Available via license: CC BY-NC-ND 4.0
Content may be subject to copyright.
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
21
ENGENHARIA DIDÁTICA COM O TEMA INTEGRAÇÃO DE
FUNÇÕES NA VARIÁVEL COMPLEXA: ANÁLISES
PRELIMINARES, A PRIORI E MODELIZAÇÃO DE SITUAÇÕES
DIDACTICAL ENGINEERING WITH THE THEME INTEGRATION OF COMPLEX
VARIABLE FUNCTIONS: THE PRELIMINARLY ANALYSIS, A PRIORI AND
MODELIZATION OF SITUATIONS
Francisco Regis Vieira Alves
PGECM – IFCE – FORTALEZA - CE.
Resumo: O presente escrito aborda, discute e caracteriza as fases iniciais de um design de
investigação e pesquisa em Didática da Matemática, com um tema envolvendo o processo
matemático de integração de funções na variável complexa. Dessa forma, após a indicação de
fatores preocupantes no âmbito da Transição Complexa do Cálculo – TCC, bem como a
identificação de elementos de transição e elementos de ruptura no âmbito do seu ensino,
apresenta elementos fundamentais que consubstanciam a etapa de análise preliminar e análise
a priori e, logo em seguida, a concepção de situações-problema. Desse modo, ao assumir um
papel distinguido para a visualização como componente preliminar para a promoção de um
entendimento tácito e intuitivo para a noção simbolizada de modo standard por
()f z dz
, o
trabalho fornece e acentua um conjunto de elementos que não podem ser desconsiderados
numa transposição didática que se apoia na tecnologia atual e se mostra inspirada pela Teoria
das Situações Didáticas – TSD.
Palavras-chave: Engenharia Didática, Integração de Funções, Análise Complexa, Visualização.
Abstract: This writting addresses, discusses and caracterizes the early stages of a research design
in Didactics of Mathematics, with a theme involving the mathematical processs of integration of
complex variable functions. Thus, after the indications of worrying factors within the Transition
of Complex Calculus – TCC, and the identification of some transition and breaking elements
within the teaching context, presents fundamental elements that embody the preliminary
analysis stage and the a priori analysis and, shortly thereafter, the construction of some problem
of situations. Thus, to take a dintinguided conception of the visualization as preliminar
components for promoting an tacit and intuitive understanding for the standard symbolized
notions as
()f z dz
, the work provides and enhances a numbers of elements that can not be
disregarded in a didactical transposition that it is based on current technology and shows be
inspired in Theory of Didatical Situations – TDS.
Keywords: Didactical Engineering, Integration of Functions, Complex Analysis, Visualization.
1. Introdução
Reconhecidamente, o período de estudos que marca a transição do contexto escolar para
o contexto acadêmico, quando nos atemos à formação em conhecimentos científicos
matemáticos, se mostra marcado por uma série de fatores preocupantes, envolvendo exigências
fregis@ifce.edu.br
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
22
inéditas aos aprendizes. Por outro lado, acentuamos ainda uma preocupação com outra espécie
de transição que, em nossa realidade dos cursos de graduação, quer sejam de licenciatura ou
bacharelado, demandam uma exigência temporal que necessita de anos na academia para
findar com sua conclusão.
De modo preciso, nos interessamos pelo período de contato dos estudantes com o
processo de integração de funções, desde o primeiro estágio, quando lidam com funções na
variável real, passando pelo trato de funções em várias variáveis e, finalmente, deparam um
corpus teórico que permite a descrição de objetos e processos matemáticos na variável
complexa. Ou ainda, expressando por uma via notacional, consideraremos a figura abaixo, que
envolve significados cifrados e não evidencia ou indica mudanças conceituais e propriedades
modificadas, em certos casos; invariantes em outros casos e, em decorrência da mudança
notacional, propriedades matemáticas generalizadas.
Figura 1. Transição simbólico conceitual para o caso do processo matemático de integração
(elaboração do autor)
Logo após enfrentar um processo de transição da escola para a academia, em que os
estudantes deparam, inclusive, um pensamento científico e a mudança de rigor, novas
exigências e habilidades, se mostram condicionadas pela mudança simbólico-conceitual. Dessa
forma, quando tomamos como referência um corpus teórico, característico da teoria das
funções em uma variável real, em várias variáveis e, ainda, da teoria das funções na variável
complexa, a figura 1 evidencia uma demarcação de nosso interesse preliminar que busca
discutir, explicitar e apontar um processo de “transição interna”, ao decorrer dos estudos
compulsórios acadêmicos que, nas universidades brasileiras, como já mencionado, podem
demandar/concorrer alguns anos. Dessa forma, diante deste contexto de discussão,
descreveremos uma Engenharia Didática com o tema envolvendo o processo de integração de
funções na variável complexa.
Indicaremos, todavia, a perspectiva de alguns escritos científicos que pretendem alertar
para os entraves e obstáculos no âmbito da Transição Complexa do Cálculo – TCC e, dessa forma,
sem mais delongas, acentuaremos elementos apontados por tal perspectiva, com ênfase ao
processo de integração de funções do tipo
( ) u(z) iv(z)fz
.
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
23
2. Transição Complexa do Cálculo
De modo prosaico, identificamos fatores que podem atuar de modo benéfico para o
processo de ensino e da aprendizagem, bem como, outros elementos que podem dificultar,
atrasar e, mesmo, bloquear o processo de elaboração de conhecimentos relativos ao contato
com funções da variável real para o contexto de funções na variável complexa. Seguindo um
pensamento semelhante ao caso da Transição Interna do Cálculo – TINC discutido por Alves
(2011; 2014a; 2014c; 2014d) em sua tese, indicaremos duas classes de fatores: (i) elementos de
transição; (ii) elementos de ruptura.
Com um ponto de vista semelhante ao caso da TINC (ALVES, 2011; ALVES, BORGES NETO
& ALVES DIAS, 2012) podemos afirmar que os elementos de transição envolvem uma natureza
que permite ao aprendiz readaptar, generalizar, manter ou aprofundar seus conhecimentos, na
medida em que verificamos a mudança da variável
0x x i z x iy
. Por outro lado, o
conjunto (ii) envolve fatores cuja natureza dificulta, retarda ou mesmo impede uma readaptação
dos conhecimentos apreendidos no Cálculo Integral em uma variável real para o Cálculo Integral
na variável complexa, passando pelo Cálculo em várias variáveis.
Isso posto, sem considerar de modo pormenorizado uma profusão de exigências impostas
aos estudantes, segundo nosso expediente, indicado na figura 1, vemos a descrição de aspectos
que carecem de vigilância quando vislumbramos a seguinte transição
( ) ( )
transição
b
af x dx f z dz
(*). Sua identificação deverá nos auxiliar na constituição e
processo acumulativo de saberes didáticos e metodológicos, tendo em vista o ensino de Análise
Complexa – AC (ALVES, 2014b; 2014c; MARINHO & ALVES, 2016). De modo sistemático,
relativamente ao que indicamos em (*), apontamos:
- A concepção geométrica da integral definida como uma área abaixo de uma curva do
tipo
()y f x
não é preservada no estudo das funções do tipo
( ) u(z) iv(z)fz
;
- A definição do cálculo da integral num intervalo
[ , ]a b IR
é substituído por uma noção
mais geral abstrata, envolvendo a determinação da integral na variável complexa, sobre uma
curva, suave, por partes, orientada no sentido anti-horário, no plano complexo;
- Para funções que admitem primitiva, no caso da variável real teremos que existe uma
()Fx
, de modo que
'(x) f(x)F
, para
x [ , ]a b IR
. Por outro lado, segundo as mesmas
condições, podemos esperar uma simbologia e condição semelhante no caso da variável
complexa, entretanto, nesse último caso, o símbolo da derivada em cada ponto não poderá ser
mais entendido pelos estudantes como o valor numérico da declividade de uma reta tangente
ao gráfico de
()fz
, que simbolizamos por
'(z) f(z) f(x iy)F
;
- No processo indicado em (*), os estudantes passam a se preocupar com dois processos
matemáticos de integração, como condicionado pelo seguinte particular sistema notacional;
Real Parte Imaginária
( ) ( ( ) ( ))( ) (u(z)dx v(z)dy) (v(z)dy v(z)dx)
Parte
f z dz u z iv z dx idy i
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
24
- O resultado do processo de integração segundo Riemann, na variável real, pode ser
indicado por
()
b
af x dx IR
, todavia, na variável complexa, pode ocorrer que
()f z dz C
, posto que, não tem sentido o símbolo
ou
em
C
;
- O domínio de integração de uma função de uma variável real é um subconjunto da reta,
enquanto que o domínio de integração de uma função em duas variáveis reais é um subconjunto
do
2
IR
, todavia, o domínio de integração de uma função na variável complexa é uma linha ou
um caminho no plano complexo;
- O Teorema Fundamental do Cálculo estudado na variável real, sob devidos ajustes,
permanece válido na passagem para a variável complexa.
Assinalamos que, em dependência das características da transposição didática
(CHEVALARD, 1991) que busquemos implementar em sala de aula, os elementos listados há
pouco podem atuar como elementos de transição de natureza epistemológica, histórica,
metodológica ou cognitiva. E, de modo similar, podem se manifestar como elementos de
ruptura de natureza epistemológica, histórica, metodológica ou cognitiva.
Ora, podemos identificar um elemento de ruptura de natureza histórica e epistemológica
a partir das ponderações de Shokranian (201, p. 143) ao recordar que:
Na teoria das funções reais, originalmente, a integração foi usada para calcular a
área de uma figura geométrica ou o volume de um sólido. Diferentemente, na
variável complexa, a teoria da integração é uma ferramenta para estudar funções
analíticas, tais como os Teoremas de Cauchy e outros que mostraremos. Por outro
lado, uma das aplicações fundamentais das integrais das funções complexas é
também o cálculo das integrais definidas de uma variável real [...]
Com arrimo do excerto anterior, constatamos um teor abstracionista mais elevado,
quando comparado aos primeiros rudimentos do Cálculo (BOYER, 1949; BOURBAKI, 1984).
Nesse sentido, vale apreciarmos a abordagem clássica formalista de Neto (1993), quando
considera uma 1-forma diferencial
( ) ( )A z dx B z dy
contínua num conjunto aberto
U
. Define, então, a integral abstrata de
ao longo de um caminho de classe
1
C
como
sendo o número complexo
, em que
( ) ( ) ( )t t i t
, com
[ , ]t a b
.
Por outro lado, quando nos atemos ao processo de integração segundo Riemann, nos
parece claro que o principal alvo diz respeito à determinação de uma área. Não obstante, no
caso da integração complexa, o processo é revertido (NEEDHAM, 2000, p. 383). Com efeito,
Needham (2000, p. 383) observa que a ideia é generalizar a noção de integrais no campo dos
reais e, depois disso, “nos questionamos o que criamos!”.
O autor considera uma função
()fz
e descreve, segundo sua perspectiva, a integração
complexa entre os pontos indicados na figura abaixo por a e b. Temos ainda uma curva no plano
ligando tais pontos. Needham (2000, p. 384) explica que “a curva K faz o mesmo papel dos
( ( )) '( ) ( ( )) '( )
b
aA t t B t t dt
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
25
intervalos de integração segundo Riemann.”. Particionamos, pois, a curva K em pequenos passos
i
que, convenientemente, escolhemos de mesmo comprimento (ao lado esquerdo). Na figura
2 divisamos os vetores de comprimentos
i
indicados pelo autor. Note-se ainda a variação que
ocorre na direção em cada passo
1ii
.
Figura 2. Descrição de uma curva K ligando os pontos a e b no plano complexo (NEEDHAM,
2000)
Needham (2000, p. 384) distingue o processo de integral segundo Riemann na variável
real do processo de integração complexa. No primeiro caso, preservamos sempre a mesma
direção dos vetores (na direção do eixo Ox), enquanto que, na figura 2 (ao lado esquerdo),
observamos as variações angulares na direção, que Needham indica por
i
. De fato, a fim de
descrever uma soma de Riemann, tomamos de modo aleatório os elementos
i
z
, de cada
pequeno segmento em K e formamos a seguinte expressão
()
ii
fz
. Finalmente, fazemos
crescer os números, fazendo com que os elementos
i
se aproximem de K. A expressão
semelhante à soma de Riemann tenderá a um valor limite (na condição em que
f
seja
contínua). Seu valor será denotado por
()
K
f z dz
.
Needham (2000, p. 384) indica vários elementos que encerram semelhança com o caso
real. Por exemplo, podemos obter uma expressão aproximada da integral, sem passar ao limite,
tomando os pontos médios dos segmentos em K.
Tal processo é descrito na figura 2. Neste modo especial de aproximação para a soma de
Riemann, o autor denota seu resultado por
M
R
. O autor desenvolve uma argumentação que
permite/possibilita o entendimento geométrico particular para
M
R
(ver na figura. 3). Na figura
2, divisamos a imagem de K por intermédio de
()z w f z
e a somação passa a ser indicada,
então, na figura 3, por intermédio de um processo construtivo de aproximação.
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
26
Figura 3. Needham (2000) indica o significado geométrico do resultado de um processo de
integração na variável complexa
De modo particular, na figura 3, notamos
()
i i i
z w f z
. Assim, o termo
correspondente em
M
R
será então
i i i
w
. E, “escolhemos pensar sobre ele como uma seta
resultado da interação de
i
w
sobre
i
(NEEDHAM, 2000, p. 384). Para concluir, a abordagem
de autores como Needham (2000), Polya & Latta (1974) e Wergert (2012) pode ser contrastada
com outras que tornam hegemônico um trato formal e analítico (CECÍLIA & BERNADEZ, 2008;
CONWAY, 1978; FLANINGAN, 1972; LINS NETO, 1993; GONG, 2001; RUDIN, 1986;
SCHWERDTFEGER, 1979; SOARES, 2014; SHOKRANIAN, 2011).
No próximo segmento, tendo em vista a eleição de uma problemática no âmbito de
ensino que tencionamos discutir, trazemos ao leitor uma apreciação sobre alguns aspectos de
uma modalidade ou design de investigação e pesquisa no campo da Didática da Matemática sob
forte influência da vertente francesa.
3. Engenharia Didática - ED
Como consequência da organização científica e a sinergia implementada na França,
sobretudo no final dos anos 60 e, com maior proeminência, entre as décadas de 80 e 90,
constatamos a demarcação e a evolução, graças a um processo cumulativo de escritos
científicos, da pesquisa em Didática da Matemática (BROUSSEAU, 1986; 1988; 1994). Tal
vertente de estudos adquiriu um substrato científico em decorrência, originalmente, do
interesse em torno dos fenômenos relacionados com o ensino e a aprendizagem em
Matemática, em seus diversos níveis (DOUADY, 1995a; 1995b).
Desse modo, uma profusão de trabalhos permitiu a consolidação e a demarcação de um
campo de estudos, bem como a evolução de um design de investigação cientifica, que se apoiou
numa metáfora que remete a um planejamento sistemático de um engenheiro, tendo em vista
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
27
a concepção e ajuste de um projeto preciso. Desse modo, a terminologia Engenharia Didática –
ED foi usada para designar um modus operandi de investigação ou ainda como “uma
metodologia para a análise de situações didáticas” (BRUM & SCHUHMACHER, 2013) e, também
Trata-se de etiquetar, de certa forma, uma forma de trabalho didático, comparável ao do
engenheiro, para realizar um projeto preciso, se apoia sobre diversos conhecimentos
científicos de seu domínio, aceita a se submeter a um controle do tipo científico e, ao mesmo
tempo, se encontra obrigado a trabalhar com objetos mais depurados da ciência [...]
(ARTIGUE, 1996, p. 243)
A constatação da ED como metodologia de pesquisa se caracteriza como um esquema
experimental baseado num conjunto de experimentações e realizações didáticas em sala de
aula. Artigue (1996, p. 247) indica as seguintes etapas: concepção, realização, observação e a
análise de sequências de ensino. Mas, do ponto de vista da ação experimental e tempo
investigativo, Artigue distingue ainda: (1) fase de análises preliminares; (2) fase de concepção e
análise a priori das situações didáticas; (3) experimentação e, por fim, (4) análise a posteriori e
validação de todo aparato construído.
No presente escrito restringir-nos-emos aos itens (1) e (2) há pouco indicados. Desse
modo, na medida em que indicaremos um problema ou entrave, efetuamos “o primeiro passo
para uma Engenharia Didática” (DOUADY, 2008, p. 2). Isso posto e tendo como cenário de
apreciação a Transição Complexa do Cálculo - TCC, indicaremos a relevância da seguinte
problemática: Os estudantes manifestam dificuldades para o entendimento geométrico do
processo de integração de funções na variável complexa.
Ora, os entraves apontados na literatura no Cálculo em uma Variável Real – CUV e no
Cálculo em Várias Variáveis – CVV (ALVES, 2011) se mostram de natureza variada, todavia,
desenvolveremos nosso expediente no sentido de extrair implicações para o ensino de AC e,
desde que, o entendimento geométrico (ALVES, 2016a; 2016b; 2016c; 2016d) deverá assumir
posição de destaque com o escopo de perspectivarmos elementos capazes de formularmos mais
conhecimentos didáticos sobre o tema, discutiremos a exploração de um software (GeoGebra),
tendo em vista a concepção, descrição e proposição de situações didáticas (BROUSSEAU, 1986).
Tendo em vista os problemas de ordem epistemológica, identificados nas seções
anteriores, e outros enquadrados no mesmo jaez, elegemos a seguinte questão de investigação:
Como conceber situações didáticas para o ensino do processo de integração na variável
complexa tendo em vista evitar ou, pelo menos, diminuir o efeito dos elementos de ruptura e
acentuar o papel de elementos de transição?
Dessa forma, indicamos as seguintes hipóteses de investigação: (a) uma mediação afetada
pelo uso do software proporciona elementos que estimulam a mobilização de uma raciocínio
apoiado na visualização e proporciona a compreensão de conceitos em AC; (b) o software
proporciona um entendimento sobre o resultado (significado) final do processo de integração
na variável complexa; (c) o software permite um entendimento do processo construtivo de
elaboração das somas de Riemann que definem a integral
()
K
f z dz
.
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
28
4. Análises Preliminares
Dois elementos devem ser evidenciados nessa etapa de acordo com Almouloud (2007, p.
172), a saber: (i) estudo da organização matemática; (ii) análise didática do objeto matemático
escolhido. Relativamente ao primeiro item, indicamos a relevância do entendimento do
processo matemático de integração, desde os seus rudimentos na variável real e, alguns séculos
depois, a busca pela sua generalidade e consistência das estruturas construídas em que foram
estabelecidas os fundamentos da teoria das funções na variável complexa (BOTTAZZINI, 1986;
BOTTAZZINI & GRAY, 2013; GRAY, 2015; DEBNATH, 2015; HAIRER & WANNER, 2008; MEDVEDEV,
1991; SCHUBRING, 2005).
Outrossim, no que concerne o entendimento do ensino atual, por intermédio de uma
apreciação preliminar de alguns compêndios da área (SOARES, 2014), podemos depreender que
o trato analítico, formalizante e estrutural, continua hegemônico, enquanto que, apesar de em
menor quantidade, deparamos autores que assinalam o componente heurístico do assunto
(KRANTZ. 1990; NEEDHAM, 2000; POLYA & LATTA, 1974). No que concerne ao item (ii), não
pretendemos realizar uma análise de diferentes instituições de ensino em que o saber ou
assunto integração de funções na variável complexa deve ser ensinado, tendo em vista a
possibilidade da compreensão do tratamento institucional do assunto. Nem muito menos
tencionamos desenvolver uma análise de propostas curriculares, como assim indica Almouloud
(2007, p. 172).
5. Análise a priori
A presente etapa, seguindo o procedimento standard das investigações dessa vertente,
busca responder às questões levantadas e validar, refutar ou modificar as hipóteses indicadas
há pouco. Por intermédio de um apelo mnemônico, Brum & Schuhmacker (2013) indicam os
elementos essenciais da fase atual. E, dando continuidade, “o pesquisador deve elaborar e
analisar uma sequência de situações-problema” (ALMOULOUD, 2007, p. 174).
Ademais, “as situações-problema devem ser concebidas de modo a permitir ao aluno
agir, se expressar, refletir e evoluir por iniciativa própria, adquirindo assim novos
conhecimentos” (ALMOULOUD, 2007, p. 174). Por fim, na etapa da análise a priori, de acordo
com as características de cada situação proposta, podemos prever o comportamento dos
alunos, o que se coaduna com o que prevê Artigue (1995).
Desse modo, exploraremos situações relacionados com o uso da noção de integral de
linha que, de modo geral, registramos sua abordagem, por partes dos compêndios
especializados, com ênfase hegemônica no viés eminentemente algébrico, formal e
estruturante (ALVES, 2015). Na próxima seção assumiremos um ponto de vista importante que
deverá envolver a noção de concepção que, de acordo com Artigue (1990, p. 265) se caracteriza
por “colocar evidência uma pluralidade de pontos de vistas possíveis sobre um mesmo objeto
matemático, distinguir suas representações e os modos de tratamento que são associados ao
mesmo, colocar em evidência sua adaptação mais ou menos eficaz a uma resolução de um ou
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
29
vários problemas”. Sob tal perspectiva, defendemos melhores condições do alcance de objetivos
e confirmação/confrontação de hipóteses, caso o aparato conceitual a ser construído seja
aplicado eventualmente em sala de aula.
6. Concepção e modelização das situações
De maneira semelhante ao destacado por Artigue (2008, p. 4-5), em nosso caso, o uso
da ED e da TSD, na fase de experimentação, deve proporcionar uma prática controlada na
intervenção em sala de aula, de modo que, o pesquisador-professor, em consonância das
variáveis micro-didáticas (ver figura 2) eleitas nas duas fases iniciais da ED, consiga predizer as
reações dos aprendizes e interpretar os sentidos produzidos pelo grupo controle. Dessa forma,
apresentamos nossa primeira situação.
Figura 2. Brum & Schuhmacker (2013, p. 70) vislumbram os elementos essenciais cotejados na
análise a priori de um ED e seu encaminhamento
Situação-problema I: Dados os vetores no plano complexo
a
e
b
e, considerando um
caminho
suave por partes, orientado no sentido anti-horário que une os dois vetores, decidir
o comportamento de convergência/divergência da seguinte integral
z
e dz
.
Comentários: A situação anterior deve transmitir o significado geométrico relacionado
com a noção do processo de integração na variável complexa. Os números complexos são
tratados como vetores! Ademais, com recurso ao software, os estudantes podem vivenciar um
clima de investigação e debate em sala de aula em torno dos significados mobilizados e
identificados por intermédio da visualização e processo construtivo da integral.
Situação de ação. Os alunos devem ser orientados em acessar uma planilha eletrônica
do software Geogebra. Assim, devem considerar os vetores
a
e
b
no plano complexo. Logo em
seguida, criamos o vetor u=Vector[a,b]/10+0*i. Daí, os alunos são estimulados a pensar num
caminho, o mais simples possível, que une os vetores tomados inicialmente. Tais vetores
deverão ser pensados como os seguintes elementos
i
, com
1 10i
e, com origem na janela
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
30
do software GeoGebra, criamos uma listagem na coluna A inserindo valores de 0 até 11 (ver
figura 4, ao lado direito).
Estimulamos os estudantes na descrição da coluna B e devem tomar B1 = a e B2= B1 +
u
. Na figura abaixo divisamos o resultado da construção a ser implementada pelos estudantes.
Sendo assim, na mesma figura, ao lado direito, listamos os pontos B1, B2, B3,...,B11. Por
conseguinte, os estudantes devem criar o seguinte vetor, na coluna C, dado por
C2=vetor[B1,B2]. Na listagem fornecida pelo software, os estudantes devem buscar a janela
“preferências” e modificar a forma matricial indicada pelo software para a forma standard de
descrição de um número complexo (ver figura 5, ao lado direito). Na figura abaixo divisamos
uma construção correspondente com a função
() z
f z e
.
Figura 4. Visualização do processo de integração de uma integral definida na variável complexa
(elaboração do autor)
Em seguida, na figura 5 ao lado direito, os alunos devem visualizar os vetores que
desempenham o papel dos elementos
i
. Todas as coordenadas devem ser descritas como
números complexos e, facilmente, o software permite tal alteração dinâmica e interativa.
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
31
Figura 5. Escolha de um caminho que liga os vetores
a
e
b
no plano complexo e valores
numéricos associados ao processo de integração (elaboração do autor)
No passo seguinte, descrevemos a coluna D. Assim, os alunos devem definir D2= =B2-
u/2 (ver figura 6, ao lado esquerdo). E, após isso, passam a descrever o comportamento da
função (contínua) integranda
() z
f z e
, através da definição dos valores na tabela E, indicados
pela expressão E2=e^D2. No que segue, os alunos devem arrastar a célula escolhida até a
posição A11 (ver figura 6, ao lado direito).
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
32
Figura 6. Visualização da escolha dos elementos da partição no caso da variável complexa
(elaboração do autor)
Para concluir e em sintonia com o modelo das somas de Riemann, o professor deverá
orientar os estudantes na avaliação de expressões do tipo
()
ii
fz
e, em seguida, prever o
comportamento da somação indicada por
11
1()
ii
ifz
. Ora, para isso, eles devem descrever a
coluna F2, ao indicar os elementos do tipo F2=E2*C2. E, para designar a soma de Riemann
anterior, os alunos são orientados em assumir G1=0+i*0 e G2=G1+G2 (ver figura 7 e 8).
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
33
Figura 7. Visualização dos vetores indicados na representação da soma de Riemann
(elaboração do autor)
Figura 8. Visualização e descrição geométrica da noção de integral na variável complexa por
intermédio da descrição vetorial de um número complexo (elaboração do autor)
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
34
Situação de Formulação. Almouloud (2007, p. 38) esclarece que, neste momento, a troca
de informações e mensagens entre os aprendentes é imprescindível. Ademais, o resultado do
debate e da dialética “permite criar um modelo explícito que pode ser formulado com sinais e
regras comuns”.
Nesse caso, o professor deverá estimular a adoção de um sistema particular simbólico
que proporcionará a descrição dos elementos conceituais assinalados na fase dialética anterior.
Desse modo, ao admitirem que
0ai
e
10bi
. Logo em seguida, tendo em vista um
caminho parametrizado que liga os vetores anteriores, podem assumir que
( ) (1 ) (0,1) (1 t)(1,0) (1 t,t)t t a t b t
, com
01t
, orientado no sentido anti-
horário e une os pontos
(0) b
e
(1) a
. Pelo intermédio da definição de integral de linha,
formulam o seguinte expediente notacional:
1
0
( ) ( ( )) '( )f z dz f t t dt
1 1 1
( ) (1 ) (1 ) (1 )
0 0 0
( 1,1) ( 1,1) cos( ), ( ) ( 1,1)
t t it t t
e dt e dt e t e sen t dt
1 1 1
(1 ) (1 ) (1 ) (1 )
0 0 0
( ) cos( ) ( ) cos( )
t t t t
e sen t e t dt e sen t dt e t dt
.
Reparemos acima, por exemplo, a seguinte integral
1(1 )
0()
t
e sen t dt
, indicada
agora na variável real. Antevemos que os estudantes poderão empregar algum método standard
de integração, por exemplo, o método da substituição por partes (ALVES & LOPES, 2013). Os
valores numéricos deverão ser confrontados com os dados obtidos quando a resolução evolui
apenas com o uso da variável complexa, o que proporciona elementos para a testagem das
hipóteses (b).
Situação de validação. Na fase atual, diferentemente da estratégia anterior,
empregaremos apenas o modelo na variável complexa. Por outro lado, recordamos que,
diferentemente da etapa anterior, se mostra necessário “provar o que foi afirmado na fase
anterior” (ARTIGUE, 1984, p. 7 – 8).
Desse modo, teremos
1 *0 1
1
1 *0
ii
z z z i i
i
e dz e dz e e e e e
. Nesse
caso, os estudantes podem empregar ainda o Teorema Fundamental do Cálculo na versão da
variável complexa, levando em consideração que a função
() z
f z e
é infinitamente
diferenciável. Podemos notar que
0 1 0 cos(1) (1) 0,54 0,84
i
e e isen i
e que
2,72 0,54 0,84i 2,18 0,84i
zi
e dz e e
. Reparemos que tal valor deve ser
confrontado/comparado com a construção que exibimos na figura 8!
Situação de institucionalização. A última fase é marcada por uma ação metodológica
que visa fazer aderir a um conhecimento local, mobilizado pelos estudantes nas fases anteriores,
uma categoria de um saber científico, revestido de um caráter a ser incorporado ao repertório
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
35
dos saberes científicos que o grupo deve possuir, e que se apresentam condicionados por uma
determinada instituição.
Por essa via, o conhecimento matemático que o expert deverá convencionar ou fixar
(ARTIGUE, 1984, p. 8), seguindo os rituais acadêmicos, o estatuto cognitivo de um novo saber,
rico em relações conceituais e, como apontamos, inclusive com relações com a Análise
Complexa. Em nosso caso, discutimos o comportamento numérico da integral
z
e dz
, cuja
função integranda indicamos por
() z
f z e
se mostra contínua e infinitamente diferenciável,
portanto, a integral
z
e dz
será convergente e, pelo Teorema Fundamental do
Cálculo, versão complexa, seu valor deverá depender apenas dos pontos final e inicial que jazem
sobre uma curva
()t
.
Outrossim, a mediação anterior buscou enfatizar um processo construtivo de
elaboração da integral anterior, semelhante ao caso da integral de Riemann, com recurso no
software. Os elementos coligidos nessa sessão auxiliam na testagem da hipótese (a) e (b).
Situação-problema II: Dados os vetores no plano complexo
a
e
b
e, considerando um
caminho
suave por partes, orientado no sentido anti-horário que une os dois vetores no
primeiro quadrante delimitado por uma circunferência. Decidir, pois, o comportamento de
convergência/divergência da seguinte integral
2
z dz
. Comentários: O aspecto diferenciado
relativamente ao caso anterior diz respeito da opção por um caminho mais geral, neste caso,
uma circunferência. Ademais, os passos construtivos de elaboração da integral são repetidos,
com ligeiras modificações, sobretudo, na descrição das colunas B e D (ver figura 9).
Situação de ação. Mais uma vez, assumiremos um papel fundamental para a visualização
(ALVES, 2014a) tendo em vista a identificação e a percepção de propriedade qualitativas e, dessa
forma, promovemos um cenário de aprendizagem propício ao alcance dos objetivos e hipóteses
escolhidas nas seções precedentes.
Dessa forma, no momento inicial, orientamos nossos alunos escolher um caminho
diferente, por exemplo, sobre uma circunferência. Assim, eles devem tomar A1=0+i*0 e
A2=pi/64. Logo em seguida, selecionar A1 e A2 e arrastar a célula, ao longo da coluna A, até a
posição A33. Em seguida, devem tomar o vetor B1=(2;A1) e, com auxílio do software, efetuar
sua conversão como número complexo e listar todos os elementos até a posição B33, repetindo
o processo anterior.
Depois, para a descrição da coluna D, os alunos devem ser orientados a determinar
D2=(2;A1+pi/128) e arrastar tal vetor até a posição D33. Após isso, os estudantes precisam
descrever os valores assumidos pela função correspondentemente à partição que tomamos
inicialmente que, nesse caso, descrita por
2 2 2 2
( ) ( ) ,2f z z x iy x y xy
.
Dessa forma, devem descrever E2=D2*2 e arrastar o cursos sobre a célula até a posição
E33. E, para a elaboração das colunas F e G, repetem o raciocínio e procedimento de construção
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
36
empregado na primeira situação. Por fim, com o intuito de visualização a representação
geométrica e numérica para a integral
22
( ) ( )z dz x iy dx idy
com
20ai
e
02bi
determinam o vetor G34=vetor[G1,G33]. O efeito final pode ser
vislumbrado e explorado pelos estudantes na figura abaixo.
Situação de formulação. Com explicamos na fase dialética anterior, os alunos devem se
apropriar de um sistema notacional que deve proporcionar a homogeneização da comunicação
entre o grupo. Ademais, como acentua Artigue (1984, p. 7) prevemos que “o aluno poderá
justificar suas escolhas, todavia, a situação não exige”.
Desse modo, desde que
2
0
( ) ( ( )) '(t)dtf z dz f t
, aonde
( ) (2cos( ),2 ( ))t t sen t
indica uma circunferência que passa pelos pontos
20ai
e
02bi
, para os parâmetros correspondentes a
0t
e
2
t
. Nesse caso,
escrevemos
Ora, o problema a ser enfrentado envolve a mobilização de antigos saberes. Com efeito,
as integrais do tipo
2 2 2
22
0 0 0
cos (t)sen(t) , sen (t) , cos(t)sen(t)dt dt dt
constituem
saberes que se inserem como pré-requisitos e se inserem num conjunto de técnicas de
integração aprendidos no estudo do CUV.
Situação de validação. Diferentemente da etapa anterior, se mostra necessário “provar
o que foi afirmado na fase anterior” (ARTIGUE, 1984, p. 7 – 8).
Semelhante ao caso anterior, preservando o sistema notacional na variável complexa,
teremos
que pode ser visualizado como um vetor (na cor vermelha), na figura 9 (ao lado esquerdo). Desse
modo, os alunos podem vislumbrar a interpretação geométrica e numérica do processo de
2
3
22
22
88
( ) 2,67 2,67
3 3 3
i
izi
f z dz z dz i
22
00
2 2 2
2 2 2 2
0 0 0
2
0
( ) ( ( )) '(t)dt 4cos(t) 4sen(t),8cos(t)sen(t) ( 2 ( ),2cos( ))dt
8cos(t)sen(t) 8sen (t) 16cos (t)sen(t) 16 cos (t)sen(t) 8 sen (t)
8 cos(t)sen(t)
f z dz f t sen t t
dt dt dt
dt
2 2 2 2 2 2
2 2 2 2
( y 2 xyi)( ) y 2 ( y ) 2
( ) 2 2
x dx idy x dx xyidx i x dy xydy
x y dx xydy i x y dy xydx
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
37
integração e o professor-pesquisador poderá deparar a obtenção de dados para a testagem da
(c).
Figura 9. Visualização de integrais definidas na variável complexa com o software GeoGebra
(elaboração do autor)
Situação de institucionalização. Nessa fase, os alunos deverão desenvolver um olhar de
transição que envolve a modificação do status de instrumento matemático para objeto. Dessa
forma, a atividade atual deve instigar a comparação dos resultados obtidos pelo modelo
computacional com o modelo analítico característico da AC. O aspecto diferenciado, que
defendemos em nossa abordagem, diz respeito ao amparo e a confirmação das ilações
produzidas nas fases anteriores por intermédio da experimentação e comparação dos
resultados matemáticos, do ponto de vista gráfico, numérico e analítico.
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
38
Para concluir a sessão atual, acentuamos que as variáveis didáticas (locais) que devem
ser identificadas nas situações anteriores, dizem respeito aos seguintes aspectos: o
entendimento de um processo construtivo da integral de funções na variável complexa,
semelhante ao caso das funções da variável real; distinção e entendimento do resultado final do
processo de integração na variável real (um número) do resultado final de uma função na
variável complexa (um vetor); domínio e habilidade na mudança notacional de funções do tipo
( ) ( ) ( ) (x,y) (x,y) (x,y) ( ) ( ) ( )f z u z i v z f u i v f z u z i v z
; o
software GeoGebra permite a exploração de um sintaxe particular e sua significação
matemática; as estratégias partem inexoravelmente do ambiente de exploração computacional
(situação de ação) e evoluem, tendo como escopo o emprego de modelos formais e, por fim,
devem se confrontados com os elementos coligidos na fase de validação do modelo
matemático.
Portanto, diante da problemática declarada ao decurso de nosso estudo, por intermédio
de uma mediação afetada pela tecnologia, que busca enfatizar a visualização como elemento
impulsionador de um tirocínio intuito e tácito, as eventuais dificuldades e entraves relacionados
ao entendimento geométrico da noção de integração na variável complexa podem ser reduzidas
ou, mesmo, evitadas.
7. Alguns elementos na validação de ED
No bojo das preocupações do professor-pesquisador com as respectivas produções do
estudantes são previstas, numa ED, uma etapa de validação interna da sequência didática, bem
como uma etapa de validação externa. A primeira envolve “uma descrição genérica da classe ou
das condutas e tipos de produção majoritárias na classe, estudo de sua evolução e verificação
de sua adequação no que concerne ao esperado dos estudantes” (LABORDE, 1997, p. 105).
Laborde (1997, p. 105) explica que a validação externa envolve uma comparação das produções
dos estudantes antes ou ao longo da sequência, ou ainda após experimentação em sala, o que
pode ocorrer por meio de entrevistas individuais ou em grupo, bem como por meio de
questionários. E, também, por meio da comparação de produções externas, envolvendo outros
alunos não submetidos à mesma sequência estruturada de ensino, ou ainda dados provenientes
de outros estilos de investigação.
Cabe observar que todas as produções dos estudantes devem possuir, segundo nossos
pressupostos, um forte componente apoiado pela visualização e nas correlações entre os
quadros analítico e numérico proporcionados pelo software, bem como pelo modelo
matemático subjacente. (ver figuras 10 e 11). Logo abaixo trazemos alguns exemplos que
possibilitam uma exploração dinâmica e não estática do processo de integração na variável
complexa. Em todos os casos, o processo matemático final resulta na determinação ou produção
de um vetor que pode ser alterado (arrastado) por intermédio de comandos elementares do
software GeoGebra.
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
39
Figura 10. Visualização de integrais definidas na variável complexa com o software GeoGebra
(elaboração do autor)
Na figura 11 trazemos ainda algumas construções elementares e que, segundo as
potencialidades dos softwares, possibilitam um raciocínio comparativo e conceitual, quando
lidamos com o processo de integração na variável real e, logo ao lado direito, divisamos o
resultado de um processo de integração na variável complexa. O cenário de aprendizagem
abaixo deverá convencer o leitor sobre as diferenças de ambos os processos e, sobretudo, o
caráter de generalidade do segundo caso (ao lado direito).
Ademais, não podemos desconsiderar as advertências de Artigue (1995, p. 49), quando
explica que “na maioria dos textos publicados concernentes às engenharias, a confrontação das
análises, a priori e a posteriori, permite a aparição de distorções”. E, pouco mais adiante, a
autora aponta a ocorrência da formulação de hipóteses demasiadamente globais, “que colocam
em jogo processos de aprendizagem demorados”, fato que impossibilita uma sintonia
pretendida com a amplitude da ED proposta.
Em nosso caso, quando nos debruçamos nas três hipóteses aqui formuladas, notamos
que parte delas possuem uma caraterística de adequação, segundo preconiza Artigue (1995, p.
49º, entretanto, outras envolvem e exigem a proposição de outras investigações que
ultrapassam os limites de nossa discussão, não obstante, com as características aqui discutidas,
nosso projeto de engenharia deverá levar em consideração “os registros dos estudos de caso,
nos quais, a validação é essencialmente interna” (HADDAD, 2012, p. 19). Por conseguinte, as
etapas de intervenção podem levar em consideração um pequeno grupo de estudantes e um
período temporal não prolongado de experimentação.
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
40
Figura 11. Descrição não estática do processo de integração com o software GeoGebra
(elaboração do autor)
8. Considerações Finais
Nas seções precedentes apresentamos os elementos que entendemos ser os mais
representativos para o ensino no âmbito da TCC, com o escopo de evitar determinados rituais
indefectíveis no locus acadêmico que, em maior ou menor substância, tendem a fornecer aos
estudantes teorias estruturantes, logicizadas e formais, desconsiderando possíveis vestígios
históricos evolutivos de um pensamento provisório e intuitivo.
Em nosso caso, a presente proposta de ED, como o tema relacionado com o
processo de integração de funções na variável complexa, buscou pontuar elementos de ordem
metodológica que, por intermédio de uma simbologia cifrada do tipo abaixo
( ,y)dxdy
( ) ( )
( , , )
transição transição
bR
a
R
fx
f x dx f z dz
f x y z dxdydz
( ) ( )
transição
b
af x dx f z dz
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
41
encobrem fatores determinantes para o avanço ou estagnação dos conhecimentos apreendidos
pelos alunos. Isso posto, manifestamos nossa preocupação com aspectos que, na transição da
variável real para a variável complexa, podem atuar como entrave ao conhecimento (elementos
de ruptura), bem outros que podem auxiliar/facilitar/impulsionar o entendimento do aprendiz
(elementos de transição).
Ora, com arrimo do software GeoGebra podemos conduzir os estudantes, sobretudo na
fase de ação da TSD, sobre o resultado do processo dinâmico e construtivo de integração de
funções na variável complexa, na obtenção final de um vetor (ver figura 8, 9, 10 e 11). Ademais,
por intermédio de uma mediação afetada/modificada pelo software, o professor terá a
oportunidade, na fase de institucionalização, de agregar um status distinguido de um saber
científico, incorporado ao patrimônio cognitivo dos aprendizes, possuidor de significados
produzidos por intermédio da visualização, exploração, investigação e um entendimento
qualitativo do cenário de aprendizagem que perseguimos apresentar.
Dessa forma, nossa perspectiva proporciona uma via alternativa para o ensino da noção
de integração de funções na variável complexa ou outros assuntos em Análise, tendo em vista
uma prática anacrônica acadêmica de ensino em nossas universidades, que costuma tornar
hegemônico certos elementos que proporcionam maior comodidade apenas para o professor
(ÁVILA, 2002), em detrimento do interesse do aprendiz.
Por fim, Artigue (2003, p. 124) acentua a trajetória acadêmica de contato dos alunos
com a teoria da integração na academia. Em seu caso de análise particular, Artigue acentua os
estudos que evoluem da integral de Riemann até o estudo da integral de Lebesgue e recomenda
que “tudo isso exige reconstruções sucessivas das relações que os alunos mantêm com a noção
de integral”. Ademais, tendo em vista a posição indubitável para a exploração da tecnologia
atual, assumimos posição semelhante, tendo em vista a necessidade de reconstruções
sucessivas dos alunos no contexto da Transição Interna do Cálculo – TINC (ALVES, 2011) e da
Transição Complexa do Cálculo – TCC (ALVES, 2016a; 2016b; 2016c; 2016d; 2016e),
relativamente ao contato prolongado com a noção com o processo matemático de integração.
9. Referências
ALMOULOUD, Ag Saddo. Fundamentos da Didática da Matemática. São Paulo: Editora UFPR,
2007.
ALVES, Francisco. R. V. Aplicações da Sequência Fedathi na promoção das categorias intuitivas
do Cálculo a Várias Variáveis (tese de doutorado). Fortaleza: Universidade Federal do Ceará –
UFC, 2011, 339f.
ALVES, Francisco. R. V. Engenharia Didática para o Teorema da Função Implícita: análise
preliminares e a priori. Revista Brasileira de Ensino de Ciência e Tecnologia, 7(3), 148 – 168,
2014a.
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
42
ALVES, Francisco. R. V. Técnica Computacional para o Ensino de Matemática Computational
Technique for Teaching Mathematics –
2
CT M
. EM TEIA: Revista de Educação Matemática e
Tecnológica Iberoamericana, 5(2), 1 – 9, 2014b.
ALVES, Francisco. R. V. Aplicações no Ensino de Variável Complexa: uma discussão sobre o uso
dos softwares Geogebra e CAS Maple. Revista do Instituto GeoGebra Internacional de São
Paulo, 3(2), 2014c.
ALVES, Francisco. R. V. Visualizing the behavior of infinite series and complex power series with
the GeoGebra. GeoGebra International Journal of Romania. 4(1), 1 – 10, 2014d.
ALVES, Francisco. R. V. Visualização de Teoremas em Análise Complexa: exemplos no contexto
da Transição Complexa do Cálculo TCC. Revista Sinergia - IFSP, 16(1), 65 – 76, 2015.
ALVES, Francisco. R. V. Transição Complexa do Cálculo – TCC: engenharia didática para as noções
de sequências, séries e séries de potências. Educação Matemática em Revista – RS. v. 17, nº 17,
83 – 97. 2016a.
ALVES, Francisco. R. V. Didática da Matemática: seus pressupostos de ordem epistemológica,
metodológica e cognitiva. Interfaces da Educação. v. 7, nº 21, 131 – 150, 2016b
ALVES, Francisco. R. V. Engenharia Didática: implicações para a pesquisa no âmbito do ensino
de Análise Complexa. Revista Ciência e Natura, v. 38, nº 2, 694 – 715. 2016c.
ALVES, Francisco. R. V. Engenharia Didática no contexto de Transição Complexa do Cálculo:
aspectos epistemológicos e metodológicos sobre a noção de integração de funções na variável
complexa. Revista THEMA, v. 13, nº 1, 47 – 64, 2016d.
ALVES, Francisco. R. V. GeoGebra e a Transição Complexa do Cálculo: o caso da regra de
L`Hospital, Revista Indagatio Didáctica, Portugal, v. 6, nº 2, 95 – 118, 2016e.
ALVES, Francisco. R. V; Borges Neto, H. & Alves Dias, M. Implicações e aplicações da Teoria das
Representações Semióticas no ensino do Cálculo. Jornal Internacional de Estudos em Educação
Matemática, 5(1), 54 – 84, 2012.
ALVES, Francisco. R. V. & Lopes, Marcos. A. Métodos de Integração: uma discussão do seu ensino
com apoio no software Geogebra. Revista do GeoGebra Internacional de São Paulo. 2(1), 6 –
21, 2013.
ARTIGUE, Michelle. Ingeniería didáctica. Gomez, Pedro (org.) Ingeniería didáctica en Educación
Matemática, Bogotá: Grupo Editorial Iberoamericano, 33 – 61, 1995.
ARTIGUE, M. Ingénierie Didactiques. Brun, J. (org.). Didactiques de Mathématiques, 243 – 264.
Lagrange J.B. & al. (eds). Jun 2003, Reims, France. 1996.
ARTIGUE, M. Qué se Puede Aprender de la Investigación Educativa en el Nível Universitário?
Boletín de La Asociatíon Venezolana, vol. X, nº 2, 117-134, 2003.
ÁVILA, G. O ensino de Cálculo e da Análise. Matemática Universitária, 33(1), 83-94, 2002.
BOTTAZZINI, U. The Higher Calculus: a history of real and complex analysis from Euler to
Weierstrass. New York: Springer-Verlag, 1986.
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
43
BOTTAZZINI, U. & GRAY, Jeremy. Hidden Harmony - Geometric fantasies: the rise of the
Complex Functions Theory. New York: Springer, 2013.
BOYER, Carl. The History of the Calculus and its Conceptual Development, New York: Dover
Publications, 1949.
BOURBAKI, N. Éléments d´Histoire des Mathematiques. Paris: Masson, 1984.
BROUSSEAU, Guy. Théorisation de phénomènes d´enseignement des mathématiques. (thése
de doctorat). Bordeaux : Université de Bordeaux I. 1986. 905f.
BROUSSEAU, G. Perspective pour la didactique des mathématiques: vingt ans de didactique
des mathématiques en France. Paris: La Pensée Sauvage, 5 – 66, 1994.
BROUSSEAU, G. Les différents rôles du maître. Bulletin de l’A.M.Q. Montréal, 14-24, 1988.
BROUSSEAU, G. Fondements et methodes de la Didactiques des Mathématiques. Recherche en
Didactiques des Mathématiques. 7(2), 33 – 115, 1986.
BROUSSEAU, Guy. L’émergence d’une science de la didactique des mathématiques. In: Repère
IREM, 55, 19-34, 2004.
BRUM, Wanderley, P. & Schuhmacher, E. A Engenharia Didática como campo metodológico para
o planejamento de aula de matemática: análise de uma experiência didática para o estudo de
geometria esférica. Jornal Internacional de Estudos em Educação Matematica, 6(2), 60 – 84,
2013.
DEBNATH, L. A brief history of the most remarkable numbers e, i and γ in mathematical sciences
with applications. International Journal of Mathematical Education in Science and Technology.
46(6), March, 853 – 878, 2015.
DOUADY, Régine. La ingeniería didáctica y la evolución de su relación con el conocimiento.
Gomez, P. (org.) Ingenieria Didactica en Educación Matemática. Bogotá: Grupo Editorial
Iberoamericano, 1 – 7, 1995a.
DOUADY, Régine. Nacimiento y desarrollo de la didáctica de las matemáticas en Francia: rol de
los IREM. Gomez, P. (org.) Ingenieria Didactica en Educación Matemática. Bogotá: Grupo
Editorial Iberoamericano, 61 – 97, 1995b.
DOUADY, Régine. Géométrie, graphiques, fonctions au collège. Revista Eletrónica de
investigación en educación e ciencias. nº 1, 1-7, 2008.
FLANIGAN, F. J. Complex Variables: harmonic and analytic functions. California: San Diego State
University, 1972.
GONG, S. Concise Complex Analysis. New Jersey: World Scientific, 2001.
GRAY, Jeremy. The Real and the Complex: a History of Analysis in the 19th century. New York:
Springer, 2015.
HADDAD, Sassi. L´enseignement de L´intégrale en classe terminale de l´enseignement tunisien.
(these de doctorat). Paris: Université Paris VII. 2012.
HAIRER, E. & WANNER, G. Analysis by Its History. New York: Springer, 2008.
Ensino de Ciências e Tecnologia em Revista Vol. 7, n. 1. jan./jun. 2017.
44
MARINHO, Monteiro, M. R. & ALVES, Francisco, R. O estuda da série de Laurent com recurso ao
GeoGebra: contributo da Engenharia Didática. Revista Indagatio Didáctica, Portugal, v. 8, nº 5,
165 – 196, 2016.
MEDVEDEV, Fyodor, A. Scenes from the History of real functions. Birkhäuser Verlag: Berlim,
1991.
NEEDHAM, T. Visual Complex Analysis. Oxford: Oxford University Press, 2000.
RUDIN, Walter. Real and Complex Analysis. New York: McGrall-Hill Book Company, 1986.
SCHUBRING, Gert. Conflicts between Generalization, Rigor, and Intuition: Number Concepts
Underlying the Development of Analysis in 17–19th Century France and Germany. New York:
Springer, 2005.
SOARES, M. G. Cálculo em uma Variável Complexa. Rio de Janeiro: SBM, 2014.
SCHWERDTFEGER, Hans. Geometry of Complex Numbers. New York: Dover Publications, 1979.
SHOKRANIAN, S. Uma introdução à Variável Complexa, São Paulo: Editora Moderna, 2011.
WERGERT, Elias. Visual Complex Functions: an introduction with the phase portrait. New York:
Birkhäuser, 2012