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C
A EVOLUÇÃO DOS CÓDIGOS DE CONDUTA
LELIO LAURETTI
Socio-fundador e professor dos cursos do IBGC
ADRIANA DE ANDRADE SOLÉ
Conselheira Certificada pelo IBGC
“O instrumento adequado
para disseminar uma
“cultura ética” na
organização é o Código
de Conduta”
Consideramos os códigos de
conduta como uma “ponte” entre a
Ética e as empresas. Para justicar
nossa posição, vamos partir da
ideia de que as empresas podem
ser vistas sob 3 ângulos:
PRIMEIRO ÂNGULO
Perl corporativo: É uma espécie
de retrato de corpo inteiro,
apresentando dados relativos
à fundação, objeto social,
controle acionário, número de
funcionários, liais no país e no
exterior, posição nos mercados
em que atua, número de
clientes, principais indicadores
operacionais e econômico-
nanceiros etc.;
SEGUNDO ÂNGULO
Identidade organizacional: Está
espelhado na Declaração de
“Missão, Visão e Valores”, cuja
estrutura básica deve ser uma
exposição bastante objetiva e
concisa dos seguintes pontos:
• Missão
Maneira pela qual a atividade
da empresa ou organização
está contribuindo para
melhoria da qualidade de vida
da sociedade;
Atualmente em enorme evidência, em grande parte promovida pelo fortalecimento das práticas anticorrupção, os
códigos de conduta são nossos velhos conhecidos e têm uma longa história a ser contada em milênios, séculos e décadas
• Visão
Síntese do planejamento
estratégico, ou seja, aonde a
empresa quer chegar;
• Valores
Fatores que permitem à
organização alcançar sua visão
e cumprir sua missão. Não se
cuida, aqui, de princípios éticos,
como integridade, transparência,
responsabilidade social etc., que
se referem à “cultura”, mas dos
“fortes” da organização, como
tradição no mercado, força da
marca, qualidade dos produtos,
rede de distribuição, motivação
do pessoal, desenvolvimento
tecnológico, bom atendimento
aos clientes e assim por diante.
TERCEIRO ÂNGULO
Cultura corporativa: Tem tudo a
ver com Ética, porque envolve,
basicamente, o nível de conança,
de respeito e solidariedade que
permeia as relações internas e
externas da organização e se
traduz nas melhores práticas de
Governança Corporativa, orientadas
pelos princípios de transparência,
equidade, prestação de contas e
responsabilidade socioambiental.
7IBGC EM FOCO OUTUBRO / NOVEMBRO / DEZEMBRO 2015
EDIÇÃO ESPECIAL - IBGC 20 ANOS
– Retrato de corpo inteiro da organização
(dados relativos à fundação, objeto social,
controle acionário, etc)
– Espelhado na declaração de
“Missão, Visão e Valores”
– Tem tudo a ver com a Ética
– Envolve nível de conança, respeito
e solidariedade
– Se traduz nas melhores práticas
de Governança
TERCEIRO ÂNGULO
CULTURA CORPORATIVA
O instrumento adequado para
disseminar uma “cultura ética”
na organização é o Código de
Conduta, como registramos na
abertura deste texto. Não o
rotulamos de “Código de Ética”
porque Ética é a inspiração dos
códigos, que são conjuntos de
normas de comportamento. Algo
parecido com um hipotético
“Código de Direito” ou um
“Código de Justiça”: o que temos
são códigos de deveres inspirados
pelo Direito e pela Justiça, como o
Código Penal, o Código Civil, o
Código de Defesa do Consumidor
e muitos outros. Além disso, é
importante que não se misturem
“valores” com “princípios éticos”:
os primeiros fazem parte da
identidade organizacional,
enquanto os segundos se integram
à cultura ética.
Embora atualmente em enorme
evidência, em grande parte
promovida pelo fortalecimento
das práticas anticorrupção, os
Códigos de Conduta são nossos
velhos conhecidos e têm uma
longa história a ser contada em
milênios, séculos e décadas.
Vamos tentar resumi-la no
infográco que se segue:
PRIMEIRO ÂNGULO
PERFIL CORPORATIVO
SEGUNDO ÂNGULO
IDENTIDADE ORGANIZACIONAL
Missão: Inuência na melhoria na qualidade de vida da sociedade
Visão: Síntese do planejamento estratégico
Valores: Fatores que permitem à organização alcançar sua visão e
cumprir sua missão
8www.ibgc.org.br
XX
ERA CRISTÃ - IDADE MÉDIA
476 A 1634
Época rotulada como anos escuros
ou idade das trevas
529 | IMPÉRIO BIZANTINO E EUROPA
CODEX JUSTINIANUS/ CORPUS
IURIS CIVILLIS
Primeiro registro sistemático do direito
romano combinado com princípios locais.
650 | MECA – ARÁBIA
ALCORÃO
Conjunto de preceitos e
recomendações éticas e morais que
direcionam o mundo Islamico.
1487 | ALEMANHA
MALLEUS MALEFICARUM
(MARTILLO DE LAS BRUJAS)
Recompilação de crenças sobre bruxaria,
um dos códigos mais obscuros e nocivos da
história. Serviu de base para a condenação
a morte de milhares de mulheres via
queimação em praça pública e degola.
1563 | ITÁLIA
CONCILIO DE TRENTO
Conjunto de diretrizes para regular a
doutrina católica.
621 A.C | GRÉCIA
CÓDIGO DE DRACÓN
Famoso por sua crueldade pois suas
leis foram ditadas por uma religião
implacável que via em qualquer
falta uma ofensa á divindade,
constituindo um crime irremissível.
Diferenciava homicídio voluntário e
legítima defesa. Até hoje, utilizamos
a expressão “draconiano“ para
referirmos a puniçãões consideradas
excessivamente severas.
594 A.C | GRÉCIA
CÓDIGO DE SÓLON
Introduziu o testamento e determinou
que a lei e normas fossem iguais
e aplicadas a todos. Aboliu a
escravidão por dívida e proibiu
homens de vender lhas e irmãs.
450 A.C | ITÁLIA
LEI DAS XII TÁBUAS
Base da cultura jurídica italiana e
considerada a Lei escrita mais antiga
do mundo ocidental que codicou os
velhos costumes nacionais.
476 A.C | EUROPA
Regras de conduta dos
senhores e cavaleiros feudais.
100
NOVO TESTAMENTO DA
IGREJA CRISTÃ
1300 A.C. | ÍNDIA
CÓDIGO DE MANU
Base da legislação indiana -
Estabeleceu o sistema de casta
da sociedade hindu.
A Evolução dos
Códigos de Conduta
1230 A 960 A.C | PALESTINA
PENTATEUCO (TORAH)
Antigo testamento da Bíblia - cinco
livros que alternavam seções
de instrução ao povo de Israel e
regulamentavam a sua conduta,
tanto na ordem ética pessoal,
social e religiosa.
MUNDO ANTIGO
2.450 A.C. ATÉ 50 D.C.
2450 A.C. | SUMÉRIA
ESTELA DE ABUTRES
Considerações sobre a relação Estado e
Deuses - Mais antigo tratado diplomático
registrando termos de paz da vitória do
rei Lagash sobre a cidade Oumna.
2350 A.C. | MESOPOTÂMIA
CÓDIGO DE URAKAGINA
Limitava o poder dos sacerdotes
e grandes proprietários de terras.
Dispunha sobre usura, roubos e
mortes. Primeira codicações de
normas jurídicas.
2040 A.C. | SUMÉRIA
CÓDIGO DE UR-NAMMU
Transformou em leis os costumes antigos
e enfatizou penas pecuniárias para
delitos diversos. Criou a escrita em
forma sentencial condicional “Se alguém
zer isso será penalizado com aquilo”.
1930 A.C. | IRAQUE
CÓDIGO DE ESHUNNA
Previa a interferência real no domínio
econômico para coibir alta dos preços
de alimentos, denia sistema de côrtes
de julgamento, e dispunha sobre
escravidão, casamento e divórcio.
Maioria das penas eram pecuniárias
e apenas 3 penais: crimes sexuais,
assaltos e roubos.
1870 A.C. | SUMÉRIA E ACADIA
CÓDIGO DE LIPS ISHTAR DE ISIN
Estabeleceu o Direito nestas regiões.
1780 A.C. | MESOPOTÂMIA
CÓDIGO DE HAMURABI
Estabelecia regras de vida e de propriedade
e trazia indício de preocupação em relação
a fraudes de processos judiciais.
9IBGC EM FOCO OUTUBRO / NOVEMBRO / DEZEMBRO 2015
EDIÇÃO ESPECIAL - IBGC 20 ANOS
XX SÉCULO XX
Período quando proliferaram os
códigos de condutas de todas
as prossões e os principais
referenciais aos direitos
humanos pós guerras.
IDADE
CONTEMPORÂNEA
1789 ATÉ OS DIAS ATUAIS
1789 | FRANÇA
PRIMEIRA VERSÃO
DA DECLARAÇÃO
DE DIREITOS DO
HOMEM E CIDADÃO
“Os homens nascem e permanecem livres
e iguais em direitos. As distinções sociais
só podem fundar-se na utilidade comum”.
1800 | INGLATERRA
PRIMEIRO CÓDIGO DE ÉTICA
MÉDICA OCIDENTAL
Manual de condutas prossionais
relacionadas a hospitais comuns e de
caridade criado por Thomas Percival
(1740 -1804)
1807 | FRANÇA
CÓDIGO FRANCÊS
Código de leis patrocinado por Napoleão
Bonaparte, baseado em 3 pilares:
propriedade, contrato, e responsabilidade
civil. Regulamentava as relações entre os
cidadãos franceses.
1873 | ALEMANHA
CÓDIGO ALEMÃO
Considerado o mais avançado da época
e caracterizado por sua perfeição técnica
que reetia o panorama sócio econômico
e o modelo social adotado na época. 1947 | EUA
CÓDIGO DE NUREMBERG
preceitos focados no respeito
necessário no uso de seres humanos
em pesquisas clínicas.
1948 | EUA
DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS
DIREITOS HUMANOS – ONU
1964
DECLARAÇÃO DE HELSINKI
Tornou obrigatório Código de condutas
éticas á todos os pesquisadores clínicos .
1979
CÓDIGO DE CONDUTA DAS
NAÇÕES UNIDAS PARA SEUS
FUNCIONÁRIOS
Normas orientadoras aos governos
sobre questões relacionadas com direitos
humanos e justiça criminal.
1992 | INGLATERRA
RELÁTÓRIO CADBURY
Considerado o Primeiro Código de Boas
Práticas de Governança Corporativa
1999
OCDE
Considerado o Primeiro Código de Boas
Práticas de Governança Corporativa.
2001
Inventário OCDE sobre códigos de
condutas de empresas transnacionais.
2001
Código de Conduta Corporativa como auto
regulação da Economia Global - ONU
2007 | UNIÃO EUROPEIA
CÓDIGO DE CONDUTA
CORPORATIVA
2013 | BRASIL
LEI ANTICORRUPÇÃO
Recomenda e reforça a importância da
existência de Códigos de Conduta nas
empresas brasileiras.
1999 | BRASIL
PRIMEIRO CÓDIGO DE
BOAS PRÁTICAS DO
INSTITUTO BRASILEIRO DE
GOVERNANÇA CORPORATIVA
10 www.ibgc.org.br
CÓDIGOS EM RETROSPECTO
O infográco precedente
cobre um período de 5.000
anos, durante o qual diferentes
povos, em diferentes épocas,
mostraram sua preocupação com
o estabelecimento de normas
de conduta que evidenciassem
o contínuo progresso da
humanidade em direção a um
relacionamento entre pessoas e
povos, orientado por conança,
solidariedade, transparência,
respeito e equidade. Nessa
caminhada, o conceito de “elite” –
tradicionalmente aplicado às elites
de qualquer natureza (dinastias,
poder militar, religiosas e, mais
recentemente, econômicas) – foi
se recongurando, para dar lugar
à verdadeira “elite”, desta vez,
formada por todas as pessoas
de bem, em qualquer classe
social, que são a impressionante
maioria. Este processo foi
alimentado pela globalização
da informação que, nalmente e
pela primeira vez na história da
civilização, converteu o mundo
em uma comunidade global, em
que propostas como “interesses
coletivos” e “prioridade para o
social” encontraram campo para
orescer e se impor.
No momento – que acreditamos
próximo – em que a maravilhosa
tecnologia da informação erigir
o bem como notícia, substituindo
a esdrúxula situação presente em
que o mal é a notícia, o processo
de aperfeiçoamento da sociedade
dará um salto quântico, os ciclos
de mudança na sociedade
ocorrerão em intervalos muito
mais curtos do que os vericados
no passado e as forças do bem
latentes serão despertadas.
EMPRESAS E CÓDIGOS EM FACE
DA GRANDE TRANSIÇÃO
Estamos convictos de que estamos
assistindo à maior transição já
ocorrida na história da civilização,
e ela acontece a partir de uma
sociedade quase totalmente
guiada por princípios econômicos,
típica do século XX, em direção
a uma sociedade orientada por
princípios éticos, que tendem
a caracterizar os processos
decisórios no século XXI.
Não estamos trabalhando com
a hipótese da revogação pura e
simples dos princípios econômicos,
mas é para nós evidente que
aqueles princípios, dos quais
resultaram enormes desperdícios
de recursos, agressões constantes
e violentas contra a natureza, ou
absurda concentração de renda e
riqueza, serão reavaliados à luz
dos interesses da maioria e das
prioridades estabelecidas pela
própria sociedade, agora muito
mais esclarecida a respeito de
sua realidade pela globalização
da informação. Seria ingênuo
imaginar que uma transição dessa
estatura pudesse realizar-se sem
resistências ou turbulências e em
curto prazo. Não esquecer, porém,
que os trabalhos de demolição
costumam anteceder obras novas
e, também signicativo, que
nessa caminhada o que importa
fundamentalmente é a direção,
não a velocidade.
Nesse novo quadro, a finalidade
da empresa, como entidade
econômica, já foi definida como
“criar valor para o acionista”
(M. Friedman); alguns anos
depois, como “criar um cliente”
(P. Drucker); mais recentemente,
A EVOLUÇÃO DOS CÓDIGOS DE CONDUTA
“Os códigos de conduta
continuarão a ser a
ponte entre a ética e as
organizações empresariais,
destacando-se, entre as
melhores práticas de
Governança, como aquela
de maior convergência e
mais rápido retorno”
11IBGC EM FOCO OUTUBRO / NOVEMBRO / DEZEMBRO 2015
EDIÇÃO ESPECIAL - IBGC 20 ANOS
em nossos dias, como “ajudar a
criar um mundo sem pobreza”
(M. Yunus). E não se trata de
uma questão de puro otimismo
ou de fantasia: o maior
respeito aos direitos humanos,
a severidade das punições por
atos danosos aos interesses
da coletividade, o crescimento
exponencial do número de
governos democráticos no mundo
(com todos os seus defeitos...),
a intensa difusão das práticas
de autorregulação, em paralelo
com o endurecimento das
disposições legais, a crescente
independência dos tribunais, a
ampliação e aperfeiçoamento
tecnológico dos órgãos de
controle, são realidades com
as quais nos defrontamos em
nosso dia-a-dia e que não
comportam outra interpretação
senão a de que a tão temida
quanto alardeada corrupção
entrou para o rol das “espécies
em extinção”, e não poderia ser
outro o destino de uma atividade
que depende totalmente da
existência de três fatores: sigilo
completo, cumplicidade absoluta
e garantia de impunidade. Estão
aí o mensalão e o petrolão que
não nos deixam mentir...
Neste novo cenário, os códigos de
conduta continuarão a ser a ponte
entre a ética e as organizações,
particularmente as empresariais,
destacando-se, entre as melhores
práticas de Governança, como
aquela de maior convergência e
mais rápido retorno.
OS BONS CÓDIGOS DE CONDUTA
Em mais uma iniciativa pioneira,
o IBGC vem promovendo, há 5
anos, um curso sobre “fundamentos
éticos e técnicas de elaboração
de códigos de conduta”. Como
etapa conclusiva desse curso, os
participantes são convidados a
responder às perguntas abaixo,
com referência aos códigos das
suas respectivas organizações:
• O código tem um modelo bem
denido: código de princípios ou
código de relacionamento?
• Ele se aplica igualmente a líderes
e liderados, sem inuência
da hierarquia?
• Os princípios estão bem
denidos e sua conversão em
normas é bem clara?
• Mistura princípios éticos com
princípios puramente disciplinares
(para os quais a organização
dispõe de outros veículos)?
• Dene bem a responsabilidade
dos líderes pelo bom ambiente
de trabalho?
• Aborda com franqueza os objetivos
econômicos da organização?
• É construído em tom
predominantemente armativo
ou é uma série de vedações?
• Tem disposições que possam ser
percebidas como manifestação
de desconança nas pessoas?
• Como é tratada a questão da
gestão do código?
Sugerimos que os nossos leitores
levem essas diretrizes em conta
na elaboração ou revisão de seus
códigos. Será, sem dúvida, um
bom começo...