rodrigues (2003, p. 1) assim conceitua língua geral:
Como um termo específico para determinada categoria de línguas, que
surgiram na América do Sul nos séculos XVI e XVII em condições
especiais de contato entre europeus e povos indígenas. A expressão
“língua geral” tomou um sentido bem definido no Brasil nos século
XVII e XVIII, quando, tanto em São Paulo como no Maranhão e Pará,
passou a designar as línguas de origem indígena faladas, nas
respectivas províncias, por toda a população originada no cruzamento
de europeus e índios tupi-guarani (especificamente os Tupis em São
Paulo e os tupinambás no Maranhão e Pará), a qual foi-se agregando
um contingente de origem africano e contingentes de vários outros
povos indígenas, incorporados ao regime colonial, em geral na
qualidade de escravos ou de índios de missão.
É importante destacar que existem divergências em relação à importância e ao alcance
da Língua Geral. Nascimento (2012), citando Noll, argumenta que para este autor
[...] a opinião disseminada em parte da literatura especializada, de que
a língua geral ocupava um lugar central como meio de comunicação
entre os habitantes do Brasil até a promulgação do Diretório dos
Índios. Para o autor esta opinião deve ser avaliada regional e
especificamente para cada caso e apresenta alguns indícios que
apontam para a força de disseminação do português mesmo
anteriormente ao século XVIII.
Na colonização portuguesa e espanhola da América do Sul houve, de acordo com
Rodrigues (2003, p. 1), “pelo menos três situações em que a miscigenação, em grande escala,
de homens europeus com mulheres indígenas teve como consequência a rápida formação de
populações mestiças cuja língua materna foi a língua indígena das mães e não a língua
européia dos pais”. Isso ocorre onde houve uma ocupação maciça de homens que vieram
sozinhos, sem mulheres europeias, e também pela proximidade com os indígenas, que se
mostravam favoráveis ao estabelecimento de matrimônios abertos com os homens europeus.
Tais condições ocorreram entre os tupis (chamados também de Tupinakins o Tupinikins) de
São Vicente e do altiplano de Piratininga, no leste do atual estado brasileiro de São Paulo, no
século XVI; entre os espanhóis e Guaranis do Paraguai, nos séculos XVI e XVII; e entre os
portugueses e Tupinambás do norte dos atuais estados brasileiros do Maranhão e Pará, no
século XVII. Os três povos, ainda que mantivessem uma grande distância geográfica entre si,
possuíam basicamente a mesma matriz cultural Tupi-Guarani. Tudo isso favoreceu, ademais
de uma aproximação com os portugueses e espanhóis, certa homogeneidade linguística, que
envolvia não somente os indígenas, mas, também, os brancos, que não tinham outra opção
além da de falar a língua geral no intuito de entabular entendimentos (RODRIGUES, 2003).
A intensa relação dos brancos portugueses com os indígenas estes já em pleno
processo de desaparecimento, naquele momento (séculos XVI e XVII), por conta da
escravidão e das epidemias trazidas pelos brancos, a que eram submetidos e também pela
assimilação e integração ao modo de vida dos brancos fez com que por mais de dois séculos
se falasse a língua geral em grande parte do território conhecido por Brasil. Disso temos como
testemunho genial a contribuição de Sérgio Buarque de Holanda:
Um século depois de Antônio Vieira, de Arthur de e Menezes, de
Antônio Pais de Sande, condição exatamente idêntica a que, segundo
suas declarações, havia preponderado em São Paulo do último decênio
seiscentista, será observada por Don Félix de Arara em Curuguati, no
Paraguai. Ali também as mulheres falavam o guarani e os homens
não se entendiam com elas em outra língua, posto que entre eles
usavam as vezes o castelhano. Essa forma de bilinguismo
desapareceria, entretanto, em outras partes do Paraguai, onde índios,
homens e mulheres, indiscriminadamente, se entendiam em
guarani, e somente os mais cultos sabiam o espanhol. Deve notar-se,
de passagem, que ao mesmo Azara não escaparam as coincidências
entre o que fora dado observar no Paraguai e o que afirmava dos
antigos paulistas. “O mesmo escreve- aconteceu exatamente na
imensa província de São Paulo, onde os portugueses, havendo
olvidado seu idioma, não falam se não o Guarani”. (HOLANDA,
1989, p. 90).
Dos matrimônios entre as mulheres indígenas e os portugueses nasciam os mamelucos,
que viveram uma jornada de difícil adaptação, pois eram renegados entre os indígenas por
serem filhos de brancos com suas mulheres índias e igualmente eram renegados pelos
brancos, por sua condição de mestiços. Os mamelucos foram responsáveis, em grande
medida, pela expansão da língua geral por meio das entradas e bandeiras:
O primeiro brasileiro consciente de si foi, talvez, o mameluco, esse
brasilíndio mestiço na carne e no espírito que, ao não poder
identificar-se com os que foram seus ancestrais americanos que ele
desprezava , tão pouco com os europeus que o desprezavam , e
sendo objeto de mofa dos reinais e dos luso nativos, via a si mesmo
condenado a pretensão de ser o que não era e nem existia, o
brasileiro. (RIBEIRO, 1995, p. 128).
Conhecidos como bandeirantes, ao entrar no vasto território até então desconhecido,
foram eles os que garantiram, na prática, com a imprescindível colaboração dos povos
indígenas, a grandiosidade do atual território brasileiro.
5
Vale ressaltar que tudo isso foi
possível também graças à União Ibérica (1580-1640), que legalizou a quadruplicação do
território brasileiro, até então limitado, pelo Tratado de Tordesilhas (1494), a um quarto do
que viria a ser, estendido pelos bandeirantes paulistas e ibéricos, reconhecido no Tratado de
Madrid, de 1750, entre Portugal e Espanha, negociado pelo brasileiro Alexandre de Gusmão
(CHACON, 2005, p. 15).
Tudo isso em virtude da dominação e escravidão de centenas de milhares de indígenas
ou simplesmente com sua aniquilação. Os indígenas dificilmente adaptavam-se ao trabalho
imposto pelo colonizador e, por isso, os conflitos eram inevitáveis. Logo, houve, na realidade,
a destruição da maioria dos povos indígenas.
Rodrigues (2003) indica a existência de três tipos de línguas gerais: a língua geral
paulista, que, a partir do núcleo de colonização que foi São Paulo, se expande pelo sul-sudeste
e região central do País, em estados brasileiros como Paraná, Minas Gerais, Goiás e Mato
Grosso. A segunda língua foi o guarani criollo e o domínio da língua guarani esteve
localizado, sobretudo, no Paraguai, mas se estendeu até regiões brasileiras como o oeste do
atual estado do Paraná.
Entre os rios Paraná e Paraguai, contudo, fora das reduções jesuíticas
e já antes delas, foi desenvolvida uma situação de contato entre
colonos espanhóis, predominantemente homens, e índios guaranis,
bastante semelhante ao que se havia produzido em São Paulo, com o
surgimento de uma crescente população mestiça cuja língua materna
era guarani e não o espanhol. Nessa situação o guarani indígena se
5
Não entraremos, neste texto, na análise dos tratados internacionais que contribuíram para conformar
juridicamente o atual território brasileiro, como o Tratado de Madrid, de 1750, e o argumento do uti
possidetis de facto. Para um estudo mais detalhado a respeito, ver Cardoso (2015).
transformou pouco a pouco na língua comum (geral) aos mestiços
(mancebos da terra), para os espanhóis ali estabelecidos e para os
índios, guaranis ou não, incorporados às atividades coloniais. Esta
língua geral é hoje o guarani criollo (GNC), chamado na própria
língua de avañen (língua da gente, língua do índio) e, com referência
as variedades mais marcadas por empréstimos do espanhol, jopará
(mixtura, mezcla); geralmente, com todo, guarani paraguaio e, na
Argentina, com pequenas divergências dialetais, guarani correntino
(do topônimo Corrientes) e guarani goyano (do topônimo Goya).
(RODRIGUES, 2003, p. 4).
Por último, a língua geral amazônica, surgida nas regiões norte e nordeste do Brasil,
nos estados do Pará e Maranhão, região dominada pelos índios Tupinambás e que foi
colonizada pelos franceses até o século XVII, quando teve início a colonização portuguesa,
que logo se expandirá por quase toda a região amazônica. Depois de estender-se ao longo do
vale do rio Amazonas e subir pelo rio Negro, alcançou a Amazônia venezuelana e
colombiana. De acordo com Rodrigues (2003, p. 5), “distintamente da língua geral paulista,
da qual só ha poucos documentos e que não se fala mais, a língua geral amazônica foi
registrada em documentos, alguns bastante substanciais, nos séculos XVIII, XIX e XX, e
segue sendo falada ainda hoje”. As três línguas gerais possuem algumas características que
explicam em parte sua existência. Vale destacar, por exemplo, o fato de que, desde o
princípio, elas apresentaram uma situação de bilinguismo parcial com a respectiva língua
europeia, com uma maioria de monolíngues na língua geral e uma minoria de bilíngues
(RODRIGUES, 2003, p. 5).
Passemos, então, à análise do processo de assimilação e integração dos povos
indígenas. Para tanto, foi utilizada como ferramenta fundamental a educação. O Estado
português, sem condições para levar a cabo tal tarefa, coloca a educação escolar indígena sob
a responsabilidade da igreja católica, sobretudo, como vimos, os jesuítas. A escola para índios
no Brasil começa a estruturar-se a partir de 1549, com a chegada da primeira missão jesuítica
enviada pelo Rei D. João III.
Curiosamente, foi nesse mesmo ano de 1549 que desembarcaram, no atual estado da
Bahia, os primeiros escravos africanos. Começava, para os negros, o largo e doloroso martírio
que perduraria, pelo menos oficialmente, até 1888, com a abolição da escravidão. O Brasil foi
o último país no mundo a acabar formalmente com o regime escravagista. “Para o Brasil
vieram negros de dois grandes grupos étnicos: os bantos, do sudoeste e sudeste africano, e os
sudaneses, do nordeste. Entre os sudaneses, a maioria eram de yorubas ou nagôs, os jejes e os
fanti-achantis. Entre os bantos, os angolas, bengalas y caçanjes” (FUNDAÇÃO CULTURAL
PALMARES, 2000, p. 9). Durante mais de três séculos, a sociedade brasileira teria como
principal sustentáculo material a mão de obra escrava negra. A atenção dada aos indígenas
correspondia, por outro lado, ao completo menosprezo em relação aos negros, pois, de acordo
com a igreja católica, eles sequer possuíam alma, suposição que os fazia, desde logo,
impossíveis de serem convertidos à fé cristã.
Na primeira etapa do processo de catequização, os jesuítas se deram conta da difícil
tarefa que teriam, pois os indígenas respondiam de forma muito distinta ao que eles
esperavam em relação ao projeto de educação proposto, inclusive, muitas vezes, de forma
violenta, com várias sublevações.
6
Dóceis, os Tupinambás3 convertiam-se à dos jesuítas. Dóceis,
decerto, mas inconstantes, queixavam-se os padres: “lo que yo tengo
por maior obstáculo para la gente de todas estas naciones es su propia
condición, que ninguna cosa sienten mucho, ni pérdida espiritual ni
temporal suya, de ninguna cosa tienen sentimiento mui sensible, ni
que les dure; y así sus contricciones, sus deseos de seren buenos, todo
es tan remiso, que no se puede hombre certificar de él” (Pe. Luís da
Grã a Pe. Inácio de Loyola. Piratininga, 8 de junho de 1556, CPJB
11:294). (CUNHA; VIVEIROS DE CASTRO, 1985, p. 57).
Além disso, os jesuítas e grande parte das demais ordens religiosas envolvidas na
colonização consideravam que o contato com os colonos portugueses ou espanhóis não
acrescentava bons exemplos morais e religiosos para os indígenas:
[...] así de soberbia como de lujuria, como de codicia, que es
servidumbre de ídolos35, como de tráfagos y todo género de
profanidades que les damos, sin verse casi en nosotros obras que sean
de verdaderos cristianos en tanta manera que temo que piensan, y aún
6
Por exemplo: Confederação dos Tamoios (1555-1667), a Guerra dos Aimorés (1555-1673), a Guerra
dos Potiguaras (1586-1599), o Levante Tupinambá (1617-1621), a Confederação Cariri (1686-1692), a
Guerra dos Manaus (1723-1744) e a Guerra Guaranítica (1753-1756) (apud HENRIQUES et al., 2007).
no sé si algunas lo han dicho, que jugar y lujuria y alcahuetar es oficio
propio de cristianos. (Información, p. 184 apud WITESE JR., 2016, p.
112).
Como alternativa, eles criaram o sistema de aldeias,
[...] procedimento já utilizado em outras colônias portuguesas e que
consistia na criação de grandes aldeias próximas das populações
coloniais para agrupar aos índios trazidos de suas aldeias no interior
do Brasil. Nela os índios passavam a viver sob as normas civis e
religiosas impostas pelos padres missionários, sem nenhum contato
com o mundo externo a não ser quando este atendia a algum interesse
dos jesuítas. (HENRIQUES et al., 2007, p. 11).
Os agrupamentos em aldeias negavam os valores culturais dos povos indígenas,
sobretudo sua diversidade linguística e cosmogônica, além de criarem uma convivência
forçada entre povos distintos e, muitas vezes, inimigos, bem como provocar matrimônios
interétnicos.
A língua geral foi, em muitos casos, o resultado da diversidade artificialmente
provocada pela ação colonizadora. Contudo, a partir do ano de 1757, portanto, duzentos anos
depois, o trabalho dos jesuítas perde o apoio da coroa portuguesa, que tinha interesse em
aumentar a produção agrícola em consonância com os colonos, que viam com muitas
restrições o trabalho desenvolvido pelos jesuítas. Estes foram expulsos do Brasil e, em
substituição ao sistema de aldeias, as quais passaram à condição de Vilas, foi criado o
Diretório dos Índios (1757-1798). Garcia (2007 apud CARDOSO, 2015, p. 72) afirma que o
objetivo do Diretório era:
[...] a completa integração dos índios à sociedade portuguesa,
buscando não apenas o fim das discriminações sobre estes, mas a
extinção das diferenças entre índios e brancos. Dessa forma, projetava
um futuro no qual não seria possível distinguir uns dos outros, seja em
termos físicos, por meio da miscigenação biológica, seja em termos
comportamentais, por intermédio de uma série de dispositivos de
homogeneização cultural (p. 24).
O Diretório não representou grandes transformações, pois manteve praticamente
inalterada a antiga estrutura colonial. Sem embargo, há de se destacar a proibição do uso de
línguas indígenas nas salas de aula, inclusive da língua geral, havendo a obrigatoriedade do
uso da língua portuguesa (HENRIQUES et al., 2007). O Diretório intensificou a utilização,
ou, pelo menos, a tentativa de utilização dos indígenas como mão de obra escrava. Isso
porque os índios eram mais baratos que os escravos negros comercializados no interior do
Brasil desde 1580.
A proposta do Diretório durou até 1798, quando foi revogada. Assim justificou a
Rainha D. Maria I (1734-1816) (apud CARDOSO, 2015, p. 75) o fim do Diretório.
Hei por bem abolir e extinguir de todo o Diretório dos Índios
estabelecido provisionalmente para o governo econômico das minhas
Povoações, para que os mesmos índios fiquem, sem diferença dos
outros meus vassalos, sendo dirigidos e governados pelas mesmas leis,
que regem todos aqueles dos diferentes Estados, que impõem (sic) a
Monarquia, restituindo os índios aos direitos, que lhes pertencem
igualmente como aos meus outros vassalos livres. E confiando eu que
vós procedereis para o importante fim da civilização dos índios com
um acerto tanto do Meu agrado, quanto o foi o da informação que
cobre este objeto me destes [...].
Os portugueses não colocaram nada em seu lugar ate 1845, quando, por decreto, foi
criado o Regimento das Missões, outra tentativa de fazer com que os missionários
assumissem a tarefa da educação (catequização e civilização) dos indígenas. O trabalho,
entretanto, de catequização e educação não tinha, naquele momento, o mesmo nível de
autonomia de que disfrutaram os jesuítas, pois estava muito mais ligado aos interesses do
estado. Nem mesmo a retomada do modelo do sistema de aldeias obteve êxito, uma vez que
agora as aldeias não eram exclusivamente habitadas por indígenas, mas também por militares,
comerciantes, escravos e ex-escravos negros.
Foi a primeira vez que o Estado monárquico assume, ainda que de forma indireta, a
tarefa de determinar o que deveria ser o sentido da educação para os indígenas brasileiros. Tal
política tinha como objetivo utilizar a escola como instrumento de desenvolvimento humano
capaz de proporcionar, pelos menos em termos ideais, a criação do povo brasileiro
(HENRIQUES et al., 2007).
Durante todo o período imperial (1808-1889) o Estado intentara, sem os suportes
adequados, implantar uma potica de educação que formalmente prevesse a inclusão dos
setores populares (índios, negros, libertos o escravos e mulheres) na formação educacional
primária. O Estado monárquico, contudo, agonizava e estava com seus dias contados.
Somente com o início do regime republicano, a partir de 1889, o Estado passa a
considerar a questão de implantar uma política indigenista que fosse capaz de mudar a
imagem do Brasil frente à sociedade nacional e internacional. Nesse sentido, foi implantado,
em 1910, como vimos anteriormente, o Serviço de Proteção ao Índio e Localização de
Trabalhadores Nacionais (SPILTN), que será extinto somente em 1967, quando, em pleno
governo militar, será substituído pela Fundação Nacional do Índio (Funai).
Ao longo do século XX houve o processo de integração e assimilação dos indígenas,
que agora passam a ser vistos como parte constitutiva da nacionalidade brasileira e como
seres capazes de produzir em nome do desenvolvimento da nação. A educação, para tanto,
cumpre um papel importantíssimo, uma vez que são estruturadas escolas que ensinam aos
indígenas, além de escrever e a leitura, noções de higiene, saneamento, práticas agrícolas,
mecânica, etc. A instrumentalização da nova proposta será efetuada por meio da valorização
da diversidade linguística dos povos indígenas, utilizando-se das línguas maternas no
processo de alfabetização. Desse modo, a educação bilíngue é oficialmente reconhecida como
uma necessidade e é implantada nas escolas indígenas, buscando a formação de indígenas,
que cumpririam a tarefa de alfabetizar aos seus respectivos grupos.
No programa de educação bilíngue então vigente, os índios eram
alfabetizados em sua língua materna ao mesmo tempo em que eram
introduzidos como aprendizes da língua portuguesa. Quando
alcançavam o domínio deste idioma, o ensino passava a ser realizado
exclusivamente em português. Essa metodologia, na qual a língua
materna era utilizada como ponte para o domínio da língua nacional, é
chamada de bilinguismo de transição. A partir dele, a língua indígena
servia para facilitar, e ainda acelerar, o processo de integração do
índio a cultura da sociedade não-índia, pois quando aprendia o
português e deixava de falar sua língua, simultaneamente, abandonava
seu modo de vida e sua identidade diferenciada. (HENRIQUES et al.,
2007, p. 14).
Em função das dificuldades técnicas encontradas para a implantação do bilinguismo,
pois o número de línguas autóctones era muito grande e o conhecimento acumulado sobre elas
era quase nenhum, a Funai, em 1970, contratou o Summer Institute of Linguistics (SIL).
7
Com
isso, tentava estabelecer um nível mínimo de estudos sobre as línguas indígenas, por meio de
pesquisas. O SIL passa a ter a responsabilidade de produzir o material para a educação dos
indígenas em sua língua materna, o treinamento de pessoas da Funai e dos próprios indígenas
e, como função última, buscava a conversão dos indígenas à religião protestante. Entre outras
coisas, no processo de alfabetização, ainda utilizando-se das línguas maternas indígenas,
intentavam dar outro significado às expressões idiomáticas dos indígenas, tentando atribuir
aos conteúdos das falas indígenas relações de proximidade entre a cultura indígena e os
valores protestantes dos missionários estadunidenses.
Com o início da abertura potica no Brasil, no final dos anos 1970, a ação do SIL
passa a ser bastante questionada, sobretudo por parte das instituições vinculadas às áreas de
Linguística e Antropologia. Somente quando a responsabilidade da educação indígena passa a
ser uma obrigação do Ministério da Educação, em 1991, houve um rompimento com aquela
instituição (SIL).
Como vimo no início do texto, o processo de redemocratização no Brasil colocou em
xeque toda a estrutura integracionista e assimilacionista das culturas indígenas. No final dos
anos 1970, houve um forte movimento, que buscou garantir e valorizar a diversidade cultural
brasileira. As principais reivindicações deste movimento foram, não em sua totalidade, mas
em grande parte, asseguradas com a proclamação da Constituição em 1988. As políticas
públicas relativas à educação indígena, a partir de 1988, passam a pautar-se pelo respeito aos
conhecimentos, às tradições e aos costumes dos povos indígenas. Para isso, são criados
conselhos, cuja participação de representantes indígenas passa a ser obrigatória.
Pouco a pouco o movimento embrionário do início dos anos 1970
ganha força e multiplicam-se as organizações não governamentais de
apoio aos índios. Paralelamente, e em consonância com esse
7
Organização não governamental protestante estadunidense que iniciou suas atividades em 1934, no
estado do Arkansas. Seu fundador foi William Cameron Townsend (1896-1982).
movimento, os próprios indígenas buscaram articular-se politicamente
para defender seus direitos e projetos de futuro e, a partir de mediados
de 1970, são criadas organizações e associações indígenas, em
diferentes regiões do país, que passam a realizar assembléias,
encontros ou reuniões, culminando na criação, em 1980, da União das
Nações Indígenas (UNID, hoje UNI) e suas regionais. (HENRIQUES
et al., 2007, p. 14).
Nesse sentido, a escola, que sempre representou uma ameaça à permanência das
culturas indígenas, passou a ser reivindicada por esses mesmos povos, que percebem na
educação escolar uma possibilidade real de assegurar seus valores e de reinventar suas
comunidades. A partir de 2003, foi institucionalizada a Secretaria de Educação Continuada,
Alfabetização e Diversidade (Secad),
8
vinculada à Coordenação Geral de Educação Escolar
Indígena (CGEEI). A educação nas escolas indígenas passa a contar com um tratamento
focalizado na asserção dos direitos humanos, entre eles os de ter seus próprios projetos
societários e identitários (HENRIQUES et al., 2007).
Segundo a Secad, as experiências alternativas que inovam tanto e a prática nas
discussões acerca da educação em um contexto de diversidade indígena estabeleceram
algumas categorias que representam marcos definidores da escola indígena como uma
categoria específica de estabelecimento de ensino. São elas: a interculturalidade, o
bilinguismo ou multilinguismo, a especificidade, a diferenciação e a participação comunitária
(HENRIQUES et al., 2007).
O novo perfil das escolas e da educação escolar indígena revela um processo de
ressignificação de seus espaços comunicativos nos quais suas práticas, que durante vários
séculos foram menosprezadas, passam a ser parte constitutiva da aprendizagem de cada um,
sempre tendo em conta que o nível de participação pode garantir mais conquistas
significativas e a ocupação legítima de seu espaço e da preservação de sua cultura e de seus
conhecimentos. Isso está configurado na garantia de uma aprendizagem verdadeiramente
intercultural e interepistêmica, na qual as línguas maternas dos educandos são espaços nos
quais o bilinguismo ou o multilinguismo representam possibilidades de afirmação de seus
valores comunitários.
Como bem observou Darcy Ribeiro (1995, p. 120):
8
Em 2011, a Secad teve suas atribuições ampliadas e passou a ser denominada de Secretaria de Educação
Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão Secadi.
‘A mais terrível de nossas heranças é esta de levar, sempre conosco, a
cicatriz do torturador gravada na alma e pronta para explorar na
brutalidade racista e classista. Ela é a que põe em brasa, ainda hoje,
em tanta autoridade brasileira predisposta a torturar, seviciar e
massacrar aos pobres que caem em suas mãos.
A longa e dura trajetória histórica imposta pela colonização deixou marcas profundas
nos povos indígenas e nas populações afrodescendentes no Brasil. Do ambiente no qual
conviviam milhares de línguas e diferentes povos indígenas restaram pouco mais de 274
línguas e 305 povos indígenas, com uma população autodeclarada indígena de 817,9
indivíduos, que correspondem a 0,4% da total da população brasileira (DUNCK-CINTRA;
BARRETOS; NAZÁRIO, 2016, p. 133). Poderíamos nos apegar ao terrível rastro deixado
pela brutalidade colonizadora, pois assim faríamos, pelo menos em parte, um pouco de
justiça. Entretanto, o mais espetacular é ressaltar como, após tantas imposições e retaliações,
esses 315 povos persistem com suas línguas, com sua cultura e com seus conhecimentos.
Graças às lutas dos povos indígenas ao longo das últimas cinco décadas, a partir de
2003 foram criados vários cursos de Educação Intercultural Indígenas em muitas
universidades públicas, federais e estaduais no Brasil. Desse modo, os artigos 78 e 79
presentes na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, número 9.394 de 1996 estavam
sendo, pelo menos em parte atendidos. Como consta em tais artigos:
Art. 78. O Sistema de Ensino da União, com a colaboração das agências
federais de fomento à cultura e de assistência aos índios, desenvolverá
programas integrados de ensino e pesquisa, para oferta de educação escolar
bilíngue e intercultural aos povos indígenas, com os seguintes objetivos:
I - proporcionar aos índios, suas comunidades e povos, a recuperação de suas
memórias históricas; a reafirmação de suas identidades étnicas, a valorização
de suas línguas e ciências;
II - garantir aos índios, suas comunidades e povos, o acesso às informações,
conhecimentos técnicos e científicos da sociedade nacional e demais
sociedades indígenas e não-indígenas.
Art. 79. A União apoiará técnica e financeiramente os sistemas de ensino no
provimento da educação intercultural à comunidades indígenas,
desenvolvendo programas integrados de ensino e pesquisa.
§1º Os programas serão planejados com audiência das comunidades
indígenas.
§2º Os programas a que se refere este artigo, incluídos nos Planos Nacionais
de Educação, terão os seguintes objetivos:
I - fortalecer as práticas sócio-culturais e a língua materna de cada
comunidade indígena;
II - manter programas de formação de pessoal especializado, destinado à
educação escolar nas comunidades indígenas;
III - desenvolver currículos e programas específicos, neles incluindo os
conteúdos culturais correspondentes às respectivas comunidades;
56
IV - elaborar e publicar sistematicamente material didático específico e
diferenciado. (BRASIL, 1996 apud SILVA, 2018, p. 55).
Assim, os cursos de Educação Intercultural Indígena, são cursos que tem como
objetivo fundamental a formação de professores indígenas que atuarão nas escolas indígenas
de suas respectivas comunidades. O curso de Educação Intercultural da Universidade Federal
de Goiás UFG, criado em 2007, conta atualmente com aproximadamente 300 discentes de
25 povos indígenas da etnoregião Araguaia-Tocantins. Nesse, como em outros cursos de
Educação Intercultural, existentes no Brasil as línguas indígenas e seus conhecimentos são
considerados como parte essencial para a formação dos discentes e posteriormente para o
fortalecimento de suas culturas nas comunidades e escolas indígenas de cada um desses
povos, por meio da formação de matrizes escolares interepistêmicas.
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... De acordo com Palacin (1981), o aprendizado da língua Tupi era uma das principais obrigações dos jesuítas, e aqueles que não se dedicavam com a atenção necessária eram muito criticados e, em alguns casos, punidos com o retorno à Portugal. Como resultante dessa estratégia, foi criada a chamada língua geral ou Nheengatu, utilizada como principal meio de comunicação no Brasil até o final do século XVIII (Nazareno, 2019). Isso explica em grande parte a distinção entre Tupi e Tapuia. ...
Chapter
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Nesse capítulo iremos abordar como foi o contato e seus desdobramentos entre o colonizador e o povo Javaé. A escolha desse povo em particular se deve, em grande parte às estratégias de isolamento adotadas por ele em relação à incursão dos colonizadores, já a partir do final do século XVI. Dentre as estratégias está, por exemplo, a sua interiorização na Ilha do Bananal, na medida que o branco, e junto a eles suas doenças, se aproximavam de seu território. Este tipo de ação tem sido interpretado por estudos recentes, vinculados à nova história indígena, como protagonismo indígena e também como de resistência e de desobediência epistêmica pelos estudos decoloniais.
... Com o passar do tempo, mudaram-se as leis, todavia, as práticas assimilacionistas que permaneceram foram sendo substituídas pelas práticas integracionistas, que visavam à integração dos indígenas nos projetos de construção nacional (NAZARENO, 2019). Essas ações reforçam o discurso presente nas sociedades capitalistas sobre os distintos grupos indígenas. ...
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Este artigo tem como objetivo problematizar e comparar interpretações e relatos voltados à interculturalidade crítica, decolonialidade e ecologia de saberes, os quais articulam elementos culturais, epistêmicos, materiais e simbólicos ligados ao papel das mudanças culturais e econômicas dos povos indígenas brasileiros, de diversas etnias, diante dos vários segmentos da sociedade nacional. Lançamos mão de olhares antropológicos, de abordagem hermenêutica, utilizando como opção política e metodológica a pedagogia decolonial, as reflexões próprias, estabelecendo debates significativos para identificar ideias e posturas (também políticas) sobre as imposições do Ocidente ante os povos indígenas. A proposta aqui estabelecida pretende reunir questões vinculadas aos sistemas políticos e comerciais das várias comunidades indígenas e os embates epistemológicos que constituem esses cenários, bem como analisar, em torno da interculturalidade, as mudanças históricas ocasionadas pelos vários segmentos da sociedade nacional.
... Com o passar do tempo, mudaram-se as leis, todavia, as práticas assimilacionistas que permaneceram foram sendo substituídas pelas práticas integracionistas, que visavam à integração dos indígenas nos projetos de construção nacional (NAZARENO, 2019). Essas ações reforçam o discurso presente nas sociedades capitalistas sobre os distintos grupos indígenas. ...
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Este artigo tem como objetivo problematizar e comparar interpretações e relatos voltados à interculturalidade crítica, decolonialidade e ecologia de saberes, os quais articulam elementos culturais, epistêmicos, materiais e simbólicos ligados ao papel das mudanças culturais e econômicas dos povos indígenas brasileiros, de diversas etnias, diante dos vários segmentos da sociedade nacional. Lançamos mão de olhares antropológicos, de abordagem hermenêutica, utilizando como opção política e metodológica a pedagogia decolonial, as reflexões próprias, estabelecendo debates significativos para identificar ideias e posturas (também políticas) sobre as imposições do Ocidente ante os povos indígenas. A proposta aqui estabelecida pretende reunir questões vinculadas aos sistemas políticos e comerciais das várias comunidades indígenas e os embates epistemológicos que constituem esses cenários, bem como analisar, em torno da interculturalidade, as mudanças históricas ocasionadas pelos vários segmentos da sociedade nacional.
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Data from the latest Brazilian demographic census uncover that the black and brown population in Brazil represent 55.6% of the total population. Nevertheless, this does not guarantee access to a fairer income distribution and access to health and quality education. The objective of this article is to evaluate the individual differences and psychological suffering resulting from the Covid-19 pandemic among indigenous and Afro-descendants compared to other ethnic groups. Participated in this study 1,914 individuals (22.3% men and 77.7% women), with age between 14 and 86 (average = 34.88 SD = 13.61), from 24 Brazilian states and the Federal District that answered the instruments online through googleforms. The results have shown significant differences in age, income and occupation according to ethnic group, with self-declared black and indigenous groups in more vulnerable conditions than other ethnic groups. In comparison with the other ethnic groups, Asians had significantly lower scores in extroversion while Blacks had significantly higher scores in openness. The data demonstrate that racism has continued in Brazil despite inclusion policies as well as the intensification and invisibilization of certain ethnic groups with the pandemic
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Resumo: O povo indígena Tapuia, vive na Terra Indígena Carretão I e II, localizada entre os municípios de Rubiataba e Nova América no Estado de Goiás, Brasil. Sua formação sócio-histórica, assim como de vários povos indígenas no Brasil, foi influenciada historicamente por diversos aspectos, entre eles, políticas de aldeamentos, assimilação, integração; contatos interétnicos; catequização, entre outras formas opressoras e violentas de domínio utilizadas pelos colonizadores europeus neste território desde o século XVI. O objetivo desse texto é mostrar a importância da Educação Escolar Indígena para o povo Tapuia que tem cunhado uma pauta de luta pela afirmação de sua identidade étnica. A pesquisa de caráter qualitativo foi desenvolvida por meio de levantamento bibliográfico, trabalhos de campo na aldeia, entrevistas, roda de conversa e observação das atividades desenvolvidas na escola indígena. O principal resultado encontrado revelou que a Educação Escolar Indígena tem contribuído de forma significativa para a permanência dos indígenas no território, bem como para o seu fortalecimento sociocultural, sobretudo, por meio da revitalização/constituição da língua indígena materna e da proteção da diversidade e sustentabilidade desse povo. Palavras-Chave: Povo Tapuia. Educação Escolar Indígena. Território. Vida Indígena. ________________________________________________________________________________ Introdução De acordo com Coutinho (2016), o bioma Cerrado cujo nome vem da língua espanhola e quer dizer fechado é o segundo maior bioma da América do Sul, tem a maior biodiversidade do planeta e no Brasil abrange 12 estados, entre eles: Maranhão, Tocantins, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Em função do caráter de centralidade, o Cerrado, possui áreas de transição com todos os demais biomas brasileiros, com exceção do Bioma Campos Sulinos (Pampas), na região Sul (LIMA, 2010). O clima dominante do Cerrado é o tropical estacional; com predomínio do solo Latossolo profundo vegetação savânica e não apresenta uma fisionomia única, mas um gradiente que vai de campo limpo a cerradão. A flora é riquíssima, com mais de 7.000 espécies
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Resumo: O objetivo deste texto é ressaltar a importância do tratamento do sofrimento psíquico em discentes pertencentes a populações indígenas em suas trajetórias acadêmicas na Universidade Federal de Goiás (UFG). Para tanto, foram realizadas análises a partir da experiência vivenciada por parte dos estudantes indígenas no curso de Educação Intercultural e nos demais cursos de graduação e pós-graduação da UFG. Na última década, tais contingentes populacionais têm acessado cada vez mais a academia, onde antes eram apenas excluídos. Desta forma, para que suas trajetórias acadêmicas, importantes para eles, suas comunidades, a universidade e o país, concluam-se com bem-estar e saúde, torna-se fundamental explorar todos os aspectos das políticas de permanência na universidade, como o sofrimento psíquico. Tendo em vista as abordagens presentes nos referenciais teóricos e metodológicos do grupo modernidade/colonialidade/decolonialidade, a hipótese presente em nosso estudo é de que há uma relação direta entre o sofrimento psíquico e a violência epistêmica. Palavras-chave: estudantes indígenas; sofrimento; universidade; políticas educacionais. Abstract: The aim of this paper is to emphasize the importance of treating the psychological suffering of students belonging to indigenous populations in their academic trajectories at the Federal University of Goiás (UFG). We analyze experiences of indigenous students in the Intercultural Education Course and other undergraduate and postgraduate courses at UFG. In the last decade, such population contingents have increasingly accessed the academy, where
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Esta tese procurou analisar a presença e participação social na política externa brasileira. Começamos nossas análises tendo como mote investigativo a dicotomia Próspero/Caliban, duas personagens da peça A tempestade (1611) de Willian Shakespeare, vistas por pensadores pós-coloniais como a representação das relações entre colonizador e colonizado. Para esta tese, essas personagens poderiam significar distância entre a política externa e a sociedade brasileira. A primeira ligada ao Próspero e a segunda ao Caliban, aquele ser do qual é retirado a prerrogativa de humanidade pelo domínio europeu, mas que resiste à dominação (resistência decolonial). Compreendemos que era necessário um “giro decolonial” em nossa tese, por isso discutimos a perspectiva da colonialidade do poder, a partir da qual entendemos que a América era parte constitutiva da formação do sistema-mundo, por meio da rota comercial do Atlântico. Assim, o sistema-mundo moderno e capitalista seria também colonial. Mas a colonialidade do poder está relacionada, sobretudo, a um processo de inferiorização de contingentes populacionais indígenas, negros/afrodescendentes e femininos em razão de seus fenótipos, ou seja, está ligada à noção de “raça” (colonialidade do ser), assim como aos saberes outros (colonialidade do saber) e às formas de espiritualidade outras e suas relações com a natureza (colonialidade da natureza). Em outras palavras, esses estratos seriam inferiores tanto ontológica quanto epistemologicamente. Essas primeiras análises nos levaram a revisitar períodos históricos anteriores ao momento em foco na tese: o lapso de tempo entre a Proclamação da República (1889) e a Era Vargas (1930 – 1945). Voltamos, pois, à colonização, os primeiros contatos entre indígenas e europeus (portugueses), a União Ibérica (1580 – 1640), a Restauração Portuguesa (1640) e a Independência (1822). Um caminho que nos ajudou a compreender como a sociedade e o Estado brasileiro se estruturaram. O primeiro baseado no “mito fundador” da grandeza territorial. E a segunda carregando as marcas da inferioridade, perspectiva que discutimos a partir da colonialidade do poder e de uma análise, ainda que en passant, de diversos intérpretes do Brasil. Detemo-nos também sobre a política indigenista empreendida desde o período colonial até a instituição da República (1889) chegando à Vargas (1930 – 1945). Percebemos com essas análises que o objetivo do Estado brasileiro era, principalmente, integrar o indígena à comunhão nacional transformando-o em mão de obra, além de utilizá-lo como protetor de fronteiras. Nesse ponto política indigenista e política externa se aproximam, já que um dos principais escopos desta última seria assegurar a integridade do território brasileiro e, quando possível ampliá-lo. Começamos, então, a análise dos relatórios do Ministério das Relações entre 1889 e 1945. Após a análise dessa documentação, ratificamos a importância da integridade do território para o Estado brasileiro e percebemos também a existência de um discurso no qual o Brasil aparece como defensor dos princípios da civilização, cujo modelo político, epistêmico, social e cultural é o Ocidente. Um discurso que, além de outras questões, inviabiliza a presença e participação de contingentes populacionais com outras formas de existência e de organização social e econômica, ou seja, indígenas e negros/afrodescendentes. Ainda que, cabe uma ressalva, esse déficit democrático e de participação tenha se alterado, em alguma medida, nos anos 1980, quando os movimentos sociais começaram a se interessar pelos assuntos internacionais, em razão da luta pela manutenção dos direitos trabalhistas, em risco pelas medidas de liberalização econômica e desregulamentação do mundo do trabalho. Esse processo está, contudo, em construção e depende de um diálogo intercultural, que torne o Ministério de Relações Exteriores e sua área de atuação o lugar do interepistêmico.
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In recent decades studies on communities of African descent in the Caribbean, South America and Brazil have revealed a constant process of resemantization of the terms maroon and palenques, given the immense variety of its organizational categories, their relationship with the surrounding society and with the territory, their processes of ethnogenesis and interethnic composition. Thus, based on recent researches between rural communities of African descent in the states of Maranhão and Piauí, this study questions some methodological and typological frameworks which support anthropological reports of recognition and delimitation of maroon’s territory, especially in Brazil where due to the purposely mobile nature of the defi ning parameters, diagnoses are produced which are sometimes very extensive, sometimes restrictive.
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Neste artigo, após uma breve revisão conceitual sobre planejamento e política lingüística, modelos de políticas de línguas e um caso exemplar de política lingüística no mundo, abordarei questões atuais de políticas de línguas no Brasil, como o ensino bilíngüe em escolas indígenas, o financiamento a pesquisas para documentação de línguas em extinção, a revitalização de línguas ou de variedades de línguas e investimento governamental em material didático específico para a educação indígena.In this article, after a brief conceptual revision on language planning and policy, models of language policies and an exemplary case of language policy in the world, I will approach actual issues about languages policies in Brazil, such as the bilingual education in indigenous schools, the financing to research for documentation of languages in extinction, the revitalization of languages or their varieties and the governmental investment in specific didactic material for the indigenous education.
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This paper aims at presenting a state-of-the-art of a subarea in Applied Linguistics, i.e., bilingual education studies in Brazil or yet education in bilingual settings such as indigenous communities, immigrant, frontier and deaf communities. These settings usually have more than two languages in use as well as language varieties. The paper shows a sociolinguistic panorama of the country and of the studies about education in linguistic minority contexts and draws implications for teacher education and language diversity.
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Los autores afirman que en el corazon de la sociedad tupinamba del siglo XVI se encuentra la venganza. El canibalismo es un aspecto de la logica de la venganza absoluta en la que el consumo antropofago es la asociacion de todos los procesos de venganza. Esta puede ejercerse aun despues de la desaparicion historica del canibalismo propiamente dicho pues la venganza es mas fundamental que el canibalismo. La venganza es en realidad la garantia de la memoria social articulando los muertos del pasado con los muertos del futuro por intermedio de los vivos. Los autores esbozan una comparacion entre la sociedad tupinamba, centrada sobre la temporalidad, y las sociedades ge y tukano de Vaupes y terminan coa una reflexion general sobre el lugar de la historicidad en la sociedad tupinamba.
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México ¿Cómo interpretar los actuales conflictos latinoamericanos entre las tradiciones que aún no se han ido y la modernidad que no acaba de llegar? En este libro el autor confronta los debates teóricos acerca de lo moderno y lo posmoderno con estudios sobre los usos populares del arte culto y de los medios masivos. Se analizan comparativamente la forma en que los museos, los políticos y el mercado ritualizan las tradiciones, los comportamientos de Octavio Paz y Jorge Luis Borges ante la televisión, el humor con que las historietas y los graffiti registran los cruces interculturales generados por las migraciones masivas y las nuevas tecnologías. Para entender estas culturas híbridas, el autor propone la utilización combinada de las disciplinas que las analizan por separado: la antropología con la sociología, la historia del arte y los estudios comunicacionales.