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Sopro (DAT Journal Design Art and Technology )

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“Sopro” é uma obra interativa energizada pelo público através do vigor de um sopro em um cata-vento. Esta proposta de arte baseia-se no uso de um sistema tecnológico simples, em uma poética do sopro e em princípios científicos primordiais. O sistema presente na obra revela também sintonia com questões energéticas e
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Milton Sogabe, Fernando Fogliano, Fabio Oliveira Nunes,
Soraya Braz, Carolina Peres e Cleber Gazana *
Sopro
Grupo cAt: Milton Sogabe, Fernando
Fogliano, Fabio Oliveira Nunes, So-
raya Braz, Carolina Peres e Cleber
Gazana O grupo de pesquisa cAt (ciên-
cia/Arte/tecnologia), criado em 2009 e
credenciado no CNPq, é coordenado pe-
los artistas-pesquisadores Milton Soga-
be e Fernando Fogliano. Caracteriza-se
pela experimentação, reexão e disse-
minação de pesquisas na intersecção
entre arte, ciência e tecnologia, com o
desenvolvimento de projetos coletivos
a partir de um perl interdisciplinar da
equipe. O grupo está sediado no Insti-
tuto de Artes da Universidade Estadual
Paulista (UNESP) em São Paulo. < milton.
sogabe@gmail.com >
Resumo “Sopro” é uma obra interativa energizada pelo público através do
vigor de um sopro em um cata-vento. Esta proposta de arte baseia-se no uso
de um sistema tecnológico simples, em uma poética do sopro e em princípios
cientícos primordiais. O sistema presente na obra revela também sintonia
com questões energéticas e de sustentabilidade atuais, inserindo-as no con-
texto da arte-tecnologia.
Palavras chave Arte-tecnologia, Energia, Sopro, Sustentabilidade, Pós-digital.
The Blow
Abstract “Sopro” is energized by the audience through the force of their blow in a
propeller. This art proposal is based on the use of a simple technological system, the
poetic of blow and primary scientic principles. The present system in the work also
reveals tune with current energy and sustainability issues, placing them in the con-
text of the art technology.
Keywords Art technology, Energy, Blow, Sustainability, Post-digital.
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Introdução
“Sopro”1 é uma obra realizada pelo grupo de pesquisa cAt (ciência/
Arte/tecnologia), do Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista
(UNESP), com o objetivo de assimilar os pensamentos presentes nos pro-
cessos de criação com o digital, embora não faça uso da tecnologia digital
em si. Neste texto, são apresentadas questões sobre interatividade, colabo-
ração e sustentabilidade, entre outras preocupações presentes no processo
de discussão que gerou “Sopro”2.
Energia e sopro
Uma das questões essenciais que se coloca na atualidade é sobre
nossas fontes energéticas. As obras no campo da arte-tecnologia podem in-
corporar de certa maneira essa discussão e preocupação. Nesse sentido as
obras que necessitam de energia podem buscar energias alternativas, como
proposição mais ecológica. É nesse contexto que surge a obra, “Sopro”, bus-
cando a poética na própria tecnologia e sua relação com o ser humano.
Na natureza, a força dos ventos é responsável por várias modi-
cações nos ambientes, tais como o ato de transformar as formas de rochas
por desgaste, a movimentação de dunas em áreas costeiras ou processos de
erosão; chama-se de eólicos, os processos que possuem o vento como agen-
te geológico. O clima e suas variações estão relacionados diretamente ao
movimento dos ventos, que afetam as temperaturas, produzem as chuvas,
que por sua vez transformam a natureza e a cultura em ciclos, como um
sistema vivo.
Dada a sua força, desde muito tempo o homem vem buscando trans-
formar o vento em energia útil, através de moinhos de vento e velas em em-
barcações e, mais recentemente, por meio de aerogeradores que produzem
eletricidade. A chamada energia eólica é considerada uma fonte de energia
alternativa aos combustíveis fósseis e a outras formas que geram grandes im-
pactos ao meio ambiente, sendo uma forma de geração de energia com pouco
impacto ambiental, especialmente quando utilizada em pequeno porte.
Ainda que em uma escala humana, soprar é uma forma de repro-
duzir o uxo de ar do vento. No senso comum, o sopro é recorrentemente
associado à gênese da vida. Diferentes culturas em suas cosmogonias, ao
explicar o surgimento do homem, envolvem um sopro divino como ação
capaz de implicar vida ao que antes era inerte. Além da conhecida passa-
gem bíblica do livro de Gênesis, na qual o sopro de Deus sobre o barro deu
vida a Adão, o primeiro dos homens, há também recorrências presentes na
mitologia Tupi-Guarani – importante cultura indígena da América do Sul:
para os índios, Tupã, principal divindade, teria soprado a vida nas formas
humanas que modelou em argila durante uma cerimônia. Já na mitologia
Yoruba – africana – Obatalá, lho direto de Olorum, o criador do universo,
1 Participaram do processo de criação
da obra “Sopro” (2015): Milton Sogabe,
Fernando Fogliano, Fabio Oliveira Nu-
nes, Agnus Valente, Antonio Saggese,
Soraya Braz, Carolina Peres, Cleber Ga-
zana e Letícia Nogueira Costa.
2 Em sintonia com o caráter processu-
al da obra “Sopro”, diferentes versões
homônimas deste texto foram apresen-
tadas em encontros e congressos. Ele
tem sido pensado como parte de um
diálogo contínuo a compor reexões
junto à obra, buscando aperfeiçoar-se
mutuamente a cada nova exibição. Esta
é a 3ª versão deste texto
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foi enviado à Terra, que era composta de água e criou as plantas, os ani-
mais e o homem: “Fato inconteste é que, por m, Obatalá recebeu a incum-
bência de criar as características físicas dos corpos que deveriam abrigar os
habitantes humanos do planeta. Com barro e água, Obatalá confeccionou os
corpos, aguardando que Olodumare complementasse com o emi – o sopro
da vida que os animaria.” (HAAS, 2013)
No contexto poético encontramos várias referências ao ato do so-
pro. Oscar Niemeyer, arquiteto brasileiro que viveu até os 105 anos, profe-
riu uma frase célebre sobre a fugacidade da vida, através da metáfora do
sopro, “A vida é um sopro, um minuto. A gente nasce, morre.” (MURRAY,
2012). No último livro de Clarice Lispector, publicado um ano após sua mor-
te, intitulado “Um sopro de vida - Pulsações”, encontramos diversos mo-
mentos nos quais a palavra “sopro” é referida: “Procuro o sopro da palavra
que dá vida aos sussurros” (LISPECTOR, 1978).
Sopro e interação
Na arte interativa o público é solicitado a participar da obra através
de várias formas. O corpo está presente não somente com o olhar, mas em sua
totalidade, vendo, sentindo, pensando, e atuando num processo simultâneo e
contínuo. Dentre as diversas manifestações do corpo humano, o sopro é uma
atividade não tão usual, mas muito signicativo, embora para os músicos de
instrumentos de sopro, essa ação seja a essência do seu instrumento.
O uso do sopro em obras interativas como prática de interação é
recorrente (BORN, 2014). Um dos exemplos mais conhecidos é a instalação
“Les Pissenlits” (1988-2005) de Edmond Couchot e Michel Bret que, baseada
em um sistema de estímulo/resposta, convida o público a soprar em um
microfone tal como sopraria a planta dente-de-leão. Essa ação do público
faz com que a imagem de um dente de leão projetada sobre uma superfície,
se comporte como no real, se desfazendo e as sementes sendo levadas pelo
vento. Sobre a obra, o autor Edmond Couchot (s.d.) comenta: “Nossa ideia
era recriar um gesto, velho como o mundo. Quando se vê essas obras, que-
remos reencontrar o gesto natural de soprar. No caso, soprar uma imagem,
pela primeira vez na história.”
Outra obra que também envolve o gesto de soprar é o trabalho “So-
pro 4” (2011) do grupo Super Uber:
“Este trabalho consiste basicamente em uma projeção de topo sobre um
cubo branco, onde vários fragmentos parecem utuar aleatoriamente
pelo espaço plano da projeção. O sistema de partículas se mantém inerte
em seus movimentos contínuos e aleatórios, até que, pelo menos um in-
terator sopre no dispositivo em forma de aro de bolha de sabão (objeto
que naturalmente é associado ao sopro), que capta o sopro através de um
microfone” (SUPER UBER, 2011)
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Há ainda “Breathing”, de Guto Nóbrega, obra criada com base na
comunicação entre um organismo natural (planta) e um sistema articial,
também permite que o sopro seja uma das formas de interação com o traba-
lho. Na base deste sistema encontra-se uma planta Jibóia (Epipremnum pin-
natum) cujos sinais eletrosiológicos são monitorados por um dispositivo
analógico-digital de maneira a controlar uma interface robótica composta
de estrutura mecânica, bra ótica e leds (light-emitting diodes) (NÓBREGA,
s.d.). Se o interator sopra suavemente em direção à planta, esse estímulo
pode ser percebido pelo sistema, possivelmente gerando alguma resposta.
A adoção do sopro como ato de interação permite que aprofunde-
mos sobre o conceito de experiência em obras de arte. Neste sentido, a cul-
tura é o lugar onde nossas experiências se constituem; e que experiências
fundamentam-se na experiência física direta. Em algumas situações, algu-
mas experiências podem ser “mais físicas” e outras mais culturais. Existem
correlatos sistemáticos entre nossas emoções e nossas experiências sen-
sório-motoras; estas formam a base dos conceitos metafóricos que George
Lakoff e Mark Johnson (1999, p.57) denominam orientadores. Tais metáfo-
ras permitem-nos conceitualizar nossas emoções em termos bem denidos
e também relacioná-los a outros conceitos semanticamente próximos.
É possível transportar essas ideias para o contexto das instalações
artísticas, observando agora que o espaço da obra constitui a arena para a
experiência física direta. Nesse contexto, elementos culturais como ima-
gens e textos podem constituir os elementos da experiência física direta.
Assim sendo, é possível imaginar uma rede de estímulos sensórios e de
ações, como soprar com vigor um cata-vento, no espaço físico. Estes, obje-
tos culturais oriundos de outras linguagens, produzem uma complexa rede
que irá resultar numa metáfora emergente ou conceito emergente (LAKOFF
& JOHNSON, 1999, p.58).
A perspectiva dada acima pode se aproximar das ideias de John
Dewey (2010, p. 215) quando arma que os objetos de arte constituem mui-
tas linguagens e que cada uma delas possuem seu meio, seu veículo, e que
esse veículo é adequado a um dado tipo de comunicação. As instalações po-
dem ser consideradas complexos agregados sensíveis que constituem espa-
ços físicos projetados para experiências sensoriais capazes de produzir es-
tados emocionais resultantes de uma experiência estética que o interagente
pode vivenciar.
Linguagens e tecnologias estiveram no cerne da produção da Arte,
Ciência e Tecnologia ao longo da história da cultura. Nesse sentido, podemos
perceber o quanto o conceito de experiência consciente é importante para
as reexões sobre a produção cultural contemporânea. Estas preocupações
aqui trazidas podem oferecer um cenário convergente necessário para que se
possa considerar a produção artística e cultural contemporânea em toda sua
diversidade. Oferecem-nos uma alternativa para a compreensão sobre como
linguagem, pensamento, cultura e tecnologia constroem as vias da cultura e
novos caminhos para o acesso à realidade (FOGLIANO, 2015).
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A obra “Sopro
A partir destas premissas, o grupo cAt (ciência/Arte/tecnologia)
desenvolveu o projeto da obra artística “Sopro” (2015). Trata-se de um sis-
tema que envolve a participação dos visitantes a partir do ato de soprar.
O sopro é a “fonte energética” para a ativação da obra. Assim, a questão
da energia em “Sopro” está presente em vários aspectos. A obra aconte-
ce no contexto da referência à crise ambiental, principalmente no que diz
respeito à adoção das energias alternativas. Nesse sentido o sopro, como
vento, faz referência à energia eólica. A energia se inicia sendo produzida
pelo próprio corpo humano, que através da respiração produz o sopro, que
provoca um movimento no cata-vento presente na obra que, através desse
cinetismo, gira um pequeno motor, reaproveitado de um DVD player, que
é transformado em gerador de energia elétrica. A energia ativa um motor
vibrador, retirado de um celular inutilizado, e que se encontra dentro de
uma esfera de acrílico, utuante, dentro de uma esfera maior cheia de água,
movimentando esta e dando sinal de vida à obra, a partir da visualização de
movimento no ambiente líquido.
Do ponto de vista da criação, buscou-se a possibilidade de trans-
parecer a tecnologia utilizada na estrutura da obra, de forma a construir
a poética, permitindo que o público visualize todo o sistema, compreenda
o resultado de sua ação no processo e ao mesmo tempo permita discutir as
questões tecnológicas em contexto ambiental. A seguir apresentamos al-
guns dos elementos envolvidos na obra.
Figura 1 Obra Sopro (2015), Grupo cAt.
Fonte arquivo do grupo de pesquisa.
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Água: a água está presente na obra como um elemento que está
sempre relacionado à vida. A água encontra-se dentro de uma
esfera de acrílico com cinquenta centímetros de diâmetro, onde
três esferas de acrílico menores  utuam. O movimento de uma ou
mais dessas esferas, provocado pela vibração do motor, reverbera
na água, remetendo a um sinal de vida. Por outro lado, a di culdade
encontrada para captar a sutil movimentação do vibrador,
encontrou na água tanto uma solução técnica, como poética.
Figura 3 Vista da esfera principal com
esferas menores na água. Grupo cAt.
Fonte arquivo do grupo de pesquisa.
Figura 2 Estrutura da obra Sopro.
Fonte arquivo do grupo de pesquisa.
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Esfera: A esfera é a forma adotada na obra, como referência às
células, que também representam vida, e energia. A estrutura
da obra está formada por um sistema de esferas de diferentes
dimensões, interligadas como em uma estrutura fractal, onde a
energia está presente em cada uma, e ao mesmo tempo são todas
elas que direcionam a energia da obra. A esfera principal da obra
mede cinquenta centímetros de diâmetro, recebendo água em
um de seus hemisférios; na superfície aquosa permanecem as três
esferas menores, com cinco centímetros de diâmetro, que contêm
os vibradores, que movimentam as esferas quando o público
interage. O visitante, por sua vez, interage soprando em um cata-
vento também condicionado a em uma esfera de acrílico de quinze
centímetros de diâmetro, sendo no total três cata-ventos.
Coletivo: Embora haja a possibilidade de um único sopro
potente provocar o movimento da esfera-célula na água, é
o sopro coletivo nas três, que vai permitir mais facilmente a
percepção do movimento na água. As três esferas com os cata-
ventos apontam para a participação coletiva, num esforço de
unir energias para ter uma melhor e ciência.
Tecnologia: O uso de um sistema tecnológico aparentemente
simples, composto por um cata-vento, motores retirados
de leitores de CD, DVD, e um motor vibrador reaproveitado
de telefones celulares, são apresentados de forma visível
propositalmente para que o público perceba a simplicidade de
como o sopro energiza o motor vibrador, fazendo com que a
esfera que o contém se movimente. Nesta obra, a transparência
do sistema que a compõe é fundamental. Não só literalmente,
como as várias peças em acrílico transparente denotam, mas
Figura 4 Interação na obra Sopro.
Grupo cAt.
Fonte arquivo do grupo de pesquisa.
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especialmente, sob o propósito de permitir acesso à essência
tecnológica da obra. É importante, por exemplo, fazer ver que
não há outros artifícios que façam mover os motores vibradores
além da energia do ato de soprar nos cata-ventos. Cada cata-vento
é composto por uma hélice de cinco pás produzida em impressão
3D (impressa no MemoLab – Laboratório de Fabricação Digital
do Memorial da América Latina, em São Paulo) com plástico
translúcido, especialmente desenhada para a obra.
Refl exões
No âmbito da pesquisa, “Sopro” tem sido uma obra de aperfeiçoa-
mento e re exão contínuos ao longo de mais de dois anos de produção,
tendo sido apresentada em diferentes versões e circunstâncias. É interes-
sante perceber que embora simples em sua construção, os aprimoramen-
tos da obra têm preconizado ações precisas, onde pequenos detalhes abrem
espaço para novos experimentos e discussões. Neste percurso, muitos ele-
mentos constituintes da obra são aprimorados.
Bastante emblemáticas do caráter processual de “Sopro”, as ven-
toinhas que compõem os cata-ventos já foram constituídas de diferentes
formas e materiais, assim como, diferentes modelos de motores vibradores
foram empregados até aqui. Nestes dois casos, buscou-se investigar como
alcançar a maior e ciência energética possível com os recursos desejáveis
para a produção (como já foi dito, sem recorrer, na ligação entre cata-ven-
tos e vibradores, a outras fontes de energia além do ato de soprar), além de
outros aspectos como durabilidade, segurança ao público e coerência com
a proposta poética.
Indo além, podemos citar aperfeiçoamentos ligados às possibilida-
des de vislumbrar a resposta ao ato de soprar quando a obra é exibida. Re-
centemente, a partir da exibição em 2016 na Exposição EmMeio#8.0, mostra
vinculada ao 15° Encontro Internacional de Arte e Tecnologia (#15.ART), a
apresentação da obra passa a agregar um sistema em vídeo composto por
micro câmera e projetor que permite ao visitante acompanhar o resultado
maximizado de sua ação em uma nova escala e novo ponto de vista. As ima-
gens em vídeo são capturadas a partir da base da esfera principal, tendo em
foco as três esferas menores. A projeção mostra os diminutos motores de
vibração, agora ampliados em seus detalhes. As imagens formadas pela exi-
bição destes itens originalmente de menor escala e de vivacidade aparente
– quando estimulados – remetem às imagens microscópicas e a processos
vitais que operam em dimensões que não vemos.
Figura 5 Diferentes ventoinhas do
cata-vento da obra “Sopro”. Grupo cAt.
Fonte arquivo do grupo de pesquisa.
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Figura 6 Testes de projeção.
Grupo cAt.
Fonte arquivo do grupo de pesquisa.
Ainda no quesito expositivo, a apresentação da obra passa a incluir
em suas últimas versões, um vídeo curto no qual a interação com o traba-
lho é explicitada3; são necessárias estratégias de convite ao público para o
envolvimento com a obra, para que os visitantes compreendam seu papel
e percebam que o trabalho só efetiva completamente com a energia que a
partir deles é emanada.
Ao optar por trabalhar com a energia elétrica gerada por um sopro,
parte signi cativa da construção da obra está voltada a lidar com a escassez
energética desta condição. Buscou-se, em muitos momentos, otimizar a mí-
nima corrente elétrica surgida a cada interação. Lidar com esta exiguidade
tem sido importante não só para manter a essência poética de um “sopro
de vida” a vivi car categoricamente o sistema, como também serve como
estímulo a lidar necessariamente com o mínimo, como metáfora das preo-
cupações energéticas dos tempos atuais.
A opção por fazer uso de dispositivos tecnológicos reciclados e
aparentemente simples, surge da percepção de que podemos dar um passo
adiante às tecnologias digitais, quando estas já foram incorporadas e ba-
nalizadas em nosso cotidiano, tendo a presença de novas gerações que são
nativas desse contexto.
Do ponto de vista do processo criativo no contexto da ciência, da
arte e da tecnologia, “Sopro” subverte as funcionalidades previstas para
elementos como o motor de drivers de DVD e o motor vibrador de aparelhos
de celular, por exemplo, reinventando suas  nalidades iniciais em prol de
um trabalho artístico. Além de produzir um resultado poético estreitamen-
te relacionado ao funcionamento do dispositivo, abre um campo de re exão
em sintonia com questões da atualidade.
3 Vídeo disponível em: https://youtu.
be/7IavcvDSCPA . Acesso em 12 de no-
vembro de 2016.
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Acreditamos que embora a obra não utilize diretamente a tecno-
logia digital, todo o pensamento que envolve a sua concepção parte da in-
corporação de processos digitais – e das discussões que se seguem após o
auge desta tecnologia, fazendo-nos atentar para as questões ambientais e
de sustentabilidade. Congura-se, assim, um horizonte pós-digital (CASCO-
NE, 2000), a partir das preocupações de “Sopro”.
Tal como descrito por Florian Cramer (2014) em seu texto “O que é o
pós-digital?”, o termo pós-digital pode ser usado para descrever um desen-
canto contemporâneo com sistemas digitais de informação e dispositivos
de mídia ou, ainda, o período em que nosso fascínio por estes sistemas e
dispositivos tornou-se histórico. Mas, além disso, surge como uma tendên-
cia que preconiza não exatamente uma superação da condição digital, mas
uma continuidade revista desta condição.
“Sopro”, assim, suscita uma revisão sobre as práticas tecnológicas,
partindo da premissa de que obras em arte-tecnologia podem discutir as
preocupações energéticas contemporâneas, já que, esta seria uma discus-
são intrínseca de trabalhos que dependem de energia elétrica para efeti-
vamente acontecerem. Por extensão, pensa-se sobre a crise ambiental que
se instala, entre outros motivos, a partir da necessidade de gerar energia
em larga escala, para contextos cada vez mais tecnológicos. Podem, então,
obras em arte-tecnologia ocuparem-se da própria energia que as alimen-
ta? Poderíamos, também, nos dedicarmos à própria energia necessária para
nossa vida? Estas são algumas das questões que tem instigado o contínuo
pensamento do grupo nesta obra.
Nota sobre este texto
Em sintonia com o caráter processual da obra “Sopro”, diferentes ver-
sões homônimas deste texto foram apresentadas em encontros e congressos.
Ele tem sido pensado como parte de um diálogo contínuo a compor reexões
junto à obra, buscando aperfeiçoar-se mutuamente a cada nova exibição.
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Recebido: 17 de Novembro de 2016
Aprovado: 07 de Dezembro de 2016
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This article discusses the postdigital as a term that can be used to describe either a contemporary disenchantment with digital information systems and media gadgets, or a period in which our fascination with these systems and gadgets has become historical. After Edward Snowden’s disclosures of the NSA’s all-pervasive digital surveillance systems, this disenchantment has quickly grown from a niche ‘hipster’ phenomenon to a mainstream position — one which is likely to have a serious impact on all cultural and business practices based on networked electronic devices and Internet services.
Book
George Lakoff and Mark Johnson take on the daunting task of rebuilding Western philosophy in alignment with three fundamental lessons from cognitive science: The mind is inherently embodied, thought is mostly unconscious, and abstract concepts are largely metaphorical. Why so daunting? "Cognitive science--the empirical study of the mind--calls upon us to create a new, empirically responsible philosophy, a philosophy consistent with empirical discoveries about the nature of mind," they write. "A serious appreciation of cognitive science requires us to rethink philosophy from the beginning, in a way that would put it more in touch with the reality of how we think." In other words, no Platonic forms, no Cartesian mind-body duality, no Kantian pure logic. Even Noam Chomsky's generative linguistics is revealed under scrutiny to have substantial problems. Parts of Philosophy in the Flesh retrace the ground covered in the authors' earlier Metaphors We Live By , which revealed how we deal with abstract concepts through metaphor. (The previous sentence, for example, relies on the metaphors "Knowledge is a place" and "Knowing is seeing" to make its point.) Here they reveal the metaphorical underpinnings of basic philosophical concepts like time, causality--even morality--demonstrating how these metaphors are rooted in our embodied experiences. They repropose philosophy as an attempt to perfect such conceptual metaphors so that we can understand how our thought processes shape our experience; they even make a tentative effort toward rescuing spirituality from the heavy blows dealt by the disproving of the disembodied mind or "soul" by reimagining "transcendence" as "imaginative empathetic projection." Their source list is helpfully arranged by subject matter, making it easier to follow up on their citations. If you enjoyed the mental workout from Steven Pinker's How the Mind Works , Lakoff and Johnson will, to pursue the "Learning is exercise" metaphor, take you to the next level of training. --Ron Hogan Two leading thinkers offer a blueprint for a new philosophy. "Their ambition is massive, their argument important.…The authors engage in a sort of metaphorical genome project, attempting to delineate the genetic code of human thought." -The New York Times Book Review "This book will be an instant academic best-seller." -Mark Turner, University of Maryland This is philosophy as it has never been seen before. Lakoff and Johnson show that a philosophy responsible to the science of the mind offers a radically new and detailed understandings of what a person is. After first describing the philosophical stance that must follow from taking cognitive science seriously, they re-examine the basic concepts of the mind, time, causation, morality, and the self; then they rethink a host of philosophical traditions, from the classical Greeks through Kantian morality through modern analytical philosophy.
O sopro como dispositivo em instalações interativas e objetos interativos de arte tecnologia: uma metáfora sensível dos limites do corpo e de suas relações com a máquina
  • R M Born
BORN, R. M. O sopro como dispositivo em instalações interativas e objetos interativos de arte tecnologia: uma metáfora sensível dos limites do corpo e de suas relações com a máquina.
Edmond Couchot Tumblr
  • E Les Couchot
  • Pissenlits
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Arte e Interação: linguagem e produção de significado
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  • De Outubro De
de outubro de 2015. Disponível em: <https://www.linkedin.com/pulse/ bem-vindos-ao-mundo-p%C3%B3s-digital-walter-longo?trk=mp-reader-card>. Acesso em: 12 de novembro de 2016.
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  • G Breathing
NOBREGA, G. Breathing. Guto Nóbrega [site do artista]. Disponível em: <http://cargocollective.com/gutonobrega/Breathing >. Acesso em: 12 de novembro de 2016.
Super Uber [site do grupo] Disponível em: <http://www.superuber.com.br/sopro-quatro-no-acervo-do-fred-jones-jr-museum-eua
  • Super Uber
  • Sopro Quatro No Acervo Do Fred Jones Jr
  • Eua Museum
SUPER UBER. Sopro Quatro no Acervo do Fred Jones Jr. Museum EUA. Super Uber [site do grupo]. 2011. Disponível em: <http://www.superuber.com.br/sopro-quatro-no-acervo-do-fred-jones-jr-museum-eua/>. Acesso em: 12 de novembro de 2016.