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ISSN 2177-8310
DOI prex. 10.18264
Recebido 30/05/2016
Aceito 10/02/2017
Publicado 30/04/2017
Resumo
O fenômeno da gamicação tem ampliado a criação de experiências e pes-
quisas em diversas áreas como marketing, treinamentos corporativos e na
Educação, que é o foco deste artigo. Aqui serão abordadas perspectivas
teóricas no intuito de demonstrar que os elementos da gamicação apli-
cados em atividades de aprendizagem podem proporcionar o aumento do
engajamento e da motivação em atividades educacionais. Para isso foram
selecionados trabalhos de cunho bibliográco e exemplos de experiências
reais que exploram o tema e que fazem uma análise crítica pertinente ao
assunto. Foi possível perceber carência de literatura sobre o tema e, além
disso, que a gamicação é muitas vezes entendida como um jogo, por ter
sua vertente originada no design de jogos. É constatado que, para entender
a utilização da gamicação, precisamos primeiramente entender o que é
um jogo e suas funções, para depois estabelecer sua funcionalidade e em-
pregabilidade na Educação.
Palavras-chave: Gamicação, Aprendizagem, Educação online.
1 Investigador, PIGEAD, UFF - Rua
Mário dos Santos Braga, s/nº
Valonguinho – Niterói – RJ
A Gamicação como Estratégia de Engajamento
e Motivação na Educação
The Gamication as a Strategy for Engagement
and Motivation in Education
Artigos originais
Bianca Vargas Tolomei*1
146
Tolomei, B.V. (2017), EaD em Foco, 7 (2), 145–156
The Gamication as a Strategy for Engagement
and Motivation in Education
Abstract
The gamication phenomenon has expanded creating experiences and
research in areas such as marketing, corporate training and also in education,
which is the focus of this article. It will be addressed theoretical perspectives in
order to demonstrate that gamication elements applied in learning activities
can provide engagement and motivation growth in educational activities. For
this we selected bibliographical works and examples of real experiences that
explore the theme and make critical analysis relevant to the subject. It was
revealed a lack of literature on the subject and, moreover, that gamication
is often understood as a game, due to its aspects related to game design. It
is known that, in order to understand the use of gamication, we rst need to
understand what is a game and its functions, and then establish its functionality
and usability in education.
Keywords: Gamication, Learning, Online education.
1. Introdução
Percebe-se que, de forma geral, há uma crise motivacional, principalmente no que tange ao cenário
educacional. Grande parte das instituições de ensino, independente de nacionalidade e de níveis de edu-
cação, encontra diculdades para engajar seus alunos utilizando os recursos educacionais tradicionais.
Na sociedade em rede (Castells, 2007), a avalanche de informação disponível torna necessário encontrar
novas formas de ultrapassar os métodos tradicionais de ensino, assim como outras maneiras para encan-
tar e motivar os alunos da nova geração nas atividades educacionais.
É importante pontuar que esse novo período, dominado pelas “tecnologias de comunicações digitais e
comércio cultural” (Rifkin, 2001, p. 12), traz o capital da contemporaneidade, o conhecimento, como fator
crucial no desenvolvimento do indivíduo. A cibercultura trouxe um novo modo de conhecer e conviver,
com novas atitudes e uxos de pensar. O indivíduo desta geração não se satisfaz apenas em receber um
conhecimento; ele precisa testar, vivenciar e experimentar.
As novas gerações utilizam de forma ampla diversas tecnologias, como computador, tablets e video-
games (McGonical, 2012). São os nativos digitais (Prensky, 2002), que não se satisfazem em ler manuais
técnicos ou instruções, mas sim preferem o “aprender fazendo”, pois já o fazem naturalmente quando,
por exemplo, descobrem como funciona um novo dispositivo ou um novo jogo de videogame. Quando
se leva em conta a realidade da nova geração e observa-se o atual modelo de ensino-aprendizagem, é
possível observar a distância existente no modo como os estudantes percebem e vivenciam a realidade e
como as instituições de ensino tratam essa mesma realidade. Não ca difícil perceber que a atual forma
de ensino ocasiona desinteresse por parte do aluno pela forma como as informações são apresentadas,
de modo abstrato.
Este artigo pretende apresentar uma abordagem sobre o uso de elementos de games na educação pro-
vendo conceitos que poderão ser empregados como base em cursos online e presenciais para incentivar
o aluno a ter maior engajamento durante as atividades e participação entre seus pares. Neste artigo, por
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meio do estudo dos principais fundamentos da gamicação, tem-se o objetivo de analisar como ela
pode aumentar a participação e motivação dos alunos quando aplicada na educação.
Para dar conta desse objetivo, este artigo foi organizado na defesa e apontamentos de alguns
temas como um panorama do histórico dos games e a fundamentação de seus elementos com o
processo de aprendizagem. Outro ponto a ser demonstrado é a gamicação e o seu benefício para
a motivação, engajamento e participação dos alunos em atividades.
Com o intuito de abrir o debate para os resultados e discussões sobre a gamicação no engaja-
mento discente, serão abordados aqui os pressupostos teóricos que nos guiarão a elaborar o apa-
rato teórico para o debate de cunho bibliográco. Para tanto, a produção deste artigo contou com
autores como Gee (2005), McGonical (2012) e Alves (2015), entre outros, para embasar as principais
abordagens que fundamentam o tema proposto.
Para a base da percepção da mudança de comportamento em relação ao engajamento e mo-
tivação dos alunos por meio do uso da gamicação, trazemos os exemplos dos seguintes casos:
• Beat the GMAT - Plataforma norte-americana para usuários de cursos de MBA.
• Kaplan University – Atividades da Universidade de Kaplan
• LOGUS SAGA – Game produzido e realizado com escolas do Rio Grande do Sul e
Santa Catarina.
• ARKOS – Game sobre projeto de leitura.
Por m, este estudo traz o resultado dessas discussões baseadas em uma pesquisa bibliográca
e documental para apresentar um pressuposto sobre o uso das técnicas de gamicação.
2. O o da história da gamicação
Jogos são uma construção humana que envolvem fatores sócio-econômico-culturais. De acordo
com Elkonin (1998), os jogos, de maneira geral, surgiram nas sociedades como forma de iniciar o
trabalho em grupo e de explicar o uso de ferramentas e artefatos para as crianças e jovens. Os
jogos serviram como meio de iniciação para os jovens sobre sua própria cultura e seu meio social.
Huizinga (1993) corrobora a importância do conhecimento da história dos jogos ao dizer em sua
pesquisa que, em outros tempos, os jogos e divertimentos eram os meios de a sociedade aproxi-
mar seus laços coletivos e se manter unida.
Podemos dizer que os jogos evoluíram conforme as necessidades da sociedade. Kishimoto
(1993), em sua pesquisa sobre a história dos jogos, recorre à Antropologia e à tradição oral como
responsáveis pela transmissão dos jogos às diferentes gerações:
Considerado como parte da cultura popular, o jogo tradicional
guarda a produção cultural de um povo em certo período his-
tórico. Essa cultura não ocial, desenvolvida, sobretudo, pela
oralidade, não ca cristalizada. Está sempre em transformação,
incorporando criações anônimas das gerações que vão se suce-
dendo (Kishimoto, 1993, p. 15).
Essa teoria histórica demonstra que o jogo traz um fator crucial para o conceito da gamicação;
ele proporciona a aprendizagem de atividades e tarefas que o jovem vai desempenhar em sua vida.
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Além dessa questão social, o jogo desperta certas necessidades no ser humano, tais como o prazer e a
satisfação, que, como veremos, são pontos importantes para o conceito de gamicação e mais ainda para
o processo de aprendizagem. Huizinga (1993) dene o jogo como:
uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de certos e
determinados limites de tempo e espaço, segundo regras livremente
consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um m em si
mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e alegria (Huizinga,
1993, p. 33).
O jogo digital é denido por Prensky como
um subconjunto de diversão e de brincadeiras, mas com uma
estruturação que contém um ou mais elementos, tais como: regras,
metas ou objetivos, resultado e feedback conito/ competição/ desao/
oposição, interação, representação ou enredo (Prensky, 2012, apud
Martins e Giraa, 2015).
Esses mecanismos de regras, objetivos e resultados, entre outros, foram trazidos para o processo de
gamicação, que, segundo Vianna et al. (2013), é uma tradução de gamication, termo em inglês utiliza-
do pela primeira vez em 2002 por Nick Pelling. Os autores concordam que, por meio da gamicação, os
indivíduos são mais facilmente engajados, sociabilizados, motivados e tornam-se mais abertos à apren-
dizagem de um modo mais eciente. Para Alves et al. (2014, p. 76), essa prática “se constitui na utilização
da mecânica dos games em cenários non games, ou seja, fora de games, criando espaços de aprendizagem
mediados pelo desao, pelo prazer e entretenimento”.
Pode-se dizer que o processo de gamicação é relativamente novo, derivado da popularidade dos
games e de todas as possibilidades inerentes de resolver e potencializar aprendizagens em diferentes
áreas do conhecimento. Segundo Fardo (2013), “esse potencial que os games apresentam já havia sido
percebido há mais de três décadas” (Papert, 2008, apud Fardo, 2013). O marketing já vem utilizando a
gamicação com nalidade de motivar, engajar e delizar clientes e usuários (Zichermann; Cunningham,
2012) há algum tempo. Temos exemplos reais da Samsung, Nike e outras empresas mundiais.
3. Games e o processo de aprendizagem
Os chamados “nativos digitais” compõem uma geração que cresceu juntamente com a revolução digital
e para quem os jogos eletrônicos utilizados como lazer são parte integrante da construção de sua cultura
(Azevedo, 2012).
Os jogos motivam, de diferentes maneiras, a avançar em suas etapas adquirindo recompensas à medi-
da que os desaos são superados. Eles ensinam, inspiram e envolvem de uma maneira que a sociedade
não consegue fazer (McGonigal, 2011).
Muitos pesquisadores vêm trabalhando com a perspectiva do potencial dos jogos para ns educacio-
nais, evidenciando entre outros pontos a relação dos jogos com a motivação e o engajamento dos indiví-
duos, conforme Alves (2015, p. 2).
A aprendizagem e a tecnologia têm muita coisa em comum, anal am-
bas buscam simplicar o complexo. A grande diferença entre esses dois
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campos está na velocidade. Enquanto a tecnologia evolui muito rapi-
damente, parecemos insistir na utilização de apresentações de Power-
Point intermináveis que só dicultam o aprendizado, dispersando a
atenção de nossos aprendizes que encontram um universo bem mais
interessante em seus smartphones.
Segundo Gee (2009), os jogos são ferramentas que motivam e engajam seus usuários de modo que -
quem por horas em uma tarefa, com o m de atingir um objetivo. Alguns dos princípios de aprendizagem
que os jogos desenvolvem são: identidade, interação, produção, riscos, problemas, desaos e consolida-
ção. Estas são algumas das possibilidades, que serão mais bem explicadas no decorrer do trabalho, apre-
sentadas nos games que propiciam o processo de aprendizagem de forma contextualizada, engajando os
jogadores a interagir com o meio, com a situação e com outros indivíduos.
Dessa forma, a ideia de que o uso de games ou atividades gamicadas favorece o engajamento dos
estudantes em atividades escolares tidas por eles como enfadonhas é inevitável, porque o uso dos games
pode aproximar o processo de aprendizagem do estudante à sua própria realidade. Primeiramente por
estimular o cumprimento de tarefas para o avanço no curso com o objetivo de alcançar as recompensas,
e segundo por ser de fácil acessibilidade, tendo em vista que sua utilização pode ocorrer com celulares,
tablets e computadores.
Segundo Alves (2015), atividades divertidas e gamicadas podem engajar públicos diferentes e com
idades diversas. E o engajamento está diretamente ligado à relevância dos conteúdos, às pessoas e à
forma como a aprendizagem é motivada.
De acordo com Gee (2005), os jogos apresentam características que auxiliam no desenvolvimento de
habilidades dos jogadores “em um nível mais profundo, porém o desao e a aprendizagem são em gran-
de parte aquilo que torna os videogames motivadores e divertidos” (Gee, 2004). Segundo esse autor,
alguns dos princípios de aprendizagem que os jogos desenvolvem são:
• Identidade: Aprender alguma coisa em qualquer campo requer que o indivíduo assuma
uma identidade, que assuma um compromisso de ver e valorizar o trabalho de tal campo.
“Os jogadores se comprometem com o novo mundo virtual no qual vivem, aprendem e
agem através de seu compromisso com sua nova identidade” (Gee, 2004).
• Interação: Nos jogos nada acontece sem que o jogador tome decisões e aja. E o jogo,
conforme as atitudes do jogador, oferece feedbacks e novos problemas. Em jogos online,
os jogadores interagem entre si, planejando ações e estratégias, entre outras habilidades.
• Produção: Nos jogos, os jogadores produzem ações e redesenham as histórias, individu-
almente ou em grupo.
• Riscos: Os jogadores são encorajados a correr riscos, experimentar, explorar; se erram,
podem voltar atrás e tentar novamente até acertar.
• Problemas: Os jogadores estão sempre enfrentando novos problemas e precisam estar
prontos para desenvolver soluções que os elevem de nível nos jogos.
• Desao e consolidação: Os jogos estimulam o desao por meio de problematizações que
“empurram” o jogador a aplicar o conhecimento atingido anteriormente.
Estas são algumas das possibilidades apresentadas nos games que propiciam o processo de aprendi-
zagem de forma contextualizada, engajando os jogadores a interagir com o meio, com a situação e com
outros indivíduos.
Diante do cenário apresentado, surgem algumas perguntas: como podemos extrair o melhor dessas
práticas para engajar a aprendizagem e participação em outras áreas como educação, trabalho e lazer?
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Como podemos transformar o ambiente virtual em um ambiente mais cooperativo e socializador?
4. Gamicação na educação
Para responder a essas perguntas, vemos surgir a gamicação, que consiste na utilização de elementos
dos games – tais como estratégias, pensamentos e problematizações – fora do contexto de games, com o
intuito de promover a aprendizagem, motivando os indivíduos a alguma ação e auxiliando na solução de
problemas e interação com outros indivíduos (Kapp, 2012).
No mundo corporativo, por exemplo, Carvalho (2012) diz que criar jogos para atrair consumidores
para lojas ou motivar os funcionários não é nada novo. O que mudou foi a introdução de tecnologia nes-
se processo. Algumas empresas, como Microsoft, Samsung e SAP, entraram no mundo da gamicação,
esforçando-se para aumentar o engajamento de seus funcionários e clientes incorporando conceitos de
jogos em tarefas diárias.
Segundo McGonical (2012), os jogos são atrativos não apenas pela atividade de jogar propriamente
dita, mas pelo prazer e experiências proporcionados ao indivíduo. Podemos destacar as sensações de
adrenalina, aventura, o desao e o fato de estar imerso em uma atividade divertida, sozinho ou com ami-
gos, sem a obrigatoriedade e a imposição que neutralizam a sensação do divertimento e prazer.
Os games, como Age of Empires, Warcraft, The Sims, entre outros, desenvolvem habilidades e competências
necessárias e imprescindíveis para os prossionais no mercado de trabalho. Segundo Mattar (2010, p. XIV),
saber aprender (e rapidamente), trabalhar em grupo, colaborar, com-
partilhar, ter iniciativa, inovação, criatividade, senso crítico, saber resol-
ver problemas, tomar decisões (rápidas e baseadas em informações
geralmente incompletas), lidar com a tecnologia, ser capaz de ltrar a
informação etc. são habilidades que, em geral, não são ensinadas nas
escolas. Pelo contrário: as escolas de hoje parecem planejadas para
matar a criatividade.
Vivenciamos uma crise de gerações entre aqueles que cresceram jogando videogames e os professo-
res que não entendem esse universo. No entanto, este não é um universo restrito. O uso de games está
presente cada vez mais nos lares brasileiros e em diferentes idades, incluindo quem está nas universida-
des e no mercado de trabalho.
É uma ilusão imaginar que apenas jovens jogam games hoje: pessoas de
diversas faixas etárias — incluindo, por exemplo, diretores de empre-
sas — também jogam. Por isso, os métodos tradicionais de ensino não
conseguem mais envolver os alunos em nenhum nível, nem mesmo na
educação online (Mattar, 2010).
As habilidades aprendidas e praticadas com os jogos são pouco desenvolvidas nas escolas, e talvez por
isso os jogos despertem ainda uma sensação ameaçadora no meio educacional. A tradição educacional
de transmissão de conhecimento não encontra terreno fértil entre os jovens que, por outro lado, não
encontram o conhecimento apenas nas escolas. O conhecimento está disponível em qualquer lugar e a
qualquer momento.
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Mediante esse cenário, o game pode ser uma estratégia motivadora nas escolas e ambientes de apren-
dizado. O prazer e o engajamento podem estar associados à aprendizagem, em uma linguagem e comuni-
cação compatíveis com a realidade atual. Isto é, diversão e seriedade caminham lado a lado nesse cenário.
Ralph Koster dene o conceito de diversão como aprender em determinado contexto em que não há
pressão e imposição. “Diversão, para ele, é o feedback que o cérebro nos fornece quando estamos absor-
vendo padrões para objetivos de aprendizagem” (Koster, 2004). De certa forma, os jogos proporcionam
exatamente essa diversão com aprendizagem.
Jogar inuencia diversos outros aspectos positivos além da aprendizagem, tais como: cognitivos, cul-
turais, sociais e afetivos. Por meio do jogo, é possível aprender a negociar em um ambiente de regras e
adiar o prazer imediato. É possível trabalhar em equipe e ser colaborativo, tomar decisões pela melhor
opção disponível. Todas essas características são sustentadas pelos jogos, e isso veremos mais adiante.
Alguns pesquisadores perceberam que a utilização de certos elementos de games fora do ambiente dos
jogos estimula a motivação dos indivíduos, auxiliando na solução de problemas e promovendo a apren-
dizagem. Essa conceituação é a gamicação, que, segundo Fardo (2013), “trata-se de um fenômeno emer-
gente, que deriva da popularidade dos games e de suas capacidades intrínsecas de motivar a ação, resolver
problemas e potencializar as aprendizagens nas diversas áreas do conhecimento e na vida dos indivíduos”.
O jogo é uma atividade social, que faz parte de nosso contexto cultural. Nada mais certo que faça parte
também de cenários educativos, “proporcionando ao estudante a vivência de experiências de aprendiza-
gem que talvez não fossem tão fáceis de serem alcançadas através do ensino tradicional“ (Giardinetto;
Mariani). Desse modo, a gamicação aplicada como estratégia de ensino à geração que conhece e enten-
de os conceitos dos games apresenta resultados positivos no engajamento.
Apesar de a tecnologia apoiar determinadas estratégias na educação, fatores como motivação, coo-
peração e engajamento dos estudantes ainda são considerados situações difíceis de driblar. De acordo
com Hein (2013), “o conceito básico por trás da gamicação é a oferta de recompensas em troca de ações.
As estratégias usadas nos jogos podem motivar pessoas e até inuenciá-las psicologicamente”. Segundo
Smith-Robbins (2011), os jogos são dinamizados em objetivos e metas, com obstáculos a serem supera-
dos a m de atingir a vitória. Por meio dessa teoria, é possível traçar o paralelo entre um jogador e o aluno,
que também supera obstáculos/problematizações para atingir metas e objetivos.
Nesse sentido, a gamicação pode aumentar a participação dos alunos extraindo os elementos agradá-
veis e divertidos dos jogos de forma adaptada ao ensino. Entretanto, Kapp (2012) alerta para o fato de que
apenas dar pontos para a entrega de tarefas ou atividades não caracteriza gamicação. De acordo com o
autor, as mecânicas dos jogos, se utilizadas de forma adequada, podem tornar os alunos mais participativos.
Segundo Klock et al. (2014), diferentes pesquisas e iniciativas vêm sendo realizadas no sentido de me-
lhorar e aumentar a motivação e o engajamento de alunos online, dentre elas a gamicação. Ainda se-
gundo os autores, os elementos dos jogos estão relacionados a desejos e necessidades humanas como
recompensas, status e desaos, entre outros. A gamicação pode ser utilizada para atender essas neces-
sidades direcionadas na Educação para motivar e engajar o aluno a ser mais participativo e aumentar sua
relação com seus pares.
Alguns elementos trazidos dos games que elevam a motivação e engajamento dos alunos podem ser
vistos na Tabela 1.
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TABELA 1: Elementos para gamicação
Pontuação Sistema de pontos de acordo com as tarefas que o usuário realiza; este é
recompensado com uma quantidade determinada de pontos.
Níveis Tem como objetivo mostrar ao usuário seu progresso dentro do sistema;
geralmente é utilizado em conjunto com os pontos.
Ranking Uma maneira de visualizar o progresso dos outros usuários e criar um
senso de competição dentro do sistema.
Medalhas/Conquistas Elementos grácos que o usuário recebe por realizar tarefas especícas.
Desaos e missões Tarefas especícas que o usuário deve realizar dentro de um sistema, sen-
do recompensado de alguma maneira por isso (pontos e medalhas). Cria o
sentimento de desao para o usuário do sistema.
Adaptado de Klock et al. (2014).
4.1 Exemplos de gamicação na Educação
Para exemplicar alguns usos da gamicação para alavancar o engajamento e a participação de usu-
ários em atividades de aprendizagem, foram selecionados dois casos da empresa Badgeville1, uma das
maiores empresas de gamicação dos Estados Unidos, e dois casos brasileiros.
Beat the GMAT (BTG) é a maior rede social do mundo para os candidatos de MBA, atendendo a mais de
2 milhões de pessoas a cada ano. A BTG habilita as pessoas a aprender, compartilhar, ensinar e apoiar uns
aos outros ao longo do processo de admissão de MBAs de grandes universidades. Essa empresa adotou
a gamicação para aumentar o engajamento e retenção de seus usuários.
Por meio de uma mecânica perspicaz de jogo, a BTG implementou essa dinâmica em sua plataforma de
comportamento com o objetivo de motivar e inuenciar os usuários a compartilhar conhecimento sobre
a solução de problemas de programas especícos de MBA.
O sistema foi congurado para, com base em determinados comportamentos, o usuário ser recompen-
sado e ter em seu perl essas recompensas. A partir daí outros usuários são incentivados a realizar o mes-
mo comportamento. Alguns exemplos de recompensas são: medalha de “Campeão da Gramática” para
usuários que escrevem 100 postagens no fórum de correção de gramática, de “Liderança de pensamento”
para usuários que conseguem 250 seguidores e de “Solucionador de problemas” para quem escreve 30
postagens na seção de solução de problemas.
Com essas e outras ações gamicadas, a BTG aumentou o tempo gasto por seus usuários em seu site e
em sua comunidade em 370%, signicando um engajamento maior dos usuários nas atividades propos-
tas. Além disso, a proposta gamicada trouxe aumento de 195% de visitação em suas páginas, proporcio-
nando à empresa uma possibilidade maior de conversão em novos usuários.
Outro exemplo trazido é o da Universidade Kaplan, nos EUA2. Essa universidade pratica uma educação
centrada no aluno, preparando-o para carreiras nas grandes indústrias. A Kaplan atende a mais de 49 mil
estudantes online e em seu campus. Como os estudantes têm muitas obrigações não acadêmicas, simples-
mente fornecer materiais de curso e instrução não era suciente para garantir o aprendizado envolvido.
Assim, percebeu que o envolvimento dos alunos era essencial para uma experiência de sucesso e utilizou
os princípios da Psicologia comportamental envolvidos na gamicação como uma oportunidade para in-
centivar a participação mais frequente e com mais qualidade.
1 BADGEVILLE. Beat the GMAT. Disponível em https://badgeville.com/beat-the-gmat/. Acesso em: out. 2016.
2 BADGEVILLE. Kaplan University. Disponível em https://badgeville.com/kaplan-university/. Acesso em: out. 2016.
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Além disso, a Escola Superior de Tecnologia da Informação da Universidade Kaplan viu a oportunidade
de aumentar as experiências de aprendizagem tradicionais por meio da inovação com a gamicação. Foi
uma forma de os estudantes receberem o reconhecimento imediato, visualizar as suas realizações e se
tornarem mais envolvidos emocionalmente na sua formação acadêmica.
A inovação consistiu em impulsionar um programa gamicado para inuenciar os principais comporta-
mentos de aprendizagem. Algumas técnicas utilizadas foram: a Mecânica de Jogo, que manteve os alunos vol-
tados para as atividades propostas; a Mecânica da Reputação, que motivou os usuários a optar por completar
conteúdos mais desaadores; e a Mecânica Social, que promoveu interação entre colegas e professores.
Ao promover essa gamicação, a Escola de TI da Universidade Kaplan levou sua experiência de apren-
dizado para um nível mais elevado, aumentando a motivação, a participação e o sucesso acadêmico. Isso
motivou novas inscrições de cursos complementares e garantiu maior engajamento dos alunos, motivan-
do-os a estudar mais e envolver-se em novos projetos.
A universidade obteve, com essa inovação, aumento de 17% do tempo gasto em sala de aula pelos
alunos, 85% de aumento na participação em cursos complementares da universidade e 9% de aumento
nas notas.
No Brasil, foram selecionados dois casos que exploram a gamicação para auxiliar o desenvolvimento
de competências socioemocionais e os processos de aprendizagem nas salas de aula presenciais.
O primeiro projeto selecionado é o Logus: A saga do conhecimento3, um game desenvolvido pela Fun-
dação Maurício Sirotsky Sobrinho (FMSS) e pelo Grupo RBS; é direcionado aos estudantes de escolas pú-
blicas do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. O jogo possui etapas online e presenciais, desenvolvendo
competências e habilidades com o objetivo de levar a cultura digital e novos formatos de aprendizagem
em escolas públicas além de estimular o desao entre as equipes que precisam elaborar projetos de
transformação para suas escolas e comunidades. A competição envolve os participantes em uma narra-
tiva gamicada. Para combater o Nulis, vírus do desinteresse e da apatia, as equipes devem completar
missões que incluem ações de sustentabilidade, leitura, cidadania e transformação da escola e do seu
entorno. Em 2016, o projeto está em sua 2ª edição e fomentou mudanças positivas após a inscrição de
633 escolas no ano anterior, com participação de mais de 7.000 pessoas, entre alunos e professores, que
travaram uma batalha virtual pela educação. O projeto Logus tem buscado uma aproximação efetiva com
os jovens, promovendo a conexão com o ambiente escolar e com o prazer de aprender.
O segundo projeto, muito promissor, é o projeto Arkos4, um portal desenvolvido para promover a lei-
tura por meio da gamicação para turmas do 2º ao 5º do ensino fundamental. O aluno acessa o portal,
procura o livro que leu e responde a perguntas sobre o conteúdo. Acertando, ganha pontos, medalhas e
adesivos virtuais, além de subir de nível e competir com os colegas. É um projeto que motiva os alunos
a ler mais por meio de estratégias gamicadas. A iniciativa encontra-se em seu 3º campeonato este ano.
O projeto existe desde 2014 e já ultrapassou a marca de 300 escolas com 60.000 alunos registrados. O
projeto tem a marca, segundo 99% dos professores cadastrados, de aumentar a média de leitura de livros
de 1 para 5 por mês por seus alunos, o que auxiliou na melhora da interpretação de textos, na escrita de
redações e até mesmo da participação nas aulas de português.
Estes exemplos reforçam nosso principal apontamento, e objetivo deste artigo de demonstrar que
a gamicação pode vir a ser uma excelente ferramenta para a melhoria e aumento do engajamento e
participação de alunos em atividades relacionadas ao processo de aprendizagem de diferentes maneiras.
3 Logus Saga. Disponível em http://logusasaga.com.br/. Acesso em: out. 2016.
4 Arkos. Disponível em: http://www.arkos.com.br/d/sobre. Acesso em out. 2016.
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Os exemplos vericados reforçam o contexto deste artigo de que a utilização de estratégias como o uso
de bonicação, medalhas, competição e metas são ações, que quando trabalhadas de forma contextuali-
zada, instigam o aluno a participar de atividades, que talvez antes não produzissem o mesmo efeito. Isto
porque a gamicação retorna o prazer da atividade e o sentimento de estar em comunidade, participando
de algo que fornece um objetivo, com caminhos diferentes, porém que levam ao mesmo ponto, uma for-
ma mais dinâmica e prazerosa de aprender.
Klock et al. (2014) ressaltam que, trabalhando com pontuações e níveis de experiência, o usuário é
instigado a buscar atividades a m de cumprir metas e atingir objetivos. Esses fatores dialogam entre si,
aumentando o senso de socialização e colaboração, sem contar o aumento de feedback continuo, propor-
cionando a noção do progresso em uma atividade realizada durante o processo de aprendizagem.
Segundo Alves (2015, p. 41),
em termos de aprendizagem, quando pensamos em gamication esta-
mos em busca da produção de experiências que sejam engajadoras e
que mantenham os jogadores focados em sua essência para aprender
algo que impacte positivamente em sua performance.
Percebe-se, nas experiências narradas, a busca por propostas engajadoras e interativas contextualiza-
das em uma linguagem de games que faz parte da realidade de nossos jovens, inuenciando-os a ser mais
participativos em atividades, em que possivelmente não teriam alto nível de participação se fosse apre-
sentadas de outra maneira, sem os recursos da gamicação. Segundo Fardo (2013), isso é possível, pois,
estratégias e pensamentos dos games são bastante populares, ecazes
na resolução de problemas (pelo menos nos mundos virtuais) e acei-
tas naturalmente pelas atuais gerações que cresceram interagindo com
esse tipo de entretenimento. Ou seja, a gamicação se justica a partir
de uma perspectiva sociocultural (Fardo, 2013).
4. Conclusão
Podemos concluir que, embora o uso da gamicação esteja relativamente no início no campo da Edu-
cação e necessite de mais estudos, esse recurso pode vir a ser um grande aliado no aumento do enga-
jamento e da motivação dos alunos de cursos online e presenciais. Sua proposta é inovadora a partir do
momento que transforma elementos de um game em um meio de comprometer seus participantes e
tornar mais prazerosas as atividades. Nesse processo,
• pontos – são transformados em tarefas realizadas;
• níveis – são vistos como progresso dos alunos;
• feedbacks – são necessários em sua dinâmica;
• erros – são uma oportunidade de refazer e buscar novas maneiras de resolução de um
mesmo problema.
Pelas fortes relações sociais e o uso do design de games, podemos trazer soluções para a vida real, ge-
rando novas potencialidades e promovendo a aprendizagem. No momento em que o aluno é chamado à
ação, transforma-se em agente de seu saber e a colaboração entre os pares é fortalecida.
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Os ambientes de cursos online e o currículo de cursos presenciais existentes no Brasil ainda se encon-
tram aquém do novo perl de aluno, uma geração que cresceu cercada por games e tecnologia. Pode-se
dizer, tomando como base os casos apresentados, que um ambiente mais instigante e estrategista, vol-
tado para a realidade atual, utilizando elementos de gamicação, traz engajamento e participação, moti-
vando, com mais qualidade, a construção do saber. Sabemos que gamicar um curso não é algo fácil e de-
manda esforços múltiplos; porém acreditamos que dispomos de uma ferramenta instigante e altamente
colaborativa para a aprendizagem. É possível perceber que, por meio da mecânica de jogos, a motivação
e o engajamento dos indivíduos são potencializados e o desejo das relações humanas, intrínsecos ou
extrínsecos, são recompensados por meio das estratégias, dos níveis que são alcançados nos problemas
solucionados e das possibilidades de compartilhar os ganhos com outros indivíduos. Essas recompensas,
por sua vez, trazem para o individuo a satisfação buscada na vida real, que, segundo McGonigal (2012),
são facilmente encontradas no mundo virtual, nos games.
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