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Vol. 5
COMPORTAMENTO
EM FOCO
OBM | Organizational Behavior Management
Análise do Comportamento nas Organizações
ORGANIZAÇÃO
Denise L. Oliveira Vilas Boas
Fernando Cassas
Hélder Lima Gusso
Comportamento em foco 5 /
C737
Organizadores: Denise L. Oliveira Vilas Boas, Fernando Cassas,
Hélder Lima Gusso. -- São Paulo: Associação Brasileira de
Psicologia e Medicina Comportamental – ABPMC, 2017.
86 p.
ISBN 978-85-65768-04-7
1. Comportamento humano. 2. Análise do comportamento.
I. Boas, Denise L. Oliveira Vilas. II. Fernando Cassas. III. Hélder
Lima Gusso. IV. Associação Brasileira de Psicologia e Medicina
Comportamental.
CDD 150.1943
Catalogação pelo Sistema Integrado de Bibliotecas da UNIVASF.
Organização deste volume
Denise L. Oliveira Vilas Boas (Núcleo Tríplice e UNIFOR)
Fernando Cassas (Paradigma – Centro de Ciências do Comportamento)
Hélder Lima Gusso (Universidade Federal de Santa Catarina)
Comissão de Publicação e Editorial da ABPMC
Fernando Cassas (Paradigma – Centro de Ciências
do Comportamento - Presidente)
Angelo A. S. Sampaio (Universidade Federal do Vale
do São Francisco - Secretário)
Francisco Lotufo Neto (IPqUSP – Editor Chefe da RBTCC)
Projeto Gráco e Editoração
Roberto Colombo - Portfólio
Instuição Organizadora
Associação Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental
Pareceristas
Aécio Borba V. Neto (Universidade Federal do Pará)
Candido V. B. B. Pessôa (Paradigma – Centro de Ciências do Comportamento)
Elen Gongora Moreira (Grupo Inquima)
Gabriel Gomes de Luca (Universidade Federal do Paraná)
Lívia Aureliano (Universidade de São Paulo)
Marcela Ortolan (Universidade Estadual de Londrina)
Sobre a ABPMC
A Associação Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental (ABPMC)
é uma associação civil sem fins lucrativos, fundada em 1991, e tem por
objetivos: (a) Promover, na sociedade, a Análise do Comportamento como
área de conhecimento e como campo de atuação profissional por meio
de sua divulgação e de procedimentos para o contínuo aperfeiçoamento
da área; e (b) Criar condições para o aperfeiçoamento do conhecimento
científico relacionado com análise do comportamento, de seus processos
de produção e de uso por parte dos analistas de comportamento no Brasil,
por meio de avaliação e crítica sistemáticas.
A ABPMC é constituída por pesquisadores, professores, profissionais que
trabalham com Análise do Comportamento em suas diferentes dimensões
– pesquisa básica, aplicada, conceitual e prestação de serviços – além de
estudantes de psicologia, medicina comportamental e de outras disciplinas
relacionadas ao comportamento humano. Atualmente congrega mais de
1.500 sócios distribuídos pela maioria dos estados brasileiros.
Entre as principais atividades da ABPMC está o Encontro Brasileiro de
Psicologia e Medicina Comportamental, realizado anualmente. É consi-
derado o maior fórum brasileiro de Análise do Comportamento e um dos
maiores do mundo. A ABPMC também mantém uma série de publicações
científicas: Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva
(RBTCC), série Comportamento em Foco (continuação da série Sobre
Comportamento e Cognição), ambas disponíveis online gratuitamente e
bem avaliadas pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (Capes). A ABPMC também contribui com outras instituições
científicas, como Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)
e a Sociedade Brasileira de Psicologia (SBP).
Outra atividade de grande importância realizada pela ABPMC é o processo
de acreditação de analistas do comportamento no país. Esta ação visa
atender uma demanda da comunidade, que apresentou a necessidade de
monitorar a qualidade da prática do analista do comportamento brasileiro,
favorecendo a escolha, pela comunidade, de profissionais qualificados
para o exercício profissional nos diversos campos de atuação em Análise
do Comportamento.
Saiba mais sobre a ABPMC em www.abpmc.org.br
Denis Roberto Zamignani
Jan Luiz Leonardi
Natália de Mesquita Matheus
Maria de Lima Wang
Lygia Teresa Dorigon
Gabriel Careli
Antonio Maia Olsen do Vale
Luciana Leão Moreira
Fabrício de Souza
Cintia Guilhardi
Emmanuel Zagury Tourinho
Francisco Lotufo Neto
Maria Amalia Pie Abib Andery
Sílvio Paulo Botomé
Vera Regina L. Otero
Bernard Pimentel Rangé
Claudia Kami Bastos Oshiro
Hélio José Guilhardi
João Ilo Coelho Barbosa
Maria Martha Hubner
Maria Zilah Brandão
Rachel Rodrigues Kerbauy (in memorian)
Roberto Alves Banaco
Wander Pereira da Silva
Isaias Pessoti
João Claudio Todorov
Presidente
Vice-presidente
Primeira Secretária
Segunda secretária
Primeira Tesoureira
Segundo Tesoureiro
Membros efevos
Membro suplente
Membros permanentes
Membros honorários
Diretoria ABPMC 2015-2016
Conselho Fiscal
Conselho Consulvo
Sobre a coleção Comportamento em Foco
Em 1997 a ABPMC iniciou a publicação da série Sobre Comportamento e
Cognição, que teve importante papel na disseminação do conhecimento
produzido em Análise do Comportamento no Brasil. Após 16 anos de pu-
blicação da série, a ABPMC mudou seu formato, de impresso para digital
e, em 2012, renomeou a série como Comportamento em Foco.
O objetivo principal da coleção Comportamento em Foco é disseminar o
conhecimento produzido pela comunidade de analistas do comportamento
no Brasil, por meio de coletâneas constituídas pelos trabalhos apresentados
nos encontros anuais da ABPMC sob forma de palestras, mesas redondas,
simpósios, sessões coordenadas, minicursos e sessões primeiros passos.
Também é objetivo contribuir na formação científica dos estudantes e
profissionais da área, por meio da avaliação das produções escritas dos
autores. Este volume apresenta artigos decorrentes das apresentações
realizadas nos encontros anuais da ABPMC de 2014 e 2105 relacionadas
ao campo da Análise do Comportamento nas Organizações.
A partir deste volume, há duas novidades: Os artigos passam a estar em
volumes temáticos específicos, que visam melhorar a experiência de leitura e
ampliar o acesso dos diferentes volumes temáticos aos diferentes segmentos
da sociedade que possam se beneficiar do acesso a esse conhecimento. A
segunda novidade é a atualização do projeto gráfico, inserindo novos ele-
mentos visuais compatíveis com o campo da editoração científica. Mantendo
a boa tradição da série, os artigos que constituem a coleção passaram pela
revisão de pareceristas ad-hoc convidados em processo de duplo-cego.
Os livros digitais de cada volume estão disponibilizados gratuitamente
no site da ABPMC: www.abpmc.org.br
Sobre os autores deste volume
Aécio Borba
Psicólogo, Analista do Comportamento, doutor em Teoria e Pesquisa do
Comportamento pela Universidade Federal do Pará. Atualmente, é professor
da Faculdade de Psicologia e do Programa de Pós-graduação em Teoria e
Pesquisa do Comportamento na mesma universidade, pesquisando os temas
de Análise do Comportamento Aplicada às Organizações e Seleção Cultural.
Camila Carvalho Ramos
Psicóloga (CRP10 - 03082), Analista do Comportamento, mestre e doutora
em Psicologia: Teoria e Pesquisa do Comportamento pela Universidade
Federal do Pará (UFPA). Atualmente trabalha como psicóloga e vice-coor-
denadora do Laboratório de Gestão do Comportamento Organizacional da
UFPA, em estágio de pós-doutoramento, desenvolvendo estudos e pesqui-
sas no campo de Gestão por Competências e da Análise do Comportamento
Aplicada às Organizações.
Candido V. B. B. Pessôa
Administrador de empresas pela FGV-SP, mestre em Psicologia
Experimental: Análise do Comportamento pela PUC/SP e doutor em ciências
(Psicologia Experimental) pela USP. Atualmente é professor e orientador
no Programa de Mestrado Profissional em Análise do Comportamento
Aplicada no Paradigma Centro de Ciências do Comportamento e professor
na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo. Coordena o grupo
de pesquisa Comportamentos e Sistemas Organizacionais.
Gabriel Gomes de Luca
Doutor em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina, pro-
fessor e pesquisador do Departamento de Psicologia e do Programa de
Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal do Paraná. Tem
realizado estudos e investigações em programação de ensino, análise com-
portamental de processos de ensino e em contextos organizacionais.
Hélder Lima Gusso
Psicólogo (CRP 12/06549), Analista do Comportamento (ABPMC 53-2015),
mestre e doutor em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC). Atualmente é professor adjunto do Departamento de Psicologia da
UFSC, desenvolvendo atividades de ensino e pesquisa no campo da Análise
do Comportamento nas Organizações. Coordenador da linha de pesquisa
em avaliação de processos de aprendizagem e de intervenção profissional
do Laboratório Fator Humano da UFSC.
Ilma A. Goulart de Souza Brio
Doutora em Ciências Sociais, Antropologia pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo. Mestre em Psicologia da Aprendizagem e
Desenvolvimento pela Universidade de Brasília, UnB. Graduada em
Psicologia pela UnB. Professora titular, pesquisadora e orientadora dos
Programas de Pós-Graduação Lato Sensu e Stricto Sensu da Pontifícia
Universidade Católica de Goiás, PUC Goiás.
Lívia Godinho Aureliano
Psicóloga (CRP 06/69497), doutoranda em Psicologia Experimental pela USP
e mestre em Psicologia Experimental: Análise do Comportamento pela PUC-
SP. Docente da Universidade São Judas Tadeu nas disciplinas de Psicologia
Organizacional e Análise do Comportamento. Atualmente desenvolve pes-
quisas e orienta estudos no campo de análise de sistemas comportamentais.
Maria Vanesse Andrade
Psicóloga (CRP 06-115477), Analista do Comportamento, Mestra em
Psicologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC) e doutoranda em
Psicologia Experimental na PUC-SP. Atualmente trabalha como Psicóloga
Especialista em Saúde na Atenção Básica e atua em Consultório particular,
ambas as funções desempenhadas a partir dos pressupostos da Clínica
Analítico-Comportamental.
Nayra Karinne Bernardes de Menezes
Doutoranda em Psicologia na linha de concentração OBM – Organizational
Behavior Management (Análise do comportamento); Mestre em
Administração; Especialista em Gestão de Pessoas e Bacharel em
Administração. Atualmente trabalha como professora assistente no de-
partamento de Administração da PUC Goiás e docente do programa de
pós-graduação lato sensu da Pontifícia Universidade Católica de Goiás; é
pesquisadora do NUPEN da mesma Instituição.
Thiago Dias Costa
Psicólogo pela Universidade Federal de São Carlos (2001), Doutor em
Psicologia (Teoria e Pesquisa do Comportamento) pela Universidade
Federal do Pará (2008). Leciona no Programa de Pós-Graduação em
Gestão Pública e na faculdade de Psicologia da Universidade Federal do
Pará. Atualmente, é coordenador do GESTCOM - Laboratório de Gestão
do Comportamento organizacional, prestando consultoria para diferentes
órgãos federais e estaduais na implantação e manutenção do modelo de
Gestão por Competências na administração pública.
A Análise do Comportamento nas Organizações
Considerando a importância do trabalho na vida das pessoas e o fato das
agências de controle do comportamento serem predominantemente ins-
titucionalizadas sob a forma de organizações, o campo de atuação em
Organizações e Trabalho não poderia estar fora do interesse dos analistas
do comportamento. Nesta coletânea sobre Análise do Comportamento nas
Organizações (um dos termos mais usados no Brasil para referir-se à tra-
dicional expressão Organizational Behavior Management – OBM) contamos
com seis capítulos que ilustram uma parcela do trabalho que vem sendo
desenvolvido no Brasil.
No primeiro capítulo, Borba, Ramos e Costa (2017) apresentam ao leitor
brasileiro um panorama da história de desenvolvimento da OBM nos Estados
Unidos a partir das pesquisas históricas desenvolvidas por Dickinson
(2000) e VanStelle, Vicars, Harr, Miguel, Koerber, Kazbour e Austin (2009).
Conhecer a história de desenvolvimento de um campo de atuação nos pos-
sibilita compreender melhor sua atual configuração. No segundo capítulo,
Gusso e De Luca (2017) examinam o conceito de organizações, explicitando
os processos comportamentais envolvidos em tal fenômeno de modo a
orientar a ação de analistas do comportamento no campo organizacional.
Fica destacada a contribuição das análises conceituais como requisito à
compreensão dos fenômenos com os quais lidamos.
No terceiro capítulo, Aureliano e Pessôa (2017) apresentam o primei-
ro capítulo de livro em língua portuguesa sobre Análise de Sistemas
Comportamentais, como recurso para análise e intervenção nas organiza-
ções. Os autores que sistematicamente apresentam trabalhos nos encontros
anuais da ABPMC sobre o tema, agora facilitam o acesso ao conhecimento
a ele relacionado em língua portuguesa. Menezes e Britto (2017) apresen-
tam, no quarto capítulo, a identificação de alguns dos comportamentos
de líderes em um estudo de caso em empresa do ramo de agronegócio, e
sua relevância como determinante na realização das atividades.
No Capítulo 5 é apresentado um olhar diferente dos demais capítulos. Não
são examinadas questões internas das empresas, mas questões relacionadas
à interação com o público. Andrade (2017) nos apresenta interessante exame
de estratégias publicitárias presentes em blogs femininos de moda. A autora
realiza exercício interpretativo sobre as funções que diferentes aspectos
presentes nos blogs podem passar a exercer sobre o comportamento de
seu público. Por fim, no Capítulo 6, Gusso (2017) explicita 12 desafios que
muito provavelmente qualquer pessoa interessada no trabalho com Análise
do Comportamento nas Organizações irá enfrentar. Junto aos desafios, o
autor apresenta algumas alternativas possíveis para lidar com cada um
deles, oferecendo uma espécie de “material de sobrevivência na selva”
aos “aventureiros” que iniciam suas jornadas no campo das organizações.
Denise L. Oliveira Vilas Boas
Fernando Cassas
Hélder Lima Gusso
Referências
Dickinson, A. M. (2001). The historical roots of organizational behavior
management in the private sector: The 1950s-1980s. Journal of
Organizational Behavior Management, 20(3-4), 9-58.
VanStelle, S. E., Vicars, S. M., Harr, V., Miguel, C. F., Koerber, J. L., Kazbour,
R., & Austin, J. (2012). The publication history of the Journal of
Organizational Behavior Management: An objective review and
analysis: 1998–2009. Journal of Organizational Behavior Management,
32(2), 93-123.
O surgimento da Análise do Comportamento
Aplicada às Organizações
Aécio Borba, Camila Carvalho Ramos e
Thiago Dias Costa
13
Organizações como Sistemas Comportamentais:
Considerações para a Delimitação do Campo de Atuação
Hélder Lima Gusso e Gabriel Gomes de Luca
28
Análise de Sistemas Comportamentais:
uma proposta de análise e intervenção nas organizações
Lívia Aureliano e Candido V. B. B. Pessôa
41
Habilidades de Líderes como Gestores em uma Empresa
do Ramo de Agronegócio
Nayra Karinne Bernardes de Menezes e
Ilma A. Goulart de Souza Brio
53
Uma Leitura sobre as Estratégias Publicitárias
em Blogs Femininos De Moda
Maria Vanesse Andrade
62
Desaos ao Analista do Comportamento
no Campo Organizacional Brasileiro
Hélder Lima Gusso
77
Sumário
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5
13
Aécio Borba, Camila Carvalho Ramos e Thiago Dias Costa
1 O presente trabalho é baseado em parte do curso Introdução à Gestão do Comportamento Organizacional (OBM), de autoria dos
mesmos autores e apresentado no XXIII Encontro Brasileiro de Psicologia e Medicina Comportamental, em 2014. Os autores gostariam
de agradecer à comissão editorial e à(ao) parecerista ad hoc cujas sugestões contribuíram para a estrutura e clareza deste trabalho.
Aécio Borba, Camila Carvalho Ramos e Thiago Dias Costa
Aécio Borba
Universidade Federal do Pará
aecioborba@gmail.com
Camila Carvalho Ramos
Universidade Federal do Pará
Thiago Dias Costa
Universidade Federal do Pará
O surgimento da Análise do
Comportamento Aplicada às
Organizações1
The emergence of Organizaonal
Behavior Management
Resumo
O presente trabalho apresenta o percurso histórico
feito pela Análise do Comportamento Aplicada às
Organizações, conhecida também pela sigla OBM
(Organizational Behavior Management). Este é o braço
da Análise do Comportamento que tem como objeto
de estudo e intervenção o comportamento humano
em organizações de trabalho. Nos anos 1950, apare-
ceram as primeiras discussões acerca da intervenção
em organizações baseada em princípios da Análise do
Comportamento. Essa entrada ocorreu efetivamente
ao longo das duas décadas seguintes a partir de um
grupo de pesquisadores que utilizaram a Instrução
Programada em treinamentos de atividades no am-
biente de trabalho. Dessas raízes, a OBM ampliou e
diversificou suas pesquisas e intervenções, produzindo
sua configuração atual.
Abstract
This paper presents the historic path of
Organizational Behavior Management. This is the
branch of Behavior Analysis that has the objective
the study and intervention in the human behavior
in work organizations. OBM has as antecedents, if
not as causal at least as chronological, the schools
of scientific and human relations in administration
science. In the 1950s, with the beginning of Applied
Behavior Analysis and Skinner’s reflections on
economy as an control agency, the first discussions
about interventions in the workplace started. This
opening came effectively when a group of researchers
applied programmed instruction to deal with
training of workplace skills. From this beginning,
OBM increased and diversified its research and
interventions, producing its current configuration.
PALAVRAS-CHAVE
Análise do Comportamento Aplicada às Organizações;
OBM; História da OBM; História da Ciência.
KEYWORDS
History of OBM; Organizaonal Behavior Management;
History of science.
14
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Aécio Borba, Camila Carvalho Ramos e Thiago Dias Costa
2 Por estar já consagrada pelo uso, mesmo no Brasil, ao longo deste trabalho ulizaremos a sigla OBM para referir-se à Análise
do Comportamento Aplicada às Organizações.
Análise do Comportamento Aplicada às
Organizações, também conhecida no meio
acadêmico brasileiro pela sigla em inglês OBM
(de Organizational Behavior Management2), se
refere ao conjunto de práticas de reflexão,
pesquisa e aplicação dos conceitos, méto-
dos e técnicas analítico-comportamentais
ao campo organizacional. É um modelo de
pesquisa e intervenção em organizações de
trabalho que tem como objetivos analisar,
compreender e propor medidas que contri-
buam para a solução de problemas organi-
zacionais e a melhoria da qualidade de vida
dos trabalhadores a partir da transformação
das contingências das quais o comporta-
mento é função (Aureliano, Arima & Careli,
2013; Austin, 2000; Culig, Dickinson, Heather
McGee& Austin, 2005; Daniels & Bailey, 2014;
Poling, Dickinson, Austin & Normand, 2000).
Este trabalho resgata a história da Análise do
Comportamento Aplicada às Organizações na
formação da área propriamente dita, apon-
tando os principais nomes e eventos que
formaram o campo de atuação da OBM, cul-
minando com a organização da OBM Network
e a fundação do Journal of Organizational
Behavior Management. Por fim, apresentare-
mos brevemente o estado atual da área, com
suas principais subdivisões e os temas mais
estudados. Uma revisão desta natureza tem
como objetivo apresentar ao leitor as origens e
desenvolvimento da área, de forma que possa
servir como base para uma percepção sobre
seu panorama e subsidiar reflexões sobre seu
presente e futuro.
O trabalho se estrutura em quatro seções.
Seguindo Dickinson (2001), apresentamos
nas duas primeiras seções os principais de-
senvolvimentos dos precursores dos anos
1950 até o “fundação” da OBM nos anos 1960
e 70. Entre os principais marcos desta fase,
está a publicação do Journal of Organizacional
Behavior Management (JOBM), que pode ser
apontado como culminação deste processo.
Por isso, a terceira seção busca, apoiada em
revisões sobre as publicações no JOBM, apre-
sentar o desenvolvimento da área ao longo
das décadas seguintes, até 2009. Por fim, a
última seção apresenta de forma resumida um
panorama da OBM, possibilitando ao leitor
perceber o ponto de chegada desse processo
de desenvolvimento histórico.
Antes de apresentar essa origem seguindo
a literatura que trata de revisões históricas
na OBM, é importante destacar que este é
um olhar histórico possível, mas não esgota
as possibilidades de análise desse percurso.
Destacamos por exemplo que, apesar de a
OBM propriamente dita ter se iniciado apenas
nas décadas de 1960 e 70, algumas de suas
ideias centrais já estavam presentes no am-
biente cultural norte-americano desde antes.
Johnson, Mawhinney e Redmon (2001) des-
tacam alguns movimentos que dispuseram
contingências importantes para a seleção da
OBM décadas mais tarde, como o movimento
da Administração Científica e da Escola das
Relações Humanas no campo da gestão orga-
nizacional. Não iremos nos aprofundar nesses
15
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Aécio Borba, Camila Carvalho Ramos e Thiago Dias Costa
3 Instrução Programada é um termo que descreve uma variedade de formas de ensino que implicam uma organização
cuidadosa de sequências de conngências de reforço que levam a um determinado objevo educacional (Skinner, 1968).
temas aqui por uma questão de espaço e
escopo do texto, mas destacamos que a entra-
da e aceitação da Análise do Comportamento
no ambiente organizacional foi precedida de
outras práticas científicas enfocando o com-
portamento humano.
Skinner e a origem da Análise
do Comportamento Aplicada
O livro Ciência e Comportamento Humano
(Skinner, 1953/1968) aparece como um dos
primeiros trabalhos em que há uma refle-
xão sobre o mundo do trabalho baseada
nos princípios analítico-comportamentais
(Dickinson, 2001), principalmente no capítulo
sobre controle econômico (Capítulo XXV). Ao
discutir o controle econômico do comporta-
mento humano, Skinner (1953/1965) aponta
questões como: os efeitos de esquemas de
reforçamento, a contingência entre qualidade
de trabalho e pagamento, a questão de con-
tingências concorrentes no ambiente laboral
e a importância do contra controle para impor
limites às possibilidades de que detentores do
capital possam controlar de forma deletéria
os trabalhadores.
Skinner (1953/1965) defendia claramen-
te que era possível o uso da Análise do
Comportamento na solução de problemas
aplicados. Embora não tenha se detido es-
pecificamente em uma proposta de inter-
venção analítico-comportamental sobre o
comportamento no ambiente de trabalho,
Dickinson (2000) destaca que as contribui-
ções de Skinner para a origem da OBM teve
como precursores também um outro conjunto
de produções suas: a Instrução Programada3.
Dickinson (2001) relata que os trabalhos de
Skinner sobre Instrução Programada em
Harvard produziram um grande interesse de
diversos pesquisadores da época, como James
Holland (com quem Skinner escreveria um livro
sobre Análise do Comportamento no formato
de instrução programada) e Thomas Gilbert,
então professor da University of Georgia que
mais tarde estaria entre os pioneiros da Análise
do Comportamento Aplicada às Organizações.
Alguns dos pesquisadores que trabalharam
com Skinner nos anos 1950, como Lloyd
Homme, Francis Mechner and David Padwa,
formaram empresas que utilizavam a Instrução
Programada para treinamento no ambiente de
trabalho, o que Dickinson (2001) aponta como
“a primeira aplicação organizada de princípios
comportamentais no ambiente de trabalho”
(p. 19). Ao longo da década de 1960, alguns
dos mais importantes nomes na consolidação
da OBM fizeram a transição de estudos em
Instrução Programada para construir treina-
mentos para empresas e indústrias, como será
visto ao longo da próxima seção.
Também ocorre nessa época a consolidação de
propostas de intervenção clínica baseada em
Análise do Comportamento, com a transição
de intervenções oriundas de procedimentos
16
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Aécio Borba, Camila Carvalho Ramos e Thiago Dias Costa
4 A autora está se referindo aos seguintes trabalhos: Skinner, B.F. (1954). The science of learning and the art of teaching. Harvard
Educaonal Review, 24, 86-97; Skinner, B. F. (1958). Teaching machines. Science, 128, 969-977; Ayllon, T. & Michael, J. (1959).
The psychiatric nurse as a behavioral engineer. Journal of the Experimental Analysis of Behavior, 2, 323-334; além de Skinner
(1953/1968).
de laboratório para a resolução de compor-
tamentos clinicamente relevantes (Barbosa
& Borba, 2010). Segundo Dickinson (2001), a
“Modificação do Comportamento” (que viria
a ser chamada mais tarde de Análise Aplicada
do Comportamento) teve grande impacto para
a origem da OBM por demonstrar a efetividade
de abordar problemas humanos com princí-
pios comportamentais, expandindo para fora
do laboratório a Análise do Comportamento.
Estavam estabelecidas condições para a aplica-
ção da Análise do Comportamento em ambien-
tes organizacionais, e assim a origem da OBM
propriamente dita ao longo da década de 1960.
Consolidação da OBM:
Anos 60 e 70
Dickinson (2001) destaca uma série de even-
tos e publicações que ocorreram ao longo dos
anos de 1960 e 1970 que marcaram a consoli-
dação da Análise do Comportamento Aplicada
às Organizações. É nesta época que se des-
tacam a produção de alguns dos principais
autores da OBM até os dias de hoje.
Ao rastrear as obras mais relevantes na for-
mação da OBM, Dickinson (2001) destaca nos
anos 1950 apenas quatro obras: o trabalho de
Ayllon e Michael, duas produções de Skinner
acerca de Máquinas de Ensino (que foram im-
portantes para a Instrução Programada), além
do próprio Ciência e Comportamento humano4.
Já nos anos 1960, pode-se rastrear seis obras
(quatro artigos e dois livros) e 46 artigos e oito
livros entre 1970 e 1977 - quando foi publicado
o primeiro número do Journal of Organizational
Behavior Management (JOBM), até hoje o prin-
cipal veículo de divulgação de trabalhos em
OBM. O aumento de publicações nessa época
é o que levam Dickinson a descrever este pe-
ríodo como o “enraizamento” da Análise do
Comportamento aplicada às Organizações.
Segundo Dickinson (2001), os anos 1960
foram marcados pela consolidação das pes-
quisas em Instrução Programada no campo
organizacional, culminando com a forma-
ção da primeira associação de analistas do
comportamento com interesses aplicados; o
fortalecimento da pesquisa e ensino univer-
sitário da área, em especial em universidades
em Michigan; e o trabalho pioneiro de auto-
res como Feeney e Tom Gilbert. Já nos anos
1970, destacamos o crescimento de publica-
ções que culmina com a fundação do Journal
of Organizational Behavior Management; o
desenvolvimento das técnicas e a divulgação
da OBM por autores como Aubrey Daniels;
e a criação dos grupos de interesse na ABA
que foram a base para a construção da OBM
Network, a comunidade de pesquisadores e
profissionais em Análise do Comportamento
Aplicada às Organizações. Examinaremos
cada um desses tópicos ao longo desta seção.
A Instrução Programada. Como apontado an-
teriormente, uma contribuição importante
para a entrada da Análise do Comportamento
17
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Aécio Borba, Camila Carvalho Ramos e Thiago Dias Costa
no ambiente organizacional foi a pesquisa a
respeito de Instrução Programada. Segundo
Dickinson (2001), essas pesquisas ganharam
grande atenção entre os anos 50 e o início
dos anos 1960.Foi tendo foco na Instrução
Programada que se formou a primeira orga-
nização voltada para o avanço da aplicação da
teoria analítico-comportamental a problemas
diversos, a National Society for Programmed
Instruction (Sociedade Nacional para Instrução
Programada), em 1962. Faziam parte dessa
associação nomes que se tornariam impor-
tantes na Análise do Comportamento apli-
cada às Organizações, como Dale Brethower,
Thomas Gilbert, e Geary Rummler.
Segundo Dickinson (2001), grande parte dos
membros dessa organização tinham como
objetivo o desenvolvimento de programas de
ensino para ambientes educacionais e clínicos
(em especial reabilitação). No entanto, alguns
profissionais começaram a responder a de-
mandas de organizações e indústrias na cria-
ção de programas de treinamento. Brethower
(2000) destaca inclusive que o ambiente or-
ganizacional foi muito mais receptivo aos
programas de treinamento que as instituições
escolares: a melhoria de sistemas de instru-
ção gerava menor custo para as organiza-
ções, uma vez que permitia o treinamento
ser mais curto, e sua eficiência evitava a re-
petição de cursos por parte do aprendiz, bem
como evitava erros posteriores no trabalho. A
construção de programas de treinamento foi,
assim, importante para a inserção do analista
do comportamento no ambiente laboral.
O Ensino Universitário da OBM. Dickinson (2001)
relata que o mesmo caminho de pesquisas em
Instrução Programada que focavam-se na
aprendizagem no ambiente laboral ocorreu na
Universidade de Michigan. Alunos e graduados
na universidade começaram a oferecer semi-
nários e workshops sobre o uso de Instrução
Programada em ambientes organizacio-
nais - em especial, Dale Brethower e Geary
Rummler. Com o posterior apoio de Richard
“Dick” Malott, da Universidade de Western
Michigan, e a liderança de Brethower ainda
na Universidade de Michigan, foi nesse perí-
odo que apareceu o interesse não apenas pelo
desempenho individual construído por planos
de treinamento, mas também pelas relações
estabelecidas entre as várias partes da organi-
zação. A concepção central aqui presente é que
o desempenho individual estava relacionado a
toda uma rede de relações dentro da organiza-
ção. Assim, seria necessário compreender essa
rede para produzir intervenções mais efetivas.
Esse foi o princípio da Análise de Sistemas
Comportamentais (Behavior System Analysis,
ou BSA; cf. Diener, McGee & Miguel, 2009).
Os programas na Universidade de Michigan
e depois na Western Michigan podem ser
apontados como os primeiros programas
de treinamento universitário em Análise do
Comportamento Aplicada às Organizações.
Seu papel foi importante tanto para aumentar
o número de profissionais treinados a atuar
no campo, quanto também de manter a forte
inclinação acadêmica que preocupação com
o rigor científico que são típicas caracterís-
ticas da Análise do Comportamento Aplicada
às Organizações.
Gilbert e Feeney. Ainda nos anos 1960, é im-
portante destacar o trabalho de Thomas
18
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Aécio Borba, Camila Carvalho Ramos e Thiago Dias Costa
5 Gilbert (1978/2009) usa “accomplishments”. Moreira (2005) traduziu o termo como realizações; Milani (1989) como resultados;
usamos aqui produto do comportamento por ser uma discussão na área de OBM se o interesse do analista do comportamento-
deve centrar-se no produto do comportamento ou no comportamento em si - esse tema é por exemplo analisado nas revisões de
literatura feitas a parr de argos do Journal of Organizaonal Behavior Management (JOBM), que discuremos adiante.
6 Para conhecer mais sobre algumas dessas contribuições, ver Ausn (2000), Milani (1989) e Diener et al. (2009), além do próprio
Human Competence (Gilbert, 1978/2007).
Gilbert e Edward Feeney. Gilbert (1927-1995)
era professor no sul dos Estados Unidos,
trabalhando principalmente com estatística.
Ele tinha um forte interesse sobre medidas
padronizadas do comportamento, de forma
que em 1958 aceitou uma bolsa para traba-
lhar com Skinner em Harvard. Na mesma
época, começou a trabalhar junto a Ogden
Lindsley no Metropolitan State Hospital em
Massachusetts, que estudava comportamento
psicótico (Lindsley, 1996).
Após esse período, Gilbert começou seu traba-
lho com o que ele viria a chamar de Tecnologia
do Desempenho Humano (Human Performance
Technology), voltado para o desenvolvimento
e melhoria do repertório no ambiente acadê-
mico e de trabalho. Ao longo dos anos 1960,
Gilbert fundou várias empresas, sendo a mais
reconhecida na época Praxis Corporation, com
Rummler e Irving Goldberg (Dickinson, 2000;
Lindsley, 1996). Reconhecido como um dos
mais importantes nos anos iniciais da OBM,
o livro Human Competence: Engineering Worthy
Performance (Gilbert, 1978/2007) foi descrito
pelo próprio Gilbert como baseado no traba-
lho desta época.
É importante apontar que, a rigor, exis-
tem diferenças entre o trabalho de Gilbert
e formas mais “tradicionais” de Análise do
Comportamento aplicada às Organizações.
Moreira (2005), por exemplo, destaca que
otrabalho de Gilbert enfocaria mais os re-
sultados do comportamento5 que o compor-
tamento em particular. Intervenções com-
portamentais, para o autor, seriam aquelas
enfocando o desenvolvimento do repertório;
estabelecer novas condições ambientais,
nesse sentido, não seria necessariamente
uma intervenção comportamental.
Mesmo com as diferenças conceituais entre
Gilbert e a Análise do Comportamento, sua
obra teve grande impacto na OBM em seus
anos iniciais. Moreira (2005) aponta que o livro
Human Competence foi citado em quase todos os
volumes do JOBM entre 1985 e 2001. Dickinson
(2001) aponta ainda a respeito de Gilbert que
Seus conceitos e termos tem permeado nosso
campo e se tornado ferramentas e terminologia
padrão: engenharia de desempenho, resultados
vs. comportamento, o modelo de engenharia
comportamental, PIPs (potencial para me-
lhoria de desempenho, e o teste de solução de
problemas ACORN, para citar alguns6 (p. 28).
Um outro autor pioneiro da OBM e de impac-
to na configuração que a área tem nos dias
de hoje segundo Dickinson (2001) é Edward
Feeney, um gerente de vendas da empresa
Emery Air Freight. Ele participou de um dos
seminários desenvolvidos na Universidade
19
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Aécio Borba, Camila Carvalho Ramos e Thiago Dias Costa
de Michigan na década de 1960, onde entrou
em contato com Análise do Comportamento
Aplicada. A partir daí, desenvolveu um siste-
ma de instrução programada que produziu um
grande aumento nas vendas da companhia. Os
resultados foram tão grandes que ele se tornou
um dos vice-presidentes da empresa.
Feeney é o primeiro exemplo de um aplicador
da OBM que não estava inserido no ambiente
acadêmico, mas desde o princípio teve empre-
sas privadas como área de atuação. Formou em
1973 uma empresa de consultoria de grande
sucesso, e - como parte de sua estratégia de
marketing - divulgou extensamente os re-
sultados de suas intervenções. Os trabalhos
dele e de seus consultores formaram grande
parte de um dos primeiros manuais de OBM,
chamado Industrial Behavior Modication, de
1982 (cf. Dickinson, 2001). Hoje, o campo é
marcado por autores que, como Feeney, tive-
ram uma formação em diferentes áreas e que
entraram posteriormente em contato com a
Análise do Comportamento. O balanço entre
acadêmicos e profissionais no campo é um
tema de debate constante nas redes e grupos
de discussão sobre a área, e já estava presente
em seus primeiros anos.
Com a consolidação nos anos 1960, a Análise
do Comportamento aplicada às Organizações
floresceu ao longo dos anos 1970. Diversos ar-
tigos começaram a ser publicados não apenas
em periódicos de Psicologia, mas também
nos de Administração de Empresas. Dezenas
de artigos e vários livros relevantes foram
publicados naquela década, que também foi
palco do nascimento de várias importantes
empresas de consultoria em OBM, como a
Aubrey Daniels &Associates (hoje, Aubrey
Daniels International).
Os anos 1970. Foi nos anos 1970 que a OBM
ganhou sua estrutura atual. Esta época é
marcada pelo crescimento de publicações na
área, o surgimento de importantes empre-
sas de consultoria na área, e proliferação de
programas de treinamento em OBM. Aqui,
destacaremos principalmente a fundação do
JOBM e o trabalho de Aubrey Daniels, além
da consolidação da OBM Network como um
grupo de interesse na área.
Aubrey Daniels. Aubrey C. Daniels é um dos
mais importantes autores e profissionais da
área de OBM. Tendo sua origem acadêmica na
psicologia clínica, começou sua intervenção
em ambientes organizacionais ao desenvol-
ver um programa de treinamento para en-
fermeiros aplicarem programas de economia
de fichas com pacientes institucionalizados
ainda na década de 1960. (Daniels, 2000;
Dickinson, 2001). Ao longo dos anos seguin-
tes, seu trabalho voltou-se para programas
de treinamento com jovens para o desenvol-
vimento de habilidades acadêmicas, o que o
pôs em contato com a Instrução Programada.
Este trabalho levou Daniels a trabalhar com
Fran Tarkenton, que buscava por sua vez a
inserir no mercado de trabalho pessoas cro-
nicamente desempregadas. Esse programa
conduziu Daniels a investir no desenvolvi-
mento de habilidades laborais, consolidando
sua entrada no mundo organizacional.
Ao longo da década de 1970, Daniels e
Tarkenton fundaram a Behavioral Systems,
Inc (BSI), que trabalhou com um grande
20
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Aécio Borba, Camila Carvalho Ramos e Thiago Dias Costa
número de empresas e, segundo Dickinson
(2000), chegou a empregar mais de 50 con-
sultores. Temas como absenteísmo, rotativi-
dade e habilidades naturais foram temas im-
portantes abordados (e solucionados) pelas
atividades da BSI. Daniels fundou em 1978
a Aubrey Daniels & Associates (hoje Aubrey
Daniels International).
O autor é até os dias de hoje um dos mais
importantes e produtivos pesquisadores em
OBM; a Aubrey Daniels International é uma
das maiores empresas de consultoria especia-
lizada em OBM. Seu impacto na área deve-se
à liderança em dois aspectos: por um lado, o
desenvolvimento das intervenções analíti-
co-comportamentais e a preocupação com a
consistência com princípios analítico-com-
portamentais; e por outro, a divulgação da
área no campo empresarial. O livro de Daniels
Performance Management: Changing behavior
that drives Organizational Performance (Daniels
& Bailey, 2016) é um dos mais vendidos da
área, tendo sido escritos inicialmente para
gestores organizacionais – mas hoje as-
sumindo um importante papel também no
ensino de OBM como livro texto em progra-
mas de treinamento na área (Careli, 2013).
O Journal of Organizational Behavior
Management. Em 1977 foi fundado o Journal
of Organizational Behavior Management, pela
primeira empresa de Aubrey Daniels (BSI),
tendo ele sido o primeiro editor do periódico.
A publicação do JOBM tem a importância de,
além de consagrar a nomenclatura da área,
estabelecer um conjunto de exigências para
os trabalhos em OBM: a importância de man-
ter-se fiel aos princípios teóricos da Análise
do Comportamento, mas também contribuir
para o desenvolvimento econômico das orga-
nizações em que ela era aplicada. Esses prin-
cípios fazem parte de seu interesse editorial
até os dias atuais.
A publicação do JOBM foi essencial pelo cres-
cimento das publicações na área, como des-
tacado por Dickinson (2001). Daniels serviu
como editor nos primeiros números, e foi
substituído por Brandon Hall, que guiou a
revista nos quatro anos seguintes. Thomas
Mawhinney ocupou a cadeira a partir de 1985
até o ano 2007 (entre 2000 e 2007 atuan-
do juntamente com John Austin).. Dickinson
(2001) destaca a importância de Hall na
manutenção do JOBM por anos turbulen-
tos (1978 a 1984), e a política editorial de
Mawhinney como responsável pela maturi-
dade da área enquanto campo de pesquisa.
Ele tentou manter um balanço entre artigos
aplicados e artigos acadêmicos, buscando um
rigor metodológico e conceitual na área, um
compromisso mantido pela atual editora do
jornal, Ramona Houmanfar, que está desde
2013 ocupando esse cargo, e Timothy Ludwig,
entre 2009 e 2013.
A OBM Network. Um último desenvolvimento
importante a ser destacado na consolida-
ção da OBM é a formação da OBM Network.
Ela é um grupo de interesse em Análise do
Comportamento com o objetivo de “desen-
volver, melhorar, e apoiar o crescimento e
vitalidade da Análise do Comportamento
Aplicada às Organizações pela pesquisa,
educação, prática e colaboração” (Missão da
OBM Network). Embora formalmente ela se
estabeleça na década de 1980, listamos aqui
21
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Aécio Borba, Camila Carvalho Ramos e Thiago Dias Costa
sua origem tanto pela sua importância na
consolidação da área ao agregar profissionais,
pesquisadores e estudantes da disciplina,
quanto por suas bases terem sido lançadas
no fim dos anos 1970.
Dickinson (2001) destaca que trabalhos em
OBM estavam presentes desde as primei-
ras convenções da Midwestern Association for
Behavior Analysis (MABA) em 1975. A MABA
viria a se tornar a Association for Behavior
Analysis (ABA) em 1979. Entre 1979 e 1982,
várias apresentações foram feitas com foco
na Análise do Comportamento aplicada a am-
bientes organizacionais. Em 1982, apareceu
pela primeira vez listada como um grupo de
interesse especial (SIG-Special Interest Group)
na ABA. Trabalhos que têm como objeto o
comportamento no ambiente de trabalho
estão consistentemente presentes na pro-
gramação da ABA desde então.
Todos esses eventos levaram à construção da
OBM como uma área reconhecida de apli-
cação da Análise do Comportamento, bem
como estabeleceram uma comunidade verbal
interessada na discussão e solução de proble-
mas organizacionais. Partindo de uma origem
preocupada com a aprendizagem de compor-
tamentos para o ambiente laboral a partir da
Instrução Programada, a OBM desenvolveu
uma série de características, técnicas, lingua-
gem particulares, constituindo uma identida-
de própria. Esse desenvolvimento continuou
ao longo das décadas seguintes, que aborda-
remos no próximo tópico.
Dos Anos 1980 ao Século XXI:
Desenvolvimento e expansão
da OBM
Durante as duas décadas seguintes, a OBM
cresceu em número de praticantes, variedade
de trabalhos e impacto. Apesar de trabalhos
de pesquisadores da área terem sido publica-
dos em diferentes periódicos - Johnson et al.
(2008) citam por exemplo o Journal of Applied
Behavior Analysis, Journal of Applied Psychology
e Organizational Behavior and Human Decision
Processes, entre outros - o JOBM ainda hoje é
um dos mais importantes veículos de divul-
gação da pesquisa em OBM, e uma revisão das
publicações dele demonstra o crescimento de
temas e métodos da área, bem como algumas
tendências em seu desenvolvimento..
Três trabalhos fizeram uma revisão sobre 30
anos de publicação do JOBM, em uma busca
de caracterizar a área (Balcazar, Shupert,
Daniels, Mawhinney & Hopkins, 1989; Nolan,
Jarema& Austin, 1999; VanStelle, Vicars, Harr,
Miguel, Koerber, Kazbour & Austin, 2009).
Nesses trabalhos, foi investigada a publica-
ção no JOBM, incluindo desde o número de
páginas (indicativo do volume de produção),
aos métodos mais comuns, sujeitos dos es-
tudos, tipo de organização estudada, nível da
intervenção, tipo e tema dos problemas de
pesquisa, e assim por diante. Todas as infor-
mações apresentadas ao longo das próximas
páginas têm origem nesses três artigos. Aqui,
nos ateremos a avaliar questões que reflitam
22
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Aécio Borba, Camila Carvalho Ramos e Thiago Dias Costa
recentes, os temas de produtividade/qualida-
de, segurança/saúde e satisfação do cliente/
consumidor foram os mais importantes pro-
blemas organizacionais investigados em OBM
(VanStelle et al., 2009).
Outro aspecto sobre o aumento da diversidade
na área é o tipo de artigo publicado. Na pri-
meira década de publicação, a maior parte dos
estudos envolviam intervenções diretas no
ambiente de trabalho (Balcazar et al., 1989).
Posteriormente, publicações apresentaram
também trabalhos experimentais, buscando
a discussão de processos básicos envolvidos
em problemas comportamentais no ambiente
organizacional - em especial no período de
1987 a 1997 (Nolanet al, 1999); e trabalhos de
discussão e teóricos, em especial no período
de 1998 a 2009.. Essas variações são interes-
santes na medida que demonstram um inte-
resse - já várias vezes debatidos por autores
da área - de reforçar a ligação da OBM com
suas raízes na Análise do Comportamento e
Análise Experimental do Comportamento,
bem como debater e rever seus conceitos (cf.
Mawhinney, 1984; Pooling, et al., 2000).
Algumas características típicas das interven-
ções analítico-comportamentais são apre-
sentadas nas três revisões, para a produção
de 1977 a 2009 do JOBM: a preferência pelo
que os autores chamaram de manipulações
de variáveis motivacionais, definidas nas três
revisões como as consequências do com-
portamento, incluindo “feedback, elogios,
recompensas monetárias, recompensas não
monetárias, punição” (VanStelle et al, 2009,
p. 98). Entre as variáveis independentes mais
estudadas, a manipulação do feedback sobre
o desenvolvimento da área de forma a carac-
terizar a história recente da OBM; para outras
análises da produção da área, recomendamos
(além dos próprios artigos acima citados) os
trabalhos de avaliação e revisão publicados
por Moreira (2005) e Careli (2013). O trabalho
de Moreira investiga a presença de caracte-
rísticas relevantes que permitem apontar os
artigos em OBM como atendendo aos critérios
estabelecidos por Baer, Wof e Ridley (1968)
para que uma pesquisa seja qualificada como
Análise Aplicada do Comportamento; já o tra-
balho de Careli (2003) discute a efetividade
das intervenções descritas no JOBM.
Uma das primeiras questões a serem aponta-
das sobre a produção da OBM é que ela vem
aumentando e se diversificando. Apesar de
uma pequena queda no número de artigos
publicados na sua segunda década avaliada
- atribuída por Nolan et al. (1999) a um au-
mento de publicações em outros periódicos
-, VanStelle et al. (2009) demonstraram um
aumento no número tanto de páginas quanto
em número de volumes publicados ao longo
da última década de publicação.
Em termos de aumento da diversidade, alguns
dados podem ser apontados. Se os temas mais
abordados na primeira décadas envolveram
a melhoria da produtividade e/ou qualida-
de no trabalho, as duas revisões posteriores
demonstraram um aumento na variabilida-
de dos tipos de trabalhos realizados: temas
como segurança comportamental e saúde no
ambiente de trabalho, treinamento, volume
de vendas, satisfação do cliente, entre outros
ganham mais espaço e número de artigos em
relação ao tema produtividade. Em anos mais
23
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Aécio Borba, Camila Carvalho Ramos e Thiago Dias Costa
7 Aqui destacamos o uso de delineamentos do sujeito como seu próprio controle e a manipulação de consequências como variáveis
independentes por serem picas na Análise do Comportamento, e interpretamos que a pesquisa em OBM apresenta a prevalência
por ser um braço da Análise do Comportamento Aplicada. No entanto, essas caracteríscas de certo não são sucientes para a
denição do estudo como analíco-comportamental, e crícas a pernência dessas pesquisas podem ser feitas. Uma discussão
sobre o quanto a OBM segue caracteríscas da Análise do Comportamento Aplicada pode ser vista em Moreira (2005) e em Culig,
Dickinson, McGee& Ausn (2005).
(Malott, 2003) e Understanding Complexity
in Organizations: Behavioral Systems (Ludwig
&Houmanfar, 2010).
A OBM nos dias de hoje:
Século XXI
Desde sua origem nos anos 60, a Análise do
Comportamento Aplicada às Organizações
vem produzindo discussões, metodologias
de intervenção e solução de problemas or-
ganizacionais. O caminho histórico que ela
seguiu ao longo dessas décadas, seus temas
e delineamentos preferidos, diferenciação em
diferentes áreas e crescimento de produção
revelam um conjunto de contingências entre-
laçadas que foram selecionadas por um am-
biente acadêmico e profissional que absorve
os produtos do comportamento de seus prati-
cantes.O site da OBM Network ( ) divide fun-
damentalmente a OBM em três áreas de pro-
dução principais: a Gestão do Desempenho,
Análise de Sistemas Comportamentais e
Segurança Comportamental (cf. Aureliano et
al., 2013; Dieder et al, 2009).
Gestão do Desempenho (Performance
Management) é um termo em alguns mo-
mentos usado como sinônimo da Análise do
Comportamento Aplicada às Organizações
(e.g., Poling et al. 2000). Quando aplicado
o comportamento, efeitos de treino, estabe-
lecimento de metas e outras aparecem como
as principais.
Outra característica típica da Análise do
Comportamento é a preferência por estudos
inter-grupais (o que seria o equivalente na
área a metodologias de sujeito único), bem
mais frequentes ao longo de toda a produção,
utilizando-se de diversos tipos de delinea-
mentos: com linha de base múltipla, rever-
sões em delineamentos ABA ou ABC, sondas
múltiplas etc. Ainda assim, delineamentos
entre-grupos estão presentes, utilizando
técnicas de análise estatística como ANOVA
e delineamentos teste/pós-teste7.
Por fim, é interessante perceber também
que VanStelle et al (2009) destacam que,
ainda que a maioria dos trabalhos em OBM
se foquem no comportamento individu-
al, vários trabalhos ao longo do período de
1998 a 2009 no JOBM têm se dedicado a
intervenções que envolvem sistemas mais
amplos. De 77 artigos empíricos analisados,
24 (aproximadamente 30%) envolveram uma
análise no nível de processo, organização ou
mesmo da comunidade em que a organiza-
ção estava inserida. É um aspecto crescente a
preocupação com sistemas comportamentais,
ressaltado por trabalhos como os publica-
dos no livro Paradox of Organizational Change
24
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Aécio Borba, Camila Carvalho Ramos e Thiago Dias Costa
BSA é a análise de como todas as partes do
sistema organizacional interagem entre si: o
ambiente organizacional, as partes interes-
sadas no processo (Stakeholders), e os vários
níveis que compõem a organização. Segundo
os autores, BSA envolveria intervenções não
apenas sobre o comportamento individual,
mas o desenho de sistemas, programas de
incentivo, entre outras técnicas importantes.
Por fim, um conjunto relevante de produ-
ções da Análise do Comportamento Aplicada
às Organizações parte de conceitos e meto-
dologias desenvolvidas tanto na Gestão do
Desempenho quanto na Análise de Sistemas
Comportamentais e foca em um tipo parti-
cular de comportamento no ambiente de tra-
balho: o comportamento relativo a segurança
e a prevenção de acidentes. Essa área é re-
conhecida como Segurança Comportamental
(Behavior-Based Safety, ou BBS). A Segurança
Comportamental é a aplicação de princípios
da Análise do Comportamento com o objetivo
de aumentar a frequência de comportamen-
tos seguros e reduzir a de atos inseguros,
dessa forma contribuindo para a prevenção
de acidentes (cf. Alavosius, Adams, Ahern &
Follick, 2000; Alvero, Rost & Austin, 2008;
Bley, 2014; Geller, 2001a, 2001b; Sulzer-
Azaroff, 1980). Para isso, uma variedade de
técnicas comuns à Gestão de Desempenho e
à Análise de Sistemas Comportamentais são
utilizadas: análises de antecedentes e con-
sequentes, reforçamento diferencial, análise
em múltiplos níveis, e assim por diante.
É importante perceber que essa divisão entre
Gestão do Desempenho, BSA e BBS não deve
ser visto como “tipos” ou “espécies” distintas:
a apenas uma parte da OBM (o que é feito
principalmente diferenciando-a de análises
em nível organizacionais, como apontaremos
adiante), refere-se ao conjunto de proce-
dimentos enfocando processos comporta-
mentais no nível do trabalhador, buscando a
manipulação do ambiente para melhoria do
trabalho. Isso incluiria aumentar comporta-
mentos produtivos, diminuir comportamen-
tos improdutivos, a melhoria da qualidade
do trabalho, e a produção de contingências
de reforçamento que busquem um trabalho
mais reforçador para o indivíduo. Alguns dos
temas mais comuns da área são a análise dos
efeitos do feedback e metas sobre o compor-
tamento, bem como de outros antecedentes
e consequentes do comportamento, qualida-
de do trabalho, esquemas de reforçamento,
entre outras (cf. Aureliano et al., 2013; Austin,
2000; Daniels & Bailey, 2014; Dieder et al.,
2009; Johnson et al., 2009; Pooling et al.,
2000). Tais temas são os mais frequentes
nos textos publicados na área (cf. Balcazar
et al., 1989; Nolan et al., 1999; VanStelle et
al., 2009).
A OBM não foca apenas suas intervenções
no nível do trabalhador. O campo tem de-
senvolvido também desde seu início o inte-
resse em estudar níveis mais complexos da
organização, incluindo aquele que engloba
múltiplas áreas (o nível de processo) e a
organização como um todo (o nível organi-
zacional). Esse é o campo de estudo e inter-
venção da área da OBM chamada de Análise
de Sistemas Comportamentais (Behavioral
System Analysis, ou BSA; cf. Aureliano et
al., 2013; Dieder et al, 2009; Malott, 2003).
Segundo Dieder et al. (2009), o objetivo da
25
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Aécio Borba, Camila Carvalho Ramos e Thiago Dias Costa
Aplicada às Organizações no Brasil. Ainda que
o modelo estritamente ligado ao modelo de-
senvolvido pelos autores norte-americanos
tenha começado a ser citado e influenciar a
prática de analistas do comportamento bra-
sileiros apenas entre o fim dos anos 1980 e
início dos anos 90, é possível rastrear in-
tervenções analítico comportamentais no
ambiente organizacional desde antes. Em
especial, trabalho de pesquisadores como
Sílvio Paulo Botomé são fundamentais na
disseminação da Análise do Comportamento
para lidar com problemas organizacionais,
além da formação de analistas do compor-
tamento interessados por essa área. Uma re-
visão histórica da construção da Análise do
Comportamento Aplicada às Organizações no
Brasil é fundamental pelos mesmos motivos
apresentadas neste trabalho, e deve ser objeto
de próximos trabalhos.
todas têm a mesma base teórica, ainda que
possam dialogar com outras ciências (a BSA,
por exemplo, tem grande influência da teoria
de sistemas). Eventualmente, o profissional
da Análise do Comportamento Aplicada que
lida com organizações pode beneficiar-se da
leitura de todas as três áreas, de acordo com os
problemas aos quais enfrenta em seu dia a dia.
O presente trabalho revisou o percurso histó-
rico da Análise do Comportamento Aplicada
às Organizações com o objetivo de apresentar
ao leitor dados que o ajudem a compreender
suas características atuais. Conhecer o pas-
sado é essencial aqui para refletirmos sobre
o presente e ter dados para programar con-
tingências que levem aonde queremos chegar.
Não abordamos nesse trabalho a evolução
específica da Análise do Comportamento
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COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5
28
Hélder Lima Gusso e Gabriel Gomes de Luca
Hélder Lima Gusso
Universidade Federal de Santa Catarina
heldergusso@gmail.com
Gabriel Gomes de Luca
Universidade Federal do Paraná
gabrielgomesdeluca@gmail.com
Organizações como Sistemas
Comportamentais: Considerações para
a Delimitação do Campo de Atuação
Organizaons as Behavioral Systems:
Consideraons for a Delimitaon of the
Professional Field
Resumo
Desde a década de 1970 há intervenções profissionais
e produção de conhecimento no Brasil em Análise do
Comportamento no campo de atuação organizacional.
Na última década o interesse pelo campo tem cres-
cido. Definir o que são organizações é uma condição
importante para orientar os trabalhos a serem de-
senvolvidos por analistas do comportamento e para
possibilitar designar com mais clareza intervenções
analítico-comportamentais nesse campo de atua-
ção. Organização é definida como sistema de interações
comportamentais orientado para a produção recorrente
de resultados signicativos para e na sociedade na qual
ela se insere. Nessa definição, as interações entre os
comportamentos das pessoas constituem o aspecto
nuclear que define uma organização, indica que as
organizações são constituídas por objetivos orientados
por necessidades da sociedade e que seus resultados
são recorrentes (contínuos) ao longo do tempo. Tal
definição, além de possibilitar distinção entre organi-
zações e instituições enfatiza a noção de organizações
como sistemas abertos que devem produzir resultados
socialmente relevantes, bem como a centralidade do
conceito de comportamento como elemento nuclear
constituinte da definição de organizações.
Abstract
Since the 1970 decade there are professional
interventions and knowledge production in Brazil on
Organizational Behavior Management. At the last ten
years, the interests about the field has growing up.
Define organizations is a important requisite to guide
the work of the behavior analists and to orientated
more clearly analytical-behavioral interventions in
the organizational field. Organizations are defined
as a behavioral interlocking system guided to produce
recurrent meaningful result to and at society in which
they belong. In this definition, the interactions
between people’s behaviors constitute the nuclear
aspect that defines an organization, emphasizes that
organizations are constituted by objectives oriented
by the society needs, that their results are recurrent
(continuous) over time, in addition to allowing
distinction between organizations and institutions.
This definition enphasies organizations as a open
system that should produce socially relevant results,
and the core role of the behavior as a nuclear
component of the definition.
PALAVRAS-CHAVE
Conceito de organização; Campo de atuação organizacio-
nal; Análise do Comportamento nas Organizações.
KEYWORDS
Organizaon concept; Organizaonal eld; Organizaonal
Behavior Management.
29
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso e Gabriel Gomes de Luca
Em pesquisa desenvolvida em 2012 a respei-
to das características da atuação profissional
de psicólogos organizacionais na região de
Curitiba/PR, Gusso et al. (2012) questiona-
ram os participantes acerca do sistema te-
órico utilizado por eles para orientar suas
intervenções profissionais. À primeira vista,
os resultados eram animadores para a co-
munidade de analistas do comportamento:
16% dos psicólogos indicaram a Análise do
Comportamento como orientação teórica
básica para suas intervenções. Esse resultado
chegava a 43% se considerado também os
que se nomearam “cognitivos-comporta-
mentais”. Mas a animação tinha vida curta.
Quando questionados sobre os principais
autores que usam como referências ao tra-
balho que realizam, apenas 4% citaram ao
menos um autor relacionado à Análise do
Comportamento. Em outras palavras, embora
16% dos profissionais indicassem identifi-
cação com a Análise do Comportamento,
poucos parecem fundamentar suas ativida-
des profissionais em contribuições específi-
cas desse tipo de conhecimento. Isso indica
a necessidade de avaliar o que faz uma atu-
ação em organizações poder ser denominada
“analítico-comportamental”. Uma das
possibilidades para responder, mesmo que
brevemente, a essa questão, envolve caracte-
rizar conceitos básicos a orientar as atuações
de analistas do comportamento. Um desses
conceitos é o que define uma “organização”.
Caracterizar organizações como um sistema
de interações comportamentais orientado para a
produção recorrente de resultados signicativos
para e na sociedade na qual ela se insere possibi-
lita identificar com clareza o tipo de fenôme-
no com o qual analistas do comportamento
lidam em organizações, orientando as ca-
racterísticas das intervenções a serem por
eles realizadas e maximizando a eficácia e a
relevância social delas.
O exame do “arcabouço conceitual” a orien-
tar as intervenções profissionais analítico-
comportamentais parece importante, não
apenas pelo fato de psicólogos autointitu-
larem-se “comportamentais”, sem estarem
sob controle dos pressupostos e fundamentos
da Análise do Comportamento (Gusso et al.,
2012), mas também porque além do psicólogo,
profissionais com outras formações também
podem se apresentar como (se auto-intitula-
rem como) analistas do comportamento sem
terem clareza do que constitui uma interven-
ção analítico-comportamental. Divergências
como essas indicam a necessidade de uma
avaliação das características que delimitam
uma intervenção como analítico-comporta-
mental. Uma delas consiste na delimitação
do próprio objeto de intervenção: no caso, o
comportamento, entendido como “interação
entre as ações apresentadas pelas pessoas
e aspectos antecedentes e consequentes a
essas ações” (Botomé, 2001; 2013). A noção
de comportamento evidencia que uma inter-
venção analítico-comportamental envolve
lidar tanto com as ações (motoras, vocais,
gestuais, pensamentos) das pessoas, quanto
com as variáveis ambientais (antecedentes e
consequentes) que afetam essas ações e, em
especial, as contingências de reforçamento
que envolvem a ocorrência desses compor-
tamentos. Esse pressuposto é orientado por
uma concepção que envolve intervir sobre
o comportamento das pessoas por meio de
explicações constituídas por determinismo
30
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso e Gabriel Gomes de Luca
probabilístico (Rebelatto e Botomé, 1999) e
não, obviamente, por explicações “mentalis-
tas”, na qual causas imateriais, insubstan-
ciais ou subjacentes ao comportamento das
pessoas são consideradas como explicações
para os comportamentos apresentados por
elas (e.g. Carrara, 2016; Ulmann e Krasner,
1965). Características como essas são, por-
tanto, fundamentais para delimitar a atuação
de um analista do comportamento em suas
intervenções em qualquer contexto, incluin-
do os contextos organizacionais.
Análise do Comportamento em
Organizações: de onde viemos?
E como estamos agora?
Um dos marcos importantes na inserção dos
analistas do comportamento em contexto or-
ganizacional foi a criação da revista Journal of
Organizational Behavior Management (JOBM)
em 1977, que passou a disseminar relatos
de intervenções utilizando os princípios e
procedimentos característicos da Análise
do Comportamento (Moreira, 2005). Mas,
antes disso, já haviam relatos de trabalhos
em diferentes contextos nos Estados Unidos,
tais como intervenção utilizando sistemas de
economia de fichas em hospitais psiquiátricos
e posteriormente em outros tipos de organi-
zação para diminuir rotatividade, conduzi-
dos por Aubrey Daniels, na década de 1960
(Dickinson, 2001). Ainda antes, Fred Keller
utilizou princípios da modelagem de respos-
tas para ensinar operadores de código morse,
em uma intervenção típica da área de trei-
namento, sendo o primeiro artigo publicado
pela revista Journal of Experimental Analysis of
Behavior (Keller, 1958). Há registros de outras
aplicações no campo de treinamento em or-
ganizações com uso da tecnologia disponível
na época: a instrução programada (descrito
em 1998, por Nale). Mas, embora haja relatos
de contribuições anteriores, a criação do JOBM
e o trabalho do grupo especial de interesse
em OBM da Association for Behavior Analysis,
possivelmente podem ser destacados como
duas das principais influências para a conso-
lidação do campo organizacional como escopo
do trabalho em Análise do comportamento.
A história de desenvolvimento da OBM no
Brasil parece ter ocorrido em paralelo ao de-
senvolvimento nos EUA. O trabalho desenvol-
vido na década de 1970 por Sílvio Paulo Botomé
na reestruturação dos serviços prestados pela
Secretaria de Saúde do município de São Paulo
talvez seja a primeira intervenção utilizando
os conceitos, princípios e procedimentos da
Análise do Comportamento em organizações
amplamente divulgada no país. O relato dessa
intervenção foi publicado em sua dissertação
de mestrado (Botomé, 1981a) e em um artigo
no qual o autor examina os riscos de o psicó-
logo atender simplesmente as demandas dos
solicitantes (geralmente quem tem poder na
organização), sem partir de um exame preciso
das necessidades das pessoas que sofrerão as
decorrências da intervenção (Botomé, 1981b).
Outro profissional mencionado nos relatos dos
pioneiros da Análise do Comportamento no país
que iniciou o uso da Análise do Comportamento
em contextos organizacionais foi Antônio
Camilo, que realizou diversas atividades re-
lacionados ao campo de recursos humanos
na Eletropaulo em São Paulo. Os trabalhos
31
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso e Gabriel Gomes de Luca
8 Alguns exemplos são: em 2012, o mini-curso Gestão do comportamento em organizações, oferecido por Marcelo José Machado Silva;
em 2013, o mini-curso Gestão do comportamento organizacional por meio de competências: do conceito à aplicação, oferecido por Aécio
de Borba Vasconcelos Neto; em 2014, os mini-cursos Análise Do Comportamento Aplicada às Organizações: Fundamentos de Behavioral
Systems Analysis, oferecido por Candido Pessôa, Lívia Aureliano e Gabriel Careli, e Uma introdução à Análise do Comportamento aplicada
às organizações de Trabalho, oferecido por Aécio de Borba Vasconcelos Neto, Thiago Dias Costa e Camila Carvalho Ramos; em 2015,
o mini-curso Análise do Comportamento nas Organizações: Intervenção e Pesquisas no Brasil, oferecido por Helder Lima Gusso e Gabriel
Gomes de Luca; em 2016, o mini-cursos Análise do Comportamento nas Organizações: O que é e como fazer análise de cargo, recruta-
mento, seleção e avaliação de desempenho?, oferecido por Helder Lima Gusso e Gabriel Gomes de Luca, a mesa-redonda Análise
do Comportamento Aplicada à Segurança do Trabalho: Behavior Based Safety – BBS, apresentada por Elen Gongora Moreira, Marcelo
José Machado Silva e Carlos Alberto de Magalhães Massera; o simpósio Contribuições da Análise do Comportamento para a Seleção de
Pessoal, apresentado por Elen Gongora Moreira, Marcelo Henrique Oliveira Henklain e Helder Lima Gusso.
desenvolvidos por Antônio Camilo e Sílvio
Paulo Botomé podem ser considerados como
o marco brasileiro de início das primeiras ex-
periências aplicadas do trabalho em Análise do
Comportamento em contextos organizacionais.
Além disso, a história de intervenção em
contextos organizacionais no Brasil também
ocorreu em diversas experiências em contex-
tos orientados para a educação profissional. As
contribuições decorrentes dos trabalhos com
Ensino Programado (Keller, 1972), renome-
ados no Brasil a partir das contribuições de
Carolina Bori, como “Programação de Ensino”
(Kubo & Botomé, 2001) e, mais recentemente,
como “Programação de Contingências para
Desenvolver Comportamentos” (Kienen,
Kubo, & Botomé, 2013), estiveram presentes
em experiências como no CENAFOR (Centro
Nacional de Formação Profissional), em curso
de especialização em Programação de Ensino
desenvolvido na Universidade de São Carlos,
além de outras dezenas de contextos nos quais
ex-orientandos da professora Carolina Bori
se inseriram profissionalmente (Nale, 1998).
Embora alguns desses trabalhos muitas vezes
não sejam localizados como no campo “orga-
nizacional”, são típicas intervenções educa-
cionais orientadas para objetivos organizacio-
nais ou para comportamentos profissionais.
Um capítulo já mais recente na história de
formação de analistas do comportamento
qualificados para atuar no campo organiza-
cional foi a criação da primeira linha de pes-
quisa em um programa de Pós-graduação no
Brasil específica em Análise do Comportamento
em Organizações, Trabalho e Aprendizagem
na Universidade Federal de Santa Catarina.
A linha de pesquisa recebeu oficialmente a
primeira turma de pós-graduandos (mes-
trado e doutorado) em 2006 e encerrou suas
atividades em 2013 com a aposentadoria dos
professores que a conduziam (José Gonçalves
Medeiros, Olga Mitsue Kubo e Sílvio Paulo
Botomé). Ao longo de sete anos de ativida-
des, foram formados 27 mestres e 17 doutores
que, atualmente, atuam em diferentes tipos
de organizações, especialmente nos Estados
da região sul do Brasil.
Há alguns anos, algumas evidências sugerem
um aumento do interesse de analistas do com-
portamento em relação ao campo de atuação
em Psicologia Organizacional e do Trabalho.
Nos encontros anuais da Associação Brasileira
de Psicologia e Medicina Comportamental
(ABPMC), tem sido frequente a realização
de apresentações e minicursos em Análise
do Comportamento em Organizações8 e tem
aumentado a quantidade de estudos nesse
32
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso e Gabriel Gomes de Luca
campo de atuação. Nesses mesmos eventos,
desde 20109, têm ocorrido os encontros do
Grupo de Interesse Especial (GIE) em OBM,
com objetivo de avaliar o desenvolvimento
desse campo de atuação e propor encaminha-
mentos para desenvolvimento e consolidação
desse campo de atuação. Com base em um dos
encaminhamentos desse grupo de interes-
se, foi elaborada a Biblioteca em OBM10, que
reúne textos de Análise do Comportamento
em Organizações produzidos fundamen-
talmente por analistas do comportamento
brasileiros. O acesso ao site e o aumento de
publicações também são animadores: em
2013, ano de criação da biblioteca, houve 182
acessos; em 2014, 921 acessos; em 2015, 2769
acessos; e em 2016, 3.825 acessos a partir
de diversos países, como Brasil, Estados
Unidos, Moçambique, Portugal, Colômbia,
Rússia, Canadá, Holanda e Angola. Também
com base em encaminhamento do GIE em
OBM da ABPMC, foi realizado em 2015 o
I Encontro de Análise do Comportamento nas
Organizações, que reuniu 144 pessoas. Em
2015, foi publicado o livro Análise de Cargo,
Recrutamento & Seleção: Manual prático para
aumentar a ecácia na contratação de pros-
sionais (Gusso, 2015), obra orientada pelos
princípios da Análise do Comportamento.
Tudo isso parece sugerir aumento do interes-
se em Psicologia Organizacional e Trabalho
pelos estudantes e profissionais de Análise do
Comportamento, o que indica a necessidade
de avaliação do que constitui esse subcampo
de atuação profissional.
Organizações: um conceito
orientador para intervenções
de analistas do comportamento
no campo da Psicologia
Organizacional e do trabalho
Definir um fenômeno, como o conceito de
“organização”, consiste no processo de cons-
trução de uma expressão verbal que indique
as variáveis nucleares do evento ou fenômeno
(Wilson, 2005; Copi, 1981). Dentre as funções
de uma definição, há o aumento da proba-
bilidade de efetiva comunicação entre duas
ou mais pessoas, uma vez que a definição
especifica as variáveis sob controle das quais
as pessoas devem ficar ao utilizarem uma
dada expressão. Além disso, uma definição
clara a respeito de um fenômeno orienta as
ações das pessoas em relação ao fenômeno
definido (Wilson, 2005) e diminui “falsas
disputas verbais”, quando pessoas ou grupos
de pessoas discordam acerca de algo devido
à falta de clareza das palavras e expressões
utilizados, e não a discordâncias “reais”
a respeito do fenômeno em exame (Copi,
1981). Definições claras diminuem ambi-
guidades, uma vez que facilitam às pesso-
as decidirem por uma dentre duas ou mais
possibilidades de uso de uma expressão, e
possibilitam delimitar o fenômeno definido,
uma vez que possibilitam decidir sobre os
casos limítrofes e avaliar se esses casos cons-
tituem ou não o fenômeno.
9 Com exceção do encontro realizado em 2014, no qual não houve a possibilidade de promoção de Grupos de Interesse Especial.
10 hps://obmbrasil.wordpress.com/biblioteca-em-obm/
33
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso e Gabriel Gomes de Luca
Uma proposta de definição de organização
que parece promissora parece ser a de orga-
nização como sistema de interações comporta-
mentais orientado para a produção recorrente
de resultados signicativos para e na sociedade
na qual ela se insere (derivada de De Luca,
Botomé, & Botomé, 2013; Kienen & Wolff,
2002; Jones, 1994; Botomé, 1981a). Essa de-
finição parece descrever as variáveis nucle-
ares do fenômeno, sem ser excessivamente
ampla ou estreita, evitando ambiguidades e
definindo o fenômeno por aquilo que ele é. O
exame das propriedades definidoras do con-
ceito está organizado a partir de quatro cri-
térios centrais na delimitação do fenômeno,
apresentados a seguir, identificados a partir
do conhecimento atualmente disponível na
literatura e das definições mais recorrentes
nas publicações da área. Neste exame, utiliza-
mos, em especial, as definições apresentadas
na sistematização da literatura realizada por
Bastos, Loiola, Queiroz e Silva (2014).
1o Critério: Ênfase nas estrutu-
ras ou nas interações entre os
comportamentos das pessoas?
O primeiro aspecto a ser examinado em re-
lação ao conceito de organização consiste em
uma avaliação da natureza desse fenômeno.
Um equívoco comum no senso-comum, já
criticado por autores como Zanelli e Silva
(2008) e Kienen e Wolff (2002), consiste em
definir organizações a partir de suas dimen-
sões estruturais, tais como infra-estrutura,
recursos físicos, sede etc. Tais dimensões,
obviamente, são de grande importância na
constituição de qualquer tipo de organiza-
ção. Entretanto, aspectos estruturais podem
variar e ser integrados em diferentes arranjos
que parecem pouco orientar na delimitação
do que constitui uma organização, possibili-
tando concluir que essas não são propriedades
definidoras do fenômeno. Em outras palavras,
não adianta recursos e infraestrutura se as
pessoas não apresentarem comportamentos
orientados para a produção do que é impor-
tante na organização. Em literatura da área,
é frequente que as organizações sejam consi-
deradas instâncias sociais, ou seja, constituí-
das por pessoas em interação (e.g. “agregado
de seres humanos”, March & Simon, 1967;
“conjunto de pessoas”, Smircich & Stubbart,
1985; “sistema social”, Daft, 2006; “unidade
social”, Etzioni, 1989; Robbins, 2010). Mas,
mais do que isso, uma organização parece
poder ser definida não apenas pelas pessoas
que a constituem, mas pelos comportamen-
tos a serem apresentados por essas pessoas e,
principalmente, pelas interações comporta-
mentais a serem estabelecidas entre elas. Essa
concepção (em oposição à simplista noção
de organizações como estrutura e mesmo à
noção de que as organizações são constitu-
ídas por pessoas em interação) enfatiza que
o aspecto mais importante e mesmo o que
define as organizações são as interações que
as pessoas estabelecem entre si e as contin-
gências que operam sobre essas interações.
Essa noção possibilita caracterizar que uma
organização consiste em um sistema com-
portamental, uma vez que o que uma “or-
ganização” faz e, principalmente, produz na
sociedade na qual ela se insere, é constituído
por aquilo que as pessoas que a constituem
34
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso e Gabriel Gomes de Luca
fazem e, principalmente, pelas interações
entre os comportamentos estabelecidos por
elas. Essa concepção possibilita entender uma
organização, analogamente, como um com-
portamento, uma vez que as organizações
lidam (a partir, obviamente, dos comporta-
mentos das pessoas que a constituem) com
aspectos do ambiente na qual elas se inserem
e produzem resultados nesse ambiente (De
Luca, Botomé, & Botomé, 2013). A relação
entre organizações como sistemas comporta-
mentais e a própria noção de comportamento
como interação entre o que as pessoas fazem
e o ambiente (antecedente e consequente)
em que o fazem (Botomé, 2001; 2013) parece
evidente. Como decorrência dessa concepção
de organizações, o comportamento das pes-
soas que trabalham na organização se torna
o aspecto nuclear delas, tanto pela possi-
bilidade de entender as organizações como
um complexo sistema de comportamentos
em interação, como pelo fato de ser os com-
portamentos dessas pessoas o aspecto que
produz os resultados que cabe à organização
produzir na sociedade em que se insere.
2o Critério: Objevos
orientados por demandas
internas, objevos pessoais
ou pelas necessidades da
sociedade?
Um segundo aspecto sistematicamente pre-
sente em definições de “organização” evi-
dencia que as interações entre as pessoas são
orientadas para a produção ou concretiza-
ção de um objetivo “comum” (e.g. Stoner &
Freeman, 1995; Etzioni, 1989; Katz & Khan,
1987; Barnard, 1971). Uma organização ser
definida e delimitada por um objetivo envolve
entender que ela é orientada para a produção
de resultados específicos. Em relação a esse
aspecto, há necessidade de distinguir o pro-
duto de uma organização do resultado que é
produzido por ela por meio desse produto. É
possível distinguir entre produto e resulta-
do a partir de um exemplo apresentado por
Malott (2003). Em um dos diversos casos ca-
racterizados pela autora, ela faz referência
a uma empresa de marketing que, em sua
origem, produzia “inserções de propaganda
em rádio” e que, tempos depois, passou a
produzir e distribuir “panfletos”. Mas o re-
sultado a ser produzido por esses dois tipos
de produtos era “aumentar a fatia de mer-
cado das empresas” que contratavam essa
organização. Obviamente, parece importante
distinguir que o resultado de uma empresa é
aumentar a fatia de mercado de outras em-
presas, e não apenas distribuir panfletos ou
realizar inserções de propagandas em rádio.
A relevância social do resultado a ser pro-
duzido é outro aspecto nuclear dos resulta-
dos a serem produzidos pelas organizações.
Isso indica que não é qualquer resultado que
deve constituir os objetivos das organizações,
mas sim resultados orientados para deman-
das externas à organização, ou seja, para
necessidades sociais (De Luca, Botomé, &
Botomé, 2013; Botomé, & Kubo, 2002; Kienen
e Wolff, 2002; Botomé, 1996, 1992, 1981a;
Kaufmann, 1977), em oposição a resultados
meramente internos às organizações e que,
por decorrência, só produzem benefícios
às pessoas que a constituem e chegam, por
35
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso e Gabriel Gomes de Luca
vezes, a prejudicar parcelas significativas da
sociedade (Dowbor, 2013). Uma contribui-
ção importante da teoria geral dos sistemas
à compreensão dos fenômenos em múltiplos
campos em meados do século XX foi a expli-
citação de que fenômenos na natureza estão
inseridos em sistemas abertos, estabelecendo
relações com outros fenômenos e instâncias
do ambiente (Bastos, Loiola, Queiroz & Silva,
2014). Nesse sentido, qualquer fenômeno
está em contínua interação com o meio a sua
volta, afetando e sendo afetado por ele. No
caso específico das organizações, elas existem
para atender a alguma necessidade específica
da sociedade (Jones, 1994; Kienen & Wolff,
2002; Kaufmann, 1977). É isso que diferencia
uma empresa produtiva (para a sociedade)
de uma empresa meramente rentista (para
o investidor) (Dowbor, 2013). Uma empresa
que fabrica móveis, atende a necessidade de
outro segmento. Uma empresa que oferece
cursos de idiomas, atende a necessidade de
outro segmento. Uma universidade, atende
a necessidade de outro segmento. Em última
instância, qualquer organização só é concre-
tizada quando passa a atender algum tipo de
necessidade da sociedade na qual se insere.
Quando não fica claro que o aspecto defini-
dor e delimitador de qualquer organização é
o resultado a ser produzido por ela em re-
lação a algum tipo de necessidade social, é
alto o risco que demandas ou necessidades
internas tornem-se imperativas nas toma-
das de decisões, o que geralmente implica em
problemas de diversas ordens nas empresas
(Botomé, 1996). Apesar disso, ainda é comum
empresas formularem seu objetivo geral (sua
“missão”) e seus objetivos específicos em
termos de sistemas fechados (olhando para
dentro), com pouca ou nenhuma visibilidade
acerca do que deveria produzir como con-
tribuição à sociedade (sistema aberto). “Ter
alta produtividade”, “ganhar acima de 10%
de lucro líquido”, “trabalhar pouco”, “não
ter desperdício”, “diminuir ociosidade” são
exemplos de expressões que já apareceram na
formulação do objetivo de grandes empresas
brasileiras. Mas, se a função dos objetivos é
orientar os comportamentos das pessoas,
parece ser um problema que os objetivos das
organizações façam referência apenas a algo
interno a elas, uma vez que, nesses casos,
tende a ser para aspectos internos que se
volta a atenção das pessoas que a constituem.
Para exemplificar o problema de haver ênfase
em resultados internos (em oposição a re-
sultados externos), é possível imaginar um
órgão público com excesso de filas e confu-
são entre usuários do serviço que solicitam
atendimento. Para “melhorar o serviço”, os
funcionários definem como objetivo “acabar
com a confusão no departamento” e propõem
que a solução encontrada envolve limitar a
quantidade de pessoas que podem entrar no
órgão, deixando os demais na rua à mercê
do frio, do sol e da chuva. Dentro do depar-
tamento tudo ficou mais calmo e tranquilo...
As necessidades internas à organização foram
atendidas, em detrimento justamente daquilo
que deveria definir e delimitar as organiza-
ções: as necessidades externas à ela. Em outro
exemplo, em uma empresa privada foi defi-
nido que o objetivo da empresa era aumentar
em 20% a quantidade de vendas. Os vendedo-
res, visando atender a esse objetivo, começam
a fragmentar as vendas de seus clientes em
36
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso e Gabriel Gomes de Luca
diferentes notas fiscais... o mesmo volume de
vendas, mas agora com maior burocracia! Os
objetivos foram considerados atingidos e um
case de sucesso empresarial. A insatisfação dos
clientes e dos funcionários com maior demora
para o fechamento de pedidos e a quantida-
de de notas fiscais desnecessárias parece ter
sido deixado de lado... Esses são exemplos
que evidenciam os riscos de orientar os com-
portamentos dos trabalhadores para apenas
objetivos internos à organização, e não da
sociedade na qual ela se insere.
Quando é enfatizada a ideia de objetivos
orientados para as necessidades sociais, está
em destaque a noção de organização como
um sistema aberto, em interação constante
com o ambiente no qual se insere. Ao menos
dois tipos de impacto das organizações da
sociedade precisam ser identificados. O pri-
meiro é que toda ação (de uma pessoa ou de
pessoas em grupo) possui impacto em outras
pessoas ou “dimensões” dos sistemas nos
quais estão relacionados. Se essa ação for
apresentada por pessoas de uma grande or-
ganização, tanto maior será o impacto (am-
biental, social, econômico etc.). Uma empresa
de fabricação de sapatos poderia impactar o
ambiente, por exemplo, poluindo rios com
resíduos tóxicos e matar animais sem cui-
dados com bem estar animal para produzir
couro (impacto ambiental), lesar física e psi-
cologicamente trabalhadores com condições
insalubres de trabalho (impacto psicológico
e social) e “quebrar” outras empresas do
mesmo ramo que remuneram melhor seus
trabalhadores e que investem em cuidados
ambientais e sociais (com impacto econômi-
co). Nesse exemplo, fica claro que impactos
na sociedade podem ser de múltiplas ordens,
ou seja, organizações sempre produzem algo
na sociedade. Sejam impactos positivos ou
negativos para as pessoas que nela vivem.
O segundo tipo de impacto das organizações
enfatiza que certos impactos são produzi-
dos pelas organizações para a sociedade. A
formulação do “objetivo geral” geralmente
é o que deveria evidenciar esse impacto. A
universidade, por exemplo, tem um “papel
social” específico na sociedade. Diferente de
outros tipos de instituições de ensino supe-
rior (faculdades, centros universitários...),
às universidades, como instituições na so-
ciedade, cabe a função ou objetivo geral de
produzir conhecimento novo e torná-lo acessível
(De Luca, Botomé, & Botomé, 2013; Botomé,
& Kubo, 2002; Botomé, 1996, 1992). À ban-
quinha de revistas no centro da cidade, cabe
a “missão” de tornar acessível às pessoas
jornais e revistas periódicas à população. E daí
por diante. Cada um desses exemplos evi-
dencia que essas organizações cumprem um
papel que não é orientado meramente para si
próprias, mas especialmente para a sociedade
na qual estão inseridas. Nesse sentido, mais
do que decorrência na sociedade, organizações
têm uma dimensão crítica quando examinado
seu objetivo para a sociedade.
O objetivo de uma organização, além de ne-
cessitar fazer referência a resultados sig-
nificativos a serem produzidos na e para a
sociedade na qual se insere, necessita ser
um objetivo “comum” aos integrantes da
organização. O aspecto que parece nuclear
em relação ao quão “comum” é o objeti-
vo de uma organização envolve a distinção
37
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso e Gabriel Gomes de Luca
entre um objetivo “similar” ou um objetivo
“comum”. Por objetivo similar, é possível
entender que diferentes pessoas possuem
o mesmo objetivo, sem, entretanto, haver
necessidade de interação entre o compor-
tamento dessas pessoas para a produção
desse objetivo. Um exemplo de pessoas com
objetivos similares envolve pessoas em um
ponto de ônibus, esperando o ônibus. Nessa
situação, essas pessoas possuem o mesmo
objetivo: se deslocar utilizando esse tipo de
transporte público. Entretanto, esse objetivo
não depende da interação entre elas. Nesse
sentido, o objetivo das pessoas é similar,
porém, não comum. Objetivo “comum”,
portanto, constituem objetivos que, para sua
consecução, enfatiza que o resultado (so-
cialmente relevante) a ser produzido pela
organização na e para a sociedade na qual
ela se insere envolve o comportamento de
diferentes pessoas em interação.
3o Critério. Ações especícas
ou classes de ações recorrentes
(connuas) ao longo do tempo?
Outro critério evidenciado na literatura é o
de continuidade na definição do que constitui
uma organização (e.g. Robbins, 2010; Katz, &
Khan, 1987; Morin, 1981). Um argumento a
favor desse critério é a ideia de que iniciati-
vas específicas que ocorrem uma única vez,
sem recorrência, não caracterizariam uma
organização (e são, por vezes, chamados de
“projeto”, “manifestação” ou “evento”, por
exemplo). Uma das dimensões típicas de tra-
balho em organizações abrange a dimensão
social desse fenômeno que difere da simples
soma de seus participantes. Uma organiza-
ção, como qualquer outro sistema cultural,
perpetua certos tipos de práticas, mesmo
que seus membros sejam alterados ao longo
do tempo. Isso constitui fenômenos como
a cultura organizacional (Silva, Todorov, &
Silva, 2012). Em síntese, a ausência de tais
características não qualificaria uma even-
tualidade específica como uma organização.
Ainda assim, embora atividades específicas
não sejam definidas como organizações, a re-
alização de eventos, projetos, manifestações
e demais atividades circunstanciais também
poderiam ser abrangidas como fenômenos
relacionados à organizações, no sentido de
considerar que muito do que é produzido
como conhecimento, instrumentos, procedi-
mentos e recursos de trabalho desenvolvidos
para o contexto das organizações pode ser
utilizado nesses eventos mais específicos.
4o Critério. Ênfase nas
organizações ou instuições
(Agências de Controle)?
Por fim, uma última distinção conceitual
importante para definir organizações é a
diferença entre organizações e instituições.
O conceito instituições é utilizado na litera-
tura para designar agências sociais que re-
gulam as atividades humanas, indicando o
que é proibido, o que é permitido ou o que é
valorizado (Bastos, Loiola, Queiroz & Silva,
2014). Skinner (1953/2000) utiliza o concei-
to agência de controle para designar grupos
que exercem “controle ético sobre cada um
38
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso e Gabriel Gomes de Luca
de seus membros através, principalmente,
de seu poder de reforçar ou punir” (p.363).
Nesse sentido, o termo instituição pode ser
lido de maneira equivalente ao termo agência
de controle proposto por Skinner (1953/2000).
Tal conceito designa diferentes arranjos
propostos pelo grupo no qual vivemos (e. g.,
Educação, Governo, Psicoterapia, Economia,
Religião etc.) que indicam o que é valoriza-
do ou punido pelo grupo. Embora conceitos
distintos, as instituições podem ser consi-
deradas como “abstrações” (leis, explícitas
ou tácitas, formais ou informais) postuladas
pelo grupo, cuja concretização é manifestada
por diferentes tipos de organizações na so-
ciedade (públicas, privadas ou da sociedade
civil organizada de interesse público) (Bastos,
Loiola, Queiroz & Silva, 2014).
Em síntese, definir organizações como sistema
de interações comportamentais orientado para a
produção recorrente de resultados signicativos
para e na sociedade na qual ela se insere parece
ser uma forma promissora para orientar os
trabalhos a serem desenvolvidos em organi-
zações e, inclusive, para orientar a atuação
de analistas do comportamento em orga-
nizações, além de viabilizar a identificação
e a designação de intervenções analítico-
comportamentais nesse campo de atuação.
Tal definição enfatiza que, mais do que a es-
trutura ou os resultados internos à própria
organização, os aspectos que mais direta-
mente delimitam o que é uma organização
são os resultados recorrentes que cabem às
organizações produzirem na e para a socie-
dade na qual elas se inserem. Essa definição
de “organizações” também enfatiza a “nu-
clearidade” do conceito de comportamento
tanto para definir a organização, uma vez
que, por meio dessa definição, as organiza-
ções passam a ser consideradas como siste-
mas comportamentais, quanto para orientar
os trabalhos que as constituem, já que é o
comportamento das pessoas que constituem
as organizações o aspecto que possibilita que
o resultado que as define e as delimita seja
produzido. Atuar sobre os comportamentos
das pessoas que constituem as organizações e
das contingências que interferem na ocorrên-
cia desses comportamentos, sempre maxi-
mizando a produção recorrente de resultados
significativos na e para a sociedade na qual a
organização se insere... essas parecem ser ca-
racterísticas promissoras da atuação de ana-
listas do comportamento em organizações.
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COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5
41
Lívia Aureliano e Candido V. B. B. Pessôa
Lívia Aureliano
Universidade São Judas Tadeu
Universidade de São Paulo
liviaaureliano@gmail.com
Candido V. B. B. Pessôa
Paradigma - Centro de Ciências
do Comportamento
candido@paradigmaac.org
Análise de Sistemas Comportamentais:
uma proposta de análise e intervenção
nas organizações
Behavioral System Analysis: A proposal for
analysis and intervenon in organizaons
Resumo
Análise de Sistemas Comportamentais constitui uma
proposta de análise que compreende uma organização
como um sistema. Essa proposta implica analisar as
múltiplas variáveis que afetam o desempenho da or-
ganização e, em última instância, que afetam também
o desempenho das pessoas que dela fazem parte.
Este texto tem como objetivo introduzir a Análise de
Sistemas Comportamentais, apresentando sua defi-
nição, sua unidade de análise Total Performance System
(TPS), assim como descrever dois dos modelos de in-
tervenção baseados na BSA: o modelo de Rummler
e Brache e o Modelo de Engenharia de Sistemas
Comportamentais.
Abstract
Behavioral Systems Analysis constitutes a proposal
for analysis comprising an organization as a system.
This proposal implies to analyse multiples variables
that affects individual performance that belongs to
the system. This text aims to introduce the Behavioral
Systems Analysis, its definition, its unit of analysis,
the Total Performance System tool (TPS), either
to describe two interventions models that use the
BSA: Rummler and Brache´s model and the Model
of Behavioral Systems Engineering.
PALAVRAS-CHAVE
Sistemas comportamentais; Intervenção organizacional;
Gestão do comportamento nas organizações.
KEYWORDS
Behavioral systems; Organizaonal intervenon;
Organizaonal behavior management.
42
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Lívia Aureliano e Candido V. B. B. Pessôa
Análise de Sistemas Comportamentais11 constitui
uma proposta de análise que compreende uma
organização como um sistema. Essa propos-
ta implica analisar as múltiplas variáveis que
afetam o desempenho da organização e, em
última instância, que afetam também o de-
sempenho das pessoas que dela fazem parte.
Trata-se, portanto, de uma visão que busca
integrar variáveis no nível comportamental
e cultural, entendendo que as variáveis que
afetam o comportamento individual resultam
em mudanças em todo o sistema, assim como
as variáveis que afetam o sistema como um
todo afetam o comportamento do indivíduo
que trabalha na organização (Brethower, 2001;
Diener, McGee & Miguel, 2009; Malott, 1999).
Ainda sobre sua definição, a Análise de
Sistemas Comportamentais ou, como é mais
conhecida, mesmo no Brasil, a Behavioral
Systems Analysis (BSA), segundo seu principal
criador, Dale Brethower, “é um conjunto de
conceitos e técnicas que ajuda a tornar mais
saudáveis os ambientes de trabalho, de ensino
e ambientes clínicos” (Brethower, 2002, p.
1). Esse conjunto de técnicas e conceitos é
baseada em duas áreas do conhecimento: a
Análise do Comportamento e a Teoria Geral
de Sistemas (TGS). A integração do conheci-
mento produzido por essas duas áreas se jus-
tifica, ainda segundo Brethower, pelo fato de
a Análise do Comportamento ajudar a enten-
der como as pessoas “funcionam” no mundo
em que vivem e a TGS ajudar a compreender
como o mundo “funciona”.
Segundo Karl Von Bertalanfy, um dos formu-
ladores da TGS, essa teoria foi criada na expec-
tativa de existirem leis gerais que possam ser
aplicadas a um grande número de sistemas,
independente das propriedades particulares
do sistema específico e de seus elementos
(Bertalanffy, 1968). O intuito da TGS é traçar
uma espécie de “máximo divisor comum”
para os conhecimentos obtidos pela enorme
fragmentação da ciência contemporânea, per-
mitindo que o estudioso de um tipo de sis-
tema possa entender algo sobre outros tipos
também, de forma a integrar conhecimentos.
Como aponta Brethower (1999), existem sis-
temas de todos os tipos. Por exemplo, sistemas
físicos, biológicos, eletrônicos, governamen-
tais, de aquecimento, de comunicação, fami-
liares, sociais sociotécnicos, ecossistemas etc.
– Essas considerações levaram Bertalanffy a
postular a TGS com o objetivo de formular
princípios válidos para “sistemas” em geral.
Nos termos da TGS, uma definição de siste-
mas será necessariamente densa. Por exem-
plo: “Um sistema é um todo, seus elementos
e as inter-relações entre os elementos, entre
cada elemento e o todo e entre o sistema
como um todo e os outros sistemas com que
ele se relaciona” (Brethower, 2006, p. 126).
Para que uma definição como essa possa ser
utilizada, Brethower (1999) sumariza sete
princípios gerais da TGS:
(1) Princípio dos sistemas abertos, que identifica a
necessidade dos sistemas de importar energia
11 Essa tradução para Behavioral System Analysis foi apresentada na mesa redonda “Questões de tradução em OBM”, durante
o XXIII Encontro Brasileiro de Psicologia e Medicina Comportamental (Pessôa, Aureliano, Careli et al., 2014).
43
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Lívia Aureliano e Candido V. B. B. Pessôa
para sobreviver. No caso de seres vivos, alimen-
to; no caso de empresas, recursos econômicos.
(2) Princípio do processamento de informação:
cada sistema biológico tem formas especí-
ficas de processar informação – i.e., agir a
partir de eventos antecedentes – e converter
insumos em energia vital.
(3) Princípio de sistemas guiados: o sistema pode
ser direcionado para a obtenção de objetivos
específicos. Por exemplo, famílias podem prio-
rizar gastos em educação; empresas podem
enfatizar a remuneração de acionistas.
(4) Princípio de sistemas adaptativos: o sis-
tema pode ser redirecionado. A família pode
passar a priorizar gastos em saúde; a empre-
sa pode passar a priorizar a remuneração de
empregados.
(5) Princípio de canalização de energia: os
esforços necessários à obtenção desses ob-
jetivos ser discricionariamente empregados.
Por exemplo, se aproximar de determinados
grupos, participar de certas organizações
de classe.
(6) Princípio da inteligência ambiental: um sis-
tema trabalhará melhor se obtiver e utilizar
informações relevantes sobre mudanças de
seu ambiente.
(7) Princípio da maximização dos subsistemas:
um sistema aberto opera sob as limitações
impostas pelo ambiente externo; essas limi-
tações fazem com que seja impossível maxi-
mizar simultaneamente o sistema como um
todo e seus subsistemas componentes.
Brethower (1999, 2002, 2006) defende o
uso desses sete princípios para se aprender
rapidamente os fatos fundamentais sobre
uma organização.
O primeiro estudo analítico-comportamental
que utilizou a ideia de sistemas para ana-
lisar comportamento parece ter sido a tese
de doutorado de Dale Brethower, defendida
em 1970. O título da tese “The classroom as a
self-modiyng system” já sugere que o autor
considera a sala de aula, seu objeto de estudo,
como um sistema, composto por elementos
(alunos e professores) que interagem entre
si, modificando uns aos outros. A definição
de sistema auto modificável contempla
também a afirmação de que uma das variáveis
que modifica o desempenho do sistema, e
o torna autorregulado, é a ferramenta do
feedback (princípio da inteligência ambien-
tal, nos termos da TGS). Além disso, a partir
dos efeitos modificadores do feedback sobre
o desempenho dos estudantes, é possível
compreender cada aluno também como um
sistema auto modificável. O principal objetivo
do autor nesse trabalho, portanto, foi mostrar
que a sala de aula poderia ser entendida como
um sistema e que o desempenho de todo o
sistema poderia ser modificado por feedback.
A unidade de análise dessas interações, de-
senvolvida e validada por Dale Brethower em
sua tese, é chamada Total Performance System
(“TPS” – Brethower, 1999). Essa unidade pro-
cura contemplar as variáveis que constituem
as inter-relações dos elementos de um sistema
e as relações desse sistema com o ambiente no
qual está inserido, como prescrito na definição
apresentada acima. Assim como a concepção
44
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Lívia Aureliano e Candido V. B. B. Pessôa
12 Produtos como aqui entendido é referido em outros textos de análise do comportamento como “resultados” do comportamento.
O importante é diferenciar o produto ou resultado do comportamento, aquilo que sobra depois da ação realizada, de suas consequên-
cias mantenedoras. Essa disnção é mais claramente feita na teoria analíco comportamental que estuda metaconngências. Nessa
literatura temos bem diferenciados o produto agregado (outro conceito aqui subsumido no presente uso de “produto”) e consequência
cultural selecionadora.
exata da unidade de análise varia entre autores
da Análise do Comportamento (Thompson &
Zeiler, 1986), podendo ser caracterizada como
a tríplice contingência ou serem adicionados
outros termos, como estímulos condicionais,
contextuais ou operações motivadoras, a de-
pender do foco da análise, na BSA o número
de termos também pode variar. No presente
texto, é usada a versão de TPS apresentada
por Malott (2003), uma vez que o foco deste
artigo é a análise de sistemas comportamen-
tais como se apresentam em organizações.
Como apresentado por Malott (2003) e es-
quematizado na Figura 1, o TPS é composto
pelos seguintes elementos:
(1) Missão: é o objetivo final do sistema anali-
sado. Por exemplo, em linhas gerais, no caso de
uma escola ser o sistema analisado, sua missão
poderá ser educar indivíduos como cidadãos
éticos e eficientes para a sociedade; no caso
de um hospital ser o sistema analisado, sua
missão poderá ser curar e prevenir doenças.
(2) Produtos12: é o que o sistema analisado
produz. Podem ser produtos ou serviços, são
o que resta após o sistema analisado operar.
Por exemplo, ao analisarmos uma univer-
sidade, seus produtos podem ser mestres,
doutores e alunos graduados em diversas
especialidades ou profissões; se o sistema
analisado for um departamento de recursos
humanos, seus produtos podem se caracte-
rizar por contratações realizadas, políticas
de remuneração feitas e treinamentos dados;
no caso de uma tarefa como contabilidade,
o produto pode ser o balanço ou o balancete
da empresa.
(3) Sistema Receptor: é o sistema que recebe
o produto do sistema analisado. Por exemplo,
no caso de uma universidade como sistema
analisado, o sistema receptor será a sociedade
que receberá os graduados ou pós-graduados
formados por ela; no caso de um departa-
mento de recursos humanos ser o sistema
analisado, os sistemas receptores serão os
outros departamentos da empresa; no caso
de um professor ser o sistema analisado os
alunos serão os sistemas receptores.
(4)Feedback do Sistema Receptor: são os dados
ou informações provenientes do sistema re-
ceptor que determinam se os produtos ou ser-
viços do sistema analisado atendem as suas
necessidades específicas. Por exemplo, no caso
da sociedade como sistema receptor de uma
universidade, seria o envio de mais alunos
para essa universidade, ou fornecer recursos
(bolsas, doações, mensalidades) para que essa
universidade continue a existir; no caso de
uma fábrica como sistema analisado, os fee-
dbacks podem ser pesquisas de satisfação dos
clientes, novas encomendas ou informações
do serviço de atendimento ao consumidor; no
45
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Lívia Aureliano e Candido V. B. B. Pessôa
caso de um professor, pode ser a satisfação
dos alunos com suas estratégias de ensino,
ou recomendações dos alunos a outros alunos
para que cursem a disciplina do professor.
(5) Sistema Processador: é o sistema proces-
sador que transforma os recursos em pro-
dutos. Como visto nos exemplos anteriores,
podem ser organizações, departamentos, ta-
refas, pessoas etc. O que será colocado como
sistema processador dependerá do que se
quer analisar.
(6) Feedback do Sistema Processador: são os
dados sobre a avaliação de como o sistema pro-
cessador está funcionando em relação a seus
próprios parâmetros. Por exemplo, a universi-
dade como sistema processador analisado está
saudável financeiramente? Seus alunos estão
atingindo os níveis de conhecimento previstos
pela instituição? Eles estão se formando no
tempo certo?; no caso de uma fábrica como o
sistema processador analisado, os produtos
estão dentro da qualidade especificada? São
vendidos com lucro?; no caso de um professor
como sistema processador analisado, a disci-
plina foi ministrada conforme o cronograma
estabelecido? Os alunos conseguiram passar
para a disciplina seguinte com os requisitos
necessários? Os trabalhos dos alunos foram
comentados no tempo certo?
(7) Recursos: são todos os antecedentes ne-
cessários para que o sistema processador
consiga realizar o produto. No caso de um
professor como sistema analisado, exem-
plos de recursos seriam a sala de aula com os
instrumentos necessários (projetor, quadro
e canetas etc.), livros didáticos, tempo para
preparação da aula e correção dos trabalhos;
no caso de uma fábrica, a matéria prima, a
tecnologia, os recursos humanos etc.; no caso
de um departamento de recursos humanos,
exemplos de recursos seriam descrições das
habilidades necessárias para o posto de tra-
balho a ser preenchido ou a disponibilidade
de recursos para remuneração.
(8) Competidores: são outros sistemas que
competem pelos recursos ou pelo sistema re-
ceptor do sistema processador analisado. No
exemplo do departamento de recursos huma-
nos como sistema processador analisado, por
exemplo, poderíamos ter concorrência por
recursos para a elaboração de treinamentos
ou para o uso de equipamentos da organiza-
ção; no caso do professor, poderíamos ter os
trabalhos dados por outras disciplinas para
os mesmos alunos ou verbas destinadas à
compra de materiais (livros, apostilas) para
outras disciplinas, poderíamos também ter
a necessidade do professor realizar outras
tarefas além de lecionar, como pesquisar e
publicar artigos científicos, ou se dedicar a
outras profissões; no exemplo mais evidente
de uma fábrica, poderíamos ter outras fá-
bricas competindo pelos mesmos clientes ou
pela contratação dos mesmos profissionais.
5. Sistema
Processador
1. Missão
2. Produto
3. Sistema
Receptor
6. Feedback do
Sistema Processador
4. Feedback do
sistema receptor
7. R
ecursos
8. Compeçã
o
Figura 1.
Fonte: desenvolvida pelos autores.
46
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Lívia Aureliano e Candido V. B. B. Pessôa
Como pode ser visto pelos exemplos dados no
parágrafo anterior, Brethower (1999, 2002)
propõe o TPS como uma unidade que possi-
bilita vários níveis de análise. Se no sistema
processador (item 5 do TPS) focamos uma
pessoa ou tarefa, teremos uma análise no
nível comportamental. De outra forma, se no
sistema processador for focada uma organi-
zação ou o departamento de uma organiza-
ção, teremos uma análise no nível cultural
(Glenn & Malott, 2004; Malott, 2003). Como
ressalta Ferond (2006), o alcance do TPS a
análises no nível cultural de seleção viabilizou
que intervenções comportamentais ganhas-
sem escalabilidade. Como afirmam diversos
autores (e.g., Austin, 2000; Rummler, 2004;
Tosti, 2004) a BSA possibilita análises em
ambientes sociais complexos, formados por
muitos indivíduos com múltiplas interações
que afetam os participantes da organização
e a própria organização.
Os trabalhos de analistas do comportamen-
to em organizações – chamados OBM, da
expressão em inglês Organizational Behavior
Management – tiveram como ênfase ini-
cialmente a manipulação de contingências
comportamentais que afetavam diretamen-
te os comportamentos dos trabalhadores
(Abernathy, 2014; Crowell, Anderson, Abel, &
Sergio, 1988; Hyten, 2009). Apesar de as in-
tervenções relatadas serem bem-sucedidas,
Abernathy (2014) defende que o uso exclusivo
desse modo de intervenção pode levar a um
erro sobre quais variáveis devem ser focadas,
além de causar efeitos imprevistos e falhar
na sustentabilidade das mudanças compor-
tamentais (p. 236). Isso aconteceria porque
intervenções que se baseiam na análise de
comportamentos individuais – isto é, que se
baseiam apenas no uso da tríplice contingên-
cia como ferramenta de análise – não cap-
tariam as variáveis relevantes em dinâmicas
de outros tipos de sistemas, tais como uma
fábrica, uma família, uma escola etc. O uso
do TPS como uma unidade de análise possi-
bilita a análise de entidades culturais e não
só individuais. Isso é importante se enten-
dermos uma entidade cultural como algo que
tem suas próprias dinâmicas, independentes
das dinâmicas analisadas no nível individual
(Skinner, 1984).
O uso da BSA para basear intervenções em
organizações cujos resultados são susten-
táveis a longo prazo passou a ser defendido
por diversos autores nas últimas décadas
(e.g., Brethower & Wittkopp, 1988; Diener,
McGee & Miguel, 2009; Hyten, 2009; Malott,
2003; Rummler & Brache, 1990). No entanto,
Abernathy (2014) afirma que muitas das dis-
cussões sobre o uso da BSA têm permanecido
em um nível conceitual, muito mais do que no
nível aplicado. E essa lacuna existente entre
discussões conceituais sobre o uso da BSA em
intervenções organizacionais e trabalhos que
descrevam aplicações efetivas usando essa
abordagem, conforme apontada pelo autor,
pode explicar o pequeno número de relatos
de intervenções realizadas que se baseiam em
BSA, já que não haveria modelos de interven-
ção nem ferramentas suficientes para tal.
Como seria, então, uma intervenção a partir
da análise de sistemas comportamentais?
Serão apresentados, em termos gerais, dois
modelos de intervenção baseados em BSA, o
apresentado por Rummler e Brache (1990) e
47
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Lívia Aureliano e Candido V. B. B. Pessôa
apresentado por Malott (2003). Espera-se que
com essas breves apresentações seja possível
a um leitor iniciante entender como a partir
de uma análise de sistemas comportamentais
pode-se chegar a modelos de intervenção.
Para Rummler e Brache (1990), o desempe-
nho da organização deve ser analisado e as
intervenções realizadas a partir de três níveis:
o nível organizacional, o nível de processo e o
nível de trabalho/executor. O nível organiza-
cional enfatiza o relacionamento da organi-
zação com o mercado e compreende as suas
principais funções. Nesse nível de análise, o
sistema processador no TPS é a organização e
os aspectos externos a ela (missão13, sistema
receptor, feedback do sistema receptor, re-
cursos, competição), assim como os aspectos
internos (produtos, composição do sistema
processador em termos dos processos que o
compõe, feedback do sistema processador)
são analisados. As variáveis levantadas na
construção do TPS da organização são traba-
lhadas em termos de objetivos, delineamen-
tos e gerenciamento. A partir das variáveis
levantadas, é feita uma série de perguntas (1)
sobre os objetivos da organização (e.g., a es-
tratégia/direção da organização foi articulada
e comunicada?; essa estratégia faz sentido em
termos de oportunidades e ameaças externas
ou de vantagens e fraquezas internas?), (2)
sobre o design da organização (e. g., a estru-
tura formal da organização suporta a estraté-
gia e melhora a eficiência do sistema?; todos
os processos relevantes para o cumprimento
dos objetivos existem e estão no lugar?) e
(3) sobre o gerenciamento da organização
(e.g., objetivos apropriados a cada função
foram estabelecidos?; os desempenhos re-
levantes estão sendo medidos?; as interfaces
entre as funções estão sendo gerenciadas?).
É nas respostas a essas perguntas pela dire-
ção da empresa e, talvez principalmente, na
ausência de respostas que a intervenção no
nível organizacional é feita, completando-se
as lacunas ou inconsistências verificadas.
O sistema processador “organização”, em
Rummler e Brache (1990), é composto por
inúmeros processos interligados, identi-
ficados primeiramente na análise no nível
organizacional. Quando se passa ao nível de
processo, cada processo identificado é ana-
lisado em um TPS. Novamente, nesse novo
nível de análise, a partir das variáveis obtidas
na elaboração do TPS de processo são reali-
zadas uma série de perguntas à direção ou
gerência da organização em relação (1) aos
objetivos de cada processo (e.g., os objetivos
dos processos chave estão em linha com os
requisitos dos clientes e da organização?),
(2) ao design de cada processo (e.g., esse é o
processo mais eficiente para se completar a
missão do processo?) e (3) ao gerenciamento
de cada processo (e.g., os objetivos de cada
processo foram estabelecidos?; o desempe-
nho do processo está sendo gerenciado?; as
interfaces entre os passos do processo estão
sendo gerenciadas?). Segundo Rummler e
Brache, as organizações são tão boas quanto
seus processos. Para os autores, geralmente
é neste nível de análise que se encontram os
13 Uma análise mais detalhada de como se idenca a missão de uma organização mostrará que essa é uma variável com aspectos
internos e externos ao sistema processador. Não cabe ao presente texto, de caráter introdutório aprofundar essa disnção. Rummler
e Brache (1990) e Malo (2003) podem ajudar o leitor se aprofundar no assunto.
48
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Lívia Aureliano e Candido V. B. B. Pessôa
maiores espaços em branco que precisam ser
preenchidos como forma de intervenção.
Ao realizar o TPS de um processo, encontra-se
como a composição do sistema processador
várias tarefas a serem executadas. Assim,
após o término da realização dos TPSs de cada
processo, cada trabalho/executor será o siste-
ma processador no nível seguinte de análise,
que foi julgado importante de ser melhorado
no nível de análise e intervenção anterior.
A partir das variáveis obtidas nos TPSs das
tarefas identificadas como relevantes, per-
guntas relacionadas ao (1) objetivo da tarefa
(e.g., os produtos e padrões da tarefa estão
em linha com os requeridos no processo?), ao
seu (2) design (e.g., os requisitos do processo
estão refletidos em tarefas apropriadas?; os
passos da tarefa estão em sequência lógica?;
há ergonomia ambiental para a realização da
tarefa?) e ao seu (3) gerenciamento (e.g., os
executores entendem os produtos espera-
dos e padrões que devem ser alcançados?; os
executores têm recursos suficientes, sinais e
prioridades claros e um delineamento lógico
da tarefa? os executores são remunerados por
atingir os objetivos da tarefa?). Novamente, as
perguntas são feitas para basear a intervenção
na elaboração de respostas que completem as
variáveis faltantes.
Para Rummler e Brache (1990), para que
a mudança organizacional ocorra, a inter-
venção precisa ocorrer nos três níveis de
desempenho, assim como estes precisam
funcionar eficientemente em conjunto, com
os mesmos objetivos. Dessa forma, pode-se
ver como o uso do TPS como unidade de
diferentes sistemas processadores, tanto
no nível cultural (organização e processos)
quanto no nível comportamental (trabalho/
executor), possibilitam um controle de vari-
áveis que não é obtido apenas em análises no
nível comportamental.
Outro modelo de intervenção em organiza-
ções que ocorre a partir da análise de sistemas
comportamentais é apresentado por Malott
(2003). Ao se basear na BSA, Malott descre-
ve seu modelo como sistemático e ordenado,
e que contempla os conceitos básicos sobre
seleção ambiental e seleção cultural, assim
como as unidades de análise: contingência
comportamental e metacontingência. Esse
modelo, nomeado por Malott como Modelo de
Engenharia de Sistemas Comportamentais14,
será apresentado em linhas gerais a seguir.
Como em Rummler e Brache (1990), Malott
parte de níveis mais complexos até os menos
complexos. Cada subcomponente que compõe
o sistema processador no “nível de cima” será
o sistema processador no nível logo abaixo.
No TPS do macrossistema, o nível mais alto
analisado por Malott, no sistema processador
está a organização alvo. No TPS da organiza-
ção, no sistema processador estão processos
que compõe a organização. No TPS dos pro-
cessos relevantes da organização, no sistema
processador estão as tarefas que compõe o
processo. No TPS da tarefa, o sistema proces-
sador é composto pelos comportamentos que
compõem a tarefa. No TPS de um compor-
tamento, o sistema processador é a tríplice
14 Tradução livre feita do termo em inglês Behavioral Systems Engineering Model.
49
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Lívia Aureliano e Candido V. B. B. Pessôa
contingência desse comportamento. Malott
propõe ainda a realização do TPS da gerência,
que é responsável pelas contínuas análises e
ajustes nas intervenções a serem realizadas.
De acordo com o modelo de intervenção de
Malott (2003), ao se realizar a análise do TPS
em cada nível, obtém-se resultados úteis
para intervenção, além da simples verifi-
cação das variáveis ausentes. Ao realizar o
TPS do macrossistema no qual a organiza-
ção está inserida, pode ser elaborada uma
missão para a organização que permitirá
a sua orientação estratégica. Para Malott,
uma missão elaborada dessa forma evita se
basear nos produtos da organização, um erro
comum na elaboração de missões, segundo
a autora. Ao realizar o TPS da organização,
podem ser estabelecidas medidas para cada
variável do TPS, o que facilita enormemente
a elaboração de um plano estratégico para a
organização, que será feito nesse nível de in-
tervenção. Além disso, a realização do TPS da
organização permite enxergar a organização
como um conjunto de processos que se in-
ter-relacionam. O TPS dos processos permite
otimizar cada um destes. É nesse ponto que a
intervenção atinge o máximo de valor, já que
apenas a otimização coordenada dos proces-
sos (como componentes inter-relacionados
da organização) maximiza os resultados da
organização (Brethower, 2006; Malott, 2003;
Rummler & Brache, 1990). A partir da rea-
lização dos TPS de tarefas, novas análises
são realizadas (inclusive usando instrumen-
tos oriundos de Rummler e Brache [1990])
para basear as intervenções de alinhamento
e otimização dos processos na organiza-
ção. Finalmente, o TPS de comportamentos
permite saber quais os comportamentos re-
levantes para a realização de tarefas e assim
focar as intervenções no nível organizacional
nos comportamentos que mais influem nos
níveis superiores de análise.
Pela sumária apresentação dos modelos
de intervenção propostos por Rummler e
Brache (1990) e por Malott (2003), pode-se
perceber que as intervenções baseadas na
BSA lidam inicialmente com questões mais
estratégicas da empresa. Com o aprofun-
damento e continuidade das análises e in-
tervenções, ocorre um aprofundamento,
chegando-se às questões de comportamentos
individuais. É a primeira parte das interven-
ções, baseadas em TPS de entidades mais
complexas (macrossistemas, organizações,
processos) que se deu a grande inovação de
intervenções desse tipo.
Os dois modelos de intervenção apresentados
não esgotam os modelos baseados em análi-
ses BSA. Mas talvez sejam os mais próximos
da Análise do Comportamento. Modelos que
englobam várias outras áreas do conheci-
mento e usam a BSA são agrupados sob o
nome de intervenções em Human Performance
Tecnology. Três grandes manuais sumarizam a
história de intervenções desse tipo (Pershing,
2006; Stolovitch & Keeps, 1992, 1999). Nele
há uma rica história de como os conceitos
originados em análises do comportamento
vão se misturando com outros conceitos na
vida prática de intervenções organizacionais.
Para concluir essa breve introdução sobre a
BSA, acrescentamos que cada autor propõe
seu método de coleta das variáveis que
50
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Lívia Aureliano e Candido V. B. B. Pessôa
baseiam as análises. Dos vários existentes,
os mais didáticos talvez sejam o de Diener,
McGee e Miguel (2009) e o de Malott (2003).
Brethwoer (2006) fornece, além de uma
série de perguntas que dirigem a coleta,
uma apresentação dos diversos autores em
que ele se baseou para a elaboração das per-
guntas. Ficará a cargo de cada um escolher
qual mais se encaixa às necessidades de cada
análise e intervenção.
Finalizamos resgatando o que Malott (2003)
aponta como uma grande força da BSA ao in-
tegrar duas áreas de conhecimento, a Análise
do Comportamento e a Teoria Geral dos
Sistemas: “a análise de sistemas nos permite
viajar através da complexidade das organizações
e identicar comportamentos alvos que valem
a pena aprimorar para sobrevivência em longo
prazo; a análise do comportamento nos permite
implementar mudanças que aprimorem os de-
sempenhos das pessoas e das organizações.” (p.
42). Com a introdução ao BSA apresentada
neste capítulo, procuramos mostrar como
a Análise do Comportamento, com foco na
Análise do Comportamento Aplicada, pode se
beneficiar de conhecimentos de outras áreas
do conhecimento para crescer e se renovar.
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COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5
53
Nayra Karinne Bernardes de Menezes e Ilma A. Goulart de Souza Brio
Nayra Karinne Bernardes de Menezes
PUC-GO
nayrakarinne@hotmail.com
Ilma A. Goulart de Souza Brio
PUC-GO
Habilidades de Líderes como Gestores
em uma Empresa do Ramo de
Agronegócio
Leadership Skills as Managers in a Company of
Agribusiness Industry
Resumo
O presente estudo teve como objetivo avaliar os com-
portamentos e as práticas de liderança em busca de
resultados em uma organização de grande porte do
ramo do agronegócio. A pesquisa caracterizou-se como
exploratória e os dados foram tratados com estatística
descritiva. Participaram do estudo 67 funcionários,
sendo 26 líderes e 41 liderados. Os dados foram cole-
tados por meio de um questionário semiestruturado e
também uma escala de modos de liderança, contendo
itens no formato Likert de cinco pontos com infor-
mações funcionais. Os resultados apontaram que as
práticas exercidas pela pessoa com a função de liderar
determinavam as tarefas, o modo pelo qual ela deveria
ser executada para aumentar a qualidade do serviço
oferecido. Os dados evidenciaram que em empresas
de agronegócios a pessoa que exerce a função de li-
derança tem relevância para o controle das tarefas e
direcionamento de pessoas lideradas.
Abstract
This study aimed to evaluate the behavior and
leadership practices in search results in a large
organization in the agribusiness sector. The research
is characterized as exploratory and the data were
analyzed with descriptive statistics. The study
included 67 employees, 26 leaders and 41 lead.
Data were collected through a semi-structured
questionnaire and also a scale of leadership modes,
containing items in Likert five-point format with
functional information. The results showed that the
activities carried out by the person with the task of
leading determined the tasks, the way it should be
done to increase the quality of the service offered.
The data showed that in agribusiness companies the
person holding the leadership role becomes relevant
for the control of tasks and directing people led.
PALAVRAS-CHAVE
Comportamento Organizacional; Habilidades de
Liderança; Agronegócio.
KEYWORDS
Organizaonal Behavior; Leadership Skills; Agribusiness.
54
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Nayra Karinne Bernardes de Menezes e Ilma A. Goulart de Souza Brio
INTRODUÇÃO
O primeiro estudo divulgado em Organization
Behavior Management (OBM) foi realizado por
O. Aldis, em 1961, com o título Of Piggeons and
Men (Dickinson, 2000). Aldis (1961) estendeu
os princípios e métodos operantes desen-
volvidos por B. F. Skinner para modificar o
comportamento de trabalhadores em organi-
zações empresariais. Desde então, os estudos
Skinner tem chamado a atenção de gesto-
res, pois com as aplicações dos princípios e
métodos da analise do comportamento no
contexto empresarial os resultados apontam
para a efetividade dos resultados alcançados
(Dickinson, 2000).
Em uma revisão dos estudos publicados entre
as décadas de 1950 a 1980, Dickinson (2001)
assinala para a efetividade das pesquisas no
contexto empresarial ao constatar a influencia
de obras de Skinner como Science and Human
Behavior em 1953, The Science of Learning and
the Art of Teaching em 1954 e Teaching Machines
em 1958, na produção de resultados. Nestas
obras os gestores notaram a importância da
instrução programada para ensinar os prin-
cípios comportamentais básicos e, também
sugestões de como realizar o treinamento de
pessoas para o trabalho em empresas.
Neste contexto, é que se faz valer o conjun-
to de estratégias operantes propostas para a
avaliação, tratamento e análises de desempe-
nho em organizações empresariais (Daniels,
1989; Gilbert, 1978). Importante destacar que
Skinner (1953/1970) enfocou o controle eco-
nômico e ofereceu uma análise sobre o com-
portamento de trabalhar e o valor econômico
do trabalho na economia, pois o desempenho
em um dado momento é determinado pelas
contingencias de reforço contingentes a exe-
cução do trabalho.
Com o conceito de comportamento operante,
Skinner (1953/2007) demonstrou que a cada
emissão de resposta, o organismo produz
uma consequência que altera a probabilida-
de de emissão daquela resposta num futuro.
Quando isto acontece pode alterar a proba-
bilidade de o comportamento ocorrer nova-
mente. Justamente por esse motivo, Skinner
(1953/2007) estava interessado no estudo
do comportamento que produz algum efeito
no ambiente, aquele cuja consequência pode
retroagir sobre o organismo. Esse compor-
tamento está na origem de grande parte dos
problemas humanos e o interesse teórico por
ele é também por suas propriedades singula-
res e, principalmente, por sua sensibilidade
às consequências.
O modelo de seleção por consequências
(Skinner, 1981) oferece uma análise do papel
do ambiente na determinação do compor-
tamento. No ambiente de trabalho, se um
funcionário realiza uma atividade bem feita
e recebe um feedback positivo do seu superior
imediato, este elogio aumentaria a proba-
bilidade deste evento, atividade bem feita,
voltar a se repetir no futuro. Em relação aos
antecedentes (Skinner, 1953/2007) estava
interessado nas condições ou eventos que
exercem efeitos sobre o comportamento, isto
é, nas condições sobre as quais o comporta-
mento é alterado devido a uma relação entre
as respostas e as consequências, o controle
de estímulos.
55
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Nayra Karinne Bernardes de Menezes e Ilma A. Goulart de Souza Brio
A partir destes pressupostos, pode-se afirmar
que desde o estudo de Aldis (1960) as refle-
xões de Skinner acerca dos determinantes do
comportamento para o ambiente de traba-
lho se fizeram presentes, visto que a OBM já
conta com mais de cinquenta anos. Dentre
os autores que trouxeram contribuições para
as empresas através do modelo OBM, desta-
ca-se A. C. Daniels. Daniels (1984) parte do
pressuposto que é possível conciliar pessoas
satisfeitas, um bom clima de trabalho e ex-
celentes resultados em OBM o que tem sido
aplicado largamente nos Estados Unidos e
mais recentemente no Brasil.
Em um trabalho com OBM, o analista do
comportamento que trabalha em consultoria
empresarial se fundamentará nos seguintes
princípios: (1) atribuição de responsabilida-
des específicas, (2) mensuração de resultados,
(3) ênfase nos comportamentos, (4) trabalho
cooperativo, (5) definição de metas desafia-
doras, porém possíveis de serem alcançadas,
(6) feedback imediato, (7) reforçamento posi-
tivo, (8) análise da tríplice contingência, entre
outros conceitos fundamentais (Nery, 2012).
Conforme Daniels (1984), a maioria dos pro-
blemas de desempenho dentro da empresa
pode oriunda da falta de disposição de con-
tingencias reforçadoras para o empenho do
trabalhador. Neste contexto, o uso do refor-
çamento positivo é o mais poderoso elemento
de atuação sobre o desempenho de funcio-
nários. Além do reforçamento positivo, existe
também o reforçamento negativo, Skinner
o define o reforçamento positivo como o
fortalecimento de uma resposta devido à
apresentação de determinado estímulo a
ele contingente; e o reforçamento negativo
consiste no aumento na frequência de uma
resposta por causa da remoção contingente
de um dado estímulo (Skinner, 1953/2007).
No modelo OBM a maioria dos comporta-
mentos pode ser medido, com isso é possível
controlar e mudar comportamentos dentro
das organizações. É necessário para isso, ve-
rificar o evento antecedente e consequente
à tarefa realizada, que para Daniels (1984),
esse modelo é chamado de ABC da mudança
de comportamento. Sendo assim, é possível
entender o que mantém o comportamento,
baseando-se nas consequências do mesmo.
Então, após analisar as contingências é pos-
sível identificar o que mantém os comporta-
mentos indesejados e indesejados (Aureliano
et al., 2008).
Dentre as variadas possibilidades de aplica-
ção do modelo OBM, ele é particularmente
eficiente no que diz respeito ao alcance dos
objetivos organizacionais, tais como a obten-
ção de lucros pela empresa, permanência no
mercado, satisfação dos acionistas e clientes,
produção de um ambiente de trabalho agra-
dável, desempenho satisfatório dos colabo-
radores, formas de gerenciamento efetivas,
entre outros (Nery, 2009).
Nesta perspectiva, Brethower em 1982 (citado
por Manwhinney, 1992) afirma que o sistema
de intervenção OBM poderia ser explicado a
partir da especificação, observação e admi-
nistração de consequências contingentes à
ocorrência de determinadas propriedades da
resposta. Por meio deste sistema, é possível
criar um ambiente de trabalho mais funcional,
56
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Nayra Karinne Bernardes de Menezes e Ilma A. Goulart de Souza Brio
mais produtivo, satisfazendo de forma ampla
os funcionários da empresa.
É possível afirmar que os objetivos
organizacionais podem ser alcançados a
partir da aquisição de um novo repertório de
comportamentos considerados relevantes
para a organização, de modo que haja a
diminuição da frequência de comportamentos
indesejados e o aumento da frequência de
comportamentos desejados, por meio de
repetições e treinamento das habilidades
necessárias na equipe, de modo que a mudança
esperada ocorra.
Um ponto essencial enfocado por Daniels
(1984) é o de que, para alterar o desempenho
de uma equipe, é necessário mudar o que as
pessoas fazem, qual seja mudar suas ações ou
atividades. Para Skinner (1953/2007) o padrão
de controle exercido por um líder forte, re-
flete muitas de suas idiossincrasias pessoais.
Com efeito, investigar se a habilidade de lide-
rar influencia os resultados alcançados pelas
organizações é tema relevante, uma vez que
os aspectos comuns que envolvem liderança
estão ligados a fenômenos grupais de pessoas,
um processo de relações recíprocas exercido
por líderes e seus liderados (Bergamini, 1994).
O padrão comportamental exigido para o de-
sempenho de liderança, conforme Fleury em
2000 (citado por Dutra, 2008), implica: mo-
bilizar, integrar, transferir conhecimentos,
recursos e habilidades, que possam agregar
valor econômico à organização e valor social
ao individuo. Desta forma, pode-se afirmar
que a tarefa de liderar é desafiadora, pois
requer conhecimento, experiência e método
para inovar. Em outras palavras, ocupar cargo
de liderança e orientar equipes de trabalho é,
sobretudo, uma condição relacionada à dis-
posição de contingencias para o bom ou mau
comportamento do trabalhador, seja aplican-
do consequencias, seja dispondo condições
antecedentes, os comportamentos do líder
são fundamentais no processo de controle do
comportamento na empresa.
Por estilo de liderança entende-se o modo
pelo qual um líder desempenha suas funções
e como ele é notado por aqueles que ele tenta
liderar (Engstrom, 1976). O líder deve agir
de modo entusiasmado, otimista, motivado,
participativo, além de pensar de equipe, saber
delegar tarefas e cobrar resultados. O líder
que age de modo centralizador, que se irrita
facilmente perde o respeito e não se mantém
no mercado de trabalho.
Autores como White, Lippitt e White (1939)
propõem que os modos de liderar podem ser
divididos em três estilos básicos: permissivo
ou liberal democrático e autocrático. O estilo
do líder descrito como permissivo ou liberal
tipo laissez-faire. Nesse estilo não há estrutu-
ra ou supervisão, os membros definem seus
próprios objetivos e padrões de desempenho;
o líder não tem autoridade, é apenas alguém
a disposição, dá o mínimo de direção e o
máximo de liberdade aos liderados (Marinho
& Oliveira, 2005; White, et al., 1939). Não dá
ordens, não orienta os liderados.
O líder democrático pode ser considerado
líder e conselheiro, e tem um mínimo de au-
toridade. As decisões são tomadas pelo grupo.
No entanto, o líder oferece assistência, sugere
57
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Nayra Karinne Bernardes de Menezes e Ilma A. Goulart de Souza Brio
e permite que flua a comunicação, com o ob-
jetivo de esclarecer problemas e resolvê-los
coletivamente, assim, as políticas se tornam
decisões coletivas. Esse estilo é próprio dos
líderes que acreditam que o modo de moti-
var os outros é envolvê-los nas tomadas de
decisões e soluções de problemas (Marinho
& Oliveira, 2005; White, et al., 1939).
Já o líder autocrático, com base em Marinho e
Oliveira (2005) não estimulam a participação
do grupo em qualquer contexto. A supervisão
é autoritária, questionamentos de ordens são
considerados insubordinação. Nos negócios,
esse estilo se concentra em regras e regula-
mentos. Os líderes concentram todo o poder
em si mesmo: acreditam que só eles sabem
o que está acontecendo e, portanto são os
únicos capazes de tomar decisões acertadas.
O presente estudo teve como objetivo le-
vantar os comportamentos e as habilidades
de lideres em busca de resultados em uma
organização de grande porte do ramo do
agronegócio. Importante esclarecer que esta
pesquisa caracterizou-se como exploratória
sendo que os dados foram tratados com es-
tatística descritiva.
MÉTODO
Parcipantes
Participaram do estudo 67 funcionários, sendo
26 líderes e 41 liderados, lotados em diferentes
unidades da empresa, de ambos os sexos, cuja
idade variou de 20 a 55 anos. Todos os partici-
pantes possuíam nível superior de escolaridade.
Local e Instrumentos
A pesquisa foi realizada em uma sala de
aproximadamente 30m2 de uma empresa do
ramo de agronegócio localizada no Distrito
Agroindustrial de Anápolis (DAIA), interior do
Estado de Goiás. Para coleta de dados foram
utilizados dois instrumentos: questionário
semiestruturado cujos itens focavam os pos-
síveis comportamentos que o líder adotaria se
estivesse exercendo a função de liderar uma
equipe. O questionário para coleta de dados foi
elaborado pela primeira autora. O instrumento
possuía itens para os dados descritivos, cate-
goria profissional, experiência na empresa,
tipo de trabalho executado, além de outras ati-
vidades. Nele também houve a contemplação
de itens relacionados ao ambiente de trabalho
e relacionamento entre líder e liderados com
o uso de uma escala de estilos de liderança,
democrático, autocrático e liberal. Os partici-
pantes quantificaram os itens segundo o grau
de acordo com o trabalho de líder, em uma
escala de cinco pontos no formato de Likert
com os itens: (1) sempre; (2) quase sempre; (3)
raramente; (4) nunca e (5) não sei responder.
Procedimento
Após contatos prévios com a diretoria da em-
presa e obtenção da licença daquela instituição
os funcionários responderam ao questionário,
na forma de autoaplicação, individualmente
na sala, destinada para tal finalidade, na pró-
pria empresa e na presença dos aplicadores. O
tempo gasto pelo funcionário para responder
ao instrumento, variou de 15 a 20 minutos.
No caso de dificuldade no preenchimento dos
itens, o aplicador esclarecia a questão.
58
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Nayra Karinne Bernardes de Menezes e Ilma A. Goulart de Souza Brio
liderança adquire relevância para o controle
das tarefas e direcionamento de pessoas li-
deradas. Discutiu-se que liderar pode ser uma
habilidade única para garantir resultados com
padrão de qualidade. Por se tratar de estudo
exploratório, recomendações práticas e suges-
tões para pesquisas futuras foram oferecidas.
Os resultados obtidos através do questionário
estruturado cujos itens focavam os possíveis
comportamentos que o líder adotaria se es-
tivesse exercendo a função de liderar uma
equipe, aplicado aos gestores, demonstraram
que, a liderança é tema que envolve relacio-
namento e desempenho. Os líderes se con-
sideraram em parte com comportamentos
autocráticos, em parte com democráticos e
alguns ainda um equilíbrio entre autocrático
e democrático. Os dados mostram, portanto
que o líder influencia o comportamento dos
membros de sua equipe, para que sejam exe-
cutadas as demandas que necessitam serem
realizadas, conforme tabela abaixo.
Já a escala de estilos de liderança foi aplica-
da na mesma sala da empresa, no período
de intervalos para descanso, na ausência do
líder. Os liderados responderam a escala na
presença dos aplicadores que esclareceram
as dúvidas surgidas. Ao final dos trabalhos
os aplicadores agradeceram aos participantes
pelas respostas.
RESULTADOS
Os resultados apontaram que as práticas exer-
cidas pela pessoa com a função de liderar de-
terminavam as tarefas, o modo pelo qual ela
deveria ser executada para aumentar a qua-
lidade do serviço oferecido, bem como as de
influenciar os liderados em relação à partici-
pação de membros do grupo para a execução
dos trabalhos, seja o de equipe ou o individual.
Os dados evidenciaram que na empresa in-
vestigada a pessoa que exerce a função de
Respostas aos instrumentos
Categorias
Selecionadas
Performance
de líder
Acompanhamento
do líder
Líder autocráco
Líder democráco
“Os líderes tanto impõem suas ordens, quanto conduzem, orientam e incen-
vam a parcipação da equipe, sendo capazes de liderar e exercer influên-
cia, propiciando um ambiente seguro para os todos nós”.
“Quando o líder exerce autoridade o funcionário se sente retraído, não
tendo oportunidades de mostrar suas ideias, pois o líder usa o poder sobre
a equipe que acaba não executando as tarefas com ênfase, mas nessa em-
presa quase não há casos”.
“Em minha opinião os colaboradores têm abertura para parcipar das toma-
das de decisão em seus setores e são reconhecidos através de elogios pela
competência do trabalho que realizam”.
“Recebemos treinamento e orientações de tudo que precisa ser feito, con-
forme as orientações do nosso gestor”.
“Eles avaliam o desempenho e habilidades na realização das tarefas, influen-
ciando posivamente no nosso resultado”.
59
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Nayra Karinne Bernardes de Menezes e Ilma A. Goulart de Souza Brio
comportamento das pessoas em relação ao
que é desejável possível e necessário.
Assim a importância de uma pessoa que lidera
de modo eficaz não pode ser subestimada, pois
uma empresa que tenha falta de líderes tem
pouca oportunidade de sobreviver. Exercer
a função de liderar deve estar cada vez mais
presente no contexto das equipes. As equipes
estão sendo introduzidas no mundo inteiro
como meio para aumentar a produtividade, a
qualidade e a satisfação do trabalhador.
DISCUSSÃO
Os dados do presente estudo apontam que na
empresa investigada, a presença de pessoas
que exercem a função de liderar se tornou
importante, dada a relação de proximidade
no controle dos comportamentos e motiva-
ção dos funcionários para a realização das
tarefas. Observa-se que na empresa estudada
encontraram-se líderes que se comportam
de modo autocrático (e.g., controle absoluto
e autoritário sobre o grupo) e democrático
(e.g., ajuda o grupo a tomar decisões). Tais
modos de relacionar se tornam importantes,
podendo influenciar as reações dos colabora-
dores, no sentindo de aumentar a qualidade
do serviço quando, ao mesmo tempo em que
o líder determina as tarefas e técnicas para
sua execução, mostra disponibilidade para
ouvir e permite a participação do colabora-
dor nas tomadas de decisão. Para a empresa
pesquisada se faz importante o controle dos
comportamentos para a realização das ati-
vidades, bem como instruções para execu-
tá-las, devido a complexidade das mesmas.
Os resultados mostraram que o comporta-
mento do líder na visão dos liderados, trans-
fere de forma clara e simples os objetivos e
as metas de trabalho aos colaboradores: é
um bom ouvinte, pois se mostra disponível
quando solicitado e tem equilíbrio, sabendo o
que fazer, sem perder a tranquilidade, como
estilo de líder democrático. Desta forma, po-
de-se confiar nele em qualquer emergência ao
incentivar a participação do grupo nas toma-
das de decisão. Em contrapartida, a maioria
dos colaboradores afirma que o líder é quem
determina as tarefas e técnicas para execu-
ção das mesmas demonstrando um estilo de
liderança autocrático.
Os colaboradores avaliam ainda que seja reco-
nhecido pelos seus líderes através de elogios
pela competência do trabalho que realizam.
Assim foi possível notar o uso de reforçamen-
to positivo para manter os comportamentos
desejados na empresa. Nota-se ainda que na
empresa, a realização das tarefas era condu-
zida pelo líder: este mostrava como desem-
penhar e orientava os esforços dos liderados
para o alcance de objetivos comuns.
Qualquer que seja o estilo do líder é ele quem
dita o ritmo para os outros membros da em-
presa. Seu estilo é questão de considerável
interesse para os funcionários de todos os
níveis, e uma importante variável de deter-
minação de quanto os funcionários estarão
comprometidos com a missão, os valores e
os objetivos da organização e vão se esforçar
para programar suas estratégias. A influência
que um líder exerce no estabelecimento dos
objetivos, na determinação da direção que o
negócio deve seguir, resulta na mudança no
60
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Nayra Karinne Bernardes de Menezes e Ilma A. Goulart de Souza Brio
de atribuição de cargos. Este estilo de lideran-
ça, que predomina na empresa, contribui para
o desempenho da organização, pois por meio
dele os líderes conseguem ser mais do que
chefes, conseguem ser gestores participativos,
e assim alcançam a contribuição dos subordi-
nados e consequentemente os resultados or-
ganizacionais desejados, contribuindo também
para a solidez da empresa no mercado.
A partir dos resultados do presente estudo,
observa-se que os gestores colocam em suas
práticas as estratégias do estilo de liderança
democrática, visto que foi possível notar nas
respostas de alguns entrevistados que existe:
a ênfase nos comportamentos, operações de
reforçamento, atribuição de responsabilidades
específicas, mensuração de alguns resulta-
dos, trabalho cooperativo, definição de metas
a serem alcançadas, feedback imediato, con-
forme literatura acima descrita.
Observa-se que as pessoas lideradas, em sua
grande maioria, consideram os seus líderes
democráticos, assim observou-se que esse é o
estilo de liderança predominante na empresa,
ou seja, para os colaboradores as diretrizes
são debatidas e decididas pelo grupo, que é
estimulado e assistido pelo líder. O resultado
em parte é compatível com o ponto de vista
dos gestores da organização, onde metade se
avaliou como autocrático e a outra democrá-
tico. O estilo autocrático para os gestores está
mais relacionado à condução das tarefas a
serem executadas, definindo as providências
e técnicas para a realização das mesmas, do
que a uma liderança imposta.
O estilo predominante na mesma é caracteri-
zado pelo direito dos liderados a opinião nas
decisões e por usar o envolvimento do grupo
no estabelecimento de seus objetivos básicos,
estabelecimento de estratégias e determinação
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61
COMPORTAMENTO
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Vol.10, 269-308.
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5
62
Maria Vanesse Andrade
Maria Vanesse Andrade
PUC-SP
vane02lp@yahoo.com.br
Uma Leitura sobre as Estratégias
Publicitárias em Blogs Femininos
de Moda
A Reading on Adversing Strategies of
Female Fashion Blogs
Resumo
O presente artigo buscou investigar as estratégias para
divulgação de produtos e serviços em blogs femininos
de moda, a partir dos princípios teórico-metodoló-
gicos da Análise do Comportamento. Como amos-
tra, selecionamos os blogs – Garotas estúpidas, Super
Vaidosa e Fashionismo. Resultados indicaram a cons-
tante descrição de reforço social (reforço informativo)
para as leitoras/seguidoras empenhadas na imitação
dos comportamentos propostos pelos blogs, ao passo
que não é observada a mesma ênfase para o custo
dos itens divulgados e valor de uso efetivo (reforço
utilitário). O uso de regras e modelação está entre as
estratégias mais comumente aplicadas, além da in-
serção de celebridades e postagens sugerindo novos
modelos comportamentais de uso, descritos como
“tendências” e “lançamentos” nos blogs.
Abstract
This paper aims to investigate promotion strategies
of products and services in female fashion blogs
from the theoretical and methodological principles
of Behavior Analysis. The blogs Garotas estúpidas,
Super Vaidosa and Fashionismo were selected as
sample. Results indicated constant description of
social reinforcement (informative reinforcement) for
readers/followers engaged in imitation of behaviors
proposed by the blogs, while it is not observed the
same emphasis on the cost of items disclosed and
effective use value (utility reinforcement). Rules and
modeling are among the most commonly applied
strategies, and the inclusion of celebrities in posts
suggesting new behavioral models of usage, described
as trends in postings on blogs.
PALAVRAS-CHAVE
Análise do comportamento; Estratégias publicitárias;
Blog feminino de moda.
KEYWORDS
Behavior analysis; adversing strategies;
Female fashion blogs.
63
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Maria Vanesse Andrade
Introdução
O advento da internet modificou a forma
como as pessoas e sociedades têm construído
relações, bem como o modo de informar-se,
procurar, selecionar e consumir bens e ser-
viços. Com tantas possibilidades, a publici-
dade precisou adaptar-se ao mundo virtual
com seu dinamismo e diversos formatos de
interação: e-mails, fóruns, redes sociais e
também através dos blogs, esses, objeto de
estudo deste trabalho.
A proposta deste artigo foi realizar uma aná-
lise das estratégias utilizadas em blogs fe-
mininos de moda para a divulgação de bens
e serviços. Para isso, partiu-se dos pressu-
postos do Behaviorismo Radical e da Análise
do Comportamento de Skinner (1981), ele-
mentos dos estudos de Foxall (1990, 2005)
sobre o comportamento do consumidor, além
de trabalhos envolvendo a análise de blogs
de moda como Medeiros, Ladeira, Lemos e
Brasileiro (2014), Laruccia (2014) e o estudo
de blogs em uma perspectiva comportamen-
tal com os trabalhos de Wang (2008, 2013).
A escolha da temática acerca dos blogs de
moda reside no interesse da autora em inves-
tigar o crescimento dessas mídias, enquanto
espaços extremamente fluidos e relevantes
em termos de informação sobre moda na
contemporaneidade. Este estudo tem sua
relevância ao propor uma discussão sobre a
popularização dos blogs femininos de moda
no contexto da internet e das mídias sociais,
evidenciando tais mídias como importantes
meios na divulgação de produtos e serviços
na atualidade e, ao mesmo tempo, entende
que tais mídias podem atuar como dissemi-
nadoras de modelos de comportamentos para
o respectivo público-alvo.
Com a investigação de estratégias publicitá-
rias em blogs femininos de moda, buscou-se:
(1) analisar brevemente como o formato
blog passou a ser um empreendimento para
o mercado de moda; (2) apresentar breve-
mente uma possibilidade de leitura desse tipo
de blog a partir de conceitos da Análise do
Comportamento; (3) analisar, sob o viés ana-
lítico-comportamental, algumas das princi-
pais estratégias publicitárias presentes nos
blogs; e (4) discutir os principais aspectos
dos blogs femininos de moda em relação às
ferramentas observadas.
Método
Para o estudo das estratégias utilizadas nos
blogs femininos de moda, optou-se por re-
gistrar as postagens analisadas. Foram sele-
cionados três importantes blogs de moda do
país para a coleta de dados – Garotas estúpidas
(GE), Super Vaidosa (SV) e Fashionismo (F) –
os quais foram acompanhados uma vez por
semana, pelo período de um ano, entre os
meses de junho de 2014 e junho de 2015.
Os blogs foram selecionados por constarem nas
listas sobre os mais influentes blogs de moda
do Brasil e por serem apontados como os mais
acessados de acordo com o buscador on-line
Google. Além disso, a escolha ocorreu com base
em 4 fatores: (1) conteúdo completamente di-
recionado para moda em segmentos variados
– roupas, acessórios, cobertura de desfiles,
64
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Maria Vanesse Andrade
15 Dados do Site E-commerce News. Disponível em: hp://ecommercenews.com.br/nocias/balancos/e-commerce-de-moda-
-preve-crescimento-mesmo-com-desaceleracao-de-mercado.
16 Portal de tendências e eslo SIGNATURE 9. The 99 most inuenal fashion and beauty blogs. Disponível em: hp://www.signa-
ture9.com/style-99#rankings. Acesso em: 29 Jun. 2014.
campanhas publicitárias; (2) elevada quanti-
dade de seguidores no próprio blog e demais
redes sociais (ex. Twitter, Facebook, Instagram);
(3) estar há mais de dois anos atuante nesse
tipo de atividade; (4) participação frequente em
campanhas publicitárias de grandes marcas e
em desfiles internacionais de moda.
O acompanhamento foi realizado a partir de
um registro, com os seguintes campos: data
da postagem; título; tema principal; publi-
cidade implícita e/ou publicidade explícita;
principais estratégias de divulgação. O re-
gistro reuniu mais de 475 postagens. Para
os limites deste artigo, elegeu-se de um a
dois posts sobre os temas mais frequentes
nas publicações, organizados em quatro ca-
tegorias: look do dia, tutoriais, celebridades
e tendências/novo.
Os blogs femininos de moda
sob o viés da Análise do
Comportamento
Em qualquer estudo sobre o comportamento
humano, o analista do comportamento sabe
que, em última instância, o comportamento
é multideterminado. Segundo Skinner (1981),
muitas variáveis entram em jogo para o con-
trole do comportamento, entre as quais, a
história ambiental e o ambiente imediato.
O autor aponta três grandes determinantes
do comportamento: filogênese, ontogênese
e cultura.
Com a internet, as relações entre as pessoas
foi modificada e também a forma como estas
têm se relacionado com os bens de consumo,
sobretudo no modo como coletam informa-
ção sobre produtos, serviços, ideias etc. Por
isso mídias sociais como os blogs podem ser
importantes objetos de estudo para o analista
do comportamento. Dentre os atuais traba-
lhos de base comportamental no âmbito dos
blogs, destacam-se os trabalhos de Wang
(2008, 2013). Em ambos os estudos o foco
da autora é a análise das interações verbais
entre os principais participantes de um blog,
ou seja, autor(es) e leitor(es).
Em relação aos blogs femininos de moda,
pode-se dizer que o sucesso guarda relação
com o fato de que mesmo com a crise15, o
mercado de moda no Brasil como um todo,
bem como as vendas e-commerce crescem.
Segundo dados do site E-commerce news, o
mercado de moda no Brasil está em cresci-
mento e a indústria têxtil possui uma im-
portante participação na economia do país.
No contexto brasileiro, o ler blogs merece
atenção particular. De acordo com Medeiros
et al. (2014), os blogs brasileiros têm rece-
bido atenção mundial: em 2014, na última
lista do ranking mundial dos 99 blogs mais
influentes, publicada pelo Signature16, foram
listados sete blogs brasileiros. Laruccia (2014)
65
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Maria Vanesse Andrade
exemplifica bem como o comportamento de
compra pode estar sob controle de um post
publicitário bem elaborado em um blog:
A leitora gera o efeito multiplicador de infor-
mações e marketing gratuito para as empresas,
no qual divulga as informações sobre determi-
nado produto que utilizou, sendo eles positi-
vos ou negativos. Dessa forma, as empresas de
cosméticos ficam vulneráveis a opiniões, de
modo que as informações divulgadas nestas
mídias possam alavancar as vendas ou denegrir
a imagem do produto de determinada empresa,
exemplo disso foi o sucesso do batom Snob da
marca canadense MAC, que graças à divulgação
maciça em blogs brasileiros se tornou sucesso
de vendas de forma a se esgotar durante meses
no Brasil. (Laruccia, 2014, p. 2)
Partindo do exposto, o escrever e o ler blogs é
uma prática possível graças ao entrelaçamen-
to de contingências às quais estão expostos
blogueiros e leitores. Atividade cotidiana, até
então situada entre o aspecto “particular” do
antigo diário (a própria palavra Blog deriva
da contração do termo em inglês Web Log, que
poderia ser traduzido como diário da Web) e
a ultraexposição proposta na rede social. O
escrever em blogs destaca-se na contempo-
raneidade como um meio tanto para interação
entre usuários quanto para demonstração/
venda/exposição de ideias, produtos e serviços.
Desse modo, a abrangência – em termos de
acessos, permanência e reinvenção – eleva
o blog à condição de importante ferramenta
na divulgação publicitária.
O blog, assim como outras ferramentas vir-
tuais, se apoia no comportamento verbal,
sobretudo com as classes escrever, ler e in-
terpretar. Os textos virtuais, assim como várias
outras modalidades escritas, objetivam pro-
mover um canal de comunicação entre o fa-
lante e o ouvinte, neste caso, o autor do blog e
seus leitores-seguidores, de forma dinâmica e
instantânea independentemente da distância.
Infere-se que é essa forma de comunicação que
mantém os acessos ao blog em alta frequência,
fazendo com que obtenha sucesso e patrocínio,
o que mantem o comportamento do autor do
blog em continuar atualizando o site.
Analistas do comportamento entendem o
comportamento verbal como um compor-
tamento operante, e como tal, aprendido e
mantido pelo contato com a respectiva comu-
nidade verbal. Baum (2008) alerta para o fato
de que todo comportamento verbal pode ser
chamado de comunicação, mas nem toda co-
municação seria um comportamento verbal.
Isso porque a “comunicação” ocorre quando
o comportamento de um organismo produz
estímulos que afetam o comportamento de
outro organismo. Além disso, segundo Matos
(1991), a história de vida e de aprendizagem
deve ser considerada.
Esta relação é por sua vez controlada por um
contexto social mais amplo, um quadro auto-
clítico, no qual se insere uma parte da história
passada dos dois atores, a qual é compartilhada
por ambos (e onde têm papel importante os
operantes discriminativos verbais). Estas ver-
balizações, atuando agora como discriminati-
vos para o ouvinte, afetam o comportamento
deste. Estes efeitos sobre o comportamento
do ouvinte atuam seletivamente sobre aquela
classe de operante verbais do emitente, modi-
ficando-a. (Matos, 1991, p. 333)
66
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Maria Vanesse Andrade
A forma como nos relacionamos atualmen-
te com blogs e seus formatos tem relação
direta com a forma como verbalmente estes
espaços foram se modificando e sendo disse-
minados culturalmente. Assim, a nova visão
de blogueiras de moda, como formadoras de
opinião sobre moda pode ser entendida a
partir da maneira como estas vêm lidando
verbalmente com o assunto: o look do dia,
a aproximação de patrocinadores ligados a
marcas famosas, os textos construídos para
disseminar um estilo de vida ligado ao glamour,
seguidores influentes sobre o tema etc.
Conforme Wang (2008, p. 20), assim como
“leitores são reforçados por ler ou ouvir no-
tícias que sejam consistentes com as próprias
histórias de reforçamento”, pode-se dizer,
com base na autora, que o mesmo processo
também ocorre nas mais diversas formas/
gêneros e meios de manifestação do com-
portamento verbal escrito no meio virtual.
O comportamento de escrever e ler blogs de
moda pode também ser analisado segundo o
Behavioral Perspective Model (BPM). O modelo,
fundamentado no behaviorismo radical, desta-
ca o efeito das variáveis do contexto ambiental
em que ocorrem as relações de consumo e por
isso busca nos princípios de aprendizagem do
comportamento operante os elementos para a
análise funcional do comportamento do con-
sumidor (Foxall, 1990, 2005).
No BPM, cenários abertos são definidos como
aqueles com grande número de alternativas
para respostas de consumo, em que diver-
sas respostas características do consumir
são possíveis (pesquisar, procurar, comprar,
não comprar, escolher, determinar a forma
de pagamento, avaliar etc.). Nesse tipo de ce-
nário, o consumidor pode expor-se a quase
todos os aspectos das contingências sob as
quais pode ocorrer a resposta de consumir,
e isto indica que o indivíduo pode respon-
der com maior autonomia. O oposto ocorre
em cenários fechados, os quais podem ser
caracterizados como contextos em que há
uma quantidade restrita de alternativas para
respostas de consumo, ou seja, as respostas
de consumo possíveis são poucas e pré-de-
terminadas, não havendo, na maioria das
vezes, possibilidade de variação nem mesmo
topográfica do responder. São cenários em
que as ações autônomas por parte do consu-
midor são bastante limitadas e este é exposto
a contingências de consumo cujos arranjos
são programados normalmente por outras
pessoas (Foxall, 1990, 2005).
O modelo também analisa o comportamento do
consumidor de acordo com as consequências,
que podem ser utilitárias ou informativas
(Foxall, 1990, 2005). As consequências in-
formativas são simbólicas, de origem social.
Elas se referem à aprovação de certos com-
portamentos, através do ambiente social,
semelhante ao conceito de reforço social. As
consequências utilitárias relacionam-se com
questões ligadas ao valor e à funcionalidade
literal do produto.
Para Perez e Bairon (2002), as novas mídias
têm um valor primordial a curto prazo, prin-
cipalmente em termos de marketing, pois
elas permitem uma enorme inovação tec-
nológica e diferenciação frente ao mercado
e seus concorrentes.
67
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Maria Vanesse Andrade
Quando se trata da relação entre consumo e
moda feminina, os blogs de moda apresentam
uma ligação direta com assunto. Eles se de-
dicam a discutir assuntos como beleza, ten-
dências, maquiagem e logicamente, moda, e
vem crescendo e adquirindo espaço além da
Internet. Os blogueiros, como são chamadas
as pessoas que os escrevem, tem primeira fila
garantida nos principais e mais concorridos
desfiles, são convidados para escrever maté-
rias em grandes revistas e podem ser vistos
até mesmo estrelando campanhas de moda.
(MEDEIROS et al., 2014, p. 07).
Compreendendo que os comportamentos de
consumir, na era da internet, são mediados
pelo ler/escrever/interpretar são aprendidos,
entende-se que um blog de moda pode ser
analisado como um cenário peculiar para
aprendizagem de comportamentos relativos
ao consumo.
Análise das estratégias
publicitárias em blogs
femininos de moda
O primeiro post analisado é do blog (GE)
(Figura 1). No contexto de apresentação,
Camila Coutinho indica “12 ideias de look
para usar em Fernando de Noronha”. Nota-se
um sutil pareamento de produtos que reme-
tem a tempo livre/férias com os momentos
agradáveis descritos pela blogueira: pôr do
sol, jantar, mergulho etc. Não é difícil notar
a indicação de um restaurante e de uma de-
terminada marca de patins organizadas ao
lado do frame. Cada momento – narrado e
fotografado – é acompanhado pela indica-
ção da marca escolhida para o look, grafa-
da em vermelho. Há certa sutileza no modo
como a autora inclui a publicidade nas fotos.
Figura 1. Looks para inspirar.
Fonte: Blog Garotas Estúpidas, postagem de 08 de Janeiro de 2015 e Blog Super Vaidosa, postagem de 16 de Junho de 2014.
68
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Maria Vanesse Andrade
17 Originalmente, o termo tutorial refere-se a um po de estratégia de ensino/aprendizagem, realizada tanto um programa de
computador quanto um texto. No contexto dos blogs femininos os tutoriais se popularizam explicando sobre o uso de certos
produtos. Fonte: hps://pt.wikipedia.org/wiki/Tutorial
Visitar/aproveitar um local deslumbrante
“pede uma vestimenta”, e o blog, referência
em dicas sobre o que vestir, apresenta os dois
de modo articulado.
O segundo post, também inclui produtos em
um evento do cotidiano, em “Look de ca-
samento: longo estampado” (Figura 1). A
blogueira Camila Coelho, destaca que esco-
lheu a roupa pela ocasião da primavera nos
Estados Unidos e por se tratar de uma ceri-
mônia durante o dia. A postagem como um
todo se resume às fotos do vestido, em que se
destacam os aspectos descritos pela autora:
a leveza, as cores e o luxo. Ao final ela cita a
fonte do vestido e joias utilizadas. A proposta
aqui foi a mesma do post do blog (GE): o pare-
amento de produtos em um evento cotidiano,
em que o modelo comportamental cita apenas
os aspectos informativos do uso. O “look do
dia” é uma forma de post com elementos pu-
blicitários, geralmente inseridos na rotina da
blogueira, que indica ao público leitor como
ter o “lifestyle” de uma garota “descolada”,
mesmo no dia-a-dia.
Os posts “Por que nosso make não fica igual
ao de um maquiador profissional” e “Cirurgia
com make: contorno e iluminado” (Figura 2),
referem-se a dicas em formato de tutorial17
destinadas a ensinar uma “make profissional”,
“cirúrgica”, aos(às) leitores (as)/seguido-
res(as). No primeiro, em forma de texto e com
imagens que remetem aos bastidores de um
desfile, Camila Coutinho explica os segredos de
uma maquiagem perfeita. Para isso, o texto se
apoia na opinião de profissionais do ramo, que
indicam o treino, o uso de bons produtos e boas
marcas. No segundo, Camila Coelho explica
todos os detalhes das técnicas de maquiagem
Fonte: Blog Garotas Estúpidas, postagem 05 de Junho de 2014 e Blog Super Vaidosa, postagem de 17 de Outubro 2014.
Figura 2. Tutoriais sobre Maquiagem.
69
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Maria Vanesse Andrade
“contorno” e “iluminado”. Em ambos os
posts, há a ocorrência de descrições verbais
como regras em: “coloque os dedinhos pra
funcionar: busque indicações de maquiadores
queridos, procure por linhas profissionais”;
“os segundos que você economiza deixando de
lavar e hidratar o rosto com produtos indica-
dos para a sua pele fazem o make durar bem
menos e ainda colaboram para uma pele mais
oleosa – pular o primer então, nem pensar!”
(GE) e “E o ideal gente é que o corretivo seja
no mínimo um tom mais claro que o da sua
pele, pra dá essa iluminada” (SV).
Para Baum (2008), um comportamento é
governado ou controlado por regras quando
existe um estímulo discriminativo verbal regra
que controla o comportamento de um ouvinte.
Catania (1999) entende o comportamento go-
vernado por regras como a tendência das pes-
soas a seguirem instruções umas das outras.
Para este autor, a aprendizagem, portanto,
além de resultar do contato com as contingên-
cias, ocorre também pelo seguimento de regras
e ambas estão intimamente relacionadas.
De acordo com Zyman (2003), a publicida-
de deve dar ao consumidor uma razão para
o comprar. Para o autor, a publicidade tem
função motivacional, o que a ligaria ao con-
ceito de operações estabelecedoras. É neces-
sário que o produto anunciado e demonstrado
possua um valor de uso a quem se destina.
Desse modo, a publicidade precisa fazer com
que o bem anunciado pareça ter esse valor.
Ainda com base no autor, pode-se dizer que
a publicidade vem com o objetivo de exercer
a função de aumentar o valor reforçador do
produto (operação estabelecedora) e elevar a
probabilidade de que o consumidor venha a
comprá-lo (operação evocativa).
As regras nos tutoriais dos blogs de moda pos-
sibilitam que o(a) leitor(a) saiba sobre os passos
básicos, produtos e técnicas adequados antes
de iniciar o processo de maquiagem. Porém,
para que se consiga realizar “com perfeição”,
é necessário que o seguidor do blog pratique,
ou seja, que seu comportamento passe ao con-
trole por contingências e não apenas regras
verbais. A própria blogueira do GE destaca isso
quando cita a falta de “experiência” como a
primeira razão pela qual a maquiagem feita
em casa não é como a profissional.
Para Skinner (1982), as regras são úteis
pela sua possibilidade de serem transmi-
tidas através de estímulos discriminativos
de uma determinada cultura que as julga
eficientes para o comportamento dos seus
respectivos membros. A produção de regras
e sua transmissão são importantes porque,
segundo Andery (2003), se vários compor-
tamentos que aprendemos a partir de regras
fossem aprendidos unicamente pela expe-
riência pessoal, demorariam muito mais
tempo para serem adquiridos. Nesse sen-
tido, seguir um tutorial e suas regras sobre
um tipo de maquiagem é mais fácil por já
haver uma descrição do que deve ser feito.
Na publicidade diluída nos tutoriais e posts
dos blogs, as regras têm lugar de destaque. Ao
descrever as contingências, a peça publicitária
torna-se mais eficaz ao instalar, naquele que a
recebe, o comportamento de compra. Pode-se
inferir que, através do ler e interpretar (com-
portamento verbal) é possível ao leitor(a)
70
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Maria Vanesse Andrade
discriminar quais respostas dará acesso aos
reforçadores descritos pelas blogueiras.
Há também nos posts a apresentação de mo-
delos comportamentais para a execução da
“maquiagem perfeita” e a indicação direta
dos produtos corretos para a finalidade.
Compreendendo o processo de modelação
como a apresentação de um comportamento
a ser imitado, percebe-se que este recurso está
presente em todas as postagens analisadas
no artigo. No vídeo, enquanto fala sobre suas
técnicas de maquiagem, a blogueira Camila
Coelho relata: “Eu amoooooo e pra mim uma
pele bem feita precisa desse jogo de luz e
sombra (...). Depois da base eu gosto de passar
o corretivo. Eu vou usar o meu corretivo ilu-
minador da Nars que é o que eu gosto mais,
pra, principalmente uma pele noite” (SV). As
verbalizações e a maneira como a blogueira
demonstra os produtos, enaltecendo suas
qualidades a partir do ensinamento do contor-
no-iluminado, compõem, em última análise,
uma série de modelos de comportamentos a
serem imitados, apresentados a cada descri-
ção verbal. Além disso, a própria entonação e
performance animada durante a exibição dos
produtos podem funcionar como autoclíticos.
É possível inferir que o blog propõe uma
aproximação entre o comportamento de
maquiar-se e as marcas publicizadas pelo post
(publicidade implícita), ou seja, o ler/ assis-
tir, o imitar e o comprar. Sobretudo porque
ao final do vídeo, Camila Coelho aponta para
o texto “lojas que recomendo” (publicidade
explícita). A blogueira ainda diz: “Espero que
gostem e não tenham medo de se jogar”, isto
é, que o público siga adequadamente as regras
tanto em relação ao tutorial de maquiagem
quando a recomendação sobre onde, em que
contexto, deve ocorrer a resposta de compra.
Por meio da modelação, a espectadora dos
blogs de moda tem acesso à aprendizagem de
respostas com topografias muito específicas
e refinadas, sem precisar se expor necessa-
riamente à aprendizagem via tentativa e erro
caso fosse tentar aprender sozinha a fazer
maquiagens e combinações de roupa espe-
cíficas. Nesse contexto, o “erro” geralmente
leva a custos financeiros e críticas de colegas,
e tais custos e críticas podem funcionar como
fortes aversivos. Os modelos – neste caso, as
autoras do blog – fornecem informação sobre
o comportamento (por meio de publicações
pagas e respaldadas pelos patrocinadores), e
os seguidores do respectivo blog, por sua vez,
podem usar esta informação para orientar
o próprio comportamento. Acredita-se que
tanto o aumento da frequência de acessos ao
blog quanto a extinção da resposta (de acesso)
servem de parâmetros para o canal em reor-
ganizar-se enquanto mídia publicitária.
Além disso, sabemos que as características
de um modelo fazem diferença no processo
de modelação (Carneiro & Medeiros, 2007).
Se o público-alvo do blog admira, respeita
ou gosta do modelo – neste caso, as bloguei-
ras –, seja pelo status, pelo sucesso ou por
qualquer outro motivo, é provável que o se-
guidor(a) aumente a frequência de acessar o
blog e provavelmente aumente a frequência
de imitação dos comportamentos (maquiar-se
“melhor”, vestir-se “bem” , frequentar
“certos” ambientes, comprar e consumir pro-
dutos e ideias semelhantes à autora do blog).
71
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Maria Vanesse Andrade
Como o modelo tem valor reforçador, quase
tudo o que faz adquire função de estímulos
reforçadores, em decorrência do emparelha-
mento modelo-reforço (Carneiro & Medeiros,
2007). Em termos comportamentais, a blo-
gueira demonstra o reforçamento que a uti-
lização de determinado produto pode trazer.
Por isso, a modelação é eficaz na publicidade.
Para Baum (2008), o desenvolvimento da
cultura provavelmente não seria possível sem
a imitação. A imitação oferece vantagens rá-
pidas à sobrevivência da espécie. Segundo o
autor, a modelação consiste em um dos meios
mais eficazes na transmissão de novos com-
portamentos. No contexto daqueles que têm
o universo da moda como um espaço de re-
forçamento, os que imitam têm mais chances
de serem socialmente reforçados por com-
portarem-se em conformidade com o que é
proposto pelos blogs. De acordo com Skinner
(1953/2000), “comportar-se como os outros
se comportam tem grande probabilidade de
ser reforçado” (p. 341). Os tutoriais, o look
do dia, as compras do mês etc., são gêneros
pelos quais os blogs femininos de moda sutil-
mente inserem modelos e regras no cotidiano
dos(as) leitores(as).
As blogueiras na atualidade dispõem de fama,
protagonizam campanhas de grandes redes
de marcas, são convidadas por programas de
televisão e aparecem em revistas femininas
de renome. Eram pessoas antes desconheci-
das que através do blog adquiriram uma po-
sição de prestígio e reconhecimento midiático
comparável ao de demais profissionais do
ramo artístico e, por isso, são consideradas
pela grande mídia como celebridades.
Apesar de serem mantidos por pessoas in-
fluentes no âmbito de moda, eventualmente
os blogs fazem uso de outras celebridades em
suas postagens como estratégia de promoção
publicitária. Dentre os blogs analisados, o (F),
de responsabilidade de Thereza Chammas, é
o que mais se utiliza do recurso. Mesmo com
a estratégia de usar personalidades famosas,
os links “Celebs” e “Red carpet” são dedi-
cados exclusivamente às celebridades. Elas
são tema de looks da semana, estilo de vida
e divulgação de produtos específicos, tanto
no uso de determinadas marcas, quanto no
licenciamento de algumas delas. Como é o
caso do post sobre os esmaltes assinados por
Olívia Palermo – personalidade televisiva e
famosa socialite norte-americana.
Segundo Carneiro e Medeiros (2007), na pers-
pectiva comportamental, celebridades fun-
cionam como estímulos discriminativos, si-
nalizam que o comportamento da celebridade
é reforçado durante a mensagem publicitária
na qual o comportamento é alvo. Tal recurso
busca promover, segundo os autores, um pro-
cesso de identificação com a personagem que
se torna porta voz da peça publicitária, uma
vez que a técnica procura transferir alguns
atributos da celebridade para o produto, atra-
vés do emparelhamento de estímulos.
Por esse aspecto, a identificação é de extrema
valia para a propaganda, pois se o leitor(a)/se-
guidor(a) da postagem conseguir identificar-
-se com aquela que aparece usando o produto
e se puder imaginar-se em situação similar,
então é provável que a publicidade tenha mais
impacto na ocorrência do comportamento
de compra. Em termos comportamentais, a
72
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Maria Vanesse Andrade
identificação ocorre quando o indivíduo dis-
crimina no modelo (celebridades, blogueiras)
certas características que também pode vir a
observar em si mesmo. Desse modo, segundo
Silva (2011), o comportamento do indivíduo
pode passar a ser controlado por reforçadores
que mantêm o comportamento do modelo. Se
um ator ou personagem (que tem função de
modelo) tem o comportamento reforçado por
um produto/marca/serviço em uma propa-
ganda, o produto pode passar a exercer função
reforçadora sobre o comportamento daquele
a quem a mensagem publicitária é dirigida.
É o que ocorre na postagem do Blog (F), Figura
3, quando Thereza Chammas chancela que
“A maior it girl da nossa geração acaba de
lançar um esmalte com nome próprio! No
início do ano, Olivia Palermo foi anunciada
como diretora criativa convidada da marca
inglesa Ciaté (lembram dos esmaltes de
caviar?) e nesse mês ocorreu o lançamento
oficial. E se tem nome de Olivinha, eu desejo,
porque sim, sou influenciável” (F. grifos da
autora).
O emparelhamento de estímulos efetuado
neste tipo de postagem visa apresentar um
estímulo e logo após o outro, que controla
uma determinada resposta. O processo de
condicionamento se dá pela repetição do pro-
cedimento, fazendo com que aprendamos um
novo comportamento (Carneiro & Medeiros,
2005). A celebridade escolhida é reconheci-
da no mundo da moda como referência de
beleza e elegância. Ao lado de sua imagem,
além da descrição atenta dos benefícios dos
esmaltes, a autora descreve uma série de pro-
dutos que Olívia Palermo supostamente usa
para a manutenção de seus atributos de bela.
Figura 3. Os esmaltes de Olívia Palermo
Fonte: Blog Fashionismo, postagem de 10 de Junho de 2015.
73
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Maria Vanesse Andrade
Apesar de citar que um dos produtos é o hit
das ricas – único momento em que a autora
atenta para o valor do produto e denota uma
consequência aversiva para o leitor(a) do post
– todo o restante do texto é voltado para as
consequências informativas tanto dos esmal-
tes quanto dos demais produtos.
Outra estratégia observada é a divulgação de
bens em forma de lançamentos e tendências
(Figura 4). O anúncio do produto novo nos
blogs é acompanhado de uma série de descri-
ções que sinalizam reforços positivos quando
do uso/aquisição dos novos produtos. Em seu
trabalho sobre a imprensa feminina, Buitoni
(2009) destaca o papel que o operante verbal
“novo” possui junto ao público consumidor de
textos relacionados à moda. Segundo a autora,
trata-se de “uma categoria sempre presente
na imprensa feminina, não só no Brasil, mas
em todo o mundo ocidental. Explícito ou im-
plícito, o novo impera” (p. 195). Baum (2008)
entende que “as contingências sociais mode-
lam o comportamento do que é normal para
aquela cultura” (p. 254). O normal em relação
aos blogs é o manter-se na moda, descartar
velhos modelos e seguir novos.
As descrições verbais exploram as caracterís-
ticas dos lançamentos: marca, tipo de produ-
to, vantagens, para que serve etc. “Depois de
passar o verão todo usando sandálias (...) che-
guei a conclusão de que preciso de mais opções
desse último modelo! Também conhecidas
como slinder sandals, elas são super práticas
de usar e dão charme a qualquer look. Desde
as mais despojadas como as basiconas da Nike
ou essas Adidas até as mais arrumadas como
essa Isabel Marant ou esse modelo Chloé” (F).
As blogueiras declaram “amar” as novida-
des, destacando sempre a disponibilidade de
reforço positivo com o uso – “Qual mulher
que não ama um lançamento de maquiagem?!
Tenho certeza que todas as vaidosas de plan-
tão por aqui adoram, inclusive eu!!! E hoje
venho falar de novidades! A Natura Una, marca
de maquiagem premium da Natura, lançou
Fonte: Blog Super Vaidosa, postagem de 26 de Fevereiro de 2015; Blog Fashionismo, postagens de 14 de Setembro de
2014 e 27 de Fevereiro de 2015.
Figura 4. Tendências, lançamentos e o Novo.
74
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Maria Vanesse Andrade
novos Sextetos de Sombras e Delineadores
em Caneta! Eu amei a novidade e tenho certe-
za que vocês também vão adorar” (SV). “Essa
semana a NK Store, multimarcas que eu amo,
lançou sua coleção de inverno e não podia ser
menos do que incrível” (F).
Uma tendência aponta novos modelos de
comportamentos que podem ser mais reforça-
dos socialmente que os anteriores, da estação
passada, justamente por estarem nas reco-
mendações de blogs influentes. O novo tratado
nos blogs é o mesmo novo explorado pelas
revistas femininas de moda, ou seja, “é o novo
que se originou talvez da moda, sistema que
exige mudanças a cada estação. Se a imprensa
feminina nasceu veículo de difusão da moda,
dificilmente se afastaria desse novo, razão de
ser de seu assunto principal” (Buitoni, 2009,
p. 195). Não é incomum esse tipo de posta-
gens semanalmente nas mídias analisadas. De
roupas a acessórios, falar de tendências é uma
constante em blogs femininos de moda.
O novo é normalmente acompanhado de
mandos sobre o uso certo e errado, ou seja,
é reforçado positivamente o uso certo – está
na tendência da maquiagem, da roupa – en-
quanto tende-se a tentar extinguir ou mesmo
punir comportamentos que não estejam ali-
nhados aos discursos e anúncios novos. No
exemplo das sandálias, o novo está relacio-
nado à marca e calçar os modelos apresen-
tados significa agregar “charme para qual-
quer look”. Sinaliza-se aí uma consequência
informativa importante, ao mesmo tempo
em que “práticas para usar” esboçam uma
consequência utilitária que corrobora ainda
mais para que o produto seja considerado
um bom investimento pelos leitores(as). Nos
posts em que a novidade é o assunto principal,
a publicidade é mais ostensiva: título, texto,
fotos etc.; não há reservas para citar a marca,
pois normalmente neste tipo de postagem
cada palavra foi paga pelo patrocinador, ou
patrocinadores em destaque.
Conclusão
O objetivo deste trabalho foi compor uma
análise das estratégias utilizadas em blogs
femininos de moda para divulgação de bens
e serviços. Dentre as principais ferramentas,
pode-se citar o uso de modelação e regras.
A primeira está presente na frequência de
imagens e textos veiculando um estilo de
vida completamente permeado por reforços
positivos, reconhecimento social e consequ-
ências informativas advindas do uso de de-
terminados produtos e desempenho de certos
comportamentos. Em relação às regras, as
postagens descrevem os produtos adequa-
dos e o modo adequado de uso, evidencian-
do as consequências alcançadas. Há ainda a
utilização de celebridades na mensagem e a
apresentação de tendências através de novos
modelos comportamentais.
Há uma tentativa em aproximar a bloguei-
ra bem sucedida do público leitor através de
posts. Em sua maioria, as publicações apre-
sentam dicas, modos de fazer (tutoriais) e
looks do dia em que as blogueiras se apre-
sentam como um modelo bem sucedido de
consumo ou introduzem alguma celebridade
para dar credibilidade a esta mesma premis-
sa. As publicações propagam informações e
75
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Maria Vanesse Andrade
pressuposições importantes sobre o que é ser
uma garota descolada, uma it girl18, antenada
nas tendências, vaidosa e poderosa. É pre-
ciso destacar que ser blogger, na atualidade,
passou a ser considerada uma profissão19, e
não apenas um simples passatempo.
Nas postagens, as blogueiras esboçam do-
mínio sobre os temas abordados e aparecem
como especialistas em moda. O estilo de
vida preconizado é apoiado em estratégias
publicitárias especializadas em enaltecer as
consequências informativas do uso/consu-
mo (status, bem-estar, elegância) proposto
e esconder as utilitárias (preço, possíveis
efeitos colaterais, desconforto). Preços, por
exemplo, são raramente citados, e quando o
são, o texto de suporte descreve tantos pos-
síveis reforçadores pela aquisição do produto,
que este se torna um mero detalhe. Segundo
Carneiro e Medeiros (2005), na publicida-
de, por meio dos estímulos condicionados,
é possível eliciar sensações que aumentem a
probabilidade do consumo do produto anun-
ciado. A ideia principal da peça publicitária
é que o produto deixe de ser um estímulo
neutro. Pode-se dizer que a publicidade em-
pregada nos blogs se apoia em várias ferra-
mentas do condicionamento respondente.
Os posts, em sua maioria em formato de guias,
descrevem e sinalizam meios para obtenção
de possíveis reforços, disponíveis para quem
seguir as orientações descritas e a partir da
compra dos produtos anunciados. Esta leitura
decorreu do fato de que não foi verificado
o consumo efetivo dos produtos divulgados,
mas apenas os enunciados verbais sugerindo
o consumo nos blogs.
Os achados sugerem a necessidade de expan-
dir o estudo, observando junto aos(as) reais
leitores(as)/seguidor(as) dos blogs femininos
de moda, se há algum impacto das publica-
ções em seu comportamento de consumidor.
18 Termo ulizado para fazer referência às mulheres vanguardistas e por possuírem essa caracterísca despertariam o interesse de
outras pessoas em ter um eslo de vida similar. Disponível em: hp://www.mileybr.com/blog-de-moda-dicas-como-ser-uma-it-girl/.
19 O curso de Mídias Sociais Digitais, ou como é apelidado “curso para ser blogueira” é o primeiro curso voltado para a formação
prossional de blogueiros(as) no mundo. Disponível em: hp://www.belasartes.br/cursos/?curso=midias-sociais-digitais.
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COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5
77
Hélder Lima Gusso
Hélder Lima Gusso
Universidade Federal de Santa Catarina
helder.gusso@ufsc.br
Desaos ao Analista do
Comportamento no Campo
Organizacional Brasileiro
The Challenges of the Behavior Analyst
in the Brazilian Organizaonal Field
Resumo
A diversidade e qualidade de trabalhos realizados
por analistas do comportamento no campo das or-
ganizações têm crescido. Ainda assim, há desafios a
serem enfrentados pelos interessados em atuar em
organizações a partir das contribuições da Análise do
Comportamento. Neste capítulo, são apresentados 12
desafios que precisam ser examinados para maxi-
mizar as chances de que intervenções profissionais
produzam resultados significativos para trabalha-
dores, organizações e sociedade. Os desafios são: (1)
formação em Análise do Comportamento; (2) forma-
ção em Administração; (3) inserção em uma comu-
nidade verbal; (4) desconhecimento sobre Análise do
Comportamento nas organizações; (5) uso indiscri-
minado do termo comportamental; (6) (ab)uso de
técnicas sem análise funcional do comportamento;
(7) solicitações que não caracterizam problemas exis-
tentes; (8) validação social; (9) papel de gestores na
determinação dos problemas; (10) uso de delineamen-
tos experimentais; (11) demonstração dos resultados
produzidos; e (12) divulgação dos serviços.
Abstract
The work carried out by behavior analysts in the
organizational field has been growing in diversity
and quality. Nevertheless, there are challenges to
be faced by people interested in performing their
work based on Organizational Behavior Management.
This chapter presents 12 challenges that need to be
addressed to maximize the chances of professional
interventions producing significant results for
workers, organizations and society. The addressed
challenges are as follows: (1) training in behavior
analysis; (2) training in management; (3) insertion in
a verbal community; (4) unfamiliarity with Behavior
Analysis in organizations; (5) indiscriminate use of
the concept of behavior; (6) (ab)use of techniques
without functional analysis of behavior; (7) requests
that do not describe existing problems; (8) social
validation; (9) the role of managers in identifying
problems; (10) use of experimental designs; (11)
statement of outcomes and (12) learning how to
disclose services in a clear manner.
PALAVRAS-CHAVE
Análise do Comportamento nas organizações;
Psicologia organizacional e do trabalho;
Gestão do comportamento organizacional.
KEYWORDS
Organizaonal Behavior Management;
Behavior Analysis in organizaons;
Industrial and organizaonal psychology.
78
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso
Os interessados em Análise do Comportamento
que já tiveram a oportunidade de folhear
livros sobre “comportamento organizacio-
nal” (e.g. Robbins, 2011) ou “teoria geral da
administração” (e.g. Araujo, 2010) devem
sentir dupla surpresa. A primeira é com a alta
frequência com que “abordagens comporta-
mentais” são mencionadas nesses livros. A
segunda, é a total falta de relação entre o que
é denominado “comportamental” no âmbito
da Administração com aquilo que estudamos
em Análise do Comportamento.
No âmbito internacional, há literatura dis-
ponível para orientar os interessados em
Análise do Comportamento sobre como ma-
nejar contingências para promover melhores
condições de saúde, segurança e satisfação de
trabalhadores, promover a qualidade e pro-
dutividade nos processos organizacionais e
gerir comportamentos nos diferentes níveis
hierárquicos (operacional, tático e estratégi-
co) da organização para produzir sua função
social (missão) na sociedade. Entretanto, há
desafios que precisam ser superados pelos
interessados em trabalhar de modo coerente
com os fundamentos, conceitos e procedi-
mentos da Análise do Comportamento no
campo organizacional brasileiro. Conhecer
os principais desafios que os profissionais
que atuam na área enfrentam pode ser útil
para avaliar possíveis formas de lidar com
tais desafios com mais precisão.
O interesse pelo trabalho com Análise do
Comportamento nas organizações tem cres-
cido, assim como a quantidade de trabalhos
debatidos nos encontros científicos da área
nos últimos anos. Esse crescimento parece
ter relação direta com algumas ações orga-
nizadas entre pesquisadores e profissionais
atuantes nesse campo.
Em 2010, por iniciativa dos associados da
Associação Brasileira de Psicologia e Medicina
Comportamental (ABPMC), Marcelo José
Machado, Elen Gongora Moreira e Lívia
Godinho Aureliano, foi criado o Grupo Especial
de Interesse em OBM (sigla para a expressão
inglesa Organizational Behavior Management,
utilizada para designar trabalhos no campo).
Desde então, o grupo realiza reuniões duran-
te os encontros anuais da ABPMC. Entre as
ações empreendidas pelo grupo estão a cria-
ção de uma biblioteca virtual de publicações
em língua portuguesa (disponível em: http://
obmbrasil.wordpress.com) e a organização do
I Encontro Brasileiro de OBM (Alo & Gusso,
2016). A lista de publicações nacionais sobre
OBM apresentadas na biblioteca sinaliza cres-
cimento na quantidade de publicações e na di-
versidade de temas examinados nos trabalhos.
Especificamente quanto à formação profissio-
nal nas instituições de ensino no País, ainda
são escassos os contextos nos quais são possí-
veis de se obter acesso a disciplinas, tanto nos
níveis de graduação quanto de pós-graduação,
que estabeleçam relações entre o trabalho no
campo organizacional e as contribuições da
Análise do Comportamento. Exemplos de ins-
tituições em que recorrentemente há registros
de produção de teses, dissertações, trabalhos
de conclusão de curso e estágios profissio-
nais no campo são Centro Paradigma, PUCSP,
UEL, UFG-Catalão, UFPA, UFPR, UFSC, UnB
e Universidade Positivo. Uma das possíveis
explicações para a baixa frequência de locais
79
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso
com disciplinas em OBM talvez seja a pequena
quantidade de publicações que possam orien-
tar professores analistas do comportamento
a inserir tópicos sobre o campo de atuação
organizacional nas disciplinas de Análise do
Comportamento Aplicada, bem como a pe-
quena quantidade de publicações que possam
orientar professores de psicologia organiza-
cional a lecionar sobre as contribuições espe-
cíficas da Análise do Comportamento nesse
campo de atuação da psicologia.
Neste capítulo, é apresentado um breve exame
de 12 desafios enfrentados pelos analistas do
comportamento interessados em atuar no
campo das organizações, e também são des-
tacadas sugestões de possíveis condutas para
lidar com esses desafios. Estes, aqui listados,
foram identificados a partir da atuação direta
do autor no campo profissional, predominan-
temente nos campos de consultoria externa
e de treinamentos ao longo dos últimos dez
anos, e do exame das situações vivenciadas
por seus alunos em suas atividades de está-
gio em diferentes tipos de organizações sob
supervisão em perspectiva analítico-compor-
tamental, ao longo dos últimos oito anos. Os
desafios aqui identificados foram os mais re-
correntes ao longo dos anos. Talvez parte dos
desafios listados possam não ser os mesmos
de outras regiões do País e, diante disso, pe-
dimos ao leitor que avalie cuidadosamente
no que e o quanto cada desafio apresentado o
auxilia a lidar com as situações específicas da
rotina na organização na qual está inserido.
O que é descrito não tem pretensão de ser um
exame preciso e representativo das condições
de trabalho de todos os analistas do com-
portamento nas organizações do país, mas
apenas de fornecer algumas dicas para lidar
com situações semelhantes as quais o autor
já se defrontou. O que nos faz imaginar que
há generalidade nas situações descritas são os
debates que decorreram da apresentação sobre
o tema no encontro anual da ABPMC em 2014,
e em outros eventos científicos e profissionais
nos quais tais aspectos foram examinados.
O primeiro desafio é a dificuldade de
acesso à formação básica em Análise do
Comportamento, em grande parte do País,
que possibilite derivar intervenções profis-
sionais compatíveis com o adjetivo analítico-
comportamental. Os conceitos, fundamentos,
processos e procedimentos da Análise do
Comportamento não são simples termos a
serem adotados e repetidos, mas um sistema
conceitual que precisa ser compreendido para
viabilizar, planejar, projetar, executar, ava-
liar e aperfeiçoar intervenções profissionais
com alto potencial de produzir mudanças
significativas na vida das pessoas e das or-
ganizações (Botomé, Kubo, Mattana, Kienen
& Shimbo, 2003). Uma forma de lidar com
essa lacuna é estabelecer contingências que
lhe mantenham em constante estudo e aper-
feiçoamento: criar ou participar de grupos
de estudos, cursos, palestras, participar do
Encontro anual da ABPMC e de Jornadas de
Análise do Comportamento (JACs). A história
recente de proliferação das JACs pelo Brasil
sinaliza que esse é um caminho possível
quando há mobilização mesmo em contextos
com poucas oportunidades formais de ensino.
Para os interessados em OBM que tiveram
oportunidades de formação em Análise do
Comportamento, o problema costuma ser
80
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso
outro: a falta de formação no mundo dos
negócios. Aprender a falar “a língua” dos
administradores e, principalmente, com-
preender os fenômenos organizacionais,
avaliar as implicações de diferentes tipos de
sistemas produtivos no comportamento dos
trabalhadores, aprender a ler organogramas
e identificar variáveis relevantes para anali-
sar os sistemas de relações comportamentais
entre trabalhadores e entre departamentos é
de grande importância. Dagen (2016) apre-
senta interessante relato sobre sua formação
para atuar em OBM, descrevendo que, como
estudante de pós-graduação em Análise do
Comportamento e interessado em organiza-
ções, sabia que as ciências comportamentais
poderiam ser muito úteis, mas não iden-
tificava no que, especificamente, poderia
contribuir às pessoas e às organizações. A
sugestão de Dagen (2016) aos analistas do
comportamento interessados em OBM e com
pouca formação na área de negócios é que
estudem, ao menos um ano, as publicações
de alguma revista de negócios (e.g. Revista
de Administração de Empresas, Revista de
Administração Contemporânea, Revista Exame).
Ao estudar, identifique ao menos uma subá-
rea de interesse para aperfeiçoar seus estu-
dos (e.g. segurança no trabalho, rotatividade,
planejamento estratégico). A partir disso,
que estabeleça as relações entre os proces-
sos descritos nas revistas de negócios com o
conhecimento na Análise do Comportamento,
identificando maneiras de contribuir para
melhorar as condições existentes nas organi-
zações. Tais indicações parecem promissoras.
Um desafio mais específico, mas de igual im-
portância, é a dificuldade de criar ou participar
de uma comunidade verbal entre pessoas
interessadas em OBM. Se a quantidade de
analistas do comportamento em determinada
região ou instituição já for pequena, ainda
menor será a de interessados especificamen-
te no campo organizacional. Felizmente as
novas tecnologias possibilitaram meios de
conectar pessoas geograficamente distan-
tes. Nesse sentido, vale a pena se inserir nas
comunidades já existentes, e participar das
reuniões do Grupo Especial de Interesse em
OBM na ABPMC e na comunidade on-line do
Grupo (disponível em: facebook.com/groups/
obmbr) pode contribuir nesse sentido.
Outros desafios estão relacionados a aspec-
tos mais específicos do trabalho nas organi-
zações. O primeiro refere-se ao fato de que
a maioria dos gestores não faz ideia do que
seja Análise do Comportamento ou no que ela
pode ajudar (Smith, 2016). É possível con-
tribuir para disseminar informações sobre a
OBM, aumentando seu reconhecimento pú-
blico em função dos resultados já demons-
trados na literatura científica. Alguns meios
promissores para isso podem ser: participar
de eventos empresariais divulgando a área,
escrever para revistas e jornais de negócios,
divulgar resultados de intervenções para
público empresarial e esclarecer ou corrigir
informações inadequadas disseminadas em
meios de comunicação.
Também relacionado ao desconhecimento das
contribuições da Análise do Comportamento
no contexto das organizações está o uso in-
discriminado do termo comportamental como
adjetivo de técnicas, procedimentos, inter-
venções e testes de qualquer tipo. Há uma
81
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso
quantidade significativa de profissionais
que prestam serviços de variados tipos, com
embasamento (ou falta dele) em variados
conhecimentos de outros sistemas psicoló-
gicos ou mesmo sem vínculo nenhum com
a psicologia, e que qualificam o que fazem
como comportamental. Um exemplo de uso
indevido é a qualificação de alguns testes
de personalidade como comportamentais,
e não psicológicos, para evitar as exigên-
cias do Conselho Federal de Psicologia sobre
testes psicológicos. A justificativa apresen-
tada para isso, segundo profissionais em
mercado que vendem esses testes, é que se o
teste é comportamental não seria psicológico.
Embora tal situações possa eliciar respon-
dentes fortes em analistas do comporta-
mento, consideramos que não adianta brigar
com gestores que contratam tais “soluções”
ditas comportamentais. Gestores buscam so-
luções aos problemas organizacionais, e as
soluções disponíveis em mercado, muitas
vezes, vendem sonhos (ilusões?) de mudan-
ças rápidas e efetivas com baixo custo de
resposta. Gestores não costumam estar sob
controle dos rótulos ou adjetivos utilizados
para nomear as propostas de intervenção que
adotam. Parece-nos mais produtivo que, se
queremos que o termo comportamental, ou
analítico-comportamental, seja utilizado para
qualificar intervenções profissionais emba-
sadas no Behaviorismo Radical e na Análise
do Comportamento, precisamos: (a) tornar
tais intervenções acessíveis (como gestores
podem acessar tais recursos?); (b) investir
na divulgação de informações acerca do que
caracteriza uma intervenção como compor-
tamental para profissionais de diferentes
campos que atuam em organizações; e, por
fim, (c) apoiar-nos na acreditação oferecida
pela ABPMC como forma de gradualmente
ganharmos legitimidade perante os demais
profissionais nas empresas.
Um problema ainda mais específico é que al-
gumas das intervenções e dos procedimen-
tos desenvolvidos no âmbito da Análise do
Comportamento hoje são comercializados
no País por profissionais sem nenhum tipo
de formação em Análise do Comportamento,
correndo o risco de reduzir procedimentos
que envolvem analisar funcionalmente con-
tingências de reforçamento à mera replicação
de técnicas de forma descontextualizada.
No campo da segurança comportamental no
trabalho, é possíve observar um exemplo
claro. A sigla BBS – da expressão Behavior-
based Safety –, bastante conhecida mundial-
mente entre profissionais de segurança no
trabalho, é um tipo de contribuição específica
oriunda da Análise do Comportamento para
prevenção de acidentes e promoção de saúde
em contextos organizacionais sobre a qual
há extensa produção internacional de artigos
e livros. No Brasil, a prestação de serviços
para implantar BBS nas indústrias tem sido
feita por diversas empresas de consulto-
ria, nas quais, salvo raras exceções, não há
profissionais com formação em Análise do
Comportamento. Tal fato pode ser identifi-
cado analisando os currículos dos profissio-
nais dessas empresas. Parece ser de grande
importância evidenciar que intervenções de
base analítico-comportamental não podem
ser reduzidas a pacotes de técnicas sem a
análise precisa das variáveis, das quais os
comportamentos são função. Nesse sentido,
82
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso
evidenciar as práticas de fundamentação
analítico-comportamental como de nosso
campo de domínio torna-se relevante, bem
como a divulgação das características dessas
práticas para que outros profissionais possam
identificar critérios para avaliar a adequação
e qualidade dos serviços oferecidos em mer-
cado. Parece-nos pertinente, também nesse
contexto, nos apoiarmos na acreditação da
ABPMC e na divulgação de sua importância
como um possível critério para que empresá-
rios possam avaliar se prestadores de serviço
possuem embasamento para prestar serviços
orientados pela Análise do Comportamento.
Outro tipo de problema são as solicitações e
demandas pouco caracterizadas que chegam
ao analista do comportamento. Esse é um
problema com o qual qualquer consultor pre-
cisa lidar no campo organizacional (Mager,
2001). Precisamos de uma pesquisa de clima...
precisamos de um trabalho motivacional...
precisamos integrar a equipe... São exemplos
de demandas rotineiras que ouvimos
nesse campo de atuação. Somando a essas
demandas imprecisas a constante exigência
de produzir resultados rapidamente, é alto o
risco de que profissionais atendam demandas
apresentadas, sem antes partir de um exame
claro e preciso das situações-problema com
as quais se defronta. Partir para a intervenção
sem partir de uma precisa caracterização da
situação-existente (leia-se: caracterização
da história de contingências que controlam
os comportamentos-problema) não costuma
produzir resultados consistentes e duradouros.
Parece ser papel do profissional contratado
pela empresa esclarecer ao contratante
a necessidade de caracterizar bem o que
acontece como condição para a execução de
uma intervenção que efetivamente resolva os
problemas. Não se trata de esquivar ou não
lidar com os problemas, mas de dimensioná-
los precisamente para a produção de melhores
resultados. Um belíssimo exame da distinção
entre as demandas apresentadas ao psicólogo
e a caracterização precisa das necessidades
que devem ser objeto de intervenção foi
apresentado por Botomé (1981) a partir da
experiência no trabalho junto à Secretaria
de Saúde do município de São Paulo, na
reestruturação do serviço de saúde oferecido à
população. No exame apresentado pelo autor,
é destacado o quanto as demandas de quem
tem poder (o chefe, o legislador) podem não
ser coerentes com as necessidades daqueles
que serão vítimas da intervenção profissional
(trabalhadores, população), demandando ao
psicólogo o exame das variáveis envolvidas
para que seu trabalho seja orientado para a
produção de benefícios predominantemente
àqueles que sofrerão os efeitos da intervenção,
e não o mero exercício de poder ou dominação.
Outro desafio de grande relevância na atua-
ção em organizações é a importância de que
as intervenções sejam apoiadas pelas pes-
soas envolvidas nos processos de mudanças.
Espera-se que intervenções produzam resul-
tados continuamente, mesmo após a saída
de quem conduz a intervenção. Infelizmente,
a maior parte dos programas nas organiza-
ções parece falhar em longo prazo por serem
abandonados assim que o “consultor” sai
de cena. Não parece ser possível promover
mudanças com resultados perpetuados no
longo prazo sem o engajamento das pesso-
as envolvidas. Esse engajamento parece ser
83
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso
melhor produzido quando as pessoas apoiam
as intervenções, notando mais benefícios (re-
forçadores de diferentes tipos e intensidades)
do que investimentos (tempo, recursos, des-
gaste) e tendo a oportunidade de participar
nas decisões sobre os encaminhamentos dos
processos de mudança. O termo validação
social tem sido utilizado para indicar o quanto
as pessoas que são afetadas direta ou indire-
tamente por intervenções apoiam aquilo que
é executado. Isso parece ser um bom preditor
sobre o engajamento das pessoas na manu-
tenção de mudanças implantadas. Vanstelle et
al. (2012) identificaram que 20% dos relatos
de intervenção em OBM apresentavam indi-
cadores de validação social, enquanto apenas
10,5% das publicações no campo da psicolo-
gia organizacional e do trabalho no mesmo
período apresentavam tal preocupação. Isso
explicita o reconhecimento já existente na
comunidade de analistas do comportamen-
to para a importância desse fenômeno na
promoção de resultados duradouros após a
implantação de intervenções.
Um importante desafio ao analista do com-
portamento decorre da ênfase que damos no
exame das variáveis ambientais, das quais o
comportamento é função. Esse tipo de po-
sicionamento no contexto das organizações
orienta o profissional a analisar as contin-
gências dispostas pelos gestores da organiza-
ção aos grupos de trabalhadores, sob a forma
de recursos, ambientes e condições para
trabalhar, descrição de processos e regras
de conduta, valorização de certos tipos de
comportamentos em detrimento de outros
etc. Em síntese, quem tem papel de gerencia-
mento em uma organização dispõe de poder
sobre o controle dos comportamentos dos
trabalhadores. Nesse sentido, embora tipica-
mente as demandas por intervenções venham
sob a forma de solicitações de mudanças no
comportamento dos trabalhadores, aquilo
que efetivamente precisa ser modificado é o
comportamento daqueles que têm poder de
alterar as contingências do ambiente organi-
zacional. Costumeiramente, há pouca aber-
tura por parte de gestores nas organizações
para reconhecer o próprio comportamento
como parte do problema. Negar a própria
participação na determinação daquilo que
acontece na empresa parece cumprir o papel
de esquivar-se da responsabilidade sobre os
problemas existentes.
O mesmo tipo de problema já foi examinado
em contexto social mais amplo por Holland
(1983), ao evidenciar a responsabilidade da
própria sociedade sobre as escolhas e oportu-
nidades que cada indivíduo apresenta, seja em
direção a comportamentos ditos disruptivos,
antiéticos, ou aqueles considerados de alto
valor social. Em nossa experiência lidando
com esse problema, identificamos três con-
dutas que parecem facilitar que gestores as-
sumam sua responsabilidade na determinação
das condições de trabalho de suas equipes e
se envolvam de maneira mais ativa no enca-
minhamento de mudanças. A primeira delas,
analogamente à promoção de validação social
junto aos trabalhadores, é envolver os gesto-
res em todas as etapas da análise dos proble-
mas existentes, facilitando que gradualmen-
te, passo a passo, estabeleçam relações entre
os problemas de desempenho e as diretrizes
ou políticas de gerenciamento que adotam.
Outra forma é, sempre que possível, iniciar
84
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso
as análises dos problemas pelas variáveis de
nível organizacional ou estratégico, passando
pelo exame dos processos de trabalho para,
apenas então, iniciar a análise de problemas
de desempenho específicos. O exame da di-
mensão mais ampla (nível organizacional)
em direção aos problemas específicos facilita
compreender como as decisões estratégicas
(políticas da empresa) afetam as dimensões
mais específicas (nível de desempenho ou de
comportamento). A literatura em OBM tem
produzido material farto sobre Análise de
Sistemas Comportamentais (BSA, na sigla
em inglês) que orienta bem nesse sentido
(Brache & Rummler, 1994; Diener, McGee &
Miguel, 2009).
Por fim, e indicado apenas em situações
mais extremas (e com alto risco de se perder
o emprego!), podemos utilizar um pouco de
controle aversivo, geralmente tornando a
resposta de esquivar mais aversiva do que
encarar diretamente o problema.
Há dois desafios metodológicos que a própria
formação em Análise do Comportamento nos
impõe. Mais do que um aplicador de técni-
cas, um analista do comportamento aplicado
é responsável por analisar e sintetizar pro-
cessos comportamentais (construir ou alterar
relações entre variáveis) utilizando, quando
possível e necessário, procedimentos prio-
ritariamente de base experimental visando
demonstrar no que e o quanto as intervenções
propostas produzem mudanças no contexto,
no comportamento e na vida das pessoas. A
autoexigência de intervir produzindo dados
que ajudem a avaliar os resultados de nosso
trabalho durante e após as intervenções
fazem parte de nossa história como analistas
aplicados do comportamento. Nesse sentido,
aprender a intervir profissionalmente pro-
duzindo dados sobre a ação que se realiza
demanda constante atualização em meto-
dologia científica, no método experimental
e nos delineamentos de sujeito único. Para
isso, sugerimos fortemente o estudo de obras
de referência nesse sentido (e.g. Johnston &
Pennypacker, 2009; Sidman, 1976), além do
constante estudo de artigos com relatos de
intervenção (e.g. artigos publicados no JOBM)
para avaliar os delineamentos propostos por
outros profissionais da área em seus contex-
tos de atuação.
O segundo desafio metodológico, relacionado
ao primeiro, é a exigência de exame e avaliação
dos resultados produzidos em cada intervenção
profissional. Um diferencial importante possí-
vel aos profissionais com formação em Análise
do Comportamento que atuam no campo or-
ganizacional é o estabelecimento de medidas
que indiquem as mudanças não apenas em
termos de satisfação das pessoas, mas também
em frequência de comportamentos relevantes,
medidas de produtos de comportamentos e,
com apoio de contadores, cálculo de retorno
sobre o investimento. Investir na formação
dos trabalhadores, em melhores condições de
trabalho e em sistemas de gerenciamento do
comportamento organizacional mais efetivos
não produz apenas mudanças no bem-estar,
na saúde e segurança dos trabalhadores, mas
também impacta na qualidade e produtivi-
dade, produzindo resultados relevantes nas
organizações. Gestores costumam ser muito
orientados por intervenções que demons-
trem resultados claros. E isso é uma grande
85
COMPORTAMENTO
EM FOCO VOL. 5 Hélder Lima Gusso
oportunidade aos analistas do comportamento
já acostumados com delineamentos experi-
mentais de sujeito único.
Por fim, o último desafio: aprender a concor-
rer com as fadas administrativas que dominam
o mundo da Administração quando o assunto é
comportamento humano. O termo fada admi-
nistrativa foi apresentado por Daniels (1994)
para descrever os modismos que surgem
fazendo grande alarde, são amplamente di-
vulgados e simplesmente desaparecem após
poucos anos – milhares de reais investidos
em cursos, livros, formações, programas de
educação corporativa que não levam ninguém
à lugar algum. O problema é que as fadas
administrativas carecem de fundamentos e
evidências que demonstrem qualquer tipo de
benefício duradouro. As fadas administrati-
vas parecem perpetuar, por entrarem em um
contexto de grande demanda (desespero para
promover desempenho), de maneiras rela-
tivamente simples e sob forma de discursos
ou atividades atraentes e sedutoras. Gostar
de um treinamento sobre algo não implica
em dizer que esse algo terá alguma utilidade
ou produzirá algum benefício. Talvez tenha-
mos algo a aprender com as fadas. Talvez as
soluções com base em evidências empíricas,
tal como parte daquilo que é feito por ana-
listas do comportamento nas organizações,
precise ganhar melhor “roupagem” ou, em
outros termos, ser falado em uma língua
mais acessível para aqueles que deveriam nos
ouvir. Se as pessoas não sabem dos poten-
ciais benefícios do trabalho em OBM, talvez
sejamos também parte do problema em não
nos comunicarmos de maneira clara. O sonho
talvez seja transformar práticas baseadas
em evidências e com consistência filosófica
e metodológica no novo objeto de desejo no
mundo corporativo. Por que não trabalhar
nessa direção?
O conhecimento produzido no âmbito da
Análise do Comportamento possibilita produ-
zir mudanças nos processos comportamentais
constituintes das organizações, que podem
contribuir para a melhoria das condições de
saúde, segurança e satisfação dos trabalhos,
qualidade e produtividades nos processos
organizacionais, e maximizar a produção da
função social (missão) dos diferentes tipos de
organizações na sociedade. Viabilizar o uso
dessas contribuições dependerá, em grande
parte, do repertório dos próprios analistas
do comportamento em divulgar essas con-
tribuições e em prestar serviços de alto grau
de qualidade à sociedade, evidenciando no
que, e o quanto, tais contribuições avançam
para além das práticas habituais correntes no
contexto das organizações.
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