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Texto Para Discussão FEE, n.
o
143
ISSN 1984-5588
Secretaria do Planejamento, Mobilidade e Desenvolvimento Regional
Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser
Textos Para Discussão FEE
Texto n.º 144
Transversalidade e integração em políticas públicas de gênero:
análise da Rede Lilás no Rio Grande do Sul
Deisi Conteratto
Clitia Helena Backx Martins
Porto Alegre, abril de 2016
Texto Para Discussão FEE, n.
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SECRETARIA DO PLANEJAMENTO, MOBILIDADE E DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Secretário: Cristiano Tatsch
DIRETORIA
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TEXTOS PARA DISCUSSÃO
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interesse da instituição, os quais, por sua relevância, levam informações para profissionais especializados e
estabelecem um espaço para sugestões. Todas as contribuições recebidas passam, necessariamente, por
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Transversalidade e integração em políticas públicas de gênero:
análise da Rede Lilás no Rio Grande do Sul
Deisi Conteratto
*
Mestranda em Políticas Públicas pela Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Bolsista da
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio
Grande do Sul (FAPERGS) na Fundação de Economia e
Estatística (FEE)
Clitia Helena Backx Martins
**
Doutora em Sociologia pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS), Economista da FEE
Resumo
Este artigo tem como objetivo analisar políticas públicas articuladas no âmbito do programa Rede Lilás de
combate à violência de gênero no Rio Grande do Sul. Para tanto, verificam-se as ações transversais
relacionadas ao enfrentamento da violência contra a mulher no Estado, bem como a integração destas com
as políticas federais visando à redução da desigualdade de gênero. Após a Introdução, apresentam-se
alguns elementos referentes à temática das políticas públicas de gênero nos contextos nacional e estadual.
Na continuidade, abordam-se a criação, a organização e o funcionamento da Rede Lilás. A seguir, levando
em consideração o III Plano Nacional de Políticas para as Mulheres — 2013-15, identificam-se os
desafios do Rio Grande do Sul frente às políticas públicas destacadas, fechando-se o texto com algumas
Considerações finais.
Palavras-chave
Políticas públicas de gênero; violência contra a mulher; Rede Lilás
Abstract
This article aims at analyzing public policies articulated within the Rede Lilás program to combat gender-
-based violence in Rio Grande do Sul. Therefore, we verify state cross-cutting actions related to addressing
violence against women, as well as their integration with federal policies which aim at reducing gender
inequality. After the introduction, some aspects are presented on the theme of public policies on gender in the
national and regional context. Next, we discuss the creation, organization and functioning of the Rede Lilás
program. Then, the challenges of the state vis-à-vis such public policies are highlighted, taking into account
the III National Plan of Policies for Women, 2013-2015. We close the text with some final remarks.
Keywords
Gender public policies; violence against women; Rede Lilás
Classificação JEL: J160
* E-mail: deisi@fee.tche.br
**
E-mail: clitia@fee.tche.br
As autoras desejam agradecer aos colegas do Núcleo de Políticas Públicas da FEE, em especial a Ana Júlia Possamai, pela atenta
e colaborativa leitura prévia do texto, isentando-os, como de praxe, por eventuais erros e omissões. Também manifestam seu
agradecimento às participantes da Rede Lilás e às demais pessoas entrevistadas, que forneceram informações valiosas para que
essa pesquisa fosse realizada.
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1 Introdução
O campo das políticas públicas de igualdade de gênero é particularmente complexo e marcado por
inúmeros pontos de tensão que interferem na formulação de programas, enquadramentos jurídicos e
processos de intervenção (BANDEIRA, 2004). Nesse sentido, considera-se que as estratégias de gestão
para o empoderamento
1
e a autonomia das mulheres devem compreender as múltiplas dimensões da
desigualdade que afeta a metade da população. Por essa ótica, a promoção de igualdade, garantida pela
execução de políticas para as mulheres, resulta no desenvolvimento de toda a sociedade, tendo em vista
uma perspectiva democrática e de cidadania (BRASIL, 2011).
Há que ser destacado que o conceito de gênero se baseia nas diferenças observadas socialmente
entre os sexos e é uma forma de dar significado às relações de poder (SCOTT, 1995), ou seja, as
percepções de gênero estão diretamente ligadas a cenários socioculturais específicos. Assim, entende-se
que o desenvolvimento de igualdade de gênero vai ao encontro dos direitos da mulher como uma
manifestação dos direitos humanos (PRA; EPPING, 2012), empoderando-a e transformando sua posição na
sociedade.
Falar sobre igualdade de gênero exige, então, partir do pressuposto de que as diferenças entre
indivíduos impulsionam os esforços na luta pela equidade, pela liberdade e pelo pertencimento. Dessa
forma, rompe-se com um universo do não reconhecimento da alteridade e permite-se a criação de espaços
onde o papel das mulheres e dos oprimidos por gênero possa ser redefinido sociocultural e politicamente
(MELO; BANDEIRA, 2005). Portanto, na visão de equidade, ao mesmo tempo em que são reconhecidas as
diferenças entre homens e mulheres, também se atribui a ambos o mesmo valor (ÇAGATAY, 2003).
Para que haja uma superação da cultura vigente de subordinação, torna-se imprescindível e, por
isso, digna de análise, a atenção com que o Estado trata o assunto. No espectro das políticas públicas
sensíveis à temática de gênero, as ações oriundas do Estado relativamente à violência contra as mulheres,
desde o momento de denúncia até o julgamento do ato criminoso, compõem um quadro essencial para que
essa violência seja cada vez mais enfrentada e, consequentemente, deslegitimada (BLAY, 2003). Tal
atenção requer uma ação transversal entre as instituições públicas de todos os níveis — federal, estadual e
local e/ou municipal (CEPAL, 2012).
Para Bandeira (2004), a governabilidade tem a ver com a capacidade governamental de sustentar
suas propostas e de atender às demandas da sociedade civil. No caso das políticas de igualdade de gênero,
ela pode ser assegurada por três conjuntos de ações articuladas: garantir a incorporação e compreensão da
transversalidade nas agendas de todas as instâncias governamentais; englobar essa incorporação na
prática de gestores de políticas públicas em todos os níveis (federal, estadual e municipal); e disseminar
novos valores culturais e políticos junto à população, na construção de uma cidadania que inclua e não
exclua.
1
Para Deere e León (2002), o empoderamento corresponde à noção de processo em que as pessoas obtêm poder sobre as próprias
vidas e, dessa maneira, passam a definir suas próprias agendas. Em geral, o termo é associado aos interesses daqueles que se
encontram desprovidos de poder, pressupondo-se que ele manifeste uma expressão de mudança desejada para a emancipação.
5
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Nesse contexto, a transversalidade
2
busca garantir um pacto de responsabilidades compartilhadas
entre todos os órgãos de governo e entes federativos. Para que isso ocorra, é imprescindível que a agenda
contra desigualdade de gênero esteja presente institucionalmente na rotina desses órgãos. Portanto, por
meio de diretorias, secretarias ou áreas técnicas, deve haver em cada órgão a consciência de “[...] que
homens e mulheres não possuem os mesmos problemas e necessidades, mas devem possuir os mesmos
direitos” (BRASIL, 2011, p. 6).
De maneira geral, salienta-se a necessidade de avaliação dos programas introduzidos, verificando-
-se, periodicamente, se os objetivos iniciais desses programas estão sendo alcançados e não desvirtuados.
Sobre esse aspecto, Bandeira (2004) aponta que o controle social sobre a ação governamental é um dos
meios que asseguram políticas públicas democráticas e inclusivas.
O objetivo deste estudo é analisar como o Governo do Estado do Rio Grande do Sul, por meio da
Rede Lilás, tem articulado e implementado políticas públicas integradas, com ações transversais que
busquem, além do atendimento de qualidade às vítimas, o desenvolvimento de uma cultura política e social
de combate à desigualdade de gênero.
Inicialmente, apresentam-se alguns elementos referentes à temática das políticas públicas de
gênero, com contextualização nacional e estadual. Na sequência, abordam-se a criação, a organização e o
funcionamento do programa Rede Lilás pelo Governo do Rio Grande do Sul. Busca-se, aqui, identificar
atores relevantes do processo e discutir alguns dos principais aspectos referentes às interfaces do
programa. Para tanto, foram realizadas diversas entrevistas com gestores e colaboradores dos órgãos
governamentais e de outras entidades que fazem parte da Rede Lilás
3
.
Ademais, recorrendo-se aos principais documentos publicados pelos órgãos diretamente envolvidos,
como a Secretaria de Políticas Para as Mulheres (SPM) do RS
4
, o Observatório da Violência contra as
Mulheres da Secretaria de Segurança Pública (SSP) do RS e o Centro de Referência Estadual de Mulheres
Vânia de Araújo, foram levantadas e sistematizadas informações sobre as políticas públicas do Governo do
Estado vinculadas à temática e relacionadas ao enfrentamento da violência contra as mulheres.
Por último, levando em consideração o III Plano Nacional de Políticas Para as Mulheres 2013-15,
analisam-se os desafios do Rio Grande do Sul frente às políticas públicas destacadas, concluindo-se o texto
com algumas Considerações finais.
2
Bandeira (2004) entende que a transversalidade de gênero nas políticas públicas compreende a elaboração de uma matriz que
oriente uma nova visão de competências políticas, institucionais e administrativas, garantindo a responsabilização dos diversos
agentes públicos sobre as assimetrias de gênero.
3
Salienta-se que as autoras também participam do Comitê Rede Lilás, como observadoras.
4
A Secretaria de Políticas para as Mulheres, criada pelo governo estadual do Rio Grande do Sul em 2011, foi extinta em janeiro de
2015, sendo substituída pelo Departamento de Políticas para as Mulheres, da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos.
6
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2 Sobre políticas públicas de enfrentamento da desigualdade
de gênero
As políticas afirmativas
5
referentes à discriminação por gênero constituem, segundo Arriagada
(2005), uma oportunidade de desconstrução cultural do cenário patriarcal em que as mulheres e a população
LGBT
6
tendem a ser menos valorizadas. Desse modo, as políticas públicas de gênero consideram a
diversidade dos processos de socialização entre homens e mulheres e envolvem a natureza dos conflitos e
negociações produzidos nas relações interpessoais. Elas também se referem à construção da condição de
sujeito das mulheres, cujas consequências se evidenciam tanto nas relações individuais quanto nas
coletivas.
O sistema de políticas públicas para as mulheres que predominou até a década de 80 restringiu-se à
visão tradicional do papel feminino enquanto parte da reprodução social. Algumas dessas políticas
reafirmam, inclusive, a visão de que a reprodução e a sexualidade causam inevitavelmente as diferenças de
valoração de gênero (MELO; BANDEIRA, 2005).
Historicamente, podem-se mencionar dois eventos internacionais, entre os mais importantes para as
políticas de gênero. Um deles foi a Assembleia da Organização dos Estados Americanos (OEA), que firmou
a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher - Convenção de
Belém do Pará, nessa cidade brasileira, em junho de 1994. O outro foi a Quarta Conferência Mundial sobre
as Mulheres, promovida pela Organização das Nações Unidas (ONU) em Pequim, em setembro de 1995,
que é considerada como um divisor de águas sobre a questão central dessas políticas
7
, pois teve como
marco fundamental a mudança na orientação predominante das proposições da ONU sobre a temática. De
políticas e ações para mulheres, o foco passou para as desigualdades de gênero, levando em consideração
que toda a estrutura da sociedade e todas as relações entre homens e mulheres dentro dela deveriam ser
reavaliadas. Pereira (2006) sintetiza a pauta da Conferência de Pequim em duas estratégias principais: a
sensibilidade para o tema de gênero em todos os processos de tomada de decisão; e a urgência de medidas
em prol do empoderamento feminino.
Nesse sentido, a comunidade internacional ali reunida foi mobilizada
para que se dedicassem esforços para combater a condição desigual de trajetórias de vida entre homens e
mulheres (UN WOMEN, 2000).
Entretanto, considera-se que, embora a ênfase à responsabilidade feminina pela reprodução social e
ao seu comprometimento em garantir o núcleo familiar não garanta empoderamento e autonomia à mulher
de maneira linear, as políticas tradicionais para as mulheres podem ser absorvidas pela abordagem mais
ampla das políticas de gênero, somente mudando o seu foco e modus operandi (MELO; BANDEIRA, 2005).
Nesse sentido, as políticas públicas que atingem as mulheres podem ser divididas em grupos, de
acordo com sua maior ou menor conexão com a abordagem de gênero. Arriagada (2005), ao citar as
5
As políticas afirmativas visam neutralizar os efeitos do preconceito de raça, etnia, gênero, idade, nacionalidade e características
físicas; sua implementação se dá por meio de ações para evitar que pessoas sejam discriminadas com base nesses fatores
(NEVES; LIMA; SILVA, 2014).
6
LGBT, ou ainda LGBTTT, corresponde à sigla de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros. Identifica
orientações sexuais diversas e manifestações de identidades de gênero divergentes do sexo designado no nascimento.
7
As três conferências anteriores das Nações Unidas sobre as mulheres ocorreram, respectivamente, na Cidade do México em 1975,
coincidindo com o Ano Internacional da Mulher; em Copenhagen em 1980; e em Nairóbi em 1985, com o tema de Igualdade,
Desenvolvimento e Paz, avaliando a Década da Mulher instituída pela ONU (1975-1985) (UN WOMEN, 2000).
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políticas dirigidas ao combate da pobreza, bem como à geração de ocupação e de renda como exemplo,
divide tais políticas em quatro grupos. O primeiro grupo refere-se a políticas universais, isto é, que não
fazem distinção por gênero; o segundo, a políticas redistributivas, como alguns programas de transferência
de renda, que muitas vezes têm uma abordagem de gênero; o terceiro grupo diz respeito a políticas de
reconhecimento e direitos culturais, que incluem principalmente medidas legislativas para a equidade de
gênero; e o quarto é composto por políticas de gênero com redistribuição de direitos econômicos, sociais e
culturais, consistindo em políticas de longo prazo, que visam ao empoderamento das mulheres.
Considerando a classificação anterior, observa-se que as políticas públicas assistenciais podem
contribuir para modificar a realidade de populações em estado de extrema carência e vulnerabilidade. Em
países em desenvolvimento, como o Brasil, fatores como chefia feminina de domicílios e pobreza estão
fortemente relacionados. Além disso, vários teóricos discutem acerca da relação entre a divisão de trabalho
e a pobreza das mulheres. Para Melo (2004), a inserção feminina no mercado de trabalho ocorreu em
paralelo com o crescimento das atividades informais e sem remuneração, de modo a concentrar as mulheres
em segmentos menos organizados da atividade econômica. Tomar como beneficiária a mulher chefe do lar
tende tanto a reduzir a pobreza entre as mulheres como a beneficiar as crianças de forma mais intensa, se
comparado às chefias masculinas beneficiárias (NOVELLINO, 2004).
No entanto, embora demonstrem um alto potencial de impacto social, as políticas assistencialistas
não são suficientes para o empoderamento real das mulheres, dada a persistência da discriminação, que
engloba a pauta de cultura política e social. Nesse contexto, indica-se que as políticas públicas específicas
focadas na população feminina mais vulnerável apresentem uma abordagem diversificada, incluindo
programas que contemplam a oferta de serviços e transferência de renda, mas indo além deles.
Também se aponta que, em vez de se concentrarem apenas nas funções reprodutivas das
mulheres, essas políticas destaquem as atividades produtivas ou geradoras de renda, já que algumas
políticas podem causar dependência ao invés de induzirem a mulher a um processo de emancipação
(NOVELLINO, 2004). Na perspectiva da titularidade dos direitos, portanto, as políticas públicas devem
garantir o acesso ao emprego e à renda, ao mesmo tempo em que promovem mudanças culturais.
No que diz respeito às políticas de enfrentamento à violência contra a mulher, há que se pontuar, ao
mesmo tempo, a sua relevância e a especificidade das questões envolvidas. Como assinala Blay (2003), a
violência de gênero consiste em um problema antigo e de âmbito universal, que perpassa historicamente
todos os países, todas as culturas e todos os regimes políticos e econômicos, sendo mais frequente e
legitimada nas regiões do mundo onde prevalece uma cultura de forte cunho patriarcal e sexista, e menos
aceita em culturas que buscam promover medidas igualitárias para as diferenças entre os gêneros. A autora
considera também que, embora as Nações Unidas tenham promovido grandes conferências desde 1975
sobre a situação global das mulheres, foi apenas em 1993 que a Comissão de Direitos Humanos da ONU
incluiu um capítulo de denúncia sobre a violência de gênero e propôs ações para coibir esse tipo de
violência.
A violência de gênero diferencia-se das demais devido a crenças e valores, de modo que a própria
mulher tem, muitas vezes, dificuldade de se reconhecer como vítima do crime. Teske (2005), usando uma
abordagem durkheimiana, explica que, apesar de cada indivíduo possuir valores e gostos específicos, ele
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está ligado a um grupo no qual existe um comportamento dito padrão. A consciência de cada um estaria
subordinada, então, a um conjunto de normas que são impostas aos indivíduos ao longo dos tempos,
criando uma consciência coletiva. Apesar do reconhecimento social e legal de direitos femininos básicos —
como o voto, o acesso ao mercado de trabalho formal e a contracepção, entre outros, a violência contra a
mulher manteve-se, em diferentes níveis e formas, em todas as sociedades contemporâneas. Em
consequência, os casos de violência contra as mulheres perduram por serem predominantemente fruto de
preconceito presente na consciência coletiva, não sendo vistos como uma falta relevante para amplos
setores da sociedade (VIANA; SOUZA, 2015). Essa naturalização do comportamento agressivo contra as
mulheres indica a persistência de um modelo masculino dominante, como adverte Bourdieu (1999), o que
torna a violência de gênero, atualmente, um dos mais graves problemas sociais dignos da atenção do setor
público (VIANA; SOUZA, 2015).
2.1 Gênero, violência e políticas públicas no Brasil
O primeiro arranjo institucional capaz de responder às demandas das mulheres foi a criação do
Conselho da Condição Feminina, no Estado de São Paulo, em 1983. No mesmo estado, surgiu, em 1985, a
Delegacia de Defesa da Mulher, primeiro órgão instituído no Brasil eminentemente voltado para reprimir a
violência contra as mulheres (BLAY, 2003).
A partir de 1985, foram criadas também as Casas-Abrigo e de Acolhida
8
, bem como Delegacias
Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs), subordinadas à Polícia Civil, em outras unidades
federativas (PASINATO; SANTOS, 2008). A característica diferencial dessas delegacias se referia a uma
nova forma de atendimento, que passou a ser realizado por mulheres policiais capacitadas para atender às
denunciantes dos casos de violência. Izumino (1993) constata que, no início da implantação das DEAMs,
algumas policiais ainda reproduziam, por seu condicionamento cultural, um comportamento análogo ao dos
colegas do sexo masculino, mantendo o tratamento inadequado às vítimas. Nota-se, atualmente, uma
tentativa de reverter esse quadro, tanto por meio de treinamentos com as policiais, que, ao ingressarem na
corporação, recebem cartilhas informativas e participam de reuniões reflexivas, como pela atuação junto às
delegacias por parte dos conselhos e órgãos de políticas para as mulheres (MOREIRA, 2015)
9
. Nesse
sentido, ao se referir à naturalização dos crimes sexuais e à convivência pós-violência, Viana e Souza
(2015) ressaltam que os arranjos privados e públicos, que formam a rede de proteção utilizada pelas
mulheres, representam uma possibilidade de reintegração social, legitimando esse aparato estatal.
Em âmbito nacional, o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), vinculado ao Ministério
da Justiça, foi implantado ainda em 1985, no Governo Sarney, para promover políticas que visassem
eliminar a discriminação contra a mulher e assegurar sua participação nas atividades políticas,
econômicas e culturais do País. Posteriormente, no final do segundo mandato de Fernando Henrique
8
As casas-abrigo, por meio de parcerias com órgãos públicos, programas e serviços, acolhem mulheres e seus filhos menores,
vítimas de violência doméstica e familiar, com o objetivo de zelar por sua integridade física e psicológica. Representam uma medida
extrema, aplicada apenas nos casos de risco de vida ou de integridade da vítima ou de seus dependentes.
9
Informação pessoal.
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Cardoso, em 2002, foi criada a Secretaria de Estado dos Direitos da Mulher (Sedim), também vinculada ao
Ministério da Justiça (PINTO, 2006).
A partir da criação do CNDM, e com as reivindicações dos movimentos feministas, e de articulações
como o Lobby do Batom
10
, entre outras, a temática específica sobre a mulher passou a estar presente nas
agendas dos órgãos do Governo. O Ministério do Trabalho, por exemplo, estabeleceu estratégias de
inserção feminina no mercado de trabalho
11
, como a promoção de cursos de capacitação e educação
profissional. Já o Ministério do Desenvolvimento Agrário instituiu programas de cotas que destinavam parte
dos recursos para as mulheres assentadas da reforma agrária e que tinham unidades de agricultura familiar,
o que aumentou de 7% para 30% a participação feminina no Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar (Pronaf). Destaca-se também o Programa Nacional de Ações Afirmativas, de 2002,
coordenado pelo Ministério da Justiça, para garantir a participação de afrodescendentes, mulheres e
pessoas portadoras de deficiência no preenchimento de cargos em comissão na administração pública
(PINTO, 2006).
Entretanto, apenas a partir de março de 2003, com a criação, no primeiro Governo Lula, da
Secretaria Especial de Políticas Para Mulheres da Presidência da República (SPM-PR), com status de
ministério, é possível dizer que a estruturação das políticas para mulheres começou a ocorrer de forma mais
ampla. O CNDM, que desde 1985 teve suas funções e atribuições bastante modificadas, deixou de
pertencer ao Ministério da Justiça em 2003, passando a integrar a estrutura da SPM-PR, contando, em sua
composição, com representantes da sociedade civil e do Governo. Isso ampliou significativamente o
processo de controle social sobre as políticas públicas para as mulheres. O CNDM tem, como uma de suas
atribuições, apoiar a SPM-PR em suas articulações com diversos órgãos da Administração Pública Federal e
com a sociedade civil (BRASIL, 2016).
No entanto, embora possa parecer que a criação de organismos e programas para mulheres no
Brasil tenha sido sistemática e gradual, a desaparição ou a diminuição de status e poder destes já esteve em
discussão em vários momentos. No caso do CNDM, este teve sua autonomia administrativa e financeira
alteradas nas décadas de 80 e 90. Por sua vez, especulações sobre a redução do status da SPM-PR, por
questões orçamentárias e administrativas, surgiram esporadicamente, e, efetivamente, na reforma ministerial
ocorrida em outubro de 2015, a Secretaria Especial de Políticas Para as Mulheres perdeu seu status de
ministério, passando a compor o Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos. Contudo,
tanto o CNDM quanto a SPM-PR têm sido mantidos devido à intensa mobilização dos movimentos de
mulheres e feministas em defesa da manutenção de ambos os órgãos (BRASIL, 2006a).
Como uma das suas ações, a SPM-PR fomentou a realização da 1.ª Conferência Nacional de
Política Para as Mulheres (CNPM), em julho de 2004, na qual se elaborou o I Plano Nacional de Políticas
Para as Mulheres (PNPM). Sucessivamente, na 2.ª Conferência, ocorrida em agosto de 2007, lançou-se o II
10
Organizado em 1987, por Organizações Não Governamentais (ONGs), movimentos sociais e o CNDM, esse lobby se empenhou
por conquistas legais para as mulheres, tendo como resultados: o direito da mulher de tomar decisões sobre a casa e de declarar o
imposto de renda separadamente; a eliminação do direito do homem de impedir que a sua esposa trabalhe em quaisquer
circunstâncias; os mesmos direitos para os filhos tidos fora do casamento e aqueles gerados no matrimônio; o direito à licença-
paternidade paga; a violência sexual como um crime contra os direitos humanos, em oposição ao crime moral, implicando, assim,
em penalidades mais duras para os que cometem crimes sexuais; a expansão dos direitos trabalhistas e previdenciários para as(os)
empregadas(os) domésticas(os), entre outros (PINTO, 2006).
11
Para tanto, foram implementados, no Ministério, em 1996, o Grupo Permanente de Trabalho da Mulher (GPTM) e o Grupo de
Trabalho para a Eliminação da Discriminação no Emprego e na Ocupação (GTEDEO) (PINTO, 2006).
10
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PNPM e, em dezembro de 2011, na 3.ª Conferência, o III Plano, vigente para o período 2013-15
12
“[...] com
ainda maior inserção das temáticas de gênero em diversas frentes do governo” (BRASIL, 2013a, p. 9). O
objetivo, portanto, é aprofundar a transversalidade no tratamento às questões referentes às desigualdades
entre homens e mulheres no Brasil.
O PNPM, nas suas três edições já publicadas, consiste em uma série de propostas que servem
como fundamentação tanto para as políticas federais como para as agendas das secretarias ou dos
departamentos que tratam das políticas para mulheres em nível estadual e municipal. Nesse sentido, os
princípios regentes do PNPM 2013-15 são: (a) promover a autonomia das mulheres em todas as dimensões
da vida; (b) buscar a igualdade efetiva entre mulheres e homens em todos os âmbitos; (c) respeitar a
diversidade e combater todas as formas de discriminação; (d) exercitar o caráter laico do Estado; (e)
universalizar os serviços e benefícios ofertados pelo Estado; (f) requerer a participação ativa das mulheres
em todas as fases das políticas públicas; (g) utilizar a transversalidade como princípio orientador de todas as
políticas públicas (BRASIL, 2013a).
Em relação ao capítulo sobre o enfrentamento à violência de gênero no Brasil, o III PNPM coloca
como objetivo geral a redução dos índices de todas as formas de violência contra as mulheres, e, como
metas, enfoca a expansão e o aperfeiçoamento de serviços especializados para esse enfrentamento em
todos os estados e municípios brasileiros.
Paralelamente, houve avanços também na esfera jurídico-legal, com a introdução de diversas leis,
como a da Lei Maria da Penha (Lei n.º 11.340)
13
em 2006, e da nova Lei do Crime de Estupro (Lei n.º
12.015) em 2009, que caracteriza este como crime hediondo. Para que tais leis fossem reconhecidas por
outros órgãos governamentais e pela sociedade civil, uma série de ações foi tomada pela SPM-PR. Já, em
2015, impulsionada pelo trabalho de movimentos sociais e feministas, entrou em vigor a Lei n.º 13.104/15,
que alterou o Código Penal e incluiu o feminicídio como homicídio qualificado.
Além do lançamento do PNPM, a SPM-PR criou a Política Nacional de Enfrentamento à Violência
contra as Mulheres e o Pacto Nacional de Enfrentamento à Violência contra a Mulher, em 2007
14
(BRASIL,
2011b), compreendendo a ação conjunta dos diversos setores envolvidos no combate, na prevenção, na
assistência e a na garantia de direitos das mulheres. Os fundamentos da política correspondem à
integralidade na atenção às mulheres vítimas, englobando a diversidade e seu conjunto de necessidades; à
intersetorialidade como modelo de gestão, prescrevendo o diálogo mútuo, a reciprocidade e a
horizontalidade entre setores e serviços; à atuação em rede; e à elaboração de normas técnicas e instruções
12
A 4.ª Conferência Nacional de Políticas Para as Mulheres está prevista para ser realizada em Brasília, entre 10 e 13 de maio de
2016, lançando o novo Plano para o próximo período e com a previsão de articulação de um Sistema Nacional de Políticas Para as
Mulheres (SPM-PR, 2016).
13
A Lei n.º 11.340/06 caracteriza como crime a ação ou omissão baseada no gênero, causando à mulher vítima: morte, lesão,
sofrimento físico sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial. Em suma, a Lei Maria da Penha reconhece a obrigação do
Estado em garantir a segurança das mulheres nos espaços público e privado, ao definir as linhas de uma política de prevenção e
atenção no enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher, determinando o atendimento nos casos de vítimas de
violência doméstica (BRASIL, 2013). Ressalta-se, inclusive, que, alguns anos antes da promulgação da Lei Maria da Penha, em
função do caso da própria Maria da Penha Maia Fernandes, denunciado internacionalmente, o Brasil havia sido condenado pela
Organização dos Estados Americanos por negligência e omissão em relação à violência doméstica, recebendo, como uma das
penalidades, a recomendação para que fosse criada uma legislação adequada a esse tipo de violência. Em 2012, a ONU
considerou essa lei como a terceira melhor do mundo para o combate à violência doméstica, sendo superada apenas pelas leis
correspondentes na Espanha e no Chile (DUFLOTH et al., 2015).
14
É interessante assinalar que o Rio Grande do Sul foi o último estado da Federação a assinar o Pacto, o que ocorreu somente em
2011 (GOMES, 2014).
11
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de atendimento, como garantia de qualidade. Para abarcar tais fundamentos, a Política Nacional de
Enfrentamento foi estruturada em quatro eixos: prevenção (ações educativas e culturais); assistência
(fortalecimento da rede de atendimento); enfrentamento e combate (aplicabilidade da legislação); e acesso e
garantia de direitos.
Para tanto, foi adotado em 2010, também pela Secretaria Nacional, o conceito “Rede de
Enfrentamento”, que salienta a relevância do papel de cada parceiro, tanto no combate à violência quanto na
garantia de direitos das mulheres. A Rede de Enfrentamento é composta por formuladores, fiscalizadores e
executores de políticas voltadas para as mulheres, centros de educação e reabilitação aos agressores,
universidades, órgãos federais, estaduais e municipais responsáveis pela garantia de direitos, serviços de
Segurança e Defesa Civil, rede de atendimento e serviços especializados e não especializados para as
mulheres. No âmbito da Rede de Atendimento Especializado estão os Centros de Referência de
Atendimento à Mulher; Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher; Casas-abrigo e Casas
de acolhimento provisório; Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher; Promotorias
Especializadas; Serviços de saúde especializados — violência sexual e doméstica; e a Defensoria da
Mulher.
Em consonância à Rede de Enfrentamento, a SPM-PR lançou, em 2013, o programa “Mulher, Viver
sem Violência”, objetivando integrar e ampliar os serviços públicos existentes voltados às mulheres em
situação de violência. O programa foi elaborado em seis eixos: implementação da Casa da Mulher
Brasileira
15
; ampliação da central de atendimento por telefone; organização e humanização do atendimento
às vítimas; implantação e manutenção dos Centros de Atendimento; campanhas continuadas de
conscientização; e unidades móveis de atendimento no campo e na floresta (SPM-PR, 2015).
A importância e a necessidade desse conjunto de políticas e programas podem ser constatadas pelo
fato que, conforme o Mapa da Violência de 2015, o Brasil está entre os cinco países do mundo com maior
taxa de homicídios femininos (WAISELFISZ, 2015). O Mapa da Violência de 2012 (WAISELFISZ, 2012)
também explicita a gravidade da situação de agressões contra o sexo feminino, evidenciando que os
homicídios de mulheres no País tiveram um crescimento de 217,6% nos últimos 30 anos, o que em parte
pode ser explicado pelo aumento do número de denúncias realizadas. Esses, entretanto, têm sua
especificidade — remetem, primordialmente, à violência doméstica, visto que a maioria dos assassinatos de
mulheres ocorreu por meio de armas brancas, no ambiente domiciliar, sendo estes cometidos por homens
com os quais elas mantiveram relacionamentos de intimidade (NARDI; SILVEIRA; MACHADO, 2013). As
pesquisas também servem de instrumento de coleta de informação acerca da violência na sociedade,
permitindo medir os atos não denunciados ou que não foram detectados em um serviço público — a
chamada “cifra negra” da violência contra as mulheres (CEPAL, 2012) —, que devem ainda ser cobertos
pelos programas específicos.
15
A Casa da Mulher Brasileira, com duas unidades, uma no Distrito Federal e outra em Campo Grande, é um espaço que integra
serviços especializados respectivos à violência contra as mulheres, tais como acolhimento e triagem; apoio psicossocial; Delegacia;
Juizado; Ministério Público, Defensoria Pública; e outros (BRASIL, 2015).
12
Texto Para Discussão FEE, n.
o
144
Observa-se, desse modo, que as mulheres estão mais sujeitas à violência doméstica, especialmente
as mais vulneráveis e de menor escolaridade
16
, já que possuem mais dificuldades para se resguardarem do
agressor. Além disso, outras particularidades acompanham as mulheres violentadas, como a vergonha e a
baixa autoestima, que afetam a imagem que as vítimas têm de si próprias. Para Chauí (1985), a violência
nega às vítimas a possibilidade de construção de seu próprio sujeito e, portanto, de autonomia de si mesma,
sendo um dos fatores que determina a hierarquização nas relações domésticas.
2.2 Políticas públicas e violência de gênero no Rio Grande do Sul
Em âmbito regional, o Governo do Estado do Rio Grande do Sul contou com uma Secretaria
Estadual de Políticas Para as Mulheres (SPM-RS) de 2011 até o início de 2015
17
. Atualmente, o órgão
responsável por essa área no Estado é o Departamento de Políticas Para as Mulheres, que pertence à
Secretaria da Justiça e Direitos Humanos do RS (DPM-SJDH-RS) (Ver Quadro A.1 do Apêndice). A
estrutura do Departamento foi dividida entre a Divisão de Promoção e Autonomia da Mulher e a Divisão de
Enfrentamento à Violência contra as Mulheres. Embora se observem esforços por parte do Departamento
para que as políticas e os programas anteriores sejam mantidos, a mudança de status levou a uma
considerável redução do número de funcionários e de recursos para o setor.
De acordo com o Plano Plurianual - PPA 2012-15, as atividades da SPM-RS atenderiam a três
principais objetivos: (a) promoção de capacitação profissional; (b) prevenção e enfrentamento da violência
contra as mulheres e cidadania, com a criação do Observatório da Violência contra as Mulheres,
fortalecimento da Rede de Atendimento e dos Centros Municipais de Referência de Atendimento à Mulher, e
reordenamento institucional do Centro Estadual de Referência da Mulher Vânia Araújo Machado (CRMVAN);
e (c) efetivação de Direitos das Mulheres, cuja atenção é dada ao fortalecimento do Conselho Estadual da
Mulher, criação de conselhos e organismos de políticas para as mulheres e realização de campanhas sobre
a temática de gênero (BRASIL, 2011a).
Em relação ao primeiro item do PPA — a promoção de capacitação profissional —, sabe-se que as
desigualdades entre homens e mulheres no mercado de trabalho reproduzem os padrões culturais
existentes, impondo às mulheres um status inferior ao dos homens nas diversas esferas sociais e
acarretando forte segregação ocupacional. As políticas públicas relacionadas ao empoderamento das
mulheres trazem benefícios para o desenvolvimento econômico e, mais do que isso, podem atuar na
desestigmatização de profissões e posturas que uma mulher supostamente deveria adotar (ALVES;
CAVENAGHI, 2013) — posturas estas que, muitas vezes, reforçam a economia do cuidado
18
, fazendo com
que a dupla ou tripla jornada feminina seja um dos elementos centrais da desigualdade de gênero entre
atividades produtivas e reprodutivas (ALVES; CAVENAGHI, 2012).
16
Ver resultados do estudo realizado por Mincato, Dornelles e Grassi (2014) intitulado Violência e seus múltiplos
condicionamentos históricos: perfil da mulher vitima de violência doméstica no Brasil, Rio Grande do Sul e Caxias do Sul.
17
A extinção da SPM-RS foi uma das primeiras medidas tomadas pelo governador eleito em 2014, José Ivo Sartori - Lei n.º 14.672 de
1.º de janeiro de 2015, para fins de corte de gastos.
18
A economia do cuidado envolve a atenção para com os filhos e parentes idosos ou com necessidades especiais, atividades de
educação, saúde e de afazeres domésticos. Da economia do cuidado dependem toda a reprodução humana e, portanto, a própria
existência da produção e do mercado (ALVES; CAVENAGHI, 2012).
13
Texto Para Discussão FEE, n.
o
144
Esse aspecto repercute na proporção de mulheres ocupadas sem remuneração, a qual é superior à
dos homens em qualquer setor econômico, sobretudo na agropecuária (BUTTO, 2009). Especificamente,
quanto à autonomia econômica das mais de 750.000 mulheres que residem na área rural do Estado (FEE,
2013), políticas públicas de acesso à terra, entre outras, com o propósito de expandir as atividades
produtivas das mulheres, poderiam trazer benefícios tanto a elas quanto ao setor econômico.
A meta referente aos direitos das mulheres no Rio Grande do Sul foi reforçada pela instalação, em
2012, do Fórum Pró-Equidade de Gênero e Raça/Etnia, relacionado ao Programa Pró-Equidade de Gênero
e Raça (Ver Quadro A.1 do Apêndice). O Programa, que funcionou até 2014, reunia práticas e condutas
para ambientes de trabalho mais igualitários, enquanto o Fórum tratava de discutir a questão no meio online
e de divulgar eventos que estivessem relacionados.
Em sintonia com os objetivos do Programa e do Fórum, pode-se mencionar o Projeto Gênero
Raça/Etnia na Mídia. Criado em 2013, o Projeto pretendia promover a autonomia das mulheres por meio de
uma comunicação pública e plural a partir de cursos de quatro até 30 horas de duração, sem custo de
inscrição e elaborados para universitários, profissionais e comunidade em geral. Realizados, em sua
maioria, em universidades do RS, os cursos contavam com investimento da SPM-PR e eram promovidos por
esta em parceria com a Secretaria de Comunicação do Estado, a Fundação Cultural Piratini, a Fundação
para o Desenvolvimento de Recursos Humanos, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS e as
universidades. Visto que o curso despertou interesse na maioria do público e estimulou o debate em salas
de aula, novas formas de apresentação foram preparadas para distribuição, como o guia para
comunicadores Manual Para Uso Não-Sexista da Linguagem.
Lançado em 2014, o manual visa a que não apenas os programas e ações contenham uma
linguagem oral e escrita não sexista, não hierárquica e equitativa, mas também que comportamentos,
atitudes e expressões discriminatórias sejam restringidos nas administrações públicas e pela sociedade em
geral.
Dentre os tópicos abordados pelo manual, estão o papel da linguagem como agente socializante de
gênero, o uso do neutro e o uso de genéricos, e possíveis mudanças na linguagem administrativa,
promovendo uma linguagem que não exclua ou negue qualquer pessoa.
Além das metas da SPM-RS, destacam-se as metas da Secretaria Estadual de Saúde no PPA 2012-
-15, que abrangiam questões sobre gênero e saúde. Basicamente, buscavam promover ações educativas
para reduzir doenças físicas e psíquicas decorrentes de violência doméstica e sexual, bem como assegurar
o acesso aos serviços de assistência e de saúde em geral.
Constata-se a importância de que os postos e hospitais considerem as dimensões de gênero e etnia,
orientação sexual e deficiência, garantindo os direitos sexuais e reprodutivos como liberdade da sexualidade
e autonomia. Nesse sentido, a efetiva implementação da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das
Mulheres (PNAISM) foi a principal estratégia conquistada pela SPM-RS, em conjunto com a Secretaria
Estadual de Saúde (SES-RS). Na PNAISM, estão traçados os eixos que devem ser seguidos pelos
hospitais, como a atenção aos direitos sexuais e reprodutivos, por meio de: prevenção e tratamento das
Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs); planejamento reprodutivo, relativo ao direito de informações e
métodos para fertilidade e contracepção; prevenção, diagnóstico e tratamento do câncer de colo do útero e
de mama, bem como a atenção às mulheres em situação de violência.
14
Texto Para Discussão FEE, n.
o
144
Ademais, a SES-RS é encarregada da Educação permanente para profissionais em Centros de
Referência de Saúde que atuam na rede de atenção às pessoas em situação de violências. No Rio Grande
do Sul, é possível encontrar 10 Centros de Referência para Atenção Integral às Pessoas Vítimas de
Violência Sexual, sendo quatro deles situados em hospitais em Porto Alegre, e outros seis nos Municípios de
Caxias do Sul, Lajeado, São Leopoldo, Imbé, São Lourenço do Sul e Santana do Livramento. Em Porto
Alegre, cinco hospitais dispõem de serviço de interrupção à gravidez em casos de violência sexual, além de
um hospital em Caxias do Sul, na região metropolitana da Serra, que também disponibiliza esse serviço.
Ressalta-se que, segundo a SES-RS, observou-se avanço na implantação da Notificação Compulsória da
Violência pelos municípios do Estado, por intermédio do serviço dos profissionais de vigilância sanitária.
Por sua vez, no atual Plano Plurianual 2016-19 do RS, a prevenção e o enfrentamento da violência
contra as mulheres, bem como a promoção da autonomia das mulheres e meninas gaúchas, constituem o
objetivo central das políticas para as mulheres no Estado. Da mesma forma, das seis ações contempladas
nesse setor, quatro mencionam diretamente o combate à violência.
Essa ênfase se justifica pelo volume de ocorrências de agressões de todos os níveis contra as
mulheres, principalmente aquelas que acontecem na esfera privada. Conforme o Suplemento Vitimização e
Acesso à Justiça, da PNAD 2009 (IBGE, 2010), entre as pessoas agredidas por cônjuge ou ex-cônjuge no
Rio Grande do Sul em 2009, 95% são mulheres. Destas, seis em cada 10 declaram haver sofrido agressão
mais de uma vez — havendo casos de mulheres agredidas até 30 vezes. Nessa pesquisa, a maioria das
vítimas de violência doméstica estava na faixa etária entre 40 e 65 anos. O dado referente à cor, contudo,
deve ser analisado com cuidado: enquanto 67,4% das mulheres que sofreram agressão se declararam de
cor branca (contra 82,3% de mulheres brancas na população total da amostra), 32,6% das agredidas
declararam-se de cor ou raça preta ou parda (contra 17,3% da população total), o que mostra uma
representação proporcionalmente maior de mulheres negras nos casos de violência doméstica. É importante
enfatizar que a pesquisa mencionada considerou apenas a violência física e sexual, caracterizadas como
agressão física, e não abrangeu outras formas de violência contra a mulher, como a moral, a psicológica ou
a econômica (ANJOS, 2014).
Dados da Secretaria de Segurança Pública do Rio Grande do Sul (RIO GRANDE DO SUL, 2014a)
corroboram as informações sobre as ocorrências. De acordo com esse documento, os registros policiais de
2012 evidenciam 44.991 denúncias de ameaça, 27.144 de lesão corporal, 1.391 denúncias de estupros e
101 feminicídios consumados. Em 2013, os registros apresentam 43.696 ameaças, 26.179 lesões corporais,
1.259 estupros e 92 feminícidios consumados, havendo registros de 229 atentados de feminicídio. Isso
demonstra que, embora a rede de enfrentamento e atendimento às vítimas tenha sido reestruturada e
aprimorada, o índice desses tipos de crime continua elevado
19
.
Outra possível razão da ênfase nessa temática, no contexto das políticas públicas, relaciona-se à
concordância entre instâncias governamentais e algumas organizações não governamentais a respeito da
19
Esse dado possivelmente sofre a influência recente do aumento dos registros de denúncias, podendo reduzir-se mais ainda quando
o número de denúncias acompanhar o número de crimes ocorridos de fato.
15
Texto Para Discussão FEE, n.
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questão da violência contra as mulheres, considerada menos polêmica e menos suscetível a
questionamentos do que temas como aborto, transgêneros e homossexualidade
20
.
Os municípios também têm sido impulsionados a ampliar seus espaços de políticas para as
mulheres mediante a adesão ao Pacto de Enfrentamento da Violência contra a Mulher, além do Programa
Gabinete do Prefeito (ver Quadro A.1 do Apêndice), levado a cabo em cooperação com a Federação das
Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs) e o Tribunal de Contas do RS. A partir da criação
de órgãos temáticos específicos, como os conselhos municipais (COMDIMs), as secretarias e as
coordenadorias (Tabela 1), juntamente com a organização de conferências municipais, há um
encaminhamento para a elaboração dos respectivos planos municipais de políticas para as mulheres, com a
finalidade de traçar as diretrizes para a implementação de políticas de gênero consonantes com o Estado e
a União.
Tabela 1 Municípios do RS com órgãos de enfrentamento à violência contra as mulheres,
por faixas de tamanho do município — 2015
HABITANTES POR
MUNICÍPIOS
TOTAL DE
MUNICÍ-
PIOS
TOTAL DE
MUNICÍPIOS COM
ALGUM ÓRGÃO
MUNICÍPIOS COM
SECRETARIA
MUNICÍPIOS
COM
COORDENADORIA
MUNICÍPIOS COM
CONSELHOS
MUNICIPAIS
(COMDIM)
Número
Absoluto
Participa
-ção %
Número
Absoluto
Participa
-ção %
Número
Absoluto
Participa-
ção %
Número
Absoluto
Participa
-ção %
1 - Até 5.000
...................
220 10 5 1 0 4 2 6 3
2 - 5.001 até 10.000
.......
110 9 8 0 0 4 4 5 5
3
-
10
.
001 até 20
.
000
.....
60
23
38
1
2
9
15
21
35
4 - 20.001 até 50.000
.....
64 30 47 1 2 11 17 28 44
5
-
50
.
001 até 100
.
000
...
24
21
88
0
0
16
67
18
75
6 - 100.001 até 500.000
18 18 100 0 0 14 78 17 94
7 - Maior que 500.0000
..
1 1 100 0 0 1 100 1 100
TOTAL
............................
497 112 23 3 1 59 12 96 19
FONTE DOS DADOS BRUTOS: DPM-SJDH-RS e Prefeituras Municipais do RS.
Além dessas iniciativas, o DPM-SJDH-RS, em conjunto com o Conselho Estadual dos Direitos das
Mulheres (CEDM-RS) e o Fórum Estadual da Mulher (FEM-RS), tem a incumbência de organizar a
Conferência Estadual de Políticas Para Mulheres, para a qual são enviadas as delegadas constituídas em
cada conferência municipal
21
. Esse evento conta com regimento federal e estadual, e, além das delegadas,
reúne estudiosos do tema, assim como a comunidade em geral.
3 A transversalidade nas políticas públicas de gênero: o caso
da Rede Lilás do Rio Grande do Sul
Em 2013, com o propósito de reforçar o diálogo e a troca de saberes entre os órgãos
governamentais e não governamentais, a então SPM-RS instituiu a Rede Lilás. Por meio desta, realizou-se
uma gestão transversal, implicando uma articulação, horizontal e não hierárquica, com o objetivo de
20
Há que levar em conta, outrossim, a pressão de setores parlamentares de tendência ultraconservadora que têm-se mobilizado para
impedir avanços das demandas feministas e de grupos trans e homossexuais.
21
A mais recente dessas foi a V Conferência Estadual de Políticas para as Mulheres do Rio Grande do Sul, ocorrida nos dias 7 e 8 de
novembro de 2015 e que teve como eixo central a demanda por mais direitos, participação e poder para as mulheres. Um dos seus
objetivos principais foi o de elaborar as propostas a serem levadas à 4.ª Conferência Nacional, em Brasília.
16
Texto Para Discussão FEE, n.
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144
influenciar o desenho, a formulação, a execução e a avaliação do conjunto das políticas públicas para as
mulheres em áreas diversas.
O primeiro passo tomado pela SPM-RS na criação da Rede Lilás foi a implantação do Comitê Gestor
Para Políticas Públicas de Gênero, hoje Comitê Rede Lilás
22
. Dessa maneira, o recorte de gênero estaria
presente nos programas implementados em todos os órgãos da administração direta e indireta.
As principais ferramentas de articulação da Rede Lilás são: o Telefone Lilás, central de apoio
gratuito para monitorar a proteção das vítimas e acionar os organismos públicos e conselhos da mulher; a
Patrulha Maria da Penha, para observar as mulheres em medidas protetivas e seus agressores; as DEAMs;
e as Casas-Abrigo e de acolhida para as vítimas. Nesse sentido, menciona-se que, no Estado do Rio
Grande do Sul, tem havido um esforço no sentido de elaboração de políticas e de implementação de
programas que abranjam o ciclo completo do enfrentamento à violência contra a Mulher, tendo em conta a
atuação conjunta da SPM-RS com a Secretaria de Segurança Pública do RS (SSP/RS) (MOREIRA, 2015)
23
.
Como responsáveis pela instauração de inquéritos policiais contra os agressores e pelo
encaminhamento de processos penais ao Tribunal de Justiça, informando o Ministério Público, as DEAMs e
os Postos de Atendimento à Mulher (Tabela 2) são os locais para onde muitas mulheres se direcionam após
serem agredidas. Para aquelas que residem em lugares de difícil acesso, existem as Delegacias Móveis,
prestando atendimento itinerante, e o Ônibus Lilás de Atendimento, adaptado para atendimentos distantes
das cidades, como comunidades quilombolas, indígenas e pescadoras.
Para proporcionar espaços de acolhimento mais privativo e seguro às vítimas, foram instauradas as
Salas Lilás (Tabela 2), tanto nas DEAMs como nos Postos de Atendimento à Mulher. Estas mantêm peritos
qualificados para a sexologia forense e técnicas de entrevistas. As Salas também permitem que a vítima
seja isolada do agressor na Delegacia, caso o crime tenha sido em flagrante, e é também nesses espaços
que os exames de corpo de delito são realizados.
22
Conforme o Decreto n.º 52.511, de 13 de agosto de 2015, os órgãos participantes do Comitê Rede Lilás são: (a) a Secretaria da
Justiça e Direitos Humanos (inclusive o Departamento de Políticas para as Mulheres e o CRM VAM); (b) o Gabinete de Políticas
Sociais; (c) a Casa Civil; (d) a Secretaria Geral do Governo; (e) a Coordenação de Comunicação; (f) a Secretaria de Segurança
Pública; (g) a Secretaria de Saúde; (h) a Secretaria de Educação; (i) a Secretaria do Trabalho e do Desenvolvimento Social; (j) a
Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência e tecnologia; (k) a Secretaria de Obras, Saneamento e Habitação, (l) a
Secretaria de Agricultura e Pecuária; (m) a Secretaria da Cultura; (n) a Secretaria de Desenvolvimento Rural e Cooperativismo; (o)
a Secretaria de Turismo, Esporte e Lazer; (p) o Banco do Estado do RS; (q) a Procuradoria Geral do Estado; (r) a Assembleia
Legislativa do RS; (s) a Ordem dos Advogados do Brasil-RS; (t) Instituições de Ensino Superior com atividades relacionadas à
temática.
23
Informação pessoal.
17
Texto Para Discussão FEE, n.
o
144
Tabela 2
Municípios do RS com equipamentos de enfrentamento à violência contra as mulheres, por faixas de tamanho do município — 2015
HABITANTES POR
MUNICÍPIOS
TOTAL
DE
MUNICÍ-
PIOS
TOTAL DE
MUNICÍPIOS
COM ALGUM
EQUIPAMENTO
MUNICÍPIOS
COM DEAM
MUNICÍPIOS
COM POSTO
POLICIAL PARA
A MULHER
MUNICÍPIOS
COM
PATRULHA
MARIA DA
PENHA
MUNICÍPIOS
COM SALA
LILÁS
Número
Absoluto
Partici-
pação %
Número
Absoluto
Partici-
pação
%
Número
Absoluto
Partici
-pação
%
Número
Absoluto
Partici-
pação
%
Número
Absoluto
Partici-
pação
%
1 - Até 5000 ...............
.....
220 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
2 - 5.001 até 10.000 .....
..
110 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
3 - 10.001 até 20.000 ...
..
60 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
4 - 20.001 até 50.000
.....
64 11 17 0 0 10 16 1 2 0 0
5 - 50.001 até 100.000 24 17 71 6 25 10 42 7 29 3 13
6
-
100.00
1 até 500.000
18
18
100
15
83
2
11
13
78
3
17
7 - Maior que 500.0000
1 1 100 1 100 0 0 1 100 1 100
TOTAL .....................
......
497 47 9 22 4 22 4 22 4 7 1
FONTE DOS DADOS BRUTOS: DPM-SJDH-RS e Polícia Civil do RS.
NOTA: Alguns municípios, como Porto Alegre, contam com mais de um equipamento; assim, o total de Patrulhas Maria da Penha no Estado chega a 30.
Nas Delegacias, o processo de atendimento às vítimas é padrão, iniciando pelo Boletim de
Ocorrência, que deve passar por inquérito em, no máximo, seis meses. Caso haja lesão corporal no
momento da queixa, a vítima é encaminhada ao Departamento Médico Legal e, em situação de medida
protetiva, é aberto um processo e enviado ao Juizado da Violência Doméstica, para que a medida seja
deferida em até dois dias. Igualmente, em seguida à denúncia efetuada na DEAM, abre-se um processo
para ser enviado ao Ministério Público, onde as mulheres que não possuem recursos recebem informações
e auxílio jurídico. Esses processos, por sua vez, são agendados para audiência pública (no caso de Porto
Alegre, no Juizado da Violência Doméstica e Familiar), que são realizadas semanalmente. Nesse momento,
as mulheres decidem se querem manter a denúncia, a reconciliação ou a separação (MENEGHEL et al.,
2011).
Ainda sobre as DEAMs, observa-se que o Ministério da Justiça aportou R$ 12,8 milhões para o
fortalecimento desses serviços em 12 estados, em 2013. Apesar disso, a percepção das mulheres em
situação de violência sobre os serviços prestados pelas delegacias especiais é de descaso e desamparo. De
acordo com pesquisa efetuada em Porto Alegre, a finalização do processo para essas mulheres torna-se
longa e, muitas vezes, não as faz sentir que foram ouvidas ou compreendidas. Uma entrevistada coloca o
seu desabafo: “[...] falei pro advogado, e o advogado nada fez, só que a justiça gratuita é muito suja e eles
não fazem nada pra gente. A gente tem que comer o pão que o diabo amassou, porque a gente não sabe ler
e é pobre, a mulher pobre e negra não tem direito de falar, eles não deixam a gente falar” (MENEGHEL et
al., 2011, p. 746).
Em uma pesquisa realizada nas DEAMs de Porto Alegre, ressaltou-se outra importante questão a
ser observada principalmente pelo Poder Judiciário, relacionada ao ambiente de trabalho das vítimas. O
caso citado diz respeito a uma mulher assassinada em 2012, que contava com medida protetiva e morava
na Casa Viva Maria, também na capital, mas era comumente ameaçada pelo ex-namorado. De acordo com
os boletins de ocorrência registrados pela vítima, o agressor ligou avisando-a de que iria até seu local de
trabalho (uma lavanderia) para matá-la e assim o fez. Na mesma pesquisa, há o relato sobre outra vítima de
18
Texto Para Discussão FEE, n.
o
144
violência doméstica, que alegou a necessidade de ter um homem dentro de casa, tendo em vista o bairro
violento e com forte presença de tráfico no qual o casal morava, expondo por completo a complexidade do
assunto. Mesmo que frequentemente violentada pelo marido, a vítima entendia que o casamento lhe
expunha a apenas um agressor ao invés de vários (NARDI; SILVEIRA; MACHADO, 2013).
A respeito disso, está sendo implementado um plano de reestruturação das DEAMs do RS, do qual
fazem parte: a uniformização documental e a inclusão de dados estatísticos; a capacitação permanente de
profissionais
24
; o protocolo de confecção de ocorrências policiais; a reestruturação dos serviços de plantões;
e convênios de fortalecimento.
Uma inovação da SSP-RS é a busca online de Pesquisa de Medidas Cautelares Diversas da Prisão
e Protetivas pela Lei Maria da Penha. A ferramenta permite acompanhar as medidas protetivas a partir de
nome da vítima ou agressor e comarca enquanto estiver em andamento. Ao fim do período da medida, o
registro automaticamente cai do sistema. A SSP-RS conta também com o Observatório da Violência contra
as Mulheres, integrando o ciclo de enfrentamento à violência contra as mulheres. É função do Observatório,
com seu departamento de estatística, levantar dados para formulação e avaliação de políticas públicas
incluídas em programas como a Rede Lilás.
A respeito das Redes de Atendimento e Enfrentamento da Violência às Mulheres, uma das principais
portas de entrada no Rio Grande do Sul é o Centro Estadual de Referência da Mulher Vânia Araújo
Machado. Localizado em Porto Alegre, o Centro mantém e capacita assistentes sociais, psicólogas(os),
advogadas(os) e agentes públicos para melhor atender as gaúchas. A responsabilidade do CRMVAM é de
atender as mulheres que tenham acionado o Telefone Lilás, ou prestar atendimento pessoalmente. Caso a
mulher que use o serviço do Telefone Lilás esteja em outra cidade, o órgão aciona as instituições cabíveis
da cidade de origem da ligação. Além do Centro Estadual de Referência, há 19 Centros de Referência
Municipais de Atendimento às Mulheres no Estado (Tabela 3). Quanto ao acolhimento das mulheres vítimas
de violência doméstica, assim como em situação de vulnerabilidade social, 12 Casas-Abrigo estão em
funcionamento no Rio Grande do Sul
25
.
Uma medida inovadora consiste no tratamento dos homens agressores, com o objetivo de romper o
ciclo de violência contra a mulher. Nesse caso, salienta-se o Projeto Metendo a Colher, implantado como
piloto, em 2013, no Presídio Central de Porto Alegre, pela Coordenadoria da Mulher na Superintendência
dos Serviços Penitenciários (Susepe), e que intenciona reeducar os aprisionados primários e reincidentes
envolvidos apenas com violência doméstica, fazendo com que os agressores recebam tratamento e
informações sobre as normas judiciais. O mesmo projeto está sendo implementado como piloto na
Penitenciária Feminina Madre Pelletier, localizada em Porto Alegre, tendo como foco, nesse local, a
prevenção da violência doméstica. Com teor similar, salientam-se as edições da Semana da Justiça Pela
Paz em Casa, desenvolvidas pelo Tribunal de Justiça, por meio da Corregedoria Geral, atividade também
destinada aos detentos envolvidos em violência doméstica (RIO GRANDE DO SUL, 2016).
24
As atividades de capacitação sobre questões de gênero para funcionários de diversas secretarias e órgãos estaduais foram
incrementadas após a instalação da SPM-RS. Como exemplo, cita-se que, em 2011, a Fundação para a Escola de Governo -
Fundação para o Desenvolvimento de Recursos Humanos (FDRH), em parceria com a SPM-RS desenvolveu o Programa de
Capacitação em Políticas Públicas para Mulheres, destinado a servidores do Estado.
25
Por se tratar de informação confidencial, não é possível divulgar a localização das casas-abrigo no Estado.
19
Texto Para Discussão FEE, n.
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144
Tabela 3
Municípios do RS com serviços de enfrentamento à violência contra as mulheres,
por faixas de tamanho do município — 2015
HABITANTES POR
MUNICÍPIOS TOTAL DE
MUNICÍPIOS
TOTAL DE
MUNICÍPIOS
COM ALGUM
SERVIÇO
MUNICÍPIOS
COM CENTRO
DE
REFERÊNCIA
MUNICÍPIOS
COM JUIZADOS DE
VIOLÊNCIA
DOMÉSTICA
Número
Absoluto
Partici-
pação %
Número
Absoluto
Partici-
pação %
Número
Absoluto Partici-
pação %
1 - Até 5.000 ................
.....
220 0 0 0 0 0 0
2 - 5.001 até 10.000 ....
.....
110 1 1 1 1 0 0
3 - 10.001 até 20.000 ..
.....
60 0 0 0 0 0 0
4
-
20
.
001 até 50
.
000
..
.....
64
2
3
2
3
0
0
5 - 50.001 até 100.000 .
....
24 7 29 7 29 0 0
6
-
100
.
001 até 500
.
000
...
18
10
56
7
39
7
39
7 - Maior que 500.0000
....
1 1 100 1 100 1 100
TOTAL ..........................
...
497 21 4 18 4 8 2
FONTE DOS DADOS BRUTOS: DPM-SJDH-RS e Prefeituras Municipais do RS.
NOTA: Alguns municípios, como Porto Alegre, contam com mais de um serviço; assim, o total de Centros de Referência no
Estado chega a 19 e o de Juizados a 9.
Outro projeto, em implementação desde janeiro de 2014, também visa oferecer segurança às
mulheres vítimas. Neste, os agressores utilizam uma tornozeleira para serem monitorados e, assim,
asseguram a fiscalização das medidas protetivas de urgência. Para o mesmo fim, foi lançado, em dezembro
de 2014, um aplicativo para celular (PLP 2.0) às mulheres vítimas de violência doméstica que tenham em
seu favor medidas de proteção. A ferramenta é produto da parceria entre a ONG Themis - Gênero e Justiça,
o Tribunal de Justiça do Estado e outras instituições, como a SSP-RS e a extinta SPM-RS. Essas políticas,
bem como as citadas anteriormente, estão expostas no Quadro A.1 do Apêndice (Composição da Rede
Lilás).
Por fim, no que diz respeito ao empoderamento do ponto de vista material, a Rede Lilás abarca
programas econômicos com enfoque de gênero em políticas públicas estaduais e federais. Atua
especificamente no programa RS Mais Igual, por meio do Crédito Lilás e cursos profissionalizantes, tentando
garantir a transferência de renda e a inclusão produtiva das mulheres, além de permitir que as mulheres
integrantes da Rede e economicamente ativas busquem crédito para investimentos. Embora os programas
ainda estejam em execução, o número de beneficiárias é baixo, considerando-se o grau de exigência para
receber empréstimos e a falta de divulgação dos cursos profissionalizantes
26
.
Ademais, observa-se que o
Crédito Lilás era incentivado pelo governo nacional e estadual, com subsídio para as taxas de juros,
tornando-as mais acessíveis. A partir de 2015, entretanto, essa linha de crédito deixou de receber o
subsídio, o que contribuiu para que deixasse de ter procura pelas possíveis interessadas (ZIMMER, 2016)
27
.
26
Além dos critérios convencionais para obtenção de crédito, como a caracterização da atividade empreendedora, e não ter
pendências no SPC ou Serasa, no caso do Crédito Lilás, é necessário ter a comprovação do destino do recurso, já que não se trata
de um crédito balcão, mas de um crédito orientado.
27
Informação pessoal.
20
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4 Desafios da Rede Lilás frente às orientações do III PNPM -
2013-15
Na análise das políticas públicas de gênero no Rio Grande do Sul, denota-se que a Rede Lilás se
destaca por seus princípios de transversalidade e de integração, os quais transparecem no intento de
consolidar os mecanismos de gênero nos órgãos e nas secretarias. Segundo o III Plano Nacional de
Políticas Para as Mulheres (BRASIL, 2013a), a questão de gênero somente é institucionalizada quando
todos os órgãos governamentais internalizam o olhar para o tema em suas ações cotidianas.
Um exemplo dessa institucionalização é dado no caso da instalação da Coordenaria da Mulher na
Susepe, pela SSP-RS. Contudo, nota-se que algumas secretarias, como a de Saúde, embora presentes em
encontros do Comitê Lilás e com recortes para gênero em algumas políticas, não possuem setor
responsável por políticas para gênero. O mesmo ocorre com a Secretaria de Educação e com a Secretaria
de Comunicação. Das 19 secretarias do Governo do Estado, apenas uma conta com coordenadoria
específica para o tema, evidenciando um aspecto a ser aprimorado pelas políticas estaduais, frente ao que é
recomendado no Plano Nacional.
Por outro lado, o diálogo com a sociedade civil e com os municípios tem aumentado, devido às
Conferências Municipais e à Conferência Estadual, assim como pelos projetos que visam conscientizar
futuros comunicadores para que incluam uma linguagem não sexista na mídia, no contato diário com seu
público.
No que tange ao exercício do caráter laico do Estado
28
, no entanto, ainda há muito para avançar,
dado que o reconhecimento da diversidade de gênero nas políticas públicas representaria um passo à frente
na questão. Do mesmo modo, a discussão dos direitos sexuais e reprodutivos é urgente para que, enfim,
todos e todas exerçam seus direitos humanos. Novamente, aqui, a mídia seria peça-chave para a formação
de opinião a respeito dos diferidos direitos. Outrossim, a inclusão da dimensão de gênero nos programas
escolares é um exemplo de uma política que pode servir para fomentar o pensamento crítico a respeito das
desigualdades entre homens e mulheres (BLAY, 2003).
Por sua vez, há necessidade de maior atenção para com as crianças envolvidas com a violência
doméstica que, muitas vezes, presenciam as agressões ou até o feminicídio da mãe. Sobre os custos
intangíveis da violência doméstica na América Latina e no Caribe, os estudos de Aguero (2013) sugerem a
influência negativa à saúde dos filhos, inclusive antes do nascimento, de mães vítimas de agressões. Além
de essas mães realizarem menos consultas pré-natais e serem induzidas a uma situação de estresse
durante a gravidez, o que pode lesionar o sistema cognitivo e a saúde da criança em gestação, em geral, os
efeitos nocivos aumentam após o nascimento. Conforme aponta o autor, filhos de mães que sofreram
agressão durante a gravidez possuem estatura e peso inferiores aos de outras crianças. Para as crianças
envolvidas na violência doméstica, é mais comum que essas tenham sintomas frequentes, como diarreia, e
que recebam menos atendimentos e vacinas.
28
Já no I PNPM, a laicidade do Estado consta como premissa para que as políticas públicas de gênero sejam formuladas e
implementadas “[...] de maneira independente de princípios religiosos, de forma a assegurar efetivamente os direitos consagrados
na Constituição Federal e nos diversos instrumentos internacionais assinados e ratificados pelo Estado brasileiro, como medida de
proteção aos direitos humanos das mulheres e meninas” (BRASIL, 2004, p. 32).
21
Texto Para Discussão FEE, n.
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Dito isso, ressalta-se que, além de políticas direcionadas às mulheres, as políticas de igualdade de
gênero exigem tanto políticas universais quanto políticas de família, porém com uma visão não reducionista
sobre o conceito de núcleo familiar.
Cabe ressaltar que os cuidados com os filhos e trabalhos domésticos estão intimamente ligados à
autonomia dos sujeitos, pois mais tempo livre é fator crucial para o aumento de capacitação profissional,
estudo e lazer feminino. Para Silveira (2004), a ampliação de creches melhora as possibilidades de trabalho
remunerado às mães, além de resguardar o direito da criança ao bem-estar e à educação de qualidade.
Outro aspecto importante, que é tratado nas políticas nacionais de gênero, relaciona-se ao tráfico
internacional de mulheres para fins de exploração sexual, revelando um setor carente de atenção pelo
Governo do Estado do Rio Grande do Sul. Parte de uma das principais rotas de tráfico do Brasil
29
, o RS
conta com o Comitê Estadual de Atenção a Migrantes, Refugiados, Apátridas e Vítimas de Tráfico de
Pessoas do Estado do Rio Grande do Sul (Comirat), criado em 2012, mas sem recorte específico de gênero,
mesmo sabendo que a maior parte de indivíduos traficados é constituída por mulheres (LEITÃO, 2014).
Nesse sentido, a Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, instituída pelo Decreto
Presidencial n.º 5.948/ 2006, ainda não está sendo abordada no Estado com suas devidas especificidades.
Um aspecto também relevante e que ainda está pendente diz respeito à implantação de Defensorias
Públicas da Mulher. Salienta-se que, desde 2008, a Defensoria Pública do Estado do RS conta com o
Núcleo de Defesa da Mulher (Nudem), que presta atendimento especializado a mulheres em situação de
violência (ver Quadro A.1 do Apêndice). Entretanto, as defensorias especializadas, projetadas ainda no
período da SPM-RS, não foram implementadas no Estado. Isso faz com que, tanto nas DEAMs como nas
Defensorias Públicas, o sentimento de grande parte das vítimas seja de desamparo relativamente aos seus
direitos. Destaca-se que muitas vezes o defensor não se inteira do processo antes da audiência e que há
grande rotatividade entre esses profissionais; desse modo, os advogados não contemplam nada além do
que já é descrito no Boletim de Ocorrência, sendo que este, muitas vezes, não corresponde à realidade das
vítimas, e sim ao entendimento do inspetor de polícia ou do escrivão que fez o atendimento inicial
(MENEGHEL et al., 2011).
Para que ocorra o monitoramento e a avaliação das políticas públicas específicas, observa-se a
relevância de contar com sistemas confiáveis de informações. Assim, face à dispersão de dados e à falta de
informações imprescindíveis, bem como de divulgação e implementação de programas e serviços, frisa-se a
necessidade premente de maiores investimentos financeiros e humanos na área (PRÁ, 2010). Dados
dispersos das DEAMs do Rio Grande do Sul impossibilitam o Observatório da SSP-RS de realizar análises
longitudinais ou comparativas, por exemplo. Igualmente, a falta de informações relacionadas às instituições
também pode atrasar o processo de enfrentamento contra a violência à mulher, pois, nesse caso, o Governo
do Estado não tem o pleno conhecimento das dificuldades encontradas para implementação da política em
determinado local. Uma fonte que tem sido utilizada com frequência é a do acompanhamento das
29
Pesquisa realizada em 2002 identificou 241 rotas nacionais e internacionais de tráfico de pessoas no Brasil, passando por 19
estados e pelo Distrito Federal. No Rio Grande do Sul, levantamentos da Polícia Rodoviária Federal indicaram as rotas principais de
tráfico humano por via terrestre nas rodovias que cortam o RS — BRs 116 (Pelotas-Jaguarão), 472 (Uruguaiana-Barra do Quaraí) e
471 (Santa Vitória do Palmar-Chuí), além de uma rota de tráfico infantil para o exterior, com destino à Argentina e ao Uruguai Os
aeroportos de Porto Alegre, Uruguaiana e Caxias do Sul também são apontados como pontos de saída usuais de pessoas
traficadas, em especial mulheres (BRASIL, 2006; LEITÃO, 2014).
22
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notificações da violência por serviço (notificação compulsória nos hospitais), por meio do Sistema de
Informação de Agravos de Notificação (SINAN-NE), do Ministério da Saúde (SILVA, 2015)
30
.
Outro ponto a ser reavaliado diz respeito a que uma grande parcela das ligações de denúncia tem
origem por intermédio do Disque 180, central de atendimento federal da SPM-PR. Embora a conexão da
central federal até o CRMVAM e outros órgãos municipais do RS seja rápida (em torno de 24h, no máximo),
o ideal, para agilização dos casos, seria que as denúncias fossem feitas diretamente à Rede Lilás, pelo
Telefone Lilás.
Avalia-se também a efetividade do Crédito Lilás, para o qual os pré-requisitos para cadastro são
vistos como um obstáculo, ocasionando que as mulheres mais afetadas pela violência doméstica dificilmente
tenham acesso a ele, além da atual falta de subsídios a essa modalidade específica de microcrédito. Pode-
-se perguntar, afinal, para quem estariam sendo elaboradas tais políticas, dada a sua inacessibilidade.
Por sua vez, embora conste em documentos oficiais da SPM-RS (2011-14) a existência da Câmara
Técnica Estadual de Gestão e Monitoramento do Pacto de Enfrentamento a Violência contra Mulheres —
órgão que deveria constituir, fortalecer e monitorar as políticas respectivas ao Pacto —, os dados referentes
às políticas estão dispersos entre secretarias estaduais e são de difícil acesso para a sociedade civil,
inclusive para a comunidade acadêmica, não levando em consideração, dessa forma, a necessidade de
transparência e prestação de contas sobre os serviços.
Por último, aponta-se a relevância da divulgação dos programas e serviços não só para
representantes da sociedade civil, mas também para os servidores públicos, principalmente para os
servidores e colaboradores envolvidos com a temática de gênero.
De qualquer forma, na comparação entre as políticas da Rede Lilás com as orientações traçadas
pelo último PNPM, surge a constatação de que, conquanto haja muito ainda por fazer, o caminho já foi
iniciado e a questão de gênero, mesmo enfrentando percalços, vem perpassando a estrutura de secretarias
e órgãos públicos estaduais.
5 Considerações finais
Nas referências à subordinação feminina, sustentada pelas matrizes histórico-culturais de ordem
patrimonial, patriarcal e autoritária (BLAY, 2003), é comum que não se associe o fenômeno ao cotidiano,
tanto no âmbito público quanto no privado. Dada a necessidade de mudança de comportamentos, crenças e
valores, tanto individuais como coletivos, reitera-se a importância dos atos normativos por parte do Estado,
por meio de políticas de médio e longo prazos, para que certos temas se tornem pauta e, dessa forma,
despertem questionamentos que confrontem a ordem social.
Acordos e eventos internacionais, como os Princípios de Empoderamento das Mulheres, lançados
pela ONU, e o Pacto Global, assim como os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e a Campanha
Pequim+20, em referência aos 20 anos da Conferência de Pequim, em 1995, têm pressionado o Governo
Federal para que se disponha a agir mais firmemente a favor da equidade de gênero. A ação requerida
30
Informação pessoal.
23
Texto Para Discussão FEE, n.
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144
centra-se na desigualdade entre homens e mulheres, abrangendo um ciclo que não reúne apenas a
violência doméstica, mas também a sub-representação feminina na política, as diferenças salariais entre os
sexos e o trabalho doméstico não remunerado em que a maioria das mulheres está envolvida. Assim sendo,
é possível instaurar o ciclo de enfrentamento contra a violência doméstica, que atue a partir do momento da
denúncia da vítima, bem como as políticas públicas de promoção de crédito para mulheres, cursos
profissionalizantes e programas de oportunidade, que insiram a mulher no mercado de trabalho.
Essa transformação requer, contudo, o fortalecimento de instituições governamentais eficazes,
democráticas e com legitimidade perante os cidadãos e cidadãs, que pode vir a partir do cumprimento das
cotas femininas nas eleições, contrariando a realidade de leis que são feitas por homens e para homens. A
penalização da falta de apoio às candidaturas femininas pelos partidos políticos e um planejamento mais
eficaz do processo eleitoral podem acarretar mudanças na equidade entre os sexos.
Incluir um recorte de gênero em políticas públicas, de maneira geral, auxilia na promoção de
autonomia das mulheres e na busca efetiva da igualdade dos sexos reconhecida pela Constituição brasileira.
Caso contrário, o empenho para que se erradique a violência contra a mulher se tornará cada vez mais alto
e, uma vez que só abarca o ciclo já instaurado, mas não a prevenção, por meio de um trabalho educativo e
de formação, pode vir a impactar menos no longo prazo.
Políticas públicas de gênero surgem, portanto, para que as mulheres sejam capazes de vencer sua
condição de desigualdade em uma sociedade restrita ao não reconhecimento da diferença e do outro. O
propósito de tais políticas é dar espaço à redefinição do sujeito feminino com base na cultura, nas relações
de trabalho e nas formas de inserção do mundo político, estabelecendo, assim, novas possibilidades de
emancipação e equidade. Logo, conclui-se que a transversalidade nas políticas públicas com enfoque de
gênero é crucial para que as mesmas desempenhem o principal papel para o qual foram concebidas:
mudança de comportamento. Somente a partir de um olhar de estranhamento ao que já foi normalizado é
que se pode atingir a equidade entre gêneros, olhar esse que pode surgir de programas escolares que
prezem pelo respeito ao próximo e estejam atentos à instrução dos alunos e das alunas
31
, de campanhas
veiculadas nas principais mídias sociais, da obrigação de salários equitativos por parte de organizações
privadas, e de programas como a Rede Lilás no Rio Grande do Sul. Dessa forma, no caso específico das
mulheres, a inclusão das suas pautas na mobilização pelo reconhecimento de direitos humanos caracteriza-
-se nos dias de hoje pelos esforços de órgãos governamentais e não governamentais, por meio de ações
que visem à equidade de gênero, respeito à diversidade e afirmação de cidadania e democracia,
sistematizando e incorporando as políticas de gênero às políticas do Estado.
Em termos de avaliação, dado que a maior parte dessas políticas teve implantação muito recente,
não é possível ainda quantificar seus resultados, mas algumas tendências já despontam, como o aumento
das denúncias e dos registros de ocorrências, o debate sobre a violência de gênero em esferas
governamentais, universidades e nas redes sociais e a mudança de visão das próprias mulheres atingidas,
que vêm buscando com maior intensidade os recursos e serviços disponibilizados.
31
É interessante mencionar a recente inclusão de temas feministas na prova do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) (em 24 de
outubro de 2015), com a Questão 42, na qual há a citação da célebre frase da filósofa francesa Simone de Beauvoir: “Ninguém
nasce mulher: torna-se mulher”.
24
Texto Para Discussão FEE, n.
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Dessa maneira, pode-se dizer que a criação e a continuidade da Rede Lilás se constituem em
marcos relevantes para as políticas públicas caracterizadas como transversais e relacionadas à temática de
gênero que estão sendo implementadas no Rio Grande do Sul.
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VIANA, A.; SOUZA, E. Crimes e segredos na violência sexual contra as mulheres: o diálogo entre Durkheim
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Janeiro]: Flacso, 2012. Disponível em: <http://mapadaviolencia.org.br/>. Acesso em: 14 nov. 2014.
WAISELFISZ, J. J. Mapa da Violência 2015: homicídios de mulheres no Brasil. [Rio de Janeiro]: Flacso,
2015. Disponível em: <http://www.compromissoeatitude.org.br/wp-
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ZIMMER, R. Depoimento de Roberto Zimmer [3 mar. 2016]. Entrevistador: Deisi Conteratto. 2016.
Entrevista concedida a Pesquisa da Rede Lilás referente ao Crédito Lilás do Banrisul.
Apêndice
Quadro A.1
Composição da Rede Lilás
POLÍTICA E/OU PROGRAMA OBJETIVO ÓRGÃOS
ENVOLVIDOS ANO DE
IMPLEMENTAÇÃO
Casas-Abrigo; Casas de
Passagem; Casas de Acolhida
Acolhimento de mulheres vítimas de
violência doméstica, assim como em
situação de vulnerabilidade social.
SPM/RS -
DPM/SJDH/RS, órgãos
de assistência social,
saúde, segurança e
coordenadorias
municipais
da
m
ulher.
1992
Centro Estadual de Ref
erência
da Mulher Vânia Araújo
Machado
Responsável pelo Telefone Lilás,
manutenção e capacitação de
serviços de apoio.
SPM/RS -
DPM/SJDH/RS. 2002; reestruturado em
2013.
Centros de Referência da
Mulher Acolhimento às vítimas, com
abordagem transdisciplinar.
CRM VAM, SPM/RS-
DPM/SJDH/RS, saúde,
segurança e assistência
social.
2002
Telefone Lilás/Escuta Lilás Serviço gratuito disponibilizado às
mulheres vítimas de agressão.
CRM VAM e SPM/RS-
DPM/SJDH/RS
.
2002
Postos de Atendimento à
Mulher Local para onde as mulheres se
dirigem após terem sido agredidas. Polícia Civil e SSP/RS. 2002
Conferência Estadual de
Políticas para Mulheres Formulação de políticas públicas de
gênero.
SPM/RS -
DPM/SJDH/RS e
Conselho Estadual dos
Direitos da Mulher.
2004
(continua)
29
Texto Para Discussão FEE, n.
o
144
Quadro A.1
Composição da Rede Lilás
Delegacias E
specializadas de
Atendimento às Mulheres Local para onde as mulheres se
dirigem após terem sido agredidas. Polícia Civil e SSP/RS. 2006
Juizados da Violência
Doméstica e Familiar
Recebem medidas protetivas de
urgência, identificando os casos mais
graves e encaminhando à Patrulha
Maria da Penha. Também são
responsáveis por inquéritos e
processos criminais relativos à
violência contra a mulher.
Tribunal de Justiça do
RS 2008
Secretaria de Políticas para as
Mulheres do Rio Grande do
Sul
Assessorar a Administração Pública
Estadual na formulação, coordenação
e articulação de políticas para as
mulheres. 2011 até 2014
Adesão do RS ao Pacto
Nacional de Enfrentamento à
Violência contra a Mulher
Planejamento de ações que visem à
consolidação da Política Nacional de
Enfrentamento à Violência contra as
Mulheres.
O Pacto foi lançado pela
SPM/PR em 2007 e
aderido pelo RS em
2011.
Câmara Técnica Estadual do
Pacto de Enfrentamento à
Violência contra a Mulher
Planejar e monitorar a
implementação das políticas do Pacto
Nacional de Enfrentamento à
Violência contra a mulher em âmbito
estadual.
SPM-RS 2011 até 2014
Comitê Gestor para Políticas
de Gênero Desenvolver políticas públicas para
as mulheres em áreas diversas. SPM-RS e outras
secretarias estaduais. 2011 até 2014
Coordenadoria Penitenciária
da Mulher - Susepe
Desenvolver trabalhos com
agressores que estão no presídio e
notificar as vítimas quando estes
saem do cárcere.
SSP-RS 2011
Conselho Estadual dos
Direitos da Mulher
Fiscalizar as políticas formuladas
pelo Comitê Gestor e ampliar a
participação dos conselhos
municipais no processo decisório.
SPM/RS -
DPM/SJDH/RS e
entidades
representantes da
sociedade civil.
2011
Conferências Municipais Discussões de assuntos sensíveis à
temática e elaboração de plano de
ações.
SPM/RS -
DPM/SJDH/RS,
coordenadorias
municipais de gênero e
secretarias municipais.
2011
Estrutura do Gabinete do
Prefeito - Parceria
Ampliar os espaços municipais
específicos de aplicação de políticas
públicas para mulheres, e qualificar
atendimento dos centros já
existentes.
SPM/RS -
DPM/SJDH/RS, Famurs,
Tribunal de Contas-RS e
outros órgãos,
municipais e estaduais.
2011
Coordenadoria Estadual das
Mulheres em Situação de
Violência Doméstica e Familiar
Órgão administrativo que assessora a
Presidência do TJ/RS na elaboração
de sugestões frente à temática, de
projeto de formação, suporte às
equipes e articulação interna e
externa.
Tribunal de Justiça do
Estado do RS. 2012
Patrulha Maria da Penha Fiscalizar o cumprimento da medida
protetiva de urgência e fazer as
rondas.
Brigada Militar e
SSP/RS. 2012
Programa Pró-Equidade e
Fórum Pró-Equidade de
Gênero e Raça/Etnia Campanhas de conscientização. SPM/RS e SSP/RS.
Programa: 2010-14
Fórum: 2012-14. As
ações dessa pauta foram
transferidas para a
Coordenadoria da
Igualdade Étnica/Racial.
Observatório da Violência
contra as Mulheres da SSP/RS Avaliações e estatísticas. SSP/RS 2012
Adesão do RS ao
p
rograma
federal “Mulher, Viver sem
Violência”
Integra e amplia os serviços públicos
existentes voltados às mulheres em
situação de violência.
SPM/RS 2013
(continua)
30
Texto Para Discussão FEE, n.
o
144
Quadro A.1
Composição da Rede Lilás
Sala Lilás Espaço destinado às mulheres
vítimas nas DEAMs.
SSP-RS (Instituto Geral
de Perícias e
Departamento Médico
Legal)
2013
Delegacias Móveis Serviço itinerante para onde as
mulheres se dirigem após terem sido
agredidas.
Polícia Civil, SSP-RS e
SPM-RS - DPM-SJDH-
RS 2013
Ônibus Lilás de Atendimento Serviço itinerante que capacita
profissionais atuantes na área de
violência contra a mulher.
Polícia Civil, SSP-RS,
SPM/RS - DPM-SJDH-
RS, e CRM VAM 2013
Projeto Gênero Raça/Etnia na
Mídia Comunicação pública e plural a
respeito do tema
SPM-RS, secretarias
estaduais, sindicatos e o
Núcleo de Jornalistas
Afrobrasileiros
2013 até 2014
Núcleo de Defesa da Mulher
(Nudem)
Suporte jurídico e institucional na
Defensoria Pública do Estado do Rio
Grande do Sul, que presta
atendimento especializado a
mulheres em situação de violência.
Defensoria Pública do
Estado. 2008
Projeto Metendo a Colher Atividades com o agressor enquanto
ele está no Presídio Central. SSP/RS (Susepe) 2013
Crédito Lilás Linha de crédito para mulheres, no
valor de R$ 100,00 a R$ 15.000.
Banrisul, Programa RS
Mais Igual, a Defensoria
Pública e SPM-RS -
DPM-SJDH-RS
2014
Manual para Uso Não-Sexista
da Linguagem
Manual de conduta de linguagem oral
e escrita não sexista, não hierárquica
e equitativa para órgãos públicos. SPM-RS 2014
Tornozeleiras Monitoramento de agressores fora do
sistema prisional e fiscalização de
medidas protetivas de urgência
SSP-RS 2014
PLP 2.0 Aplicativo de celular para as
mulheres que tenham em seu favor
medidas de proteção
ONG Themis, o Tribunal
de Justiça do Estado e
SSP-RS 2014
Comitê Rede Lilás Acompanhamento do Protocolo de
Fluxos da Rede de Enfrentamento a
Violência Contra as Mulheres
Órgãos públicos,
universidades e outros
serviços que compõem
a Rede de
Enfrentamento
2015
Fórum Estadual de
Enfrentamento à Violência às
Mulheres do Campo, da
Floresta e das Águas
Tem a finalidade de formular, debater
e monitorar as propostas de políticas
públicas relacionadas à problemática
e à realidade das mulheres.
Integram o colegiado
representantes de
diversas secretarias do
Estado.
2016