Essa tese explora o relacionamento entre o discurso e a agenda anticorrupção no Brasil, durante o período de 1945 a 1964, e a implementação de medidas político-econômicas de racionalidade neoliberal, bem como suas implicações no arranjo político-social do país e na cultura política brasileira. Proponho uma nova forma de se entender o tópico da corrupção, não mais como um instrumento de manipulação social, mas como elemento dotado de racionalidade que vai além da ideia de instrumentalização política, pois é parte da essência neoliberal. Para isso, utilizo a perspectiva proposta por novos estudos que identificam os princípios do neoliberalismo já no pós 1ª Guerra Mundial como forma de conter aspirações sociais e o intervencionismo estatal. Trata-se de ideologia conservadora que assim como utiliza a austeridade para alcançar seus objetivos (Mattei 2022), também utiliza a agenda anticorrupção, seu braço moralista e, pretensamente, técnico. Sendo conservadora, ela consegue, para alcançar seus objetivos, coadunar-se com outras formas de conservadorismos, como ocorreu no golpe civil-militar de 1964. A partir dessa reconfiguração teórica, podemos entender a agenda anticorrupção como meio de se combater qualquer modelo de planificação estatal, ao mesmo tempo que o busca diminuir ao representá-lo como corrupto e corruptor, bem como qualquer classe ligada a ela. Por outro lado, esse discurso será utilizado para proteger e expandir o “mercado livre”, pretensamente isento das disputas políticas, movidos pela eficiência da “mão livre” e, por isso, livre de corrupção. O tema da anticorrupção também possui outra agenda, como a necessidade de legislação e regulação para conter fraudes no setor privado e na formação de trustes, visando não só suprir um dos maiores problemas do Brasil, a falta de divisas para investimento, como gradualmente eliminar o poder de decisões governamentais em favor de créditos privados e investimentos diretos pela Bolsa de Valores que se consolidará como fonte de poder e investimento à medida que as regulações pró-mercado se implementam no país. Apesar disso, mostro que estes eram regramentos sem dentes, pois nenhum ator será punido, mas o discurso de um mercado regrado era obtido, fazendo contraponto à percepção negativa de um Estado corrupto. Essa teorização e metodologia que aqui proponho permite investigar não só a seletividade presente nos discursos políticos anticorrupção, mas entender que há racionalidade por trás desses discursos e agenda, permitindo que se investigue casos de corrupção privada pela mesma ótica e no mesmo trabalho, antes estudados em separado, mas que agora pois agora fazem parte do
mesmo arcabouço teórico-metodológico: a implementação do neoliberalismo no Brasil.