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Ambientes educativos inovadores: o
estudo do fator espaço nas ‘salas de
aula do futuro’ portuguesas
Neuza Pedro*1
Resumo
De forma consistente, múltiplas iniciativas de redesign dos es-
paços de sala de aula têm vindo a ser constituídas no panorama
internacional. Como problema comum estas iniciativas apon-
tam para a necessidade de recon gurar o espaço educativo,
tornando-o mais permeável à adoção de metodologias ativas
de aprendizagem, favorecendo diferentes dinâmicas de ação
entre alunos e entre estes e o professor. No contexto portu-
guês, tais espaços assumem a designação de ‘salas de aula do
futuro’, ambientes educativos inovadores que funcionam como
laboratórios de aprendizagem propícios à utilização de novas
tecnologias e metodologias de ensino. O presente estudo foca-
liza na análise de 19 salas de aula do futuro criadas no contexto
português analisando, em especí co, elementos associados ao
fator espaço. Salientam-se as principais conclusões extraíveis
dos dados encontrados: as salas de aula do futuro integram em
si diferentes zonas de trabalho, organizadas com vista à promo-
ção de múltiplas e variadas competências; várias tecnologias
encontram-se disponíveis no espaço; o mobiliário integrado
em sala de aula revela-se diversi cado, multifuncional e recon-
gurável; existe já preocupação com o estabelecimento de me-
lhorias ambientais promotoras de maiores níveis de bem-estar,
conforto e ergonomia.
Palavras-chave: Salas de Aula do Futuro, Integração educativa
das tecnologias, Inovação pedagógica.
* Licenciada em Psicologia, Mestre em Psicologia da Educação e Dou-
tora em Educação, na área de especialidade de Tecnologias de Infor-
mação e Comunicação na Educação. Professora Auxiliar do Instituto de
Educação da Universidade de Lisboa. Membro da Unidade de Investi-
gação em Educação e Formação (UIDEF) do Instituto de Educação da
Universidade de Lisboa. Coordenadora do Laboratório de E-learning da
Universidade de Lisboa. E-mail: nspedro@ie.ulisboa.pt
Revista Tempos e Espaços em Educação, São Cristóvão, Sergipe, Brasil, v. 10, n. 23, p. 99-108, set./dez. 2017.
http://dx.doi.org/10.20952/revtee.v10i23.7448 | ISSN: 1983-6597 (versão impressa); 2358-1425 (versão online).
AMBIENTES EDUCATIVOS INOVADORES
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Innovative learning environments: the
study of space in Portuguese ‘Future
Classrooms’
Abstract
In a very consistent way, multiple initiatives of classroom
redesign have been constituted on the international context.
As a common problem, these initiatives point out to the
need to recongure the educational space, making it more
permeable to the adoption of active learning methodologies,
favoring dierent dynamics of action among students and
between them and the teacher. In the Portuguese context,
such spaces assume the designation of ‘future classrooms’,
innovative educational environments that function as learning
laboratories conducive to the use of technologies and new
teaching methodologies. The present study focuses on the
analysis of 19 future classrooms created in the Portuguese
context by analyzing elements associated with the space factor.
The main conclusions drawn from the data are highlighted:
the future classrooms integrate dierent working zones,
organized for promoting multiple and varied competences;
several technologies are available in the classroom space; the
furniture integrated in the classrooms proves to be diverse,
multifunctional and recongurable; concerns with the
establishment of environmental improvements that promote
higher levels of well-being, comfort and ergonomics are
already presented.
Keywords: Future Classrooms, Educational integration of
technologies, pedagogical innovation.
Ambientes educativos innovadores:
el estudio del espacio en las ‘salas de
aula del futuro’ portuguesas
Resumen
De forma consistente, múltiples iniciativas de rediseño de
los espacios de aula se han constituido en el panorama
internacional. Como problema común, estas iniciativas
apuntan a la necesidad de recongurar el espacio educativo,
haciéndolos más permeables a la adopción de metodologías
activas de aprendizaje, favoreciendo diferentes dinámicas de
acción entre alumnos y entre éstos y el profesor. En el contexto
portugués, tales espacios asumen la designación de “aulas
del futuro”, ambientes educativos innovadores que funcionan
como laboratorios de aprendizaje propicios a utilización de
tecnologías y nuevas metodologías de enseñanza. El presente
estudio se centra en el análisis de 19 aulas del futuro creadas
en el contexto portugués analizando en especíco, elementos
asociados al factor ‘espacio’. Se destacan las principales
conclusiones extraíbles de los datos encontrados: las aulas del
futuro integran en sí diferentes zonas de trabajo, organizadas
para la promoción de múltiples y variadas competencias;
varias tecnologías se encuentran disponibles en el espacio;
el mobiliario integrado en el aula se muestra diversicado,
multifuncional y recongurable; ya existe preocupación por
el establecimiento de mejoras ambientales promotoras de
mayores niveles de bienestar, confort y ergonomía.
Palabras-clave: Aula del Futuro, Integración educativa de las
tecnologías, Innovación pedagógica.
Neuza Pedro 101
1. Introdução
As inúmeras evoluções tecnológicas, cientícas e sociais
que têm marcado o século XXI têm exercido uma forte
pressão para a mudança dos sistemas educativos, tanto
no que diz respeito aos seus currículos e metodologias
como no que se associa aos seus espaços e dinâmicas. Ao
mesmo tempo que essas mudanças demoram a se esta-
belecer, a demanda pelas mesmas ganha cada vez maior
urgência e multiplicam-se os projetos nacionais e inter-
nacionais que buscam trazer inovação pedagógica para
a sala de aula. Entre os mesmos, dois fatores aparecem
recorrentemente focados: a promoção de ‘novas’ peda-
gogias, ligadas à aprendizagem ativa, e a integração das
‘novas’ tecnologias. Contudo, essa mudança, nos modos
e nos meios, não se tem feito acompanhar por alterações
no espaço escolar; especicamente a sala de aula, pouco
ou nada tem sido alterada com vista a acolher essas ‘no-
vas’ pedagogias e essas ‘novas’ tecnologias.
2. A relevância do espaço ‘sala de aula’ no pro-
cesso de aprendizagem
Dando relevância ao conhecimento que atualmente se
detém sobre o processamento cognitivo da informação
no cérebro humano, Wulsin (2013) refere que sabemos
hoje demasiado acerca de como a aprendizagem acon-
tece para se ignorar o quanto os espaços e ambientes
educativos, a forma como são planeados, construídos e
mantidos, inuenciam tal processo. Para Oblinger (2006)
“spaces are themselves agents for change” (para.1);
O’Donnell et al. (2010) referem-se mesmo à sala de aula
como ‘The third teacher’.
Vários estudos têm procurado salientar o impacto que
o espaço e os fatores ambientais exercem no processo
de aprendizagem dos alunos. Considerando especica-
mente os fatores externos, associados à construção das
escolas, vários autores têm atestado o seu impacto so-
bre múltiplas funções humanas, incluindo os processos
cognitivos (HYGGE; KNEZ, 2001), as emoções (LOEWEN;
SUEDFELD, 1992) e o bem-estar mental (EVANS, 2003).
Higgins et al. (2005) salientam o impacto signicativo
que elementos como a temperatura, iluminação e acús-
tica têm na constituição do ambiente interno da escola.
Através da revisão de literatura e análise a estudos de
caso sobre design de instituições escolares, Montazami,
Gaterell e Nicol (2015) concluíram que o desempenho
de alunos e professores é inuenciado pelo ambiente in-
terno dos edifícios, especicamente por fatores como o
nível de ruído, a temperatura interior, a qualidade do ar
e a iluminação. Níveis adequados nestes fatores correla-
cionam-se positivamente com a aprendizagem e o com-
portamento dos alunos (GUARDINO; FULLERTON, 2010),
bem como com os seus índices de satisfação e perfor-
mance académica (BUTT, 2010; HILL; EPPS, 2010).
No que se refere aos fatores internos associados à sala
de aula, um estudo recente, conduzido por Barrett et al.
(2015), em 153 salas do ensino primário do Reino Uni-
do, demonstrou que parâmetros relativos ao design da
sala de aula conseguiam explicar 16% da variância no
sucesso académico dos 3766 alunos envolvidos no estu-
do. Esta investigação centrou-se na análise do impacto
sensorial de 10 fatores ambientais, organizados em três
dimensões: naturalness (parâmetros ambientais neces-
sários para a sensação de conforto, tais como a proximi-
dade com a natureza, luz, qualidade do ar, temperatura
e nível de ruído), individualisation (relacionado com a
exibilidade do espaço, sensação de propriedade e de
conexão) e stimulation (associado à atratividade da sala
de aula, sua complexidade e cor). Através da aplicação de
um modelo de análise multinível, este estudo permitiu
concluir que a progressão das aprendizagens dos alunos
(51%) se encontrava associada aos seguintes parâme-
tros: a luz, a sensação de propriedade, qualidade do ar,
cor, temperatura, nível de complexidade e exibilidade
(BARRETT, et al., 2015).
Além dos elementos ambientais, os próprios artefactos
colocados em sala de aula, especicamente mobiliário
e equipamentos, têm também sido atentamente con-
siderados pela literatura. Mediante o aumento das pre-
ocupações associadas ao conforto físico e psicológico
de alunos, vários trabalhos têm salientado a relevância
assumida pela elevada ergonomia, exibilidade e adap-
tabilidade do mobiliário em sala de aula (BASYE, et al.,
2015; VISSER, 2001; YANG; BECERIK-GERBER; MINO, 2013).
AMBIENTES EDUCATIVOS INOVADORES
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Novos conceitos começam efetivamente a emergir. Re-
centemente, tem ganho destaque o estudo de mobiliá-
rio associado ao exible seating (DELZER, 2016), ou seja, a
integração em sala de aula de múltiplos e exíveis arte-
factos que suportem a ação de sentar/recostar/reclinar,
na medida em que se veri ca que tais elementos, ao per-
mitir aos alunos mudar de postura, revelam-se positivos
para a sua saúde física (MAHAR, 2006; TREMBLAY, et al.,
2011), ao mesmo tempo que se revelam favorecedores
do restabelecimento da atenção, concentração e envol-
vimento na tarefa (CLEMES, et al, 2016; SHERRY; PEAR-
SON; CLEMES, 2016).
A integração da tecnologia em sala de aula necessita
igualmente ser considerada. Sobretudo ao longo da últi-
ma década, a tecnologia tornou-se um componente cen-
tral de muitas salas de aula sob a forma de equipamen-
tos audiovisuais e computadores pessoais com acesso à
internet (MICHAEL, 2013; YANG, et al., 2013). Contudo,
o seu impacto nas dinâmicas de sala de aula necessita
ainda ser estudado. Na verdade, Basye et al. (2015) sa-
lientam que raramente os espaços educativos têm vindo
a ser projetados de modo a que a tecnologia disponível
possa ser utilizada de forma rápida, acessível e natural
ainda que o autor defenda que “Technology is a much
part of a digital age learning environment as are the o-
ors and ceilings (BASYE, et al., 2015, p. 94).
Múltiplas são, pois, as investigações que alertam para a
necessidade de se repensar, e consequentemente de se
estudar de modo rigoroso, a forma como se organiza os
espaços escolares, em especial, a sala de aula. O ambiente
físico e os elementos que o constituem transmitem a fun-
cionalidade do espaço e in uenciam o comportamento
e bem-estar dos seus utilizadores, pelo que os mesmos
necessitam corresponder de forma mais e ciente às ne-
cessidades dos alunos atuais, sobretudo se tivermos em
atenção o volume de tempo que, desde muito cedo, as
crianças passam nas escolas (BARRETT, et al., 2013).
3. Contextualização do estudo
No contexto europeu, vários projetos recentes têm pro-
curado perspetivar forma de conduzir à desejada mo-
dernização das práticas educativas; contudo, poucos têm
colocado em articulação três fatores críticos: o espaço, a
pedagogia e a tecnologia (LEAHY, 2016). O Projeto ITEC
‘Innovative Technologies for Engaging Classrooms’ desen-
volvido entre 2010 e 2014 e, mais recentemente, o Projeto
FCL ‘Future Classroom Lab’ surgem como exceção. Ambos
os projetos se revelam associados à rede europeia de Mi-
nistérios da Educação, a European Schoolnet.
No seio destes projetos, foi construído em 2012, o
Future Classroom Lab, um espaço inovador de sala
de aula que pretende servir de inspiração a decisores
políticos, escolas e professores na transformação das
salas de aula convencionais em espaços de aprendiza-
gem modernizados que suportem mudanças efetivas
nas práticas de ensino e de aprendizagem (EUROPEAN
SCHOOLNET, 2016a). Este ‘laboratório de sala de aula
do futuro’ integra em si uma proposta de organização
do espaço de sala de aula que se edifica com torno de
seis zonas funcionais, alinhadas com diferentes com-
petências e dinâmicas de aprendizagem que se procu-
ram desenvolver:
Figura 1: Future Classroom Lab
Fonte: (retirado de http://erte.dge.mec.pt/ambientes-educativos-
-inovadores)
• Zona de ‘Criar’: um espaço de aprendizagem promo-
tor do envolvimento ativo dos alunos na criação de
determinados produtos/conteúdos altamente rela-
cionados com a vida real. Fornece-se assim aos alunos
oportunidade para estimular a sua criatividade, sen-
tido de produtividade e de propriedade sobre a sua
aprendizagem. As tecnologias aí existentes suportam
o processo de plani cação, criação e disseminação
dos produtos desenvolvidos pelos alunos;
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• Zona de ‘Interagir’: As atuais tecnologias de informa-
ção e comunicação, a internet e os seus ambientes
online permitem hoje não apenas que cada aluno
possa expressar o seu processo de aprendizagem, em
imediato ou em diferido, como igualmente permitem
que sejam recebidos em sala de aula outros agentes
educativos de relevo (alunos, professores ou especia-
listas) tanto do contexto nacional como internacional.
Esta zona procura estimular a interação entre alunos e
entre estes e outros agentes educativos;
• Zona de ‘Apresentar’: esta zona procura estimular
competências ligadas à comunicação, apresentação e
utilização produtiva de feedback. Ao desenvolvimen-
to e entrega dos trabalhos dos alunos merece ser adi-
cionada uma dimensão comunicativa, de apresenta-
ção interativa e publicação on-line, permitindo assim
a partilha de ideias a uma vasta audiência;
• Zona de ‘Investigar’: para uma sala de aula de/do futu-
ro entende-se que os alunos necessitam ser incentiva-
dos a realizar pesquisa cientíca, a recolher e analisar
criticamente dados, a tomar decisões e a descobrir
por si mesmos como resolver problemas efetivos, sob
abordagens ativas de aprendizagem. A zona de inves-
tigar procura corresponder a este objetivo;
• Zona de ‘Partilhar’: A organização globalizada da so-
ciedade, e dentro desta o atual mercado de trabalho,
tem sinalizado como muito importante a capacidade
de colaborar. No trabalho em equipa, a colaboração
é determinada pelo comprometimento e responsa-
bilidade individual, mas igualmente pela capacidade
de comunicação e de partilha do processo de tomada
de decisão. Com as tecnologias digitais aí integradas,
esta zona procura garantir que tais processos de parti-
lha se sedimentem e ampliquem, tanto na dimensão
presencial como online;
• Zona de ‘Desenvolver’: Esta zona procura estimular
que os espaços de aprendizagem e produtividade in-
tegrem hoje uma área informal de trabalho, onde se
estimule a autonomia, a reexão e o aprofundamento
das aprendizagens desenvolvidas. Com vista a promo-
ver a independência dos alunos, vê-se vantagem em
acolher dentro da sala de aula espaços mais descon-
traídos e não-monitorados, onde haja oportunidade
de acesso a elementos lúdicos que estimulem a mo-
tivação e a autoexpressão de todos e de cada um dos
alunos (EUROPEAN SCHOOLNET, 2016a).
3.1 As salas de aula do futuro no contexto portu-
guês
Desde a sua inauguração em 2012, o FCL tem vindo a ins-
pirar vários professores, escolas e organizações a criar os
seus próprios laboratórios de aprendizagem, tendo sido
criada a FCL network. Esta rede integra ocialmente 28
espaços em 14 países distintos, designados de salas de
aula do futuro (EUROPEAN SCHOOLNET, 2016b).
De entre estas encontram-se vários laboratórios criados
no contexto português, sendo na verdade Portugal o
país que se destaca pelo número de espaços que acolhe.
No contexto português, estas salas assumem ocialmen-
te a designação de ambientes educativos inovadores
(ERTE, 2016) que funcionam como laboratórios de apren-
dizagem para professores e alunos propícios à utilização
de novas metodologias de ensino. Sendo entendidas
como iniciativas individuais das escolas, as mesmas sur-
gem, ainda assim, identicadas como uma das iniciativas
nacionais de integração curricular das TIC tuteladas pela
Equipa de Recursos e Tecnologias Educativas do Ministé-
rio da Educação.
Atualmente, encontram-se listados 24 ambientes educa-
tivos inovadores ou salas de aula do futuro no contexto
português: 12 em agrupamentos de escolas, 2 em cen-
tros de formação, 2 em colégios privados, 3 em escolas
prossionais, 4 em escolas secundárias e 1 numa institui-
ção de ensino superior.
O presente trabalho procurou analisar esses mesmos es-
paços focando a sua atenção sobre a organização nestes
estabelecida, analisando em especíco, elementos asso-
ciados ao layout (zonamento), equipamento e mobiliário
existente, e melhorias ambientais estabelecidas.
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4. Metodologia
O processo de recolha de dados decorreu entre de-
zembro de 2016 e janeiro de 2017, com o objetivo
de analisar e descrever as salas de aula do futuro ou
ambientes educativos inovadores (AEI) que se têm
vindo a construir no contexto do sistema educativo
português. Os dados foram recolhidos através de web
survey.
4.1 Caraterização dos respondentes
Participaram neste estudo 22 professores representan-
tes de 19 dos 20 AEI existentes em Portugal, no início de
2017, ou seja, 95% dos mesmos. Em três dos AEI foi en-
tendido adequado que a resposta ao questionário fosse
efetivada por mais do que uma pessoa; deste modo, dos
19 AEI representados conta-se com a resposta de 22 par-
ticipantes.
O grupo de respondentes integrou maioritariamente
professores do sexo feminino (59,1%), apresentando
uma idade média de 49 anos e cerca de 25 anos de le-
cionação. A maioria possui Mestrado como grau acadé-
mico (59%). As respostas ao questionário apresentam
representação de docentes de todos os níveis de ensino,
destacando-se a presença de professores que integram
a direção da respetiva escola/agrupamento (45,5% dos
respondentes).
4.2 Descrição do instrumentos e procedimentos de
recolha de dados
O questionário online foi eleito como instrumento de re-
colha de dados. O mesmo garantia: i) rapidez e economia
de custos associados ao processo de coleta de dados, ii)
a satisfação da exigência de representatividade e de ga-
rantia de anonimato dos respondentes, (iii) a uniformi-
dade no processo de resposta às questões, e (iv) a dimi-
nuição de enviesamentos provocados pelo investigador
(QUIVY; CAMPENHOUDT, 2013).
A estrutura imposta ao questionário associou-se ao ob-
jetivo último da investigação realizada onde se procu-
rou caracterizar os espaços físicos associados às salas de
aula do futuro existentes no sistema educativo nacional.
Construído e disponibilizado online, através do Google
forms, o questionário era composto por três partes, sen-
do que o presente trabalho se foca apenas nos dados re-
colhidos com base em parte dos itens constitutivos da
primeira parte do instrumento. Esta era constituída por
um total de sete itens de resposta aberta e focava-se na
procura de informações relativas ao modelo de organi-
zação estabelecido, equipamento, mobiliário existente
e outros elementos integrados com vista à melhoria do
espaço, a iluminação, acústica, cor, qualidade do ar, tem-
peratura, conforto e segurança.
5. Resultados
A análise das caraterísticas constitutivas do espaço que
dá forma a cada um dos AEI criados no contexto nacional
foi considerada com base nas diferenças/proximidade
relevada entre o layout imposto a estes espaços e o mo-
delo de organização em zonas de trabalho utilizado no
Future Classroom Lab.
Os dados recolhidos, e representados na gura 2, per-
mitem vericar que seis dos 19 AEI analisados (31.6%)
assumem seguir o modelo de organização do espa-
ço preconizado pelo Future Classroom Lab. Cinco AEI
(26.3%) referem assumir apenas, de forma parcial, esse
modelo, retirando ou agregando algumas das zonas
preconizadas.
Em oposição, 8 AEI (42.1%) armam ter adotado um
modelo próprio, especicamente desenhado para o
seu espaço e projeto. Estas salas integram no seu inte-
rior outras áreas de atividades. Com maior incidência,
surge a organização de áreas para trabalho autónomo,
planicação e pesquisa, onde computadores portáteis e
tablets se encontram disponíveis para utilização por par-
te de alunos e professores. Seguem-se-lhes outras áreas
propositadamente organizadas para: atividades de apre-
sentação/visualização (contendo tecnologia de display
como LCDs, projetores HD, quadros e/ou painéis intera-
tivos), zonas lúdicas (destinadas a jogos educativos), es-
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túdios para produção multimédia, e zonas de modelação
e impressão 3D. Um dos AEI refere que integra no seu
interior uma área com equipamentos e componentes
especicamente associados à Programação e Robótica;
outro distingue-se ainda pela existência de uma zona
snoezelen desenhada especicamente para alunos com
necessidades educativas especiais.
Figura 2: Identificação das zonas de trabalho existentes nos AEI
No que se refere à tecnologia, os resultados apresenta-
dos na gura 3 deixam patente a diversidade de equipa-
mento tecnológico que os AEI disponibilizam aos profes-
sores e alunos que os utilizam.
Em destaque, surge a tecnologia de visualização (dis-
play), nomeadamente quadros interativos, mesas intera-
tivas e painéis multitouch indicados como existente em
cerca de 79% dos AEI (15 de 19 dos espaços representa-
dos pelos respondentes).
A disponibilização de tablets e de computadores portá-
teis para utilização individual ou coletiva é igualmente
referida em 79% dos espaços sob análise.
Revelou igualmente expressão a categoria relativa a kits
de Robótica educativa (68.4%) e disponibilização de
tecnologia associada à edição de vídeo e produção de
conteúdos multimédia, sendo que em 10 dos 19 espaços
(52.6%) sob análise existe disponíveis sistemas de som,
de luz e equipamento de captação e edição de vídeo.
Figura 3: Listagem das tecnologias existentes (frequências absolutas)
Relativamente às melhorias ambientais estabelecidas,
na totalidade dos AEI existentes verica-se que foram
realizadas melhorias no espaço que os acolheu, tanto
relativamente ao mobiliário, cor, conforto, segurança,
iluminação, acústica, qualidade do ar e temperatura (de
acordo com a ordem possível de identicar com base nas
frequências absolutas indicadas na gura 3).
Maioritariamente, essas melhorias associaram-se à inte-
gração de mobiliário exível e recongurável (100%) e à
mudança na cor dos espaços (89.5%), sendo frequente-
mente referido a adoção das cores associadas às diferen-
tes zonas de atividade preconizadas pelo FCL (represen-
tadas na gura 1).
As melhorias associadas ao conforto foram também
substancialmente referidas (77.3%), sendo as mesmas
materializadas sobretudo através da integração de mo-
biliário novo nestes espaços. Esse mobiliário é sinalizado
como sendo bastantes distinto do que frequentemente
se encontra nas salas de aula regulares, sendo referido
como mais ergonómico, confortável e aprazível. Encon-
tra-se indicação de que os AEI acolhem no seu interior
uma grande variedade de mobiliário, indo além das me-
sas e cadeiras comuns. Identica-se nas respostas ana-
lisadas a indicação de mobiliário leve, robusto e simul-
taneamente exível que permite aos alunos trabalhar
individualmente, em pares ou em grupo, e em múltiplas
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posições (sentado, reclinado, em pé, etc.). De igual modo,
é identicado no mobiliário outra característica distinti-
va: a facilidade de movimentação e a consequente re-
congurabilidade destes elementos no espaço.
Figura 4: Identificação das melhorias estabelecidas (frequências
absolutas)
Os restantes fatores ambientais, nomeadamente os liga-
dos à segurança dos espaços e das pessoas e o aumento
da qualidade da iluminação e da acústica das salas fo-
ram igualmente sinalizados por respetivamente, 68.2% e
63.6% dos respondentes.
6. Conclusões
Salienta-se as principais conclusões extraíveis dos resul-
tados encontrados no estudo dos AEI ou salas de aula do
futuro criados no contexto português: estas novas salas
constituem-se em torno de diferentes zonas de trabalho,
organizadas com vista à promoção de múltiplas e varia-
das competências, em especíco aquelas que a literatura
refere com frequência como XXI-century skills; múltiplas
tecnologias encontram-se integradas nestes espaços,
com maior incidência encontram-se as tecnologias de
display e os dispositivos móveis (tablets); o mobiliário
integrado nestas salas de aula revela-se diversicado,
multifuncional e recongurável; existe já uma nítida pre-
ocupação com o estabelecimento de melhorias ambien-
tais nestes espaços de sala de aula com vista a garantir
maiores níveis de bem-estar, conforto e ergonomia aos
seus utilizadores.
Constata-se pois, que os espaços analisados reclamam
para si um layout radicalmente distinto daquele que se
encontra nas salas de aula convencionais. Nestes, a sala
de aula em vez de ser entendida como um espaço único,
perspetiva-se como plural, logo divisível e recongurá-
vel, com uma arquitetura exível, modular e adaptável
(PEDRO; MATOS, 2015). A organização em zonas de tra-
balhos revela ainda que estes ambientes educativos
inovadores procuram romper com a conguração tra-
dicional das salas de aula transmissivas, onde leiras de
cadeiras e mesas se alinham vertical ou horizontalmente
de fronte para um quadro sob domínio do professor. Es-
tes espaços, organizados com vista a promover metodo-
logias ativas de aprendizagem, recusam essa herança e
procuram organizar-se em áreas que facilitem a apren-
dizagem colaborativa, a utilização de tecnologias e uma
efetiva diferenciação pedagógica.
De igual modo, verica-se que tais ambientes procuram
criar experiências educativas mais aprazíveis, alicerçadas
em elevados níveis de conforto e bem-estar. Preocupa-
ções com a qualidade funcional dos espaços aparecem
alinhadas com preocupações ergonómicas e estéticas,
tanto nos seus elementos arquitetónicos, como nos equi-
pamentos e mobiliário. Existe pois alinhamento entre es-
tes espaços e o que a investigação tem vindo a salientar,
relativamente ao impacto que o ambiente físico exerce
sobre o envolvimento, atenção e motivação dos alunos
(PHILIPS, 2014; SHERRY; PEARSON; CLEMES, 2016), o seu
comportamento (GUARDINO; FULLERTON, 2010), satis-
fação e performance académica (BARRETT, et al., 2015;
BASYE, et al, 2015; BUTT, 2010; HILL; EPPS, 2010).
Sabe-se (não hoje, mas há muito!) que mudanças nos
habitats tendem a estabelecer mudanças nos compor-
tamentos, que os espaços reetem e simultaneamente
impõem hábitos aos sujeitos que neles se movimentam.
Desta forma as salas de aula, a sua disposição e elemen-
tos, exercem igualmente pressão sobre o tipo de experi-
ência educativa que em si é vivenciada. Os seus modelos
de organização comunicam muito sobre a abordagem
pedagógica que se encontra subjacente às práticas que
ai decorrem; ao mesmo tempo que podem exercer efei-
tos favorecedores ou restritivos sobre a mudança dessas
mesmas práticas. Assim sendo, revela-se insensato pen-
sar que a aprendizagem na atualidade contém os meios
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necessários para ser bem-sucedida em salas de aula
construídas em meados do século passado (OBLINGER,
2006), onde o que se esperava da escola era tão diferen-
te do que hoje se deseja. Permanece urgente reetir de
forma séria e organizada sobre o modo como o espaço
físico da sala de aula se revela ajustável ao século vigen-
te, reclamando-se a necessidade de se estudar para os
mesmos novos designs e congurações, ajustando-os
realmente às práticas pedagógicas que se ambicionam
estabelecer hoje como padrão e não como exceções cuja
sustentabilidade permanece questionável.
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Agradecimentos
Este trabalho foi desenvolvido sob nanciado da Fundação
para a Ciência e Tecnologia, I. P. – Portugal, no âmbito do Pro-
ject Technology Enhanced Learning @ Future Teacher Educa-
tion Lab (Ref. PTDC/MHC-CED/0588/2014).
A autora expressa os seus sinceros agradecimentos a Patricia
Pereira pelo seu apoio nas várias etapas associadas ao processo
de recolha e organização dos dados.
Recebido em 09 de agosto de 2017.
Aceito em 01 de setembro de 2017.