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Rev. Virtual Quim. |Vol 8| |No. 1| |130-140|
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Artigo
Plantas Oleaginosas Amazônicas: Química e Atividade
Antioxidante de Patauá (Oenocarpus bataua Mart.)
Hidalgo, P. S. P.; Nunomura, R. C. S.; Nunomura, S. M.*
Rev. Virtual Quim., 2016, 8 (1), 130-140. Data de publicação na Web: 4 de janeiro de 2016
http://rvq.sbq.org.br
Amazon Oilseeds: Chemistry and Antioxidant Activity of Patawa (Oenocarpus bataua
Mart.)
Abstract: The Amazon oilseeds, especially from native palm trees are significant species belonging to the
Amazon landscape and culture. The Amazon species produce oil with great potential to generate
valuable medicines, cosmetics, nutraceuticals and energy. The Oenocarpus bataua (patawa) is an edible
species and from its fruits is produced the “vinho de patauá”, a well-known beverage, considered very
nutritive and energetic. Fresh fruits collected nearby Manaus-AM, were separated into peel, pulp and
seeds. The methanolic extracts from pulp and seeds were evaluated in different antioxidant assays and
both extracts were considered active. The seed extract showed antioxidant activity compared to the
positive control (quercetin) in the radical scavenging-DPPH assay. The pulp extract were fractionated
guided by TLC-antioxidant analysis that led to the isolation of the stilbene, piceatannol. This is the first
report of an isolated compound from patawa. Piceatannol is considered a bioactive compound and in
some cases was considered more active than resveratrol, a well-known bioactive compound. These
results showed the great potential of patawa to produce nutraceutical products.
Keywords: FRAP; DPPH; phenolics; stilbenes.
Resumo
As espécies oleaginosas amazônicas e em especial oriundas de palmeiras nativas fazem parte das
paisagens e da cultura amazônica. Os óleos amazônicos possuem grande potencial na geração de
produtos medicinais, cosméticos, nutracêuticos e na geração de energia. A espécie Oenocarpus bataua
(patauá) é uma espécie comestível, a partir de seus frutos se extrai o “vinho de patauá”, que é bastante
nutritivo e energético. Frutos inteiros foram coletados nas proximidades de Manaus-AM e separados em
cascas, polpa e sementes. Os extratos metanólicos da polpa e das sementes foram avaliados em
diferentes ensaios de atividade antioxidante e ambos os extratos foram considerados ativos. Do extrato
da polpa, foi realizado um isolamento monitorado por cromatografia em camada delgada para
substâncias antioxidantes, que levou ao isolamento do estilbeno, piceatanol. Esse é o primeiro relato de
isolamento de um produto natural de patauá. O piceatanol possui propriedades farmacológicas
descritas, algumas inclusive superiores ao resveratrol, um antioxidante bem conhecido. Esse resultado
demonstra o grande potencial do patauá na geração de um bioproduto nutracêutico.
Palavras-chave: FRAP; DPPH; fenólicos; estilbenos.
* Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Coordenação de Tecnologia e Inovação, Avenida André
Araújo, 2936, CEP 69067-375, Petrópolis, Manaus-AM, Brasil.
smnunomu@inpa.gov.br
DOI: 10.5935/1984-6835.20160009
Volume 8, Número 1
Revista Virtual de Química
ISSN 1984-6835
Janeiro-Fevereiro 2016
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Rev. Virtual Quim. |Vol 8| |No. 1| |130-140|
Plantas Oleaginosas Amazônicas: Química e Atividade
Antioxidante de Patauá (Oenocarpus bataua Mart.)
Patrícia S. P. Hidalgo,a Rita de Cássia S. Nunomura,a Sergio M.
Nunomurab,*
a Universidade Federal do Amazonas, Instituto de Ciências Exatas, Departamento de Química.
Avenida General Rodrigo Otávio Jordão Ramos, 3000, CEP 69077-000, Japiim, Manaus-AM,
Brasil.
b Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Coordenação de Tecnologia e Inovação,
Avenida André Araújo 2936, CEP 69067-375, Petrópolis, Manaus-AM, Brasil.
* smnunomu@inpa.gov.br
Recebido em 3 de janeiro de 2016. Aceito para publicação em 3 de janeiro de 2016
1. Introdução
1.1. A espécie Oenocarpus bataua Mart. (patauá)
2. Materiais e métodos
2.1. Coleta de patauá
2.2. Preparação de extratos orgânicos
2.3. Análise de fenólicos totais
2.4. Análise da atividade antioxidante pela capacidade de sequestro do radical livre
DPPH
2.5. Análise da atividade antioxidante pela capacidade redutora de Ferro (III) (FRAP)
2.6. Análise da atividade antioxidante por cromatografia em camada delgada (CCD)
2.7. Isolamento da substância antioxidante (piceatanol)
2.8. Elucidação estrutural por RMN e EM de alta resolução
3. Resultados e Discussão
4. Conclusões
1. Introdução
A busca de novas fontes de óleos vegetais
tem sido de grande interesse nas últimas
décadas, não apenas para a indústria
alimentícia. Na indústria cosmética, os óleos
são empregados como umectantes,
emolientes, emulsificantes e agentes
modificadores de viscosidade.1 Os ácidos
graxos assim como seus derivados ésteres
podem ser usados em uma variedade de
aplicações relacionadas aos cuidados
pessoais. Os ácidos mirístico, palmítico,
esteárico, linoleico e linolênico são muito
comuns em certos tipos de cosméticos como
sabões e shampoos, enquanto outros ácidos
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graxos possuem propriedades
rejuvenescedoras ou curativas.2
Os óleos vegetais têm também
despertado o interesse do homem pelo seu
potencial nutracêutico. Os óleos vegetais são
apontados como uma importante fonte de
lipídios benéficos à saúde. Estudos revelaram
que nas regiões onde existe um maior
consumo de azeite de oliva, existe uma
menor incidência de câncer de mama.3
As propriedades nutracêuticas das
espécies oleaginosas não se restringem
apenas a sua composição lipídica, mas
também à presença de outras substâncias,
normalmente denominadas de matéria
insaponificável, que possuem propriedades
biológicas importantes. Por exemplo, no óleo
de oliva são as substâncias fenólicas
presentes que são responsáveis pela sua
propriedade cardioprotetora.3 Dentre as
substâncias bioativas que podem ser
encontradas nos óleos vegetais estão
incluídas algumas vitaminas, que exercem
ação protetora contra a evolução de
processos degenerativos que conduzem às
doenças e ao envelhecimento precoce com
destaque para as vitamina C (ácido
ascórbico), vitamina E (tocoferóis) e β-
caroteno (que é um dos precursores da
vitamina A), os quais estão presentes em
diversas espécies oleaginosas. Essas
substâncias antioxidantes são extremamente
importantes na diminuição dos efeitos
maléficos dos radicais livres gerados em
processos oxidativos em nosso metabolismo.4
A região amazônica possui várias espécies
oleaginosas, com destaque para as palmeiras
nativas, algumas das quais são responsáveis
por alguns dos mais belos cenários da
floresta amazônica como são os babaçuais ou
Mata de Cocais, formados por espécimens de
babaçu, os buritizais por espécimens de
buruti e os açaizeiros por espécimens de açaí.
A flora Amazônica possui uma rica
biodiversidade que é refletida na diversidade
de constituintes químicos isolados de suas
espécies vegetais. As espécies oleaginosas
amazônicas possuem muito poucos estudos
de caracterização da composição química e
normalmente é restrita a caracterização da
cadeia graxa dos óleos e gorduras. O nosso
grupo de pesquisa busca de forma
sistemática, estudar os óleos produzidos por
espécies oleaginosas nativas, procurando
descrever o seu potencial na produção de
produtos cosméticos, medicinais,5
alimentícios ou nutracêuticos6 e na geração
de energia.7 Muitas dessas palmeiras
possuem frutos comestíveis como é o caso da
bacaba (Oenocarpus bacaba), patauá
(Oenocarpus bataua), buriti (Mauritia
flexuosa) e a pupunha (Bactris gasipaes).8 As
espécies de frutos amazônicos que são
consumidos pelas populações locais são ricos
em gordura insaturada, composta
principalmente pelos ácidos oleico e
linoleico, que aumentam os níveis de HDL e
diminuem os níveis de LDL no organismo
humano, possuindo propriedades
cardioprotetoras.9,10 Esses frutos também
apresentam composição notável de
micronutrientes, especialmente de vitaminas,
sendo valorizados no contexto atual como
alimentos saúde;4 alimentos naturais ou
ainda como produtos éticos ou
ecologicamente corretos. Contudo existem
poucos estudos químicos que procuram
descrever esses constituintes.
1.1. A espécie Oenocarpus bataua Mart.
(patauá)
Uma espécie oleaginosa amazônica e
comestível muito conhecida na região é a
espécie patauá, considerada uma das plantas
úteis mais utilizadas pela comunidade
indígena na Amazônia. É uma palmeira
monocaule, com 4 a 26 m de altura,
largamente distribuída na Amazônia
brasileira, tanto em floresta úmida de várzeas
e de galeria, como inundáveis como de terra
firme. É considerada uma espécie
‘‘oligárquica’’, cuja população natural produz
cerca de onze toneladas de frutos/ha/ano,
podendo gerar rendas substanciais e
ecologicamente sustentáveis. A polpa do
fruto é empregada para produzir o chamado
“vinho de patauá”, que é bastante nutritivo e
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energético. Desse vinho extrai-se um óleo
que pode substituir o azeite de oliva na
culinária, por ter sabor e composição química
semelhante. O mesocarpo (polpa) de
Oenocarpus bataua é rico em lipídios com
51,6 % de peso seco. Em 2010, Montúfar e
colaboradores8 descreveram 15 ácidos graxos
identificados em amostras oriundas de
diversas localidades, sendo que para o óleo
de patauá amazônico, eles descrevem os
ácidos oleico (77,7%) e palmítico (13,2%)
como os componentes majoritários e juntos
perfazem aproximadamente 90% do
conteúdo total de ácidos graxos. Outros
componentes em quantidades menores são o
ácido linoleico (2,7%), ácido esteárico (3,6%),
ácido palmitoleico (0,6%) e ácido α-linolênico
(0,6%). Devido ao alto conteúdo de ácido
oleico, comparável ao do azeite de oliva, os
frutos de patauá são uma ótima fonte de
óleo monoinsaturado. De acordo com
Montúfar e colaboradores,8 o óleo de patauá
apresenta 368 mg de esteroides por kg de
óleo, sendo 34,2% de β-sitosterol, 27,8% de
Δ5-avenasterol, 19,2% de estigmasterol, 7,2
% de campesterol, 6,0% de campestanol e
3,4% de colesterol. Possui ainda 2,4 mg de
carotenoides (β-caroteno) por kg de óleo, e
1.700 mg de tocoferóis por kg de óleo.
A composição nutricional foi descrita por
Aguiar e colaboradores em 1980,11 que
relataram que a polpa de patauá possuía 35,6
% de umidade e em 100 g de polpa seca
foram determinados 3,3 g de proteína, 12,8 g
de gordura, 47,2 g de carboidratos, 1,1 g de
cinzas e 31,5 g de fibras. Cada 100 g de polpa
correspondem a 317,2 Kcal de energia
consumida.
A polpa do fruto tem usos medicinais no
controle da queda de cabelo, caspa,
bronquite e tuberculose, a maceração dos
frutos é utilizada no tratamento da malária.8
Recentemente, Rezaire e colaboradores,12
realizando um estudo com espécimens
coletados na Guiana Francesa, com um
extrato obtido por ultrassom da polpa
liofilizada com uma mistura de acetona e
água, também observaram significativa
atividade antioxidante da amostra. Nesse
mesmo estudo, a partir de estudos realizados
pela técnica de UPLC-API-IT-MSn, os autores
identificaram de forma preliminar várias
substâncias fenólicas como fenilpropanóides,
antocianinas e estilbenos. Dentre os
estilbenos, foram identificados o resveratrol
e possíveis derivados hidroxilados do
resveratrol, como o piceatanol. Contudo essa
identificação não foi realizada de forma
conclusiva e os resultados são citados pelos
próprios autores como dados preliminares.
O trabalho realizado foi motivado pelo
limitado número de trabalhos relacionados
com a confirmação da atividade antioxidante
dos frutos e em suas diferentes partes, bem
como o isolamento de constituintes
antioxidantes presentes nos frutos de patauá.
2. Materiais e métodos
2.1. Coleta de patauá
A coleta dos frutos de patauá (Oenocarpus
bataua) foi realizada em dois períodos: em
outubro de 2007 e posteriormente foi
necessária nova coleta para término do
trabalho em agosto de 2010, na Reserva
Florestal Adolpho Ducke, localizada a 34 Km
de Manaus (AM). A espécie estudada de
patauá foi encontrada em um terreno
arenoso. Foram coletados 500 frutos, foram
selecionados e acondicionados em freezer a -
18 ⁰C e posteriormente foram descascados e
despolpados manualmente separando-se as
cascas, a polpa e as sementes.
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Figura 1. Frutos de patauá coletados na Reserva Adolpho Ducke
2.2. Preparação de extratos orgânicos
Tanto a polpa quanto a semente de cada
um dos frutos foram secas em estufa a 60 °C
e o teor percentual de água (42,2%) foi
medido. A polpa e semente (separadamente)
foram extraídas por extração sólido-líquido
contínua em Soxhlet com n-hexano (3 x 6 h) e
a seguir extraídas com metanol (3 x 6 h). Os
extratos foram concentrados em
rotaevaporador em temperaturas inferiores a
40⁰C.
2.3. Análise de fenólicos totais
A determinação do teor de fenólicos totais
foi realizada por meio de espectroscopia na
região do visível utilizando o método de
Folin-Ciocalteau13 com calibração externa
utilizando ácido gálico como padrão de
referência. Foram transferidos 200 μL da
amostra para frascos âmbar e adicionou-se
1,5 mL do reagente Folin-Ciocalteau (10,0 %
m/v, em água Milli-Q). Após cinco minutos,
foram adicionados 1,5 mL de solução tampão
de bicarbonato de sódio (6,0 % m/v). As
amostras foram incubadas durante 90
minutos em ausência de luz. A absorbância
foi medida em espectrofotômetro UV/Visível
Femto 800XI a 725 nm. Como branco utilizou-
se água Milli-Q. As análises foram realizadas
em triplicata.
2.4. Análise da atividade antioxidante
pela capacidade de sequestro do radical
livre DPPH
A análise da capacidade de sequestro de
radicais livres foi feita utilizando o método de
Blois modificado por Brand-Williams.14 Foi
preparada uma solução de DPPH (2,2-difenil-
1-picril hidrazil) a 0,2 mg/mL em metanol. No
ensaio, 2,5 mL de cada amostra foram
adicionados a 1,0 mL da solução de DPPH. A
absorbância de cada solução foi lida a 518
nm, após 30 minutos de incubação na
ausência de luz. O cálculo da atividade
antioxidante foi realizado com base na
fórmula:
%CS = 100 – (Aamostra – Abranco) x 100
Acontrole
O branco utilizado foi o metanol puro e o
controle a absorbância da amostra analisada.
Para a determinação do CS50 foi construído
um gráfico do %CS vs. concentração com
diferentes diluições para cada amostra. A
quercetina foi utilizada como controle
positivo, que apresentou CS50 = 6,5 µg/mL.
2.5. Análise da atividade antioxidante
pela capacidade redutora de Ferro (III)
(FRAP)
O método FRAP (“ferric
reducing/antioxidant power assay”), descrito
Hidalgo, P. S. P. et al.
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por Benzi e colaboradores em 1996,15
determina a atividade antioxidante pela
medida da capacidade redutora de íons de
Fe3+ para Fe2+ com o auxílio do agente
complexante de [2,4,6-tri(2-piridil)-1,3,5-
triazina] (TPTZ). O reagente FRAP é uma
solução contendo FeCl3 20 mM, TPTZ 10 mM
e tampão ácido acético/acetato de sódio 0,3
M pH 3,6 na proporção 1:1:10. No ensaio, a
100 μL da amostra foram adicionados 300 μL
de água Milli-Q, seguido de 3,0 mL do
reagente complexante FRAP. Após 4 minutos
de incubação à temperatura ambiente, foi
feita a leitura da absorbância em
espectrofotômetro Femto 800 XI a 593 nm. A
calibração foi feita com base numa curva de
calibração com diferentes concentrações de
Fe2SO4. Os valores foram expressos em mM
de Fe2+ por g de peso seco de extrato.
2.6. Análise da atividade antioxidante por
cromatografia em camada delgada (CCD)
Todos os extratos metanólicos foram
analisados por CCD usando quercetina como
padrão positivo. As cromatoplacas foram
eluídas em CHCl3: MeOH (8:2) e após
secagem, foram nebulizadas com reveladores
específicos. Para indicação da presença de
fenólicos foi utilizado o FeCl3 como revelador
(coloração azul esverdeada indicando a
presença de fenólicos ) e para a atividade
antioxidante foi utilizado uma solução de
DPPH na concentração de 1 mg/mL como
revelador, onde o aparecimento de manchas
amarelas sob fundo de coloração púrpura
indicou a atividade antioxidante nas
amostras.
2.7. Isolamento de uma substância
antioxidante (piceatanol)
O extrato metanólico de patauá (14,0 g)
foi solubilizado em MeOH: H2O (3:7), e a
seguir foi particionado com (3 x 200 mL) de
hexano, logo a seguir foi particionado com (3
x 200 mL) de clorofórmio e por último (3 x
200 mL) com acetato de etila. Cada fração foi
concentrada em rotaevaporador em
condições brandas.
Todas as frações foram analisadas através
de placas de CCD, quanto à atividade
antioxidante, utilizando-se DPPH como
reagente revelador para o isolamento de
substâncias antioxidantes. As frações
também foram reveladas com reagente FeCl3
para a detecção de fenólicos.
A fração AcOEt apresentou a maior
quantidade de componentes antioxidantes
em placas de CCD, bem como a maior
quantidade de compostos fenólicos de
acordo com reagente FeCl3, por isso a fração
AcOEt (1,75 g) foi submetida a uma
separação em coluna aberta de Sephadex LH-
20 de 50 cm de altura e 3 cm de diâmetro,
eluída com metanol. Foram coletadas oito
frações de 150 mL. A fração 05 (123,2 mg) foi
então submetida a uma coluna de sílica
(Merck 0,045-0,055 mm) com uma altura de
13 cm e diâmetro de 1,5 cm. Foram coletadas
trinta frações de 10 mL, que foram depois
reunidas em oito frações. A fração 6 continha
uma substância antioxidante e pura por CCD,
na forma de um sólido amorfo de cor
marrom clara com massa de 7,0 mg, que foi
encaminhada para análises por RMN e EM de
alta resolução.
2.8. Elucidação estrutural por RMN e EM
de alta resolução
Os espectros de ressonância magnética
nuclear de hidrogênio (RMN 1H) e carbono
(RMN 13C e DEPT 135) foram registrados no
Centro de Biotecnologia da Amazônia (CBA),
utilizando-se espectrômetro Inova-500 da
Varian operando a 500 MHz. Os
deslocamentos químicos foram registrados
em partes por milhão (ppm) tendo como
referência o sinal do solvente (CD3OD).
Os espectros de massas de alta resolução
foram obtidos num aparelho microTOF II da
marca Bruker Daltonics da Faculdade de
Ciências Farmacêuticas da USP-RP. A amostra
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foi diluída em acetonitrila e analisa por
injeção direta, no modo positivo, com uma
fonte ESI, tendo como calibrante uma
mistura de formiato de sódio.
3. Resultados e discussão
Os frutos foram despolpados e o
percentual de casca, polpa e sementes foi
determinado. Em seguida, as polpas e as
sementes, após secas, foram extraídas com
hexano e metanol para a realização dos
ensaios antioxidantes e isolamento
fitoquímico. Os resultados são apresentados
na tabela 1.
O resultado obtido é semelhante ao
anteriormente publicado por Cavalcante em
199616 que descreveu um percentual de
casca de 17,2%, polpa 18,1% e semente
64,6%.
Os extratos metanólicos obtidos foram
então submetidos à determinação de
fenólicos totais e da atividade antioxidante
com os reagentes de DPPH e FRAP, cujos
resultados são apresentados na tabela 2.
Tabela 1. Composição percentual dos frutos e de extratos hexânicos e metanólicos
Fruto
Partes do
fruto
Massa
fresca (g)
Percentual
(%)
Ext Hex
(%)
Ext. MeOH
(%)
Patauá
20 frutos
Inteiro
264,6
-
-
-
Polpa
31,35
13,15
14,20
19,90
Casca
46,22
17,46
-
-
Semente
169,1
63,87
0,18
9,87
Tabela 2. Resultados da dosagem de fenólicos totais e da atividade antioxidante de extratos
metanólicos de patauá
Parte
Fenólicos totais (µg/mL)
FRAP (µM de Fe2+)
DPPH (CS50 µg/ mL)
Polpa
72,200 ± 0,004
584,9 ± 5,3
115,00 ± 0,11
Semente
245,000 ± 0,005
1.791,4 ± 3,2
7,0 ± 0,1
Observou-se uma forte correlação entre a
presença de substâncias fenólicas e a
atividade antioxidante medida tanto pela
capacidade redutora de Fe (III) como pelo
sequestro de radicais de DPPH. O extrato
metanólico de sementes apresentou elevado
teor de fenólicos totais e maior capacidade
redutora de Fe (III), isto é, maior atividade
antioxidante, bem como menor concentração
capaz de sequestrar 50% de radicais de
DPPH. O valor de sequestro de radicais de
DPPH apresentado pelo extrato de sementes
foi comparável ao observado para o padrão
de quercetina (CS50 = 6,5 µg/mL), indicando a
significativa atividade para essa parte dos
frutos.
Contudo os extratos obtidos de sementes
são normalmente ricos em taninos, que são
responsáveis também pelas elevadas
atividades antioxidantes observadas. Além
disso, a parte comestível do patauá, de onde
se extrai o vinho de patauá, é a polpa. Em
razão disso, decidiu-se investigar as
substâncias antioxidantes presentes no
extrato metanólico da polpa.
O fracionamento do extrato metanólico
da polpa, envolveu análise por CCD com
reveladores específicos como FeCl3 indicativo
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de substâncias fenólicas e de DPPH para
substâncias antioxidantes. E posteriormente
técnicas cromatográficas como coluna em
permeação em gel e adsorção em gel de
sílica, desta maneira foi possível isolar 7,0 mg
de uma substância pura que foi identificada
como sendo o piceatanol, 3,3’,4,5’-trans-
tetrahidroxiestilbeno ou 4-[(1E)-2-(3,5-
dihidroxifenil)etenil]-1,2-benzenodiol. Esta é
a primeira substância isolada de Oenocarpus
bataua, uma vez que não foram encontrados
trabalhos publicados na literatura acerca do
isolamento de substâncias dessa espécie.
H
H
OH
OH
OH
OH
2
4
6
2´
5´
6´
Figura 2. Estrutura do 3,3’,4,5’-trans-tetrahidroxiestilbeno,
piceatanol, isolado da polpa de patauá
O espectro de RMN de 1H da substância
isolada apresenta somente sinais
característicos de hidrogênios aromáticos e
olefínicos. Os dados de deslocamentos
químicos e constantes de acoplamento foram
comparados aos dados encontrados na
literatura para o piceatanol e apresentados
na tabela 3.
Tabela 3. Atribuição dos deslocamentos químicos de RMN 1H do piceatanol isolado e
comparado com dados da literatura17
H
Dados obtidosa
Dados da literaturab
H
mult. (J, Hz)
H
Mult. (J, Hz)
H-2, H-6
6,43
d (2,0)
6,51
d (2,0)
H-4
6,16
t (2,0)
6,25
t (2,0)
H-β
6,89
d (16,0)
6,91
d (16,1)
H-α
6,74
d (16,0)
6,80
d (16,1)
H-2’
6,97
d (2,0)
7,05
d (1,9)
H-5’
6,73
d (8,0)
6,79
d (8,1)
H-6’
6,83
dd (2,0; 8,0)
6,81
dd (1,9, 8,1)
a 500 MHz, CD3OD; b 200 MHz; CD3COCD3.
Na região dos hidrogênios aromáticos e
vinílicos, observa-se um dubleto em δH 6,97
que foi atribuído ao H-2’, que apresenta
constante de acoplamento igual a 2,0 Hz
concernente ao acoplamento em meta com
H-6’. O duplo dubleto em δH 6,83 foi
atribuído ao H-6’, que possui constantes de
acoplamento de 2,0 Hz e 8,0 Hz, referente ao
acoplamento em meta com H-2’ e em orto
com H-5’, respectivamente. Em δH 6,73, têm-
se um dubleto que foi atribuído ao H-5 com
constante de 8,0 Hz. Em δH 6,43 um dubleto
Hidalgo, P. S. P. et al.
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referente aos hidrogênios H-2 e H-6,
homotópicos devido à simetria desse anel no
eixo C1-C4, com constantes de acoplamento
de 2,0 Hz pelo acoplamento em meta com H-
4. O H-4 é representado por um tripleto em
δH 6,16 com constante de acoplamento de
2,0 Hz. O hidrogênio Hβ apresenta um
dubleto em δH 6,89 com constante de
acoplamento igual a 16,0 Hz com o
hidrogênio Hα com δH 6,74, indicando uma
configuração (E) para a ligação dupla.
Foram obtidos também espectros de RMN
13C e de DEPT 135, cuja análise permitiu a
atribuição completa dos sinais, que está
apresentada na tabela 4.
Tabela 4. Atribuição dos deslocamentos químicos de RMN 13C do piceatanol isolado e
comparado com dados da literatura17.
C
C obtidoa
C literaturab
C-1
141,3
140,7
C-2, C-6
105,8
105,5
C-3, C-5
159,6
159,5
C-4
102,6
102,5
C-β
129,7
129,6
C-α
127,0
126,8
C-1’
131,3
132,9
C-2’
113,8
113,7
C-3’
146,5
146,2
C-4’
146,4
146,0
C-5’
116,4
116,1
C-6’
120,2
119,8
a125 MHz, CD3OD; b50,1 MHz, CD3COCD3.
O espectro de massas obtido no modo
positivo da substância isolada apresentou um
pico em m/z 245,0817 referente ao aduto
formado ([M+H]+), correspondente à fórmula
molecular C14H12O4 com erro experimental de
3,5%. Verificou-se também a presença do
pico em m/z 267,0624 referente ao aduto de
sódio ([M+Na]+), que corresponde com um
erro experimental de 1,4%. Todos esses
resultados permitem confirmar o isolamento
do piceatanol da polpa de patauá.
O piceatanol teve sua estrutura
confirmada em 1963 por Cunninghan e
colaboradores18 e possui uma estrutura
análoga ao resveratrol, apesar de ser muito
menos estudado e de apresentar várias
atividades biológicas. Em dois artigos de
revisão publicados por Pietrowska e
colaboradores19 e Tang & Chan20 são
apresentados estudos farmacológicos do
piceatanol, como antitumoral, antioxidante e
anti-inflamatório e prevenção de doenças
cardiovasculares confirmando o grande
potencial nutracêutico do patauá. Em outro
estudo, Corcova-Gomez e colaboradores21,
observaram que o piceatanol possui maior
atividade de sequestro de radicais peroxila do
que o próprio resveratrol, confirmando o
grande potencial antioxidante do piceatanol.
Hidalgo, P. S. P. et al.
139
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4. Conclusões
A polpa de patauá apresentou forte
atividade antioxidante e concentração de
fenólicos totais com destaque para as
sementes. A partir do extrato metanólico da
polpa foi possível fazer um estudo de
isolamento de substâncias antioxidantes que
resultou no isolamento do piceatanol.
Considerando ainda as propriedades
farmacológicas já descritas para o piceatanol,
os frutos de patauá possuem um potencial
uso nutracêutico ainda inexplorado.
Agradecimentos
Esse trabalho foi financiado pelo fundo
CT-Amazônia-CNPq. Os autores também
agradecem ao CNPq, CAPES-FAPEAM pelas
bolsas concedidas e dedicam esse trabalho
ao Prof. Raimundo Bráz-Filho, que dedicou a
sua vida à Química de Produtos Naturais no
Brasil.
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