Content uploaded by Celine Melo
Author content
All content in this area was uploaded by Celine Melo on Apr 18, 2016
Content may be subject to copyright.
ARTIGO
Columba livia e Pitangus sulphuratus como indicadoras
de qualidade ambiental em área urbana
Suélen Amâncio1,2, Valéria Barbosa de Souza2 e Celine Melo2
Rua Rio Grande do Sul, 1087, 38400-650, Uberlândia, MG, Brasil. E-mail: suelenbio24@yahoo.com.br
Laboratório de Ornitologia e Bioacústica, Instituto de Biologia, Universidade Federal de Uberlândia. Rua Ceará, s/n, 38400-902, Uberlândia,
MG, Brasil. E-mails: valerybsouza@yahoo.com.br e celinemelo@gmail.com
Recebido em: 15/06/2007. Aceito em: 04/03/2008.
ABSTRACT: Columba livia and Pitangus sulphuratus as environmental indicators in urban areas. Biological communities
have been widely used to evaluate environmental impacts and, in urban areas, they are important instruments to determine the
environmental quality of this ecosystem. The main goal of this work was to study the potential of the Columba livia and Pitangus
sulphuratus as bioindicators of urban environmental quality, and thus, evaluate the influence of this environment in the ecology
of these species. Six neighborhoods in Uberlândia, Minas Gerais, Brazil, were selected for this research and four observation spots
were established in each neighborhood. The data was collected during the following intervals: 7:00-9:00, 12:00-14:00 and 16:00-
18:00. Each interval was sampled twice a season (twice in the wet season and twice during the dry season), totalizing 144 h. The
researched areas were characterized according to the level of urbanization and the intensity of flow of both vehicles and people.
Columba livia can be considered as a bioindicator of negative environmental quality because it was more abundant in areas with
high flow of vehicles and people. Pitangus sulphuratus, although common in urban areas, wasn’t considered a good bioindicator of
urban environmental quality because no correlation was found with the your abundance and human direct intervention and not
with the level of impact areas.
KEYWORDS: bioindicator, urban environment, Columba livia, Pitangus sulphuratus.
RESUMO: A utilização de comunidades biológicas para avaliação de impactos ambientais vem sendo amplamente difundida, e
no ambiente urbano é uma ferramenta útil na determinação da qualidade ambiental desse ecossistema. O objetivo do trabalho
foi determinar o potencial de Columba livia e Pitangus sulphuratus como bioindicadores de qualidade ambiental urbana, e assim,
avaliar a interferência deste ambiente nas populações das espécies estudadas. Foram selecionadas seis áreas em Uberlândia (MG),
com quatro pontos cada. As coletas ocorreram nos horários de 7:00-9:00, 12:00-14:00 e 16:00-18:00. Cada intervalo foi amostrado
duas vezes por estação (chuvosa e seca), totalizando 144 h. Foi realizada a caracterização das áreas quanto à urbanização, fluxo de
veículos e pessoas. Columba livia pode ser considerada uma bioindicadora de qualidade ambiental negativa, pois foi encontrada em
maior abundância em áreas com alta movimentação de pessoas e veículos. Pitangus sulphuratus mesmo sendo comum no ambiente
urbano não foi considerada bioindicadora de qualidade ambiental urbana, pois não foi encontrada correlação de sua abundância com
a intervenção humana direta nem com o nível de impacto das áreas.
PALAVRASCHAVE: bioindicação, ambiente urbano, Columba livia, Pitangus sulphuratus.
1.
2.
mutum-do-nordeste (Mitu mitu) e arara-azul-pequena
(Anodorhynchus glaucus)].
O processo de urbanização ocorre de forma acele-
rada e como conseqüências têm-se efeitos intensivos e
localizados que provocam profundas alterações nos siste-
mas naturais e na paisagem original das cidades e, con-
sequentemente, nos padrões de qualidade ambiental do
meio urbano. Dessa forma, em face às ações antrópicas, a
vegetação natural desaparece gradativamente dos centros
urbanos e cede lugar à paisagem construída (Pereira et al.
2005).
Mendonça-Lima e Fontana (2000) afirmaram que,
em decorrência às essas mudanças, muitos animais, prin-
cipalmente as aves, têm encontrado refúgios para sua so-
brevivência em áreas urbanas como praças, bosques, par-
A Região Sudeste vem sendo historicamente desma-
tada, onde a cobertura florestal do estado de Minas Gerais
foi reduzida a 2% do original (Andrade 1997). A redução
da cobertura florestal a fragmentos pequenos tem trazido
conseqüências negativas para a avifauna (Marini 1996)
como a diminuição no número de espécies mais especia-
lizadas, e manutenção em sua maioria, das generalistas
(D’Angelo Neto et al. 1998).
De acordo com Marini e Garcia (2005) as interven-
ções humanas afetaram, significativamente, as espécies de
aves que habitam os ecossistemas naturais brasileiros. A
resposta das aves a essas alterações varia desde aquelas que
se beneficiaram com as alterações do habitat e aumenta-
ram suas populações [p. ex., bem-te-vi (Pitangus sulphu-
ratus)], até aquelas que foram extintas da natureza [p. ex.,
Revista Brasileira de Ornitologia, 16(1):32-37
março de 2008
ques, hortos, cemitérios, que de alguma forma, mantém
um mínimo de arborização. Neste contexto, a arborização
urbana é um dos fatores primordiais a ser contemplado no
planejamento urbano de cidades, pois desempenha neste
ambiente uma referência para qualidade de vida (Pereira
et al. 2005).
A utilização de comunidades biológicas para avalia-
ção de mudanças e impactos ambientais vem sendo am-
plamente difundida, e no ambiente urbano é uma ferra-
menta útil na determinação da qualidade ambiental deste
ecossistema. Muitos grupos animais ou espécies têm sido
propostos como indicadores da qualidade ambiental, po-
rém poucos estudos abordam a questão essencial sobre a
correlação entre o status do indicador e as mudanças nas
variáveis ambientais (Ramos et al. 2006).
As aves são indicadores biológicos interessantes, pois
possuem comportamento conpíscuo, são de fácil e rápi-
da identificação, têm elevada diversidade e especialização
ecológica, são de fácil amostragem, há riqueza de infor-
mações sobre elas e são altamente sensíveis a distúrbios
(Rutschke 1987, Stotz et al. 1996). O conhecimento das
exigências ecológicas de muitas famílias, gêneros e espé-
cies de aves pode ser suficiente em diversas situações para
indicar condições ambientais às quais são sensíveis (Do-
natelli et al. 2004).
Columba livia (Gmelin 1789), “pomba doméstica” foi
introduzida no Brasil no século XVI. É comum em cidades
e fazendas, onde nidifica em construções e edificações hu-
manas. É uma espécie abundante em praças públicas, pois
consome restos de alimento no chão (Sigrist 2006). No
Brasil, gera problemas sanitários pelos dejetos que produz e
pelo seu potencial na transmissão de doenças (Sick 1997).
Pitangus sulphuratus (Linnaeus 1766), “bem-te-vi” é
uma das espécies mais comuns em quase todo o Brasil,
ocorrendo em diversos tipos de ambientes, inclusive ur-
banos. Possui dieta onívora e é agressiva (Sigrist 2006).
Ajusta-se a qualquer meio e descobre facilmente novas
fontes de alimentos (Sick 1997).
Segundo Matarazzo-Neuberger (1995), as aves são
partes significativas da fauna urbana, e com o crescimento
acelerado das cidades, torna-se importante o estudo da
ecologia desses organismos neste ecossistema. Muitos le-
vantamentos já foram realizados nestes ambientes (Argel-
de-Oliveira 1995, Franchin e Marçal Júnior 2002, 2004),
porém na região tropical pouca atenção tem sido dada aos
estudos envolvendo as respostas da avifauna aos processos
de urbanização (Reynaud e Thioulouse 2000, Marzluff
et al. 2001, Lim e Sodhi 2004).
O objetivo do trabalho foi realizar uma estimativa
populacional de duas espécies comuns em ambientes ur-
banos (Columba livia e Pitangus sulphuratus) e determinar
quais são os fatores que interferem na abundância e distri-
buição dessas aves, e a partir destes, avaliar o potencial de
serem indicadoras da qualidade (positiva ou negativa) em
ambientes urbanos.
MÉTODOS
O trabalho foi realizado entre os meses de junho de
2006 e março de 2007 no ambiente urbano do município
de Uberlândia, MG (18°52’34”S; 48°15’21”O), que está
inserido no domínio do Cerrado (lato sensu) (Araújo et al.
1997). O clima na região apresenta sazonalidade eviden-
te com verão chuvoso (outubro a março) e inverno seco
(abril a setembro) (Rosa et al., 1991).
Foram amostrados 24 pontos distribuídos igualmen-
te em seis áreas. Os quatro pontos de cada área estavam a
uma distância mínima de 100 m, para diminuir a sobre-
posição entre eles. Estas áreas foram escolhidas de acordo
com o grau de urbanização, fluxo de pessoas e de veículos
que conjuntamente resultaram em três níveis distintos
(baixo, médio e alto) de qualidade ambiental. Para cada
nível foram amostradas duas áreas.
O grau de urbanização foi classificado em nível 1,
quando a área construída e/ou pavimentada era de até
30%; nível 2, quando possuía de 30% a 70% de área
construída e/ou pavimentada; e em nível 3, para áreas
com 100% de construção e/ou pavimentação.
Os fluxos de veículos e pessoas foram registrados nos
três períodos de coleta de dados (07:00-09:00, 12:00-
14:00 e 16:00-18:00 h), totalizando 72 h. Para fluxo de
pessoas, estimado em número de indivíduos por hora, fo-
ram considerados os seguintes níveis: 1) quando inferior
a 100; 2) entre 100 e 300; e 3) superior a 300. O fluxo de
veículos, mensurado em número de veículos por hora, foi
classificado em: 1) se inferior a 200; 2) entre 300 e 600; e
3) quando superior a 600.
Em cada ponto, os parâmetros foram medidos seis
vezes, e para a classificação das áreas quanto ao nível de
impacto foram calculadas as médias dos três parâmetros
(urbanização, fluxo de veículos e pessoas) (Tabela 1).
A abundância de cada espécie foi obtida pelo núme-
ro de indivíduos contatados em cada ponto, em um raio
de cobertura de aproximadamente 20 m. As observações
foram em seções de 15 minutos, cobrindo três intervalos
horários: 7:00-9:00, 12:00-14:00 e 16:00-18:00 h. Cada
intervalo horário foi amostrado duas vezes por estação
TABELA 1: Caracterização prévia das áreas estudadas de acordo com
os parâmetros urbanização, fluxo de veículos e pessoas.
TABLE 1: Characterization of the studied areas according to the level
of urbanization, intensity of flow of both vehicles and people.
Impacto Bairros
Média dos parâmetros:
urbanização, fluxo de
veículos e pessoas
Baixo Morada da Colina (B1) 1,6
Alto-Umuarama (B2)
Médio Tabajaras (M1) 2,21
Santa Mônica (M2)
Alto Centro (A1) 2,34
Taiamam (A2)
Columba livia e Pitangus sulphuratus como indicadoras de qualidade ambiental em área urbana
Suélen Amâncio, Valéria Barbosa de Souza e Celine Melo 33
Revista Brasileira de Ornitologia, 16(1), 2008
(chuvosa e seca) nas áreas. Assim, foram feitas 24 h por
área, totalizando 144 horas de observação.
Para as análises, foi feita a média horária de indivídu-
os registrados por espécie, fluxo de veículos e de pessoas,
levantados nos oito pontos de cada nível de impacto. O
teste de normalidade utilizado foi Shapiro-Wilk. O Co-
eficiente de Correlação de Pearson (r) foi utilizado para
correlacionar a abundância das espécies e o fluxo de veí-
culos e de pessoas. O Teste Kruskal-Wallis (H) foi reali-
zado para verificar se havia diferença na abundância das
espécies de acordo com o horário. O Teste de Mann-Whi-
tney (Z) foi calculado para constatar se ocorreu diferença
na abundância de cada espécie entre as duas estações es-
tudadas. Qui-Quadrado (χ2) foi calculado para constatar
se existiu diferença na abundância das espécies de acordo
com o nível de impacto. Utilizou-se o software BioEstat
3.0 (Ayres et al. 2003).
RESULTADOS
Todas as áreas apresentaram o mesmo padrão para
fluxo de veículos, nas quais as maiores intensidades fo-
ram entre 12:00-14:00 e 16:00-18:00 h. Nas áreas com
alto impacto, o fluxo de pessoas foi mais intenso entre
07:00-09:00 e 12:00-14:00 h, enquanto que para áreas
de médio e baixo impacto foi entre 07:00-09:00 e 16:00-
18:00 h (Figura 1).
As áreas com alto impacto apresentaram eleva-
da abundância de Columba livia em ambas as estações,
seca e chuvosa (Figura 2). Sua abundância foi correla-
cionada positiva e significativamente ao fluxo de pesso-
as (r = 0,862; gl = 16; p = 0,000) e veículos (r = 0,924;
gl = 16; p = 0,000). A população de C. livia não sofreu
flutuação acentuada, e consequentemente não apresentou
variação significativa entre as duas estações seca e chuvosa
nas áreas estudadas (Z = 0,4804; U = 15; p = 0,631).
Em cada área, C. livia apresentou um padrão dife-
renciado de horário de atividade. Nas áreas com baixo
impacto, foi mais abundante entre 12:00-14:00 h, en-
quanto que em áreas com médio e alto impacto concen-
trou sua atividade nos horários de 07:00-09:00 e 16:00-
18:00 h (Figura 3). Para C. livia foi possível constatar
diferença significativa na abundância de acordo com os
horários estudados nas duas estações (H = 15,9708; gl =
5; p = 0,0069) e sua abundância foi maior em áreas de
alto impacto tanto na estação seca (χ2 = 209,09; gl = 2;
p = 0,00) e quanto na chuvosa (χ2 = 129,92; gl = 2;
p = 0,00).
Pitangus sulphuratus não sofreu influência da sazona-
lidade, mantendo padrão similar de sua abundância entre
as estações (Z = 1,0408; U = 11,5; p = 0,298). Não hou-
ve diferença na sua abundância entre os níveis de impacto
das áreas na seca (χ2 = 3,49; gl = 2; p = 0,174) quanto na
chuva (χ2 = 4,89; gl = 2; p = 0,087) (Figura 2).
FIGURA 1: Fluxo de veículos e pessoas nas áreas com diferentes níveis
de impacto de acordo com o horário.
FIGURE 1: Vehicles and people flow in areas with different levels of
impact in accordance with the schedule.
FIGURA 2: Abundância (N/hora) de Columba livia e Pitangus
sulphuratus na estação seca e chuvosa pelo nível de impacto das áreas.
FIGURE 2: Columba livia and Pitangus sulphuratus abundance (N/
hour) in the dry and rainy season for the level of impact in areas
FIGURA 3: Abundância (N/hora) de Columba livia na estação seca e
chuvosa por horário.
FIGURE 3: Columba livia abundance (N/hour) in the dry and rainy
season in accordance with the schedule
Columba livia e Pitangus sulphuratus como indicadoras de qualidade ambiental em área urbana
Suélen Amâncio, Valéria Barbosa de Souza e Celine Melo
34
Revista Brasileira de Ornitologia, 16(1), 2008
Na estação seca, P. sulphuratus apresentou maior ati-
vidade no início da manhã e final de tarde, enquanto na
chuvosa, foi observado um declínio nos registros ao lon-
go dia (Figura 4). Embora não tenha ocorrido diferença
na abundância entre os horários (H = 10,4886; gl = 5;
p = 0,0625) foi observada uma tendência a concentrar ati-
vidade no início da manhã. Diferente de C. livia, a abun-
dância de Pitangus sulphuratus não foi correlacionada sig-
nificativamente ao fluxo de pessoas (r = -0,1168; gl = 16;
p = 0,6445) e veículos (r = -0,179; gl = 16; p = 0,4772).
DISCUSSÃO
A urbanização altera a composição da comunidade
de aves, pois aumenta o sucesso de espécies que apresen-
tam relações específicas com o homem e diminui para
aquelas que necessitam de habitats naturais (Anjos e La-
roca 1989, Donnely e Marzluff, 2006). A estrutura do
ambiente urbano pode influenciar a distribuição e abun-
dância da avifauna, e fatores como grau de urbanização,
arborização e fluxos de veículos e pessoas podem ser os
principais indicativos desta influência.
Alguns estudos já foram realizados para compreender
a interferência da urbanização sobre a avifauna neste tipo
de ambiente, e a conseqüência mais imediata é a redução
da diversidade em zonas de maior antropização (Mata-
razzo-Neuberger 1995, Argel-de-Oliveira 1995, Men-
donça-Lima e Fontana 2000, Blair 1996; Clergeau et al.
2001, Donnely e Marzluff, 2006, Torga et al. 2007).
As cidades, independente de sua localização geográ-
fica, seguem um padrão em sua estrutura. Geralmente,
bairros mais periféricos possuem um menor grau de área
construída e vegetação mais similar àquela encontrada
em áreas naturais, enquanto os bairros centrais possuem
grande quantidade de prédios, pouca arborização e eleva-
do número de pessoas (Jokimäm e Suhonen 1993; Rey-
naud 1995, Reynaud e Thioulouse 2000).
No presente trabalho, foi possível verificar que esta
estrutura influencia o tamanho populacional de espécies
de aves comuns neste ambiente como Columba livia e Pi-
tangus sulphuratus. Columba livia foi registrada em maior
abundância em áreas com alto índice de urbanização
(presença de pessoas, prédios, resíduos e movimentação
de veículos), pois depende diretamente dos produtos dis-
ponibilizados pelo homem (Anjos e Loroca 1989, Gibbs
et al. 2001, Rose et al. 2006). Pitangus suphuratus parece
não depender do grau de urbanização, pois foi mais en-
contrado em áreas com baixo e médio impacto.
Para as duas espécies estudadas não foi possível
constatar flutuação populacional durante o ano. Segundo
Jokimäm e Suhonen (1993, 1998), no ambiente urbano
não existe uma evidente variação em relação à oferta de
recursos entre as estações, como ocorre em ambientes na-
turais. Isto proporciona a possibilidade das espécies pre-
sentes nestas áreas, manterem suas populações com baixas
flutuações durante o ano.
A distribuição das aves no ambiente urbano está di-
retamente relacionada com as respostas individuais das es-
pécies à heterogeneidade ambiental destes locais. O ajuste
das espécies ocorre, provavelmente, por razões de sobrevi-
vência como, por exemplo, Columba livia, que é favoreci-
da pela oferta abundante de abrigo e alimento e ausência
de predadores (Nunes 2003, Donnely e Marzluff, 2006).
Alguns trabalhos realizados em áreas temperadas (Buijs
e Wijnen, 2004, Rose et al. 2006, Savard et al. 2000) e
tropicais (Anjos e Loroca 1989) confirmaram a correlação
positiva entre o aumento populacional de C. livia e a alta
densidade populacional humana, edificações e resíduos
orgânicos.
Em áreas temperadas, C. livia era encontrada em
ambientes naturais, sua dieta baseava-se em grãos, folhas
verdes e ocasionalmente invertebrados. Sua nidificação
ocorria em áreas rochosas litorâneas, porém com o avanço
da urbanização e a perda de habitat, conseguiu ajustar-se
ao ambiente urbano e atualmente é dependente direta da
presença humana e explora todas as vantagens destas áreas
(Gibbs et al. 2001, Polomino e Carrascal 2006).
De acordo com Emlen (1974), Columba livia e Pas-
ser domesticus não são afetadas pela alta urbanização, pois
são gregárias e despendem baixo custo na defesa e ma-
nutenção de território, podendo assim, ser encontradas
de forma abundante em centros urbanos. Um estudo de
controle e manejo realizado em ambiente urbano na Eu-
ropa mostrou que C. livia nidifica preferencialmente em
áreas próximas aos locais utilizados para alimentação, ge-
ralmente regiões centrais e comerciais (Rose et al. 2006).
Pitangus sulphuratus, mesmo sendo uma espécie
comum em áreas urbanas (Sigrist 2006), não apresen-
ta correlação entre o número de indivíduos e os fatores
analisados, fluxo de veículos e pessoas, que consistem em
FIGURA 4: Abundância (N/hora) de Pitangus sulphuratus na estação
seca e chuvosa por horário.
FIGURE 4: Pitangus sulphuratus abundance (H/hour) in the dry and
rain season in accordance with the schedule.
Columba livia e Pitangus sulphuratus como indicadoras de qualidade ambiental em área urbana
Suélen Amâncio, Valéria Barbosa de Souza e Celine Melo 35
Revista Brasileira de Ornitologia, 16(1), 2008
uma interferência humana direta. Lim e Sodhi (2004)
mostraram que em regiões tropicais, as espécies onívoras
geralmente, não se aproveitam de restos de alimentos pro-
duzidos pela ação antrópica, mas sim de novas fontes de
recursos disponibilizados nas áreas urbanizadas.
Ruszczyk et al. (1987) realizaram um estudo em
Porto Alegre (RS) que verificou a influência do gradien-
te urbano no padrão de distribuição de oito espécies,
incluindo Pitangus sulphuratus, e constataram que esta
possuía distribuição em todo o ambiente urbano, sendo
mais abundante nas proximidades do centro da cidade.
Este fato não foi detectado no presente estudo, possivel-
mente pela diferença na estrutura e localização das duas
cidades.
A presença de um gradiente urbano possibilita uma
ampla variedade ambiental, com diferenças na oferta de
recursos e estrutura física (Blair 1996, Torga et al. 2007).
Esta instabilidade ecológica resulta em padrões de ativida-
des diversificadas entre as áreas e horário estudados para
uma mesma espécie, pois cada setor da cidade possui ca-
racterísticas próprias. Em áreas de alto impacto, C. livia
demonstrou que sua atividade e abundância estão correla-
cionadas à presença humana (Anjos e Loroca 1989), isto
pôde ser evidenciado em horários de pico de movimenta-
ção de pessoas.
Em regiões tropicais, poucos trabalhos são realizados
para demonstrar a capacidade das aves como indicadoras
ambientais (Rutschke 1987, Donatelli et al. 2004, Ramos
et al. 2006), sendo importante a realização de estudos da
constante interferência humana nas áreas urbanas sobre as
populações das aves. As duas espécies estudadas são exem-
plos de aves que se ajustaram ao meio urbano e, mes-
mo sendo comuns nestes ambientes podem ser utilizadas
como indicadoras de qualidade ambiental urbana.
Este estudo demostrou que Columba livia, em am-
biente urbano, pode ser considerada uma espécie indi-
cadora de qualidade ambiental negativa, pois as áreas
com maior nível de interferência antrópica suportam
altas populações, sendo dependentes dos recursos produ-
zidos pelo homem para sua sobrevivência. Este fato foi
bem visualizado nas áreas com alto impacto. Pitangus
sulphuratus não pode ser considerada uma bioindicadora
de qualidade ambiental urbana, pois não foi encontrada
correlação de sua abundância com a intervenção humana
direta (fluxo de pessoas e veículos) e nem entre os níveis
de impacto das áreas.
AGRADECIMENTOS
Somos gratas a: Oswaldo Marçal Júnior; Everton T. Pedroso,
Cyntia A. Arantes e Zélia da P. Pereira pelas críticas ao manuscrito. A
Carlos E. R. Tomé pela revisão do Abstract. Ao CNPq pela bolsa de
Iniciação Científica concedida à primeira autora durante o desenvolvi-
mento deste e à FAPEMIG pelo apoio na divulgação em evento. Aos
corretores anônimos pelas pertinentes críticas e sugestões.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Andrade, M.A. (1997). A vida das aves. Belo Horizonte: Fundação
Acangaú.
Araújo, G.M.; Nunes, J.J.; Rosa, A.G. e Resende, E.J. (1997).
Estrutura comunitária de vinte áreas de cerrado residuais no
município de Uberlândia, MG. Daphne, 7(2):7-14.
Argel-de-Oliveira, M.M. (1995). Aves e vegetação em um bairro
residencial da cidade de São Paulo (São Paulo, Brasil). Revista
Brasileira de Zoologia, 12(1):81-92.
Anjos, L. dos e Loroca, S. (1989). Abundância relativa e diversidade
específica em duas comunidades urbanas de aves de Curitiba (Sul
do Brasil). Arquivos de Biologia e Tecnologia, 32(4):637-643.
Ayres, M.; Ayres-Junior, M. e Santos, A.S. (2003). BioEstat 3.0:
aplicações estatísticas nas áreas das ciências biológicas e médicas.
Belém: Sociedade Civil Mamirauá.
Blair, R.B. (1996). Land use and avian species diversity along urban
gradient. Ecological Applications 6(2):506-519.
Buijs, J.A. and Wijnen, J.H.V. (2004). Survey of feral rock doves
(Columba livia) in Amsterdam, a bird-human association. Urban
Ecosystems, 5(4):235-241.
Clergeau, P.; Jokimäki, J. and Savard, J.P.L. (2001). Are urban birds
communities influenced by the diversity of adjacent landscape?
Journal of Applied Ecology, 38:1122-1134.
D’angelo-Neto, S.; Venturin, N. e Oliveira-Filho, A.T. (1998). Avifauna
de quarto fisionomias florestais de pequeno tamanho (5-8 ha) no
campos da UFLA. Revista Brasileira de Biologia, 58(3):463-47.
Donatelli, R.J.; Costa, T.V.V. e Ferreira, C.D. (2004). Dinâmica
da avifauna em fragmento de mata na Fazenda Rio Claro,
Lençóis Paulista, São Paulo, Brasil. Revista Brasileira de Zoologia,
21(1):97-114.
Donnelly, R. e Marzluff, J.M. (2006). Relative importance of habitat
quantity, structure, and spatial pattern to birds in urbanizing
environments. Urban Ecosystems, 9:99-117.
Emlen, J.T. (1974). An urban bird community in Tucson, Arizona:
derivation, structure, regulation. Condor, 76:184-197.
Franchin, A.G. e Marçal-Júnior, O. (2002). A riqueza da avifauna
urbana em praças de Uberlândia (MG). Revista Eletrônica
Horizonte Científico, 1(1):1-20.
Franchin, A.G. e Marçal-Júnior, O. (2004). A riqueza da avifauna
do Parque do Sabiá, zona urbana de Uberlândia (MG). Biotemas,
17(1):179-202.
Gibbs, D.; Barnes, E. and Cox, J. (2001). Pigeons and Doves: A guide
to the Pigeons and Doves of the World. New Haven, Connecticut:
Yale University Press.
Jokimäki, J. e Suhonen, J. (1993). Effects of urbanization on the
breeding bird species richness in Finland: a biogeographical
comparison. Ornis Fennica 70:71-77.
Jokimäki, J. and Suhonen, J. (1998). Distribution and habitat
selection of wintering birds in urban environments. Landscape and
Urban Planning, 39:253-263.
Lim, H.C. and Sodhi, N.S. (2004). Responses of avian guilds to
urbanization in a tropical city. Landscape an Urban Planning,
66:199-215.
Marini, M.A. (1996). Menos mata, menos pássaros. Ciência Hoje,
20(1):15-22.
Marini, M.A. e Garcia, F.I. (2005). Conservação de aves no Brasil.
Megadiversidade, 1(1):95-102.
Marzluff, J.M.; Bowman, R. and Donnelly, R. (2001). A historical
perspective on urban bird research: trends, terms, and approaches,
p. 1-17. Em: Marzluff, J. M., R. Bowman e R. Donnelly (ed).
Avian ecology and conservation in an urbanizing world. Boston:
Kluwer Academic Published.
Matarazzo-Neuberger, W.M. (1995). Comunidade de aves de cinco
parques e praças da Grande São Paulo, Estado de São Paulo.
Ararajuba, 3:13-19.
Columba livia e Pitangus sulphuratus como indicadoras de qualidade ambiental em área urbana
Suélen Amâncio, Valéria Barbosa de Souza e Celine Melo
36
Revista Brasileira de Ornitologia, 16(1), 2008
Mendonça-Lima, A. e Fontana, C.S. (2000). Composição, freqüência
e aspectos biológicos da Avifauna de Porto Alegre Country Clube,
Rio Grande do Sul. Ararajuba, 8(1):1-8.
Nunes, V.F.P. (2003). Pombos urbanos: o desafio de controle. Biológico
65(1-2):89-92. http://www. biologico.sp.gov.br/biológico/ (Acesso
em 15/1/2007).
Pereira, G.A.; Monteiro, C.S.; Campelo, M.A. e Medeiros, C. (2005).
O uso de espécies vegetais, como instrumento de biodiversidade
da avifauna silvestre, na arborização pública: o caso do Recife.
Atualidades Ornitológicas, 125:10-18.
Polomino, D. and Carrascal, L.M. (2006). Urban influence on birds
at a regional scale: A case study with the avifauna of northern
Madrid province. Landscape and urban planning, 77:276-290.
Ramos, C.A.; Carvalho-Júnior, O. e Nasi, R. (2006). Animais como
indicadores: Uma ferramenta para acessar a integridade biológica
após a extração madeireira em florestas tropicais? Belém: IPAM.
Reynaud, P.A. (1995). Avifauna diversity and human population in
some West African urbanized areas; comparison with the tropical
town of Cayenne, French Guiana, p. 478-497. Em: Bellan, D., G.
Bonin e C. Emig (eds). Functioning and dynamics of natural and
perturbed ecosystems. Lavoisier: Intercept Ltd.
Reynaud, P.A. and Thioulouse, J. (2000). Identification of birds
as biological markers along a neotropical urban-rural gradient
(Cayenne, French Guiana), using co-inertia analysis. Journal of
Environmental Management, 59:121-140.
Rosa, R.; Lima, S.C. e Assunção, W.L. (1991). Abordagem preliminar
das condições climáticas de Uberlândia (MG). Sociedade &
Natureza, 3:91-108.
Rose, E.; Haag-Wackernagel, D. and Nagel, P. (2006). Pratical use
of GPS-localization of Feral Pigeons Columba livia in the urban
environment. IBIS, 148(2):231-239.
Ruszczyk, A.; Rodrigues, J.J.S.; Robert, T.M.T.; Bentati, M.M.A.;
Del Pino, R.S.; Marques, J.C.V. and Melo, M.T.Q. (1987).
Distribution patterns of eight species in the urbanization gradient
of Porto Alegre, Brazil. Ciência e Cultura, 39(1):14-19.
Rutschke, E. (1987). Waterfowl as bio-indicators, p. 167-172. Em:
International Council for Bird Preservation Technical Publication.
Cambridge: International Council for Bird Preservation.
Savard, J.P.L.; Clergeau, P. and Mennechez, G. (2000). Biodiversity
concepts and urban ecosystems. Landscape and Urban Planning,
48:131-142.
Sick, H. (1997). Ornitologia Brasileira. Rio de Janeiro: Editora Nova
Fronteira.
Sigrist, T. (2006). Aves do Brasil: uma visão artística. São Paulo: Tomas
Sigrist.
Stotz, D.F.; Fitzpatrick, J.W.; Parker, T.A. and Moskovists, D.K.
(1996). Neotropical birds: Ecology and Conservation. Chicago: The
University of Chicago.
Torga, K.; Franchin, A.G. e Marçal Júnior, O. (2007). Avifauna
em uma seção da área urbana de Uberlândia, MG. Biotemas,
20(1):7-17.
Columba livia e Pitangus sulphuratus como indicadoras de qualidade ambiental em área urbana
Suélen Amâncio, Valéria Barbosa de Souza e Celine Melo 37
Revista Brasileira de Ornitologia, 16(1), 2008