ArticlePDF Available

“Taca cachaça que ela libera”: violência de gênero nas letras e festas de forró no Nordeste do Brasil

Authors:

Abstract

A violência contra a mulher é, antes de tudo, uma questão de valores culturais hierárquicos de gênero produzidos socialmente. Desse modo, esta pesquisa buscou compreender os sentidos atribuídos à violência sexual contra a mulher expressa nas letras de forró por rapazes adolescentes residentes na periferia de Fortaleza, Ceará, Brasil. Partimos da etnomusicologia, cuja teoria considera que estudos de músicas regionais e suas performances transpõem o espaço geográfico de sua execução, na medida em que descortinam práticas universalmente disseminadas de legitimação de violências. A pesquisa foi realizada em escolas estaduais do bairro Bom Jardim, na periferia de Fortaleza. Esse bairro registra os piores índices de violências contra as mulheres do município. Foram realizados grupos focais com seis a oito participantes, em que foram debatidas três músicas de forró cujas letras remetiam à violência sexual. Os resultados demonstraram como as músicas reproduzem e influenciam ideologias patriarcais entre os jovens nordestinos. Observa-se nas falas o discurso do “estupro reverso”, que busca justificar a violência sexual por meio da inversão de papeis de gênero, ignorando assimetrias socialmente construídas. O forró se demonstra uma arena de gênero, onde gladiadores competem para registrar ideias de masculinidade, sexualidade e relações de gênero, replicando o sexismo dominante na sociedade contemporânea e contribuindo para a perpetuação da violência contra a mulher.
“Taca cachaça que ela libera”: violência de
gênero nas letras e festas de forró no Nordeste
do Brasil
Give her booze and she’ll loosen up”: gender
violence in Northeast Brazilian forró lyrics
and parties
Tómate una cachaza que te libera”: violencia
de género en las letras y estas del forró de
Nordeste de Brasil
Aline Veras Morais Brilhante 1
Marilyn Kay Nations 1
Ana Maria Fontenelle Catrib 1
Correspondência
A. V. M. Brilhante
Rua Bento Albuquerque 895, Fortaleza, CE 60192-055, Brasil.
alineveras@unifor.br
1 Universidade de Fortaleza, Fortaleza, Brasil.
ARTIGO
ARTICLE
doi: 10.1590/0102-311X00009317
Cad. Saúde Pública 2018; 34(3):e00009317
Resumo
A violência contra a mulher é, antes de tudo, uma questão de valores cultu-
rais hierárquicos de gênero produzidos socialmente. Desse modo, esta pesquisa
buscou compreender os sentidos atribuídos à violência sexual contra a mulher
expressa nas letras de forró por rapazes adolescentes residentes na periferia de
Fortaleza, Ceará, Brasil. Partimos da etnomusicologia, cuja teoria considera
que estudos de músicas regionais e suas performances transpõem o espaço geo-
gráfico de sua execução, na medida em que descortinam práticas universal-
mente disseminadas de legitimação de violências. A pesquisa foi realizada em
escolas estaduais do bairro Bom Jardim, na periferia de Fortaleza. Esse bair-
ro registra os piores índices de violências contra as mulheres do município.
Foram realizados grupos focais com seis a oito participantes, em que foram
debatidas três músicas de forró cujas letras remetiam à violência sexual. Os
resultados demonstraram como as músicas reproduzem e influenciam ideolo-
gias patriarcais entre os jovens nordestinos. Observa-se nas falas o discurso
do “estupro reverso”, que busca justificar a violência sexual por meio da in-
versão de papeis de gênero, ignorando assimetrias socialmente construídas. O
forró se demonstra uma arena de gênero, onde gladiadores competem para
registrar ideias de masculinidade, sexualidade e relações de gênero, replicando
o sexismo dominante na sociedade contemporânea e contribuindo para a per-
petuação da violência contra a mulher.
Cultura; Música; Violência Contra a Mulher; Gênero e Saúde; Etnologia
Este é um artigo publicado em acesso aberto (Open Access) sob a licença
Creative Commons Attribution, que permite uso, distribuição e reprodu-
ção em qualquer meio, sem restrições, desde que o trabalho original seja
corretamente citado.
Brilhante AVM et al.
2
Cad. Saúde Pública 2018; 34(3):e00009317
Introdução
Em 31 de janeiro de 2015, uma médica foi raptada por três homens na saída de um show de forró em
Sobral, Ceará, Brasil, colocada no porta-malas do próprio veículo e estuprada
1
. Infelizmente, esse não
é um caso isolado. Das 9.049 notificações de violências e acidentes em 2006 e 2007, 33% foram vio-
lências sexuais
2
. No Brasil, em 2011, foram notificados 12.087 casos de estupro
3
. Estima-se que 43%
das mulheres brasileiras sofreram algum tipo de violência sexual ao longo da vida
4
e que anualmente
0,26% da população brasileira (cerca de 527 mil) sofre violência sexual, dos quais 10% são reportados
à polícia
3
.
Apesar da elevada frequência e das graves repercussões da violência sexual
5
, as ações de assis-
tência e prevenção
6
não reduziram a prevalência
7
. Ocorre que a vida cotidiana é atravessada por
discursos sociais e pelo biopoder
8
. Nesse sentido, o discurso biomédico hegemônico tem sido histo-
ricamente utilizado para legitimar dicotomias
9,10
e práticas sociais segregadoras
11
. A 5
a
edição do
Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM)
12
, por exemplo, ainda associa violência
a traços de personalidade masculinos e descreve mulheres como susceptíveis a transtornos de estres-
se agudo. Tal patologização da violência minimiza as interfaces do sujeito com o seu mundo local
moral
12,13
, ignorando que injúrias de gênero são produzidas como parte de uma tendência de oposi-
ção binária culturalmente sustentada
11,14
.
A etnomusicologia, em sua vertente próxima à antropologia, emerge como possibilidade para
a compreensão de comportamentos sociais
15
. Estudos etnomusicológicos recentes possibilitam a
compreensão do lugar da música na construção dos papéis de gênero
16,17,18,19,20
e sua relação com a
violência cotidiana
18,21,22,23
. Nesse contexto, emergiu a necessidade de analisar os discursos musicais
da região brasileira com os piores índices de violência contra a mulher: o Nordeste.
O forró surgiu durante a Segunda Guerra Mundial, nas festas “for all” (para todos) promovidas
por militares estrangeiros no litoral nordestino
19
. Nos anos 1940, as músicas instrumentais ganha-
ram letras nas interpretações de Luiz Gonzaga
24
. Desde então, o forró tornou-se “um dos símbolos da
‘cultura nordestina’
24
(p. 87). Na década de 1990, emergiu o forró eletrônico, marcado pelo mercado
pop
25
. A modernização atraiu novos públicos entre todas as faixas etárias e classes sociais
26
. Suas
letras, contudo, permaneceram marcadas por princípios patriarcais, dentre eles, a valorização da
virilidade masculina
26,27
e a objetificação dos corpos femininos
19,25
.
Estudos prévios analisaram a relação entre forró e violência de gênero
17,19,26,27
. É necessário, con-
tudo, compreender a dinâmica da música e da cultura popular nas práticas cotidianas, principalmente
entre adolescentes em processo de consolidação dos papéis de gênero. Diante dessa premissa, emer-
gem as perguntas: qual o papel da música na perpetuação e legitimação da violência sexual? Como a
música atua na estruturação dos papéis sócias de gênero entre adolescentes? Partimos, assim, do refe-
rencial teórico da etnomusicologia para compreender os sentidos atribuídos por rapazes residentes
na periferia de Fortaleza, Ceará, à violência sexual contra a mulher nas letras de forró.
Metodologia
Descrição do contexto
O bairro do Bom Jardim, com Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 0,403
28
, está localizado
na Secretaria Regional de Saúde de maior vulnerabilidade social da cidade – a SER V. Essa é a Regional
mais populosa de Fortaleza (com 585.347 habitantes) e a mais pobre, com rendimento familiar médio
de 3,07 salários mínimos. É também a mais jovem, com 44% da população com até 20 anos e a segunda
com o maior índice de analfabetismo (17,83%). O bairro pertence à Área Integrada de Segurança (AIS)
2, território com o maior registro de homicídios de Fortaleza, chegando a 209 apenas no primeiro
semestre de 2015
29
. Também apresenta o maior número de registros de violência contra mulheres,
com 246 casos em 2014
30
.
Na etnomusicologia, o trabalho de campo analisa sons como fenômenos imbricados às dinâmicas
sociais
21
. Desse modo, durante oito meses, entre março e novembro de 2014, pesquisadoras e equi-
pe técnica experienciaram uma imersão profunda no cotidiano do Bom Jardim. Aprofundamos as
VIOLÊNCIA DE GÊNERO NAS LETRAS E FESTAS DE FORRÓ
3
Cad. Saúde Pública 2018; 34(3):e00009317
observações etnográficas nos bailes de forró, observando estrutura física, som, performances sociais,
dinâmica das festas e as relações entre homens e mulheres em situações reais. As anotações do diário
de campo situaram os resultados, evitando interpretações descontextualizadas
31
. O aprofundamento
histórico-social nos discursos do forró, desde os anos 1940 até a contemporaneidade, foi realizado
em um estudo prévio
19
, permitindo uma interpretação semântica contextualizada
32
dos discursos
associados às letras e festas de forró no Bom Jardim.
Seleção dos participantes
Participaram da pesquisa 14 rapazes entre 14 e 18 anos, matriculados nas duas escolas estaduais de
Ensino Fundamental e Médio do Bom Jardim. O vínculo com os adolescentes foi construído durante
três anos de atuação de um projeto de extensão. Os critérios de inclusão foram: ser do gênero mas-
culino, estar regularmente matriculado em alguma das escolas, frequentar com regularidade (mínima
de uma vez ao mês) festas de forró e ouvir regularmente as músicas. Foram excluídos os adolescentes
menores de 18 anos sem autorização dos responsáveis. Identidade de gênero e orientação sexual não
foram consideradas critérios de inclusão ou exclusão. Optamos por investigar o público masculino
por diversas razões: os homens são os principais perpetradores de violência sexual
33,34
; são escassos
os estudos abordando os sentidos da violência pela ótica masculina
35
; e, finalmente, adolescentes
sentem-se mais livres para tratar de temas controversos entre pares do mesmo gênero do que em
grupos mistos
36
.
Dos 14 participantes, 100% declararam-se heterossexuais; 71% relataram relações sexuais prévias;
35,7% tinham namorada; 57,1% são evangélicos e 42,9% católicos.
Coleta de dados
Foram realizados dois grupos focais em agosto de 2015 com seis e oito participantes. Dois facilita-
dores masculinos conduziram os grupos, fortalecendo o elo afetivo entre os presentes. Após explica-
ções preliminares, foram reproduzidas três músicas de forró elegidas em estudo prévio
19
. A seleção
baseou-se na presença de elementos associados à violência sexual e na ampla reprodução midiática.
Após cada música iniciava-se o debate sobre o significado dos seus conteúdos. As discussões foram
gravadas e transcritas na íntegra.
As músicas – Levanta o Copo, da banda Aviões do Forró; Bichinha Cheia de Besteira e Dança da Piroca
Torta, da banda Saia Rodada, estão denominadas no artigo por M1, M2 e M3. As letras estão dispostas
a seguir:
M1 – Levanta o Copo
Começou, aumenta o som, quero ver quem aprendeu/Pode chamar o garçom/Enche o seu que eu encho o
meu/É só levantar o copo. É muito fácil/Gatinha mamadinha vai, corre pro abraço/Eu quero ver/Levanta o
copo/Dá uma rodadinha/Dá um golinho/Tá facinho/Taca cachaça que ela libera/Se você tá com medo de pedir
um beijo pra ela/Taca cachaça que ela libera”.
M2 – Bichinha Cheia de Besteira
Eu tenho um amigo/Ele é um cara legal/A namorada dele é que é bestinha demais/Se chama pra ir à praia/
Ai, eu tenho medo/Pra tomar um banho de rio/Ai, eu tenho medo/Um banho de piscina/Ai, eu tenho medo/Ô
bichinha cheia, cheia, cheia de besteira (...) Um dia lá na praia foi aquele rebuliço/Ele foi tomar banho e deixou
ela comigo/E veio um caranguejo entrou na saia da loirinha/E ela gritava: tira, tira, tira o bicho/Tira, tira, tira,
tira o bicho/Tira, tira, tira, tira o bicho/ Tira, tira, tira, tira o bicho/Eu levantava o pano mas o bicho não saía”.
M3 – Dança da Piroca Torta
Tô chegando na balada na maior animação/Mas pra me desanimar tá lotado de dragão/A feiosa me cha-
mou pra tomar uma meiota/Aí, eu mostrei pra ela a dança da piroca torta/Torta, torta dança da piroca torta/
Pra esquerda ou pra direita o importante é encoxar/Balançando nesse som roça em todo lugar/Já tomei muita
cachaça não sei se você se importa/Agora quero dançar ‘bebo’ o forró da piroca torta/Torta, torta dança da
piroca torta”.
Brilhante AVM et al.
4
Cad. Saúde Pública 2018; 34(3):e00009317
Procedimento de análise
Após a transcrição das falas e leituras exaustivas do material resultante, a análise seguiu os princípios
da Análise do Discurso (AD)
31
. Foram identificadas quatro formações discursivas principais, a saber:
desmoralização da vítima, legitimação do estupro pelo álcool, desqualificação da recusa feminina e
banalização da violência contra a mulher. As formações discursivas foram relacionadas às formações
ideológicas para chegar aos processos discursivos. Nesse momento observamos paráfrases, metáforas
e fenômenos semânticos produzidos por substituições contextuais, fazendo emergir o não-dito
37
.
O dispositivo analítico foi então construído com base em recortes de sequências discursivas, sendo
analisado à luz do contexto sociohistórico
31,37
.
Procedimentos éticos
O projeto desta pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade de Fortaleza,
sob o número 435/2011. Os nomes dos informantes são fictícios.
Resultados
A imersão no cotidiano do Bom Jardim aproximou músicas e discursos das práticas sociais. Iniciamos
os resultados com a descrição do contexto que situou a análise dos discursos. A essa etapa, segue-se
o aprofundamento nas quatro categorias identificadas nos discursos: desmoralização da vítima, legi-
timação do estupro pelo álcool, desqualificação da recusa feminina e banalização da violência contra
a mulher.
Imersão no cotidiano do Bom Jardim
O nome Bom Jardim deriva de um antigo bordel onde as prostitutas adotavam nomes de flores. O
bordel se foi, mas os espinhos ficaram. Os resíduos do descaso governamental e da violência urbana
são evidentes. Ruas esburacadas, lixo e esgoto a céu aberto, praças abandonadas e grades de ferro
protegendo portas e janelas de mercadinhos familiares coexistem com fronteiras invisíveis que deli-
mitam áreas de comando de diferentes grupos criminosos. Para acessá-las, é necessária autorização.
Em conversas com moradores do bairro é frequente a comparação com o passado. “Antes era bem pior
– eles dizem, no mesmo instante em que o telejornal noticia mais um tiroteio no Bom Jardim. Onde há
grande vulnerabilidade social, como no Bom Jardim, músicas e festas atuam na catarse e na resistência
às condições sociais e ao estigma territorial
38
.
Caminhar pelas ruas do bairro favoreceu uma densa imersão sônica. Diversos estilos musicais
vibram no Bom Jardim. Em meio ao funk e à música sertaneja, contudo o forró se destaca. Calçadas,
carros, celulares – tudo vibra ao som do forró eletrônico.
Seis casas de forró animam a paisagem de pobreza e desprezo. São grandes terrenos cercados por
muros altos, com passagens estreitas que funcionam como entrada e saída. As bilheterias são pequenos
buracos na parede, através dos quais a compra do ingresso transcorre sem contato visual entre cliente
e funcionário. Para atrair mulheres, as casas lhes oferecem entradas gratuitas até um determinado
horário. Ao chegar, observa-se o código de vestuário tacitamente estabelecido para as mulheres: shorts
curtos ou calças justas compõe o visual com saltos altos, blusas decotadas e maquiagens carregadas.
Em palcos pequenos apresentam-se bandas geralmente compostas por dois vocalistas – um
homem e uma mulher –, além de duas ou três dançarinas. Vestimentas, música e movimentos dos
corpos exaltam no palco a sensualidade feminina e a virilidade masculina, em performances reprodu-
zidas no salão de forma ritualística. Observamos sequências temporais, hierarquias, regras, interditos
e obrigações
9
. Hierarquicamente, cabe ao homem a abordagem, enquanto as mulheres posicionam-se
em rodas aguardando a intervenção masculina. Essa aproximação modifica-se com o tempo e o limiar
do álcool. Se no começo há convites, do meio para o fim da festa há puxões pela cintura e palavras
jocosas ao pé do ouvido. Embora homens e mulheres consumam bebidas, o álcool assume simbolo-
gias diferentes entre os gêneros. Para os homens, autoriza abordagens grosseiras. Para as mulheres,
VIOLÊNCIA DE GÊNERO NAS LETRAS E FESTAS DE FORRÓ
5
Cad. Saúde Pública 2018; 34(3):e00009317
desqualifica a recusa. Desse modo, quando a mulher foge à previsibilidade ritualística, rechaçando a
abordagem, ela é ofendida com gestos e palavras. “Vagabunda”, “ maloqueira”, “ piriguete”,troço” foram
palavras ouvidas nas festas do Bom Jardim. Tudo se articula para que, naquele grande terreno com
infraestrutura precária e forte presença de álcool, tudo seja permitido. “Ninguém é de ninguém” – ouvi-
mos. Uma faixa na entrada de uma das casas de forró sintetiza o ambiente: “Tudo junto e misturado!”.
Análise dos discursos
• Desmoralizaçãodavítima
As falas dos adolescentes revelam a internalização de valores patriarcais que os levam a distinguir duas
categorias de mulheres: “a honesta” e “a vagabunda”. A mulher honesta é descrita como alguém que
não frequenta o forró, não ingere bebidas alcoólicas, mantém o controle e o recato. A essas mulheres,
segundo nossos informantes, cabe a tutela social. Para Carlos, 15 anos, “Quando o cara bota alguma
coisa na bebida dela, aí eu acho sacanagem. Porque às vezes a menina tá tomando um refrigerante, nem tá no
forró nem nada. Aí, o cara vem e coloca algum trampo na bebida dela. Aí eu acho que é estupro mesmo. O cara
é um sacana. Carlos distingue essa menina “honesta” da “vagabunda”. Comportamentos que fujam ao
recato, como frequentar o forró e consumir bebidas alcoólicas, são tomados como autorização para
o assédio. A essas mulheres não é dada a opção da recusa e Carlos não reconhece nelas uma vítima
de violência: “Mas a criatura tá num forró, bebendo todas, sai do forró com o cara e depois diz que não queria!
Ah, faça-me o favor, né?”.
Essas ideias são corroboradas por todos os informantes, na medida em que nenhum deles reco-
nheceu a violência em M3. Para eles, a música apenas descreve a dinâmica das festas. Segundo, Adria-
no, 17 anos: “O forró foi feito pra dançar coladinho e a gente encoxa mesmo. É pra isso que a gente vai no forró”.
Augusto, 16 anos, exemplifica a naturalização do assédio: “Olha, o forrozeiro que disser que nunca fez isso,
tá mentindo. A gente vai pro forró pra que mesmo? Pra dançar, beber e namorar. A gente e as mulheres também.
Todo mundo lá quer a mesma coisa. Apesar de a mulher ter avançado na ocupação do ambiente externo
ao lar, a crença hegemônica ainda é a de que a mulher que foge ao recato socialmente preconizado
abre mão de sua dignidade, como corrobora Mário, 18 anos: “Tá no forró pra quê? Não quer ser encoxada
vai pra missa e não pro forró, né?”.
A moralidade surge nos discursos como uma estrutura ideológica sólida, capaz de determinar
contra quem a violência é legitimada. Nascido e criado em meio a interdiscursos carregados dessa
ideologia, João, 15 anos, encontra no comportamento sensual e livre de algumas mulheres a autori-
zação tácita para a abordagem masculina, invalidando qualquer negativa sequencial. Após a execução
de M2, João afirma: “Mas, assim, tem menina que faz tudo. Se exibe toda. Dá mó pinta pro cara e, aí, na
hora de chegar junto, fica que nem diz a música, cheia de besteira. Aí, não dá!. José, 17 anos, corrobora essa
percepção quando afirma: “Tem delas que procuram. Não perdem uma chance de deixar o cara doido. Aí, sai
com ele. Vai pra algum canto só os dois. Deixa o cara em ponto de bala e, aí, nada! Vem com ‘agora não’. Porra,
é difícil pro cara”.
A racionalidade da desmoralização feminina é reforçada pela massificação do estereótipo da
“mulher interesseira”. Essa imagética, frequente em diversas mídias, contribui para a generalização
desse estereótipo, culminando na invisibilidade de algumas violências e no indulto de outras. Paulo,
16 anos, afirma: “Eu vi uma vez numa novela que a menina fez sexo bêbada e engravidou do cara. Cara, ela
bebeu, foi pro quarto com ele e depois que tira a roupa fica com ‘não quero’. A própria mãe da menina fez foi
gostar porque o cara tinha dinheiro. Só é estupro quando o cara é liso. A afirmação é complementada por
Ricardo, 15 anos, que reforça: “Ou então, se o cara tivesse dinheiro e depois dispensasse ela. Aí, também
era estupro”.
O interessante é que não há uma barreira rígida entre a “mulher honesta” e a “vagabunda”. Esse
limite é determinado pelo assujeitamento ou não às estruturas de controle vigente. Segundo Lucas, 18
anos, para ser “vagabunda” basta que a mulher defenda outra: “Hoje em dia é cheio de vagabunda querendo
se dar bem em cima da gente. E é tudo vagabunda, mesmo. As que fazem e as que defendem”.
Há, portanto, uma trivialização da violência decorrente de um processo discursivo. Os homens
não se percebem como criminosos e as mulheres, assujeitadas, não se percebem como vítimas.
Brilhante AVM et al.
6
Cad. Saúde Pública 2018; 34(3):e00009317
• Legitimaçãodoestupropeloálcool
Enquanto a embriaguez masculina é culturalmente estimulada, o consumo de álcool por mulheres é
culturalmente utilizado para legitimar a violência sexual, como demonstra a fala de Marcos, 17 anos:
Quem vai pras festa sabe. O mulheriu hoje bebe mais que o macharal e é muito! Né pouco não. Aí bebe porque
quer. Ninguém tá obrigando. Depois se arrepende e fica com negócio de ‘Ah, eu não queria’, ‘Ah, eu tava bêbada’,
(...). Mas na hora não disse nada. Não reclamou de nada. É só depois pra pagar de santa”.
A culpabilização da vítima é transversal aos discursos, encontrando eco em informações descon-
textualizadas e em crenças do senso comum, como demonstra Jorge, 14 anos, ao afirmar: “Cara, eu vi
num programa uma vez que ninguém faz nada bêbado que não fizesse bom. (...) Então se a mulher bebe e faz sexo,
bebeu por que quis, fez sexo por que quis. Frescura isso de depois vir botar a culpa em cima do cara”.
Para os nossos informantes, as mulheres bebem sabendo das consequências – ficar “molinha” – e
assumem o risco. Lucas, 18 anos, alega: “Cada um tem que saber seu limite na bebida. O cara tá oferecendo,
mas não tá obrigando ela a tomar. Ela bebe porque quer. E sabe que fica molinha, molinha quando bebe. Pra
mim isso é coisa de quem quer dar e não tem coragem”.
No processo de legitimar o crime sexual cometido contra uma mulher entorpecida, emerge nos
discursos um ardil ideológico aqui nomeado de “estupro reverso”. A estratégia consiste em inverter
os papéis no que se refere ao uso do álcool – o homem está alcoolizado e não a mulher. Apesar disso,
a prerrogativa da abordagem permanece masculina. Tal distorção é exemplificada por Luís, 16 anos:
Até porque o cara às vezes tá bêbado também né. Se a menina tá bêbada, inventaram agora que é estupro. Agora
se a menina faz sexo com o cara e ele tá bêbado, não é. Sacanagem isso. O discurso da violência reversa surge
após M1, sendo retomado após M3, por Jorge, 14 anos: “Olha aí, tá vendo? A cunhã se aproveitou do cara
que tava bêbo e aí não é estupro”.
• Desqualificaçãodanegativafeminina
M2 provocou reações paradoxais. Alguns informantes, como André, 15 anos, reconheceram a violên-
cia: “O ritmo é muito bom de dançar. Aí a gente nem percebe. Mas escutando, prestando bem atenção, é pesado
isso, cara. Nesse caso aí, é estupro sim”.
Apesar do reconhecimento da violência, o crime é atenuado pela desqualificação da negativa
feminina. Na música, uma longa introdução apresenta uma mulher “cheia de besteira”, cuja recusa ao
ato sexual é expressa em tom infantilizado, contrastando com a dança sexual. A performance objetiva
desqualificar a negativa e cumpre seu papel. Essa estratégia ideológica está refletida na fala de Lucas,
18 anos: “Se eu te disser que eu nunca tinha prestado atenção nessa música direito. Assim, eu sabia que o bicho
era o pênis, né? Mas eu não tinha atentado que era forçado. Até porque a cantora canta bem animadinha”.
Apenas André, 15 anos, considerou válida a negativa: “Bicho, mas se ela disser que não quer e disser de
verdade não pode. É estupro. Sua percepção, contudo, não é compartilhada por seus colegas. A ideologia
socialmente disseminada de que a mulher diz não querendo dizer sim perpassa os discursos sociais,
sendo sumarizada por Pedro, 17 anos: “E quando é que a gente sabe que o não de uma mulher é não?”.
• Banalizaçãodaviolênciacontraamulher
A banalização da violência contra a mulher encontra respaldo no alívio cômico e na “coisificação”
feminina. Os chistes ocorreram principalmente após a reprodução de M3, ancorando-se na falta de
beleza da mulher. Pedro, 17 anos, afirma: “Oxe! Mas se ela tinha era que agradecer o cara! O cara tava tão
bêbado que nem ligou dela ser feia. Os discursos consecutivos, todavia, demonstram que a falta de beleza
não é o problema: feia ou bonita a mulher é reduzida a uma fonte de prazer masculino, como nos diz
Adriano, 17 anos: “Dá uma hora no forró que você já tá tontim de bêbado e aí, nessa hora, é a que aparecer
na frente. Pode ser bonita, pode ser feia. O que passar na frente tá valendo. Reduzida à sua vagina, a mulher
ainda precisa ser grata, segundo afirmara anteriormente Pedro. O alívio cômico que permeia os dis-
cursos contribui para atenuar o assédio sexual e moral. É frequente em chistes e piadas a deturpação
de conceitos para produzir riso. Esse artifício é utilizado por Carlos, 15 anos. O adolescente desvirtua
os sentidos de “igualdade” e “democracia” para legitimar práticas desiguais e assujeitadoras, ao afir-
mar: “Isso é pra mostrar que o forró é democrático. Até as feias têm seu momento de felicidade”.
VIOLÊNCIA DE GÊNERO NAS LETRAS E FESTAS DE FORRÓ
7
Cad. Saúde Pública 2018; 34(3):e00009317
Discussão
Os resultados obtidos são permeados de paradoxos, sendo um deles transversal a todos os discur-
sos. Apesar da sensualidade inerente ao forró, a moralidade está no cerne das falas. Para além do
idiossincrático, podemos pensar o que há de coletivo nessas situações. A sociedade estabelece regras
morais cuja infração culmina em crimes sociais não incluídos na legislação, mas socioculturalmente
arrolados
39
. A ordem social determina quais formas de violência são culturalmente consentidas e
contra quem o são
40
. Nesse sentido, o não-dito tem um grande poder de dominação, já que faz passar
por ontológico algo socialmente construído
37
. Desse modo, ser vítima de estupro é um status social
condicionado à reputação. Não basta sofrer a violência. É necessário receber da sociedade o aval de
quem realmente é inocente
41
.
O artifício da moralidade na desqualificação da vítima é uma prática histórica e persistente inclu-
sive no âmbito jurídico
42
. Para além do dito, contudo, é crucial a análise do não-dito, mas implícito na
persistência secular dessa estrutura ideológica. As conquistas feministas das últimas décadas modifi-
caram a balança da economia familiar, alterando relações intrafamiliares e sociais
41
. A toda reação à
norma hegemônica, contudo, emerge uma contrarreação
8,43
, culminando na persistência de antigos
discursos assujeitadores, repaginados pela cosmiatria da pós-modernidade.
No mundo globalizado, artefatos culturais transformam-se em fenômenos de massa, responsáveis
pela veiculação maciça de fenômenos ideológicos. Para Althusser
44
, o Aparelho Repressivo do Estado
pertence ao poder público, já os Aparelhos Ideológicos do Estado – incluindo expressões culturais –
pertencem aos domínios particulares. Nesse processo, a “midiação da cultura” magnificou os simbo-
lismos das relações de controle e a violência embutida no processo
45
. A massificação do estereótipo
da “mulher interesseira”, por exemplo, atua em retroalimentação com a divisão sexual do trabalho
44
e
com a “coisificação”
46
da mulher, na medida em que reafirma o homem como mantenedor financeiro
da relação e a passividade da mulher que, como coisa, foi comprada
19
. Nesse processo, estereótipos
como “vagabunda” e “interesseira” tornam-se passíveis de generalização para a totalidade das mulhe-
res
41
. Basta para tal apenas o mero questionamento da ordem patriarcal vigente, como demonstra a
frase de Lucas.
O álcool surge nos discursos legitimando a violência sexual, aparte do que afirma o Código Penal
Brasileiro sobre a presunção da violência contra pessoas que não puderem oferecer resistência
42
.
Entre a letra da lei e sua execução existe, contudo, a cultura, o biopoder
8
e as formações ideológicas
44
.
A sociedade não possui as mesmas regras morais sobre o consumo de álcool para homens e
mulheres. A embriaguez abona a má conduta masculina – a culpa é do álcool. Apenas a mulher é
culpabilizada por “beber porque quer”. Nesse caso, o álcool é inocente – a culpa é da mulher. Ocorre
que as exigências morais para homens e mulheres divergem de modo geral. O álcool é apenas um
elemento dentro de um vasto complexo que remonta a ocupação dos espaços externos ao lar. A per-
cepção de Marcos sobre o aumento do consumo de bebidas alcoólicas por mulheres é corroborada
pelas estatísticas
47
. Alguns estudos, contudo, associam esse fenômeno com mudanças de comporta-
mento social, incluindo a ampliação do espaço feminino no mercado de trabalho e na vida social e
política
47,48
. Desse modo, a condenação moral da mulher pelo consumo de bebidas alcoólicas coadu-
na com as formações ideológicas que assujeitam as mulheres
44
e docilizam seus corpos
49
. Descorti-
na-se o verdadeiro crime social, não-dito pelos discursos, mas implícito nas estruturas ideológicas: a
ocupação do espaço externo pela mulher e o direito ao seu próprio corpo e à sua sexualidade
14
.
As assimetrias sociais entre os gêneros são novamente ignoradas na falácia do “estupro reverso.
Esse ardil atribui igual valor social a duas situações distintas. Em ambas, a prerrogativa da abordagem
é masculina. Essa realidade condiz com o observado durante a imersão nas casas de forró. A diferença
entre as cenas está em quem fez uso abusivo do álcool. O ritual do forró, contudo, reflete os valores
externados em suas letras. Seu cerne gira em torno da virilidade masculina
14,43
, de modo que esta
sempre é legitimada – com ou sem álcool. Dessa maneira, ao ignorar as assimetrias sociais entre os
gêneros, o discurso do “estupro reverso” produz uma falácia argumentativa. Ao afirmar que a mulher,
por ser feia, deveria “agradecer” a investida masculina, Pedro reitera duas construções ideológicas: o
papel social da mulher de satisfação do prazer masculino e a permissão de punir a mulher que ocupa
o espaço externo. Embora, nesse momento, o adolescente busque reiterar discursos que sustentam o
ardil do “estupro reverso”, termina por ilustrar seu paradoxo.
Brilhante AVM et al.
8
Cad. Saúde Pública 2018; 34(3):e00009317
Outra categoria que emergiu dos discursos foi a desqualificação da negativa feminina. Essa estru-
tura ideológica parte do pressuposto de que as mulheres dizem não porque assim são ensinadas. Seria
uma simulação para que não abrissem mão do recato, cabendo ao homem “transformar” a negativa
em permissão
50
. O paradoxo desse argumento é que ele torna vitimável exatamente o estereótipo
tutelado socialmente: a mulher “honesta”.
Segundo Goffman
9
(p. 188), a “ritualização da feminilidade” determina o comportamento femi-
nino ideal e “tudo o que impeça o ideal (...)” deve ser “cortado, suprimido. Ora, mas se a própria negativa
– associada à simbologia do recato – deve ser desrespeitada, o que resta à mulher? Os discursos dos
adolescentes demonstram que a ritualização da feminilidade normativa não depende de atitudes, mas
de passividades. Mulheres que fujam aos dispositivos de controle da sexualidade são destituídas da
proteção social, tendo de aceitar passivamente a violência. De modo semelhante, o direito de recusar
a abordagem é negado à mulher apenas por esta ser mulher. Cabe-lhe novamente a passividade diante
do desejo masculino. É a “coisificação”, a transformação da pessoa em objeto
46
.
A banalização da violência e o alívio cômico surgem nos discursos como argamassa que consolida
estruturas ideológicas atreladas ao inconsciente
51,52
. O processo psíquico da construção do chiste
demanda um ouvinte
51
. Partindo do pressuposto de que a estruturação do inconsciente é atravessada
pelo discurso do outro
52
, no chiste o significante encontra um significado transformando-se em sím-
bolo linguístico
31
. Desse modo, as piadas e chistes nos discursos dos adolescentes reforçam práticas
assujeitadoras das mulheres e a “coisificação” de seus corpos.
Cabe ressaltar que o forró é um símbolo cultural do Nordeste. A misoginia inerente às letras, con-
tudo, converte-se em injúria estrutural e cotidiana
13
. Não existe discurso inocente
53
. Ignorar isso é
perpetuar a violência.
Imagine uma performance musical, ciente de que som, ritmo e movimento exercem efeitos físicos
e psicológicos sobre a audiência
54
. Visualize um palco, onde são reproduzidas, em um ritmo alegre
e envolvente, as letras aqui descritas. Imagine-se agora adolescente, em processo de introjeção dos
papéis de gênero, estabelecendo uma relação de pertencimento com esse artefato cultural. Agora,
relembre que 43% das mulheres sofreram algum tipo de violência sexual, sendo que mais de 50% não
pediram ajuda e que em 53% dos casos os maridos e parceiros foram os agressores
4
; que o Brasil é o
5º país do mundo em feminicídio e que dos 4.762 assassinatos de mulheres registrados em 2013 no
Brasil, 50,3% foram cometidos por familiares (incluindo parceiros e ex-parceiros em 33,2%)
33
.
Não pretendemos aqui criticar o forró como expressão cultural, mas sim alertar sobre a violência
subliminar de letras e performances, e sua influência nos discursos sociais dos adolescentes. Críticas
a esses discursos contribuem para a criação de relações de gênero mais justas, saudáveis e menos
violentas entre os gêneros.
Conclusão
O presente artigo objetivou compreender os sentidos atribuídos por rapazes residentes na periferia de
Fortaleza à violência sexual contra a mulher nas letras de forró. Os achados da pesquisa descortinaram
um panorama preocupante. Os sentidos da violência sexual determinados pelas posições ideológicas
nos discursos expuseram a construção de relações conflituosas entre os gêneros como norma social.
Nesse processo, letras e performances do forró contribuem para que esses adolescentes estabeleçam
uma relação de pertença com um contexto pautado pela violência contra a mulher.
VIOLÊNCIA DE GÊNERO NAS LETRAS E FESTAS DE FORRÓ
9
Cad. Saúde Pública 2018; 34(3):e00009317
Colaboradores
A. V. M. Brilhante e M. K. Nations participaram da
concepção e do planejamento da pesquisa, da análi-
se dos dados e da redação do artigo. A. M. F. Catrib
colaborou na concepção e planejamento da pesquisa
e aprovação do texto final.
Agradecimentos
À equipe técnica, por sua contribuição para os gru-
pos focais.
Referências
1. Mulher é raptada em saída de show e violen-
tada em Sobral. O Povo Online 2015; 2 fev.
http://www.opovo.com.br/app/ceara/sobral/
2015/02/02/notsobral,3386811/mulher-
e-raptada-em-saida-de-show-e-violentada-
em-sobral.shtml (acessado em 20/Jun/2016).
2. Ministério da Saúde. Temático prevenção de
violências e cultura de paz III. Brasília: Organi-
zação Pan-Americana da Saúde; 2010. (Painel
de Indicadores do SUS, 5).
3. Cerqueira D, Santa D, Coelho C. Estupro no
Brasil: uma radiografia segundo os dados da
saúde. Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada; 2014.
4. Venturi G, Recamân M, Oliveira S. A mulher
brasileira nos espaços público e privado. São
Paulo: Fundação Perseu Abramo; 2004.
5. Black MC, Basile KC, Breiding MJ, Smith SG,
Walters ML, Merrick MT, et al. The National
Intimate Partner and Sexual Violence Survey
(NISVS): 2010 summary report. Atlanta: Na-
tional Center for Injury Prevention and Con-
trol, Centers for Disease Control and Preven-
tion; 2011.
6. Departamento de Ações Programáticas Estra-
tégicas, Secretaria de Atenção à Saúde, Minis-
tério da Saúde. Prevenção e tratamento dos
agravos resultantes da violência contra mulhe-
res e adolescentes: 3a Ed. Brasília: Ministério
da Saúde; 2010. (Norma Técnica).
7. Facuri CO, Fernandes AMS, Oliveira K, An-
drade TS, Azevedo RCS. Violência sexual:
estudo descritivo sobre as vítimas e o atendi-
mento em um serviço universitário de referên-
cia no Estado de São Paulo. Cad Saúde Pública
2013; 29:889-98.
8. Foucault M. História da sexualidade. I: a von-
tade de saber. Rio de Janeiro: Edições Graal;
1988.
9. Goffman E. A ritualização da feminilidade. In:
Goffman E, organizadora. Os momentos e os
seus homens. Lisboa: Relógio D’Água; 1999. p.
154-89.
10. Foucault M. O nascimento da clínica. São Pau-
lo: Editora Forense Universitária; 2004.
11. Zanello V, Costa e Silva RM. Saúde mental,
gênero e violência estrutural. Rev Bioét 2012;
20:267-79.
12. American Psychiatric Association. Manual
diagnóstico e estatístico de transtornos men-
tais. 5a Ed. Porto Alegre: Editora Artmed;
2014.
13. Kleinman A. The violence of everyday life: the
multiple forms and dynamics of social vio-
lence. In: Das V, Kleinman A, Ramphele M,
Reynolds P, editors. Violence and subjectivity.
Berkeley: University of California Press; 2000.
p. 226-41.
Brilhante AVM et al.
10
Cad. Saúde Pública 2018; 34(3):e00009317
14. Saffioti H, Almeida SS. Violência de gênero:
poder e impotência. Rio de Janeiro: Revinter;
1995.
15. Rhodes W. Toward a definition of ethnomusi-
cology. Am Anthropol 1956; 58:457-63.
16. Cohen S. Men making a scene: rock music and
the production of gender. In: Whithley S, edi-
tor. Sexing the groove: popular music and gen-
der. New York: Routledge; 1997. p. 17-36.
17. Faria CN. Puxando a sanfona e rasgando o
nordeste: relações de gênero na música popu-
lar nordestina (1950-1990). Mneme – Revista
de Humanidades 2002; 3:1-35.
18. Koskoff E. A feminist ethnomusicology: writ-
ings on music and gender. Chicago: University
of Illinois Press; 2014.
19. Brilhante AVM, Catrib AMF. A violência con-
tra a mulher e o forró nosso de cada dia. Forta-
leza: EdUECE; 2016.
20. Järviluoma H, Moisala P, Vilkko A. Gender and
qualitative methods. London: Sage; 2003.
21. Santos LZ. “Todos na produção”: um estudo
etnográfico das narrativas sônicas e raps em
um bairro popular do sul do Brasil [Tese de
Doutorado]. Porto Alegre: Programa de Pós-
graduação em Música, Universidade Federal
do Rio Grande do Sul; 2015.
22. Maia AF, Antunes DC. Música, indústria cultu-
ral e limitação da consciência. Revista Subjeti-
vidades 2016; 8:1143-76.
23. Johnson B, Cloonan M. Dark side of the tune:
popular music and violence. Bodmin: Ashgate;
2008.
24. Chianca LO. A festa do interior: São João, mi-
gração e nostalgia em Natal no século XX. Na-
tal: Editora da UFRN; 2006.
25. Marques R. Quem “se garante” no forró eletrô-
nico? – produzindo diferenças em contextos
de fronteira e ebulição social. Cadernos Pagu
2014; 43:347-83.
26. Strathern M. Música popular, moral e sexuali-
dade: reflexões sobre o forró contemporâneo.
Revista Contracampo 2009; 20:132-46.
27. Brilhante AVM, Silva JG, Vieira LJES, Barros
NF, Catrib AMF. Construção do estereóti-
po do “macho nordestino” nas letras de forró
no Nordeste brasileiro. Interface (Botucatu,
Online) 2018; [Epub ahead of print].
28. Universidade Estadual do Ceará; Universida-
de Federal do Ceará. Mapa da criminalidade
e da violência em Fortaleza. Perfil da SER V.
http://www.uece.br/covio/dmdocuments/
regional_V.pdf (acessado em 20/Out/2016).
29. Secretaria de Segurança Pública e De-
fesa Social. Indicadores criminais 2017.
http://www.sspds.ce.gov.br/noticiaDetalhada.
do?tipoPortal=1&codNoticia=2142&titulo=
Reportagens&action=detail (acessado em 11/
Jul/2017).
30. Observem. Filtro de pesquisa sobre a violên-
cia contra a mulher em Fortaleza, 2016. http://
observem.woese.com/page/9086 (acessado em
20/Out/2016).
31. Orlandi E. A leitura e os leitores possíveis. In:
Orlandi E, organizador. A leitura e os leitores.
Campinas: Editora Pontes; 1998. p. 7-24.
32. Bibeau G, Corin EE. From submission to the
text to interpretative violence. In: Bibeau G,
Corin EE, editors. Beyond textuality: asceti-
cism and violence in anthropological interpre-
tation. Berlin/New York: Mouton de Gruyter;
1995. p. 3-54.
33. Waiselfisz JJ. Mapa da violência 2015: homi-
cídios de mulheres no Brasil. Brasília: Organi-
zação Pan-Americana da Saúde/Organização
Mundial da Saúde/Secretaria Especial de Polí-
ticas para as Mulheres/Ministério das Mulhe-
res, da Igualdade Racial e dos Direitos Huma-
nos/Faculdade Latino-Americana de Ciências
Sociais; 2015.
34. Brilhante AVM, Moreira GAR, Vieira LJES,
Catrib AMF. Um estudo bibliométrico so-
bre a violência de gênero. Saúde Soc 2016;
25:703-15.
VIOLÊNCIA DE GÊNERO NAS LETRAS E FESTAS DE FORRÓ
11
Cad. Saúde Pública 2018; 34(3):e00009317
35. Lenz K, Oliveira C. Homens e violência conju-
gal: uma análise de estudos brasileiros. Ciênc
Saúde Coletiva 2011; 16:2401-13.
36. Brilhante AVM, Catrib AMF, Silva RM. Educa-
ção sexual na adolescência como estratégia de
promoção da saúde. Fortaleza: EdUECE; 2014.
37. Orlandi E. Análise de discurso: princípios &
procedimentos. 8a Ed. Campinas: Editora Pon-
tes; 2009.
38. Wacquant L. Os condenados da cidade: estu-
dos sobre marginalidade avançada. 2a Ed. Rio
de janeiro: Revan; 2005.
39. Dornelles JR. O que é crime. São Paulo: Edito-
ra Brasiliense; 1988.
40. Minayo MCS. Violência: um problema para a
saúde dos brasileiros. In: Ministério da Saú-
de, organizador. Impacto da violência na saúde
dos brasileiros. Brasília: Ministério da Saúde;
2005. p. 9-41.
41. Sousa RF. Cultura do estupro: prática e incita-
ção à violência sexual contra mulheres. Revista
Estudos Feministas 2017; 25:9-29.
42. Marcão R, Gentil P. Crimes contra a dignidade
sexual : comentários ao Título VI do Código
Penal. 2ª Ed. São Paulo: Saraiva; 2015.
43. Faludi S. Backlash: the undeclared war against
women. New York: Vintage; 1992.
44. Althusser L. Ideologia e aparelhos ideológicos
do Estado. Lisboa: Presença; 1974.
45. Thompson JB. Ideologia e cultura moderna –
teoria social crítica na era dos meios de comu-
nicação de massa. 7a Ed. Petrópolis: Editora
Vozes; 2007.
46. Moffatt A. Psicoterapia del oprimido. São Pau-
lo: Cortez Editora; 1991.
47. Klingemann H. Alcohol and its social conse-
quences: the forgotten dimension. Geneva:
World Health Organization; 2001.
48. Rehm J. Concepts, dimensions and measures
of alcohol-related social consequences: a ba-
sic framework for alcohol-related benefits
and harm. In: Klingemann H, Gmel G, editors.
Mapping the social consequences of alcohol
consumption. Dordrecht: Springer Nether-
lands; 2001. p. 11-9.
49. Foucault M. Vigiar e punir: nascimento da pri-
são. Rio de Janeiro: Editora Vozes; 2009.
50. Brilhante AVM, Moreira GAR, Vieira LJES,
Silva RM, Catrib AMF. O “macho nordestino
em formação: sexualidade e relações de gêne-
ro entre adolescentes. Rev Bras Promoç Saúde
2015; 28:471-8.
51. Freud S. Os chistes e sua relação com o incons-
ciente. Edição Standard Brasileira das Obras
Completas/Sigmund Freud. v. I. Rio de Janei-
ro: Imago Editora; 1996.
52. Lacan J. Seminário V: as formações do incons-
ciente, 1957-58. Recife: Traço Freudiano Vere-
das Lacanianas; 1958.
53. Denzin N. Performance ethnography: critical
pedagogy and the politics of culture. Thousand
Oaks: Sage; 2003.
54. Seeger A. Etnografia da música. Cadernos de
Campo 2008; 17:237-69.
Brilhante AVM et al.
12
Cad. Saúde Pública 2018; 34(3):e00009317
Abstract
Violence against women is primarily a socially
produced issue of gender-hierarchy cultural val-
ues. This study aimed to unveil the meanings as-
signed to sexual violence against women in the
forró lyrics by adolescent boys living on the out-
skirts of Fortaleza, Ceará State, Brazil. Our point
of departure was ethnomusicology, the theory of
which contends that studies of regional songs and
their performances transcend the geographic space
in which they are performed, to the extent that
they reflect universally disseminated practices in
the legitimation of violence. The study was con-
ducted in state public schools in the Bom Jardim
neighborhood on the outskirts of Fortaleza. This
neighborhood has the highest rates of violence
against women in the city. Focus groups were
conducted with six to eight participants each, de-
bating three forró songs whose lyrics referred to
sexual violence. The results showed that the lyr-
ics reproduce and influence patriarchal ideologies
among Northeast Brazilian youth. Quotes by the
boys reveal the discourse of “reverse rape”, which
seeks to condone sexual violence through the re-
versal of gender roles, ignoring socially construct-
ed asymmetries. Forró proves to be a gender arena
in which gladiators compete to flaunt notions of
manhood, sexuality, and gender relations, repli-
cating the dominant sexism in contemporary Bra-
zilian society and contributing to the perpetuation
of violence against women.
Culture; Music; Violence Against Women;
Gender and Health; Ethnology
Resumen
La violencia contra la mujer es, ante todo, una
cuestión de valores culturales jerárquicos de géne-
ro producidos socialmente. Por ello, esta investiga-
ción procuró comprender los sentidos atribuidos a
la violencia sexual contra la mujer, expresada en
las letras del forró por parte de chicos adolescen-
tes, residentes en la periferia de Fortaleza, Ceará,
Brasil. Partimos de la etnomusicología, cuya teoría
considera que los estudios de músicas regionales y
sus representaciones traspasan el espacio geográ-
fico de su ejecución, en la medida en que desvelan
prácticas universalmente diseminadas de legiti-
mación de la violencia. La investigación se realizó
en escuelas estatales del barrio de Bom Jardim, en
la periferia de Fortaleza. Este barrio registra los
peores índices de violencia contra las mujeres del
municipio. Se crearon grupos focales de seis a ocho
participantes, en los que se debatieron tres cancio-
nes de forró, cuyas letras remitían a la violencia
sexual. Los resultados demostraron de qué forma
las canciones reproducen e influencian ideologías
patriarcales entre los jóvenes nordestinos. Se ob-
serva en las intervenciones el discurso de la “viola-
ción inversa”, que busca justificar la violencia se-
xual mediante la inversión de los papeles de géne-
ro, ignorando las asimetrías socialmente construi-
das. El forró demuestra ser la arena de un coliseo
del género, donde los gladiadores compiten para
registrar ideas de masculinidad, sexualidad y rela-
ciones de género, replicando el sexismo dominante
en la sociedad contemporánea y contribuyendo a
la perpetuación de la violencia contra la mujer.
Cultura; Música; Violencia contra la Mujer;
Género y Salud; Etnología
Recebido em 20/Jan/2017
Versão final reapresentada em 14/Jul/2017
Aprovado em 28/Ago/2017
... Falando especificamente do consumo de álcool, a questão de gênero se torna ainda mais evidente: As regras morais de consumo de álcool por homens e mulheres não são as mesmas. Enquanto eles são estimulados a fazer uso da substância, mulheres sofrem sanções sociais frequentes, sendo o consumo de álcool culturalmente utilizado para legitimar diferentes tipos de violência -inclusive a sexual -podendo culminar em desfecho letal (Brilhante;Nations;Catrib, 2018). ...
... Falando especificamente do consumo de álcool, a questão de gênero se torna ainda mais evidente: As regras morais de consumo de álcool por homens e mulheres não são as mesmas. Enquanto eles são estimulados a fazer uso da substância, mulheres sofrem sanções sociais frequentes, sendo o consumo de álcool culturalmente utilizado para legitimar diferentes tipos de violência -inclusive a sexual -podendo culminar em desfecho letal (Brilhante;Nations;Catrib, 2018). ...
... Falando especificamente do consumo de álcool, a questão de gênero se torna ainda mais evidente: As regras morais de consumo de álcool por homens e mulheres não são as mesmas. Enquanto eles são estimulados a fazer uso da substância, mulheres sofrem sanções sociais frequentes, sendo o consumo de álcool culturalmente utilizado para legitimar diferentes tipos de violência -inclusive a sexual -podendo culminar em desfecho letal (Brilhante;Nations;Catrib, 2018). ...
Article
Full-text available
Resumo A dependência química é entendida pela ciência como um fenômeno complexo, multifatorial e polêmico. Embora o consumo de substâncias psicoativas e os problemas dele decorrentes sejam comuns nos diferentes gêneros, faixas etárias, classes econômicas e grupos sociais, esses constructos atuam de modos diferentes considerando seu papel nas estruturações das subjetividades e relação destas com o meio social. Buscou-se, nesse estudo, compreender a relação entre questões de gênero e dependência química partindo da percepção de mulheres que buscaram acompanhamento em saúde por adicção. Trata-se de pesquisa qualitativa realizada com mulheres dependentes de substâncias psicoativas, sendo estas lícitas - como álcool, tabaco e medicamentos - e ilícitas - como maconha e cocaína. A análise das entrevistas teve como base a análise de conteúdo de Bardin, embasada por estudos sobre gênero e dependência química. Os resultados demonstram que as questões de gênero marcam fortemente as percepções femininas de si, da forma como os papéis de mulher são ou não exercidos no movimento da dependência química e de como a sociedade valida seus comportamentos. Evidências deste estudo permitem inferir que as questões de gênero perpassam as vivências atreladas à dependência química, singularizando a relação da mulher com a droga.
... Understanding the violent behaviour and mimetic performances of violence as part of a coherent system loaded with cultural significance, a strand of the so-called applied ethnomusicology seeks to understand the performative abilities of violence and the meanings that violent performances have to victims, perpetrators and witnesses 15 . From that emerged a study anchored in the epistemological assumptions of applied ethnomusicology that sought to understand the relationship between the ritualistic performances of forró and youth perception about sexual violence 16 . ...
... The discussions were recorded and transcribed in full and analysed according to the principles of DA 47 . The findings of that study have been published 16 , and we do not intend to repeat them here. The present article focuses on the methodological aspects that guided the aforementioned study, seeking to discuss the application of ethnomusicology in a study in the field of Public Health. ...
... Twelve songs were chosen in a previous study 14 , based on the presence of elements associated with sexual violence. During immersion in daily life in the neighbourhood, based on the observation of everyday sounds and parties and on the mediatic reproduction in the neighbourhood's most popular media, this group was reduced to three 16 . ...
Article
Full-text available
Resumo O artigo analisa possibilidades metodológicas da etnomusicologia no campo da saúde coletiva, partindo de uma experiência que triangulou teorias etnomusicológicas com a análise do discurso (AD). Após uma introdução à etnomusicologia aplicada, segue-se a descrição de aspectos metodológicos da experiência em questão. Em sequência, descreveu-se a condução da etapa etnomusicológica e o processo de triangulação. Os resultados mostram que os sistemas musicais se situam em estruturas de poder, influenciando a construção das subjetividades. A etnomusicologia aplicada emerge, portanto, como possibilidade para a análise das estruturas sobre as quais a música se alicerça. A partir de uma pesquisa a respeito das relações entre o forró e a percepção de jovens sobre a violência sexual, a etnomusicologia apresentou-se como possibilidade teórica para o estudo das performances sociais violentas e dos efeitos da música nas construções identitárias, além de fornecer elementos para o enfrentamento da violência dentro do próprio sistema cultural. Sua triangulação com a AD contribui para uma pesquisa etnográfico-discursiva, como possibilidade de análise das práticas sociais.
... Visto isso, no contexto nacional, de acordo comBrilhante, Nations & Catrib (2018), o artigo "Taca cachaça que ela libera": violência de gênero nas letras e festas de forró no Nordeste do Brasil aborda como as letras de músicas de forró contribuem para o alto índice de violência sexual contra mulheres, especialmente entre adolescentes de periferia no Nordeste(Brilhante, Nations & Catrib, 2018). A pesquisa revela que essas letras são permeadas por valores patriarcais, como a exaltação da virilidade masculina e a objetificação dos corpos femininos. ...
... Visto isso, no contexto nacional, de acordo comBrilhante, Nations & Catrib (2018), o artigo "Taca cachaça que ela libera": violência de gênero nas letras e festas de forró no Nordeste do Brasil aborda como as letras de músicas de forró contribuem para o alto índice de violência sexual contra mulheres, especialmente entre adolescentes de periferia no Nordeste(Brilhante, Nations & Catrib, 2018). A pesquisa revela que essas letras são permeadas por valores patriarcais, como a exaltação da virilidade masculina e a objetificação dos corpos femininos. ...
Article
A música exerce um papel crucial na formação da identidade dos adolescentes, sendo uma ferramenta que os jovens utilizam para expressar suas emoções, moldar seus valores e se conectar socialmente. Este estudo tem como objetivo compreender como a música contribui para a construção da identidade nessa faixa etária, buscando reunir evidências científicas sobre o tema.Trata-se de uma revisão integrativa, onde o processo foi estruturado em etapas que incluem a definição dos objetivos, critérios de inclusão e exclusão, estratégias de busca, seleção e extração de dados, análise, apresentação dos resultados e síntese das evidências encontradas. A pesquisa foi orientada pela pergunta condutora: Quais são as evidências científicas disponíveis sobre a influência da música na construção da identidade dos adolescentes? Os resultados sugerem que a música impacta significativamente os aspectos emocionais, sociais e psicológicos dos jovens. A escolha de gêneros musicais específicos e a identificação com letras e artistas refletem os valores e sentimentos dos adolescentes, enquanto a interação em comunidades musicais fortalece os laços sociais e o senso de pertencimento. Além disso, o consumo musical está associado à regulação emocional e ao desenvolvimento da autoestima. Conclui-se que a música desempenha um papel complexo na vida dos adolescentes, contribuindo tanto para o autoconhecimento quanto para a integração social. Compreender a influência da música na formação da identidade pode proporcionar compreensões benéficas para estudos em cultura, psicologia e sociologia.
... Por fim, 5,00% (n=1) de mulheres de DABEN não considera estupro manter relação como uma mulher alcoolizada ou sobe efeito de drogas. Segundo estudo realizado por Brilhante, et al., (2018) ao qual discute sobre a letra da música "taca cachaça que ela libera", a embriaguez masculina é considerado algo cultural, comum e é incentivada, diferentemente do consumo de álcool pela população feminina, sendo considerada uma forma de legitimar a violência sexual, a culpabilização da vítima é baseada em crenças do senso comum e descontextualizas. Nesse sentido, a "midiação da cultura" ampliou simbolismos de relações de controle e a violência camuflada no processo. ...
Article
Full-text available
A violência é um grave problema de saúde pública devido ao aumento dos índices de morbimortalidade relacionada a esse tema. Sendo a escola um importante espaço para o desenvolvimento e aprofundamento de conhecimentos e mudanças; é um local propício e adequado para a implementação de ações educativas em diferentes áreas. Para jovens, a desinformação é algo significativo, considerando a falta de conhecimentos específicos sobre determinada questão, e a falta de habilidade em lidar com dificuldades que possam surgir referente a um determinado problema em seu cotidiano. Com o objetivo de saber o conhecimento entre adolescentes jovens sobre violência contra a mulher, neste trabalho foi realizado primeiramente o levantamento socioeconômico e a segunda etapa foi analisar o nível de conhecimento sobre violência contra a mulher de adolescentes jovens entre 15 e 19 anos (ONU). Tal levantamento foi realizado por meio de questionário virtual, devido a pesquisa ser realizada durante o período de pandemia da COVID-19, o qual é composto por questões fechadas onde o discente terá a opção de concordar, discordar ou assinalar não saber acerca da informação questionada. Foi observado que apesar de os participantes já terem contato com o tema, eles demonstraram que o conhecimento adquirido não foi de total eficácia. Espera-se que o presente trabalho contribua para a redução dos índices de violência contra a mulher, enfatizando os papéis fundamentais dos enfermeiros na orientação, prevenção, promoção e recuperação da saúde, principalmente os enfermeiros com a especialidade forense que se encontram mais capacitados a lidar com o tema expresso.
Article
Full-text available
RESUMO Objetivo: Analisar a tendência e o padrão espacial das notificações de estupro por parceiro íntimo contra mulheres no Nordeste do Brasil. Métodos: Estudo ecológico de série temporal e análise espacial com dados secundários do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) entre 2013 e 2022. Foram calculadas taxas brutas de estupro por tipo de parceiro íntimo e por faixa etária da vítima. Para o cálculo de tendência, utilizou-se a regressão de Prais-Winsten e, para a análise espacial, adotou-se o índice global e local de Moran. Resultados: Foram notificados 5.542 casos de estupro pelo parceiro íntimo. As taxas perpetradas pelo cônjuge variaram de 0,34/100 mil mulheres em 2013 para 0,51/100 mil em 2017, com maiores elevações entre 2018 (1,04/100 mil) e 2022 (1,28/100 mil). Houve tendência de aumento no Nordeste como um todo (VPA=19,47; IC95% 15,88–23,22) e em quase todos os estados, exceto Paraíba e Sergipe. Os casos perpetrados por namorados (VPA=23,90; IC95% 12,80–36,09) e entre mulheres de 15 a 19 anos (VPA=22,63; IC95% 4,18–44,35) exibiram maior variação anual. Observou-se concentração de altas taxas em diversos municípios no noroeste do Ceará e no sudeste de Pernambuco. Conclusão: A tendência das taxas de estupro contra mulheres perpetrado pelo parceiro íntimo aumentou no Nordeste, principalmente entre as mais jovens e por namorados, tendo maior aglomerado de notificações no Ceará e em Pernambuco.
Article
Full-text available
Objective To analyze the trend and spatial pattern of intimate partner rape reports against women in Northeast Brazil. Methods Ecological time-series study and spatial analysis with secondary data from the Notifiable Diseases Information System between 2013 and 2022. Gross rape rates were calculated by type of intimate partner and by age group of the victim. Prais-Winsten regression was used to calculate the trend, and the global and local Moran indices were used for spatial analysis. Results A total of 5,542 cases of intimate partner rape were reported. Spousal rates ranged from 0.34/100,000 women in 2013 to 0.51/100,000 in 2017, with greater increases between 2018 (1.04/100 thousand) and 2022 (1.28/100 thousand). There was an upward trend in the Northeast as a whole (APC=19.47; 95%CI 15.88–23.22) and in almost all states, except Paraíba and Sergipe. Cases perpetrated by boyfriends (APC=23.90; 95%CI 12.80–36.09) and among women aged 15 to 19 years (APC=22.63; 95%CI 4.18–44.35) showed the highest annual variation. A concentration of high rates was observed in several municipalities in the northwest of Ceará and southeast of Pernambuco. Conclusion The trend in intimate partner rape rates against women increased in the Northeast, especially among younger women and by boyfriends, with a greater agglomeration of notifications in Ceará and Pernambuco. Keywords: Violence against women; Intimate partner violence; Sexual violence; Rape; Northeast
Article
Full-text available
No desenvolvimento da ciência moderna, a arqueologia tem desempenhado um papel significativo na legitimação e manutenção de agendas racistas, patriarcais e opressoras da colonialidade do poder e do saber. Através da análise de três curtas-metragens adotados nos últimos cinco anos em ações de extroversão do conhecimento e educação patrimonial em arqueologia preventiva (In the rough [2005], Uhug – Na Serra da Capivara [2005] e Komum [2010]), busco refletir sobre nosso papel social enquanto arqueólogos e pessoas educadoras e discutir como uma prática irrefletida pode atuar em favor de políticas de apagamento e formas de opressão discursivas e materiais contra grupos minoritários, sobretudo mulheres e povos racializados.
Article
Full-text available
A escolha da mulher por estudar em um curso de uma área tradicionalmente masculina (Segurança do Trabalho) e a sua inserção no estágio constituem o tema deste trabalho, escrito a partir de uma pesquisa que foi realizada no ambiente escolar do Instituto Federal de Alagoas (IFAL) – Campus São Miguel dos Campos. O seu objetivo é compreender os aspectos sócio-histórico-emocionais que envolvem essa escolha e conhecer a realidade das mulheres ao realizar o estágio, etapa crucial para a consolidação dos ensinamentos do curso e para a empregabilidade das mesmas. A pesquisa também visa ampliar o debate no IFAL, focando as questões de gênero, ensino e trabalho. O estudo investigativo é caracterizado como uma pesquisa-ação, de cunho quanti-qualitativo, e os instrumentos metodológicos utilizados foram o questionário semiestruturado e a roda de conversa. Os dados apontam para a necessidade de ampliar as pesquisas envolvendo a temática gênero e EPT, no sentido de pensar a educação como promotora de pensamento crítico, para estimular discussões e práticas que fortaleçam a equidade de gênero, no IFAL e na sociedade.
Article
Full-text available
Resumo Historicamente nota-se que a domesticação e a normatização do corpo feminino podem ser reconhecidas como uma estratégia consideravelmente durável e flexível de controle social, cumprindo também com uma função ideológica que pode vir a se desdobrar em inúmeras formas de violência. Nesse contexto, o presente artigo teve como objetivo compreender como o corpo feminino e a violência de gênero são abordados no documentário brasileiro de 2018 Chega de Fiu Fiu. A partir de uma análise de conteúdo temática os principais resultados destacam a objetificação e a submissão das mulheres por parte dos homens que, naturalizados, reforçam e reiteram os assédios morais e violências sexuais que vitimam as mulheres na nossa sociedade.
Article
Full-text available
Transtornos de ansiedade e depressão são diagnósticos frequentes no mundo ocidental. Autores os definem como transtornos mentais comuns e pesquisas têm apontado alta correlação entre seu aparecimento e condições socioeconômicas tais como gênero, pobreza e baixa escolaridade, dentre outras. O presente artigo fez uma análise dos sintomas e diagnósticos encontrados em prontuários de pacientes homens e mulheres de dois grandes hospitais psiquiátricos do Distrito Federal. Foram analisados 72 prontuários masculinos e 165 femininos. A frequência dos sintomas foi contabilizada da mesma maneira que os diagnósticos. Observou-se que 27,5% dos diagnósticos masculinos e 59,6% dos femininos podem ser considerados transtornos mentais comuns. Além disso, o perfil biométrico levantado aponta para a prevalência de mulheres, negras, pobres e domésticas como usuárias destes serviços. Discussão: questiona-se se tais diagnósticos apontam para um quadro médico ou se o que está ocorrendo é uma medicalização de mazelas sociais.
Article
Full-text available
Objetiva-se compreender a construção e as modificações da identidade de gênero masculina na Região Nordeste, com base no estudo das letras de forró. A partir das análises das canções como um território semiótico, o corpus da pesquisa conglomera letras de representantes icônicos, de cada período do forró, incluindo desde o compositor brasileiro Luiz Gonzaga até a contemporaneidade. Este corpus organiza-se nas categorias ‘Nordestinidade’, ‘Imagética Masculina’, ‘Imagética feminina’ e ‘Violência de Gênero’. Pode-se apreender que a identidade cultural do nordestino foi historicamente consolidada nos princípios patriarcais. Os discursos do forró comprovaram a adaptação desses preceitos às leis de mercado do mundo globalizado, levando, cada vez mais, a mulher a se perceber como mercadoria e a legitimar sua subordinação. Neste contexto, ressalta-se a relevância da compreensão dos símbolos culturais e de seu papel na construção das subjetividades masculinas e femininas no Nordeste brasileiro.
Article
Full-text available
The objective of this article is to propose, through bibliographical research, a discussion about which are the systemic and cultural mechanisms that promote the rape culture while protecting the rapist and canceling out the victim’s right. In a focusing sexual violence against the woman, we seek to observe which are the forms of symbolic violence which result in this kind of de violence. The idea is to deconstruct the popular, mythical, image of both victims and perpetrators, and, in doing so, clarifying our concept of rape. Once we clarify the status of both victims and perpetrators, we will be able to demonstrate how rape is above all one of the most widespread forms of gender violence.
Article
Full-text available
Gender violence, though global, is socially invisible, making it urgent for scientific production to stay ahead of this theme. A bibliometric study increases the demand for debates, by demonstrating that research is restricted to a few countries, ignoring the consequences of the damage and, despite expansion, still incipient. This article has the objective to describe the panorama of the scientific literature on gender violence, seeking to make a critical analysis on the magnitude of the demand. We sought articles in English, using the descriptors gender and violence, in the Web of Science database, from 1982-2012, excluding texts from specific areas, dealing with general violence or adopting "gender" instead of sex, resulting in 450 remaining articles. Bibliometry confirmed that women were more frequently in situations of violence, despite pointing to references of children and adolescents, as well as homosexuals and men. Research productivity in various areas of knowledge is growing, revealing its multidisciplinary nature. Only 26 countries hosted studies, a reduced number considering the scale of the problem. Most studies failed to address the consequences of gender violence, highlighting an important gap in scientific production. This research showed some points little explored by scientific production, and could serve as guidance for future studies.
Article
Full-text available
Objetivo: Analisar a sexualidade e as relações de gênero sob a ótica de adolescentes. Métodos: Estudo qualitativo realizado com dez adolescentes de escolas públicas de Fortaleza, CE. Os dados foram coletados no período de maio a junho de 2012 usando entrevistas semiestruturadas e analisados através da Análise do Discurso. Resultados: Os adolescentes trouxeram elementos discursivos que refletem os tabus que os cercam sobre a sexualidade e a marcada exigência de um comportamento estereotipado segundo os padrões regionais. A necessidade de autoafirmação masculina, a submissão feminina ante os desejos masculinos, a responsabilidade da mulher pela reprodução e o preconceito velado em relação à homossexualidade foram comuns nos discursos dos participantes, como uma extensão de suas realidades familiar e social. Esses padrões espelham um modelo hierárquico de relação de gênero que expõe homens e mulheres a situações de vulnerabilidade eternizadas por fatores socioculturais e que iniciam sua afirmação no período da adolescência. Conclusão: Desse modo, torna-se imperioso trabalhar as questões de gênero com esse grupo, mediante a exposição de novas perspectivas, visando mudanças de atitudes e convicções.
Book
In presenting this volume of anthropological essays under the title of Beyond textuality. Asceticism and violence in anthropological interpretation, the editors want to translate the basic ambiguity experienced today by anthropologists about the identity of their discipline, as well as the uncertainty surrounding the boundaries of the territory covered by ethnography. Anthropology has recently entered into an era of self-questioning regarding the specificity of its own methods and its autonomy as a discipline within the humanities and the social sciences. A deep current of interrogation lies at the confluence of three concerns that initially developed separately as answers to specific questions but which since seem to have merged together and created the context of uncertainty in which many anthropologists presently practice their discipline.
Article
One of the pioneers of gender studies in music, Ellen Koskoff edited the foundational text Women and Music in Cross Cultural Perspective, and her career evolved in tandem with the emergence and development of the field. In this intellectual memoir, Koskoff describes her journey through the maze of social history and scholarship related to her work examining the intersection of music and gender. Koskoff collects new, revised, and hard-to-find published material from mid-1970s through 2010 to trace the evolution of ethnomusicological thinking about women, gender, and music, offering a perspective of how questions emerged and changed in those years, as well as Koskoff's reassessment of the early years and development of the field. Her goal: A personal map of the different paths to understanding she took over the decades, and how each inspired, informed, and clarified her scholarship. For example, Koskoff shows how a preference for face-to-face interactions with living people served her best in her research, and how her now-classic work within Brooklyn's Hasidic community inflamed her feminist consciousness while leading her into ethnomusicological studies. An uncommon merging of retrospective and rumination, A Feminist Ethnomusicology: Writings on Music and Gender offers a witty and disarmingly frank tour through the formative decades of the field and will be of interest to ethnomusicologists, anthropologists, scholars of the history and development of feminist thought, and those engaged in fieldwork. Includes a foreword by Suzanne Cusick framing Koskoff’s career and an extensive bibliography provided by the author. © 2014 by the Board of Trustees of the University of Illinois. All rights reserved.
Article
Written against the academically dominant but simplistic romanticization of popular music as a positive force, this book focuses on the 'dark side' of the subject. It is a pioneering examination of the ways in which popular music has been deployed in association with violence, ranging from what appears to be an incidental relationship, to one in which music is explicitly applied as an instrument of violence. A preliminary overview of the physiological and cognitive foundations of sounding/hearing which are distinctive within the sensorium, discloses in particular their potential for organic and psychic violence. The study then elaborates working definitions of key terms (including the vexed idea of the 'popular') for the purposes of this investigation, and provides a historical survey of examples of the nexus between music and violence, from (pre)Biblical times to the late nineteenth century. The second half of the book concentrates on the modern era, marked in this case by the emergence of technologies by which music can be electronically augmented, generated, and disseminated, beginning with the advent of sound recording from the 1870s, and proceeding to audio-internet and other contemporary audio-technologies. Johnson and Cloonan argue that these technologies have transformed the potential of music to mediate cultural confrontations from the local to the global, particularly through violence. The authors present a taxonomy of case histories in the connection between popular music and violence, through increasingly intense forms of that relationship, culminating in the topical examples of music and torture, including those in Bosnia, Darfur, and by US forces in Iraq and Guantánamo Bay. This, however, is not simply a succession of data, but an argumentative synthesis. Thus, the final section debates the implications of this nexus both for popular music studies itself, and also in cultural policy and regulation, the ethics of citizenship, and arguments about human rights.