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Os Testemunhos que as Rochas nos Legaram: Geodiversidade e Potencialidades do Património do Canhão Fluvial de Penha Garcia

Authors:
  • UNESCO Naturtejo Global Geopark
Os Testemunhos que as Rochas nos Legaram:
Geodiversidade e Potencialidades do Património do Canhão
Fluvial de Penha Garcia
Carlos Neto de Carvalho
Centro Cultural Raiano - Gabinete de Geologia e Paleontologia.
Avenida Zona Nova de Expansão 1º, 6060-101 Idanha-a-Nova.
Centro de Geologia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.
Bloco C6, 4º piso, P-1749-016 Lisboa.
Email: praedichnia@hotmail.com
Resumo: Neste trabalho são apresentadas algumas singularidades paleontológicas no seio da diversidade natural do canhão fluvial do Rio Ponsul.
O roteiro de locais de interesses paleontológico e geológico, associado intrinsecamente a um património construído de índole etnográfica (unidade
moageira do Ponsul, hortas) e histórica (Castelo medieval e restos do “castelo da Bufa”), caracterizam o Geomonumento de Penha Garcia. Os
vestígios de actividades paleobiológicas de invertebrados (pistas de alimentação, estruturas de habitação, trilhos de pegadas) são salientados pela
sua particular diversidade em termos de comportamentos assumidos e grau de preservação, verdadeiros apanágios de uma identidade cultural
milenar enraizada nas fragas quartzíticas. Por fim, encontram-se reunidos alguns dos critérios que fundamentam a protecção e criação de um
espaço temático em Penha Garcia, que actualmente já é dado a conhecer pela Rota dos Fósseis.
Palavras-chave: Património Paleontológico; Icnofósseis; Parque Icnológico; Penha Garcia; Idanha-a-Nova.
Abstract: In the present work it is introduced several paleontological singularities found among the heart of the Ponsul river canyon natural
diversity. The itinerary of paleontological and geological sites, intrinsically associated to an inherited ethnographic (Ponsul watermills complex,
ancient vegetable gardens) and historical (medieval castle and vestiges of “castelo da Bufa” tower), typify the Penha Garcia Geomonument.
The remains of invertebrate paleobiological activities (feeding burrows, dwelling structures, tracks and trails) are emphasized by their peculiar
diversity in assumed behaviors and preservation rate, real attribute for a millenary cultural identity implanted over the quartzitic relieves. There
are assembled some criteria which establish the preservation and creation of a thematic park in Penha Garcia, actually already make known by
the Rota dos Fósseis (Fossils Trail).
Key-words: Paleontological Heritage; Ichnofossils; Ichnological Park; Penha Garcia; Idanha-a-Nova.
anos. São também um exemplo de como a Terra
é brutalmente dinâmica e de como muita coisa se
terá modificado desde a sua origem. A Vida é um
exemplo disso. As rochas metassedimentares da
região de Penha Garcia, particularmente aquelas
preservadas no interior da dobra, são extrema-
mente antigas e encontram-se, por vezes, pejadas
de evidências fossilizadas de hábitos e formas de
vida extintas há muito. É esta associação geológica
entre o fóssil e o estrato em que este se integra que
nos permite relatar o modo como as comunida-
des biológicas se estruturavam face às sequenciais
variações ambientais, a face visível e mutável de
um sistema dinâmico universal. É pela riqueza na
diversidade, na preservação, na singularidade das
formas e rochas, mas também pela necessidade da
contextualização geológica e pela urgência da sua
1. Introdução
Quando vislumbramos a região de Penha Garcia
do mirante que é o inselberg de Monsanto, sobressai
na planura o dorso crispado da Serra do Ramiro
prolongada na Serra da Gorda, até desaparecer
no horizonte espanhol. Na verdade, este rele-
vo esconde uma crista gémea, correspondente à
Serra da Ribeirinha estendendo-se pela Serra da
Cacheira. As duas estruturas correspondem aos
flancos de grande dobra em U que, irrompen-
do da campina raiana em Aranhas, se prolon-
ga quase ininterruptamente muito para além da
fronteira do Erges, atravessando várias provín-
cias espanholas. São os testemunhos residuais de
uma mega-colisão continental que terá constitu-
ído, deformado e levantado em grande extensão
o que é hoje o território português, em múlti-
plas fases decorridas mais de 300 milhões de
Geonovas nº 18, pp. 35 a 65, 2004Associaç ão port uguesa de geólogos
Carlos Neto de Carvalho
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compreensão como substrato vital para os frágeis
ecossistemas actuais, que se deverá considerar Pe-
nha Garcia como um verdadeiro Exomuseu (sensu
Galopim de Carvalho, 1989).
Este trabalho pretende resumir a importância das
associações fósseis no quadro geológico e mesmo
etnográfico de Penha Garcia, sumarizando e ilus-
trando em jeito de conclusão os geótopos ou lo-
cais de interesse geológico e paleontológico, para
além do património construído de realce (veja-se
o ANEXO). A presente proposta resulta do pro-
cesso decorrente de classificação como Imóvel de
Interesse Municipal, no âmbito do Decreto-Lei
107/2001, do Conjunto cultural de Penha Garcia
que compreende:
· O Património Geológico presente nas verten-
tes do canhão fluvial de Penha Garcia (dobras,
falhas, lões de quartzo, estruturas sedimen-
tares, litologias, …);
· o Património Paleontológico (todas as lajes
com icnofósseis in situ ou descontextualizadas da
sequência estratigráfica e outro fósseis abran-
gidos na área delimitada);
· o Castelo de Penha Garcia;
· a Unidade Moageira do Rio Ponsul (todos os
moinhos e estruturas associadas preservadas);
· os vestígios de atalaia (“Castelo da Bufa”);
· as hortas tradicionais em socalcos.
A classificação apresenta-se como um mecanismo
necessário para a salvaguarda urgente do rico e
diversificado património paleontológico e geo-
lógico de Penha Garcia, substrato paisagístico e
responsável em última análise pela existência de
outros elementos de cariz histórico-etnográfico
importantes aí implantados ao longo de cente-
nas de anos, como o castelo medieval de Penha
Garcia, os vestígios da atalaia denominada por
“Castelo da Bufa” e todos as infra-estruturas as-
sociadas à actividade moageira. Este conjunto é
considerado notável pela sua unidade e integra-
ção na paisagem e pelo seu interesse científico,
histórico, arqueológico e mesmo cénico. Só a in-
terrelação entre os vários componentes referidos
permite compreender a sua origem.
2. Diversidade de comportamentos presentes e
sua preser vação delicada nas rochas quartzíti-
cas de Penha Garcia
A Formação do Quartzito Armoricano, corres-
pondente às cristas que irrompem da paisagem
desde Aranhas até ao Rio Erges, prolongando-se
muito para da fronteira, é constituída por se-
quências detríticas, argilo-quartzoareníticas da-
tadas do Arenigiano (490-480 milhões de anos),
correspondendo a uma deposição em ambientes
do tipo supralitoral a infralitoral com influências
tempestíticas frequentes. A sua distribuição em
Portugal abrange uma área superior a 2500km2,
correspondendo ao prolongamento de unidades
correlativas pertencentes ao Maciço Armoricano
europeu. Em Penha Garcia, a sequência quart-
zítica apresenta-se completa, assentando segundo
uma discordância angular sobre unidades ne-
oproterozóicas e sendo sobreposta por uma se-
quência xistenta em continuidade estratigráfica,
datada do Oretaniano?-Dobrotiviano (480-460
milhões de anos). A ausência de fósseis esqueléti-
cos contrasta com a abundância e diversidade em
vestígios de actividades paleobiológicas ou icno-
fósseis, distribuídos por toda a Formação. Só re-
centemente se iniciou um estudo mais aprofunda-
do e sistemático dos icnofósseis de Penha Garcia
(Neto de Carvalho et al. 1998; Neto de Carvalho,
2003a, 2003b, 2004). De facto, não obstante a
sua grande importância, reforçada pela comuni-
dade geológica nacional no recente workshop inti-
tulado Fósseis de Penha Garcia-Que Classificação? promo-
vido no ano transacto pela Câmara Municipal de
Idanha-a-Nova, a Paleoicnologia destas unidades
quartzíticas é conhecida apenas pontualmente
através dos trabalhos clássicos do ilustre paleon-
tólogo português Nery Delgado, datados dos -
nais do séc. XIX, os quais incidiram fundamen-
talmente sobre as Bilobites (Delgado, 1885, 1888).
O termo Bilobites era dado no final do séc. XIX, a
todos os fósseis de atribuição duvidosa encontra-
dos nos quartzitos, como Cruziana, Arthrophycus ou
Skolithos. No entanto, conhecem-se actualmente
as origens, muitas vezes completamente díspa-
res, destas formas, sendo conveniente designá-
las separadamente por um nome estabelecido.
Por outro lado, Bilobites era o nome formal de
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um fóssil de braquiópode antes de se darem no-
mes à maioria dos icnofósseis. Embora o termo
expresse efectivamente a forma bilobada das Cru-
ziana, o baptismo deste tipo de estruturas foi da
responsabilidade de Alcides d’Orbigny em 1842,
um naturalista francês que, explorando a Bolívia,
concedeu o nome do seu amigo General de Santa
Cruz (responsável pela independência deste país
em 1825), às estranhas formas que aí tinha desco-
berto e descrito pela primeira vez. Desta forma,
pensamos que fica claro porque é errado utilizar
Bilobites para designar o que está estabelecido como
Cruziana ou outros icnofósseis.
Mas o que são realmente as Cruziana? Nery Delga-
do considerava apenas as formas que englobava no
Fig. 1 – Perspectiva aérea com a localização dos principais elementos patrimoniais da Via Icnológica de Penha Garcia (Idanha-a-Nova),
a jazida paleoicnológica mais importante de toda a região de Idanha-a-Nova e uma das importantes jazidas paleontológicas do Pa-
leozóico português (o percurso marcado corresponde ao PR3 – “Rota dos Fósseis”). O trecho do vale do Rio Ponsul que atravessa a
crista quartzítica situa-se a NNE da povoação de Penha Garcia. O acesso faz-se por caminho situado a 75 m W do Castelo, na zona
alta da vila (Rua da Lapa) e ainda pela estrada municipal que faz o acesso entre a EN239 a Vale Feitoso, com ligação à Barragem de
Penha Garcia. O mirante da Igreja Matriz, de onde se pode perspectivar todo o cenário geológico envolvente ao circuito proposto,
tem acesso directo a partir do centro da vila, pela Rua do Castelo.
grupo das Bilobites, Rusophycus, Arthrophycus, Frae-
nae, sobretudo Cruziana, como moldes internos
de algas relacionados com as Sifonáceas (Delga-
do, 1885). Para este autor, as “algas” que estudava
cresciam horizontalmente em ambientes mari-
nhos litorais, formando grandes comunidades. A
acção da rebentação sobre a estrutura levaria ao
desprendimento de numerosas tiras que se iriam
acumular na praia, acabando por ser enterradas e
fossilizarem como moldes internos, e originando
as já então célebres lajes com abundante Cruziana.
Bastantes anos volvidos, a conotação de Cruziana
com a botânica foi mantida por autores desta re-
gião, que a atribuíram a marcas de raízes (Lobo e
Lucas, 1972).
Carlos Neto de Carvalho
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Curiosamente, os icnofósseis de Penha Garcia vi-
rão a ter, precisamente um século mais tarde, um
papel importante no conhecimento do modo de
formação de Cruziana (Goldring, 1985) e sua con-
sequente atribuição a icnofósseis de alimentação
de trilobites (Fig. 2) e de outros artrópodes mor-
fologicamente similares, produzidos no substrato
marinho. As Cruziana correspondem a sulcos es-
sencialmente horizontais, bilobados, com uma
crista central mais ou menos definida, apresen-
tando intricados padrões ornamentais de estrias.
A sua atribuição a pistas de alimentação de trilo-
bites e outros artrópodes morfo-funcionalmen-
te alogos deve-se ao achado de estruturas cor-
relativas imediatamente sob uma espécie destes
organismos, à ocorrência frequente de trilobites
e Cruziana nas mesmas unidades, a comparações
neoicnológicas com artrópodes que produzem
sulcos análogos, às frequentes marcas que acom-
panham Cruziana e Rusophycus e que definem clara-
mente estruturas esqueléticas de trilobites, assim
como à morfologia e tipo sequencial das estrias
que ornamentam as Cruziana, correspondentes às
impressões dos apêndices locomotores deixadas
no acto de obtenção de alimento (Fig. 2).
Regressemos ao passado e imaginemos uma tri-
lobite a alimentar-se de matéria orgânica conti-
da nos sedimentos, escavando e revolvendo, “la-
vrando” o substrato arenoso até atingir a interfa-
ce deste com um nível argiloso de elevada plasti-
cidade. A depressão gerada no nível argiloso por
acção dos apêndices locomotores, à medida que
o animal avança processando alimento, pôde ser
preservada e realçada através de certos mecanis-
mos de fossilização, dando origem às inúmeras
marcas meândricas que hoje podemos contem-
plar nas imediações de Penha Garcia.
Nas escadas de acesso ao castelo, construídas em
1995, nas últimas obras de reconstrução do caste-
lo, é possível estabelecer o primeiro contacto com
icnofósseis como Cruziana (parte do corrimão e
alguns degraus possuem lajes onde ocorrem pro-
fusamente estes icnofósseis, resultado da sensibi-
lidade e esforço de protecção demonstrados pela
Junta de Freguesia local). A Via Icnológica, onde se
encontraram os exemplares de icnofósseis mais
espectaculares à mistura com tradições culturais
milenares ainda hoje bem vincadas na paisagem,
deverá ser realizada ao final da tarde, pois o ân-
gulo de incidência da luz solar com as superfí-
cies das camadas com icnofósseis permite ver até
as mais delicadas marcas dos apêndices locomo-
tores dos artrópodes marinhos que os produzi-
ram, como resultado de um estilo de preservação
muito perfeito e raro. Alguns dos exemplares de
Cruziana encontrados figuram entre os icnofósseis
Fig. 2 – Produção de Cruziana por trilobites (esquema adaptado de Hawle & Corda, 1847; W hittington, 1980 e Seilacher, 1970).
Reconstituição de uma Trilobite
(perspectivas dorsal e ventral)
Modo de locomoção de uma Trilobite
(A lguns apêndices locomotores foram retirados
para facilitar a observação)
Produção de pistas-Cruziana
(Trilobite Em Corte Transversal)
Sentido de movimento
(Perspectiva Oblíquo-ventral)
As pistas do tipo C ruziana são o
resultado da escavação do substrato por
acção do aparato locomotor
(As incisões apendiculares são evidentes na
ornamentação estriada de Cr uziana )
Os Testemunhos que as Rochas nos Legaram Geodiversidade e Potencialidades do Património do Canhão F luvial de Penha Garcia 39
Fig. 3 Diversidade de comportamentos patente nas Cruziana,
a dimensão ímpar atingida por algumas estruturas e uma pre-
servação delicada são alguns dos factores que tornam o vale do
Ponsul um parque icnológico único a nível nacional e raro no
resto do mundo.
A - Cruziana rugosa e C.furcifera formando longas rectas (estação 11);
B - Grande C. rugosa com forma em U (estação 15);
C - Roller Coas ter behavior numa laje clássica com C. furcifera (esta-
ção 18, escala=20cm);
D - Idem (estação 69, escala=10cm);
E - Estrutura teichichnóide em C. furcifera (estação 69,
escala=20cm);
Carlos Neto de Carvalho
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F - C. rugosa orientadas em oposição à
orientação das correntes (estação 74);
G - Laje intensamente bioturbada
por grandes C. rugosa com 16-19cm de
largura (estação 19);
H - A maior Cruziana in situ figurada do
mundo, com 24cm, provavelmente
produzida por uma trilobite asafídeo
(estação 71, escala=20cm).
Os Testemunhos que as Rochas nos Legaram Geodiversidade e Potencialidades do Património do Canhão F luvial de Penha Garcia 41
mais bem preservados que se conhecem a nível
mundial (Seilacher, comun. Pessoal; Fig. 3G).
A tectónica fez um trabalho magnífico em Penha
Garcia. Por deformação, verticalizou grandes
lajedos que muito mais tarde foram limpos”
pelo encaixe do Rio Ponsul. Da tectónica e da
erosão fluvial resulta o espectáculo incomum das
grandes lajes com inúmeros icnofósseis (Fig. 3C,
F), particularmente Cruziana que sobressai pelas
dimensões. Com efeito, surgem aqui verdadeiros
recordes mundiais nas dimensões das Cruziana, o
que daria organismos seus produtores com quase
0,5m de comprimento (Fig. 3B, H)! No entan-
to, as dimensões médias das trilobites em Penha
Garcia eram inferiores a 8cm. Ocorrem ainda
pistas com padrões idênticos, com menos de 1cm,
podendo corresponder à acção alimentar de or-
ganismos em estado precoce das suas vidas.
Em Penha Garcia, identificam-se quatro mor-
fotipos de Cruziana, a maioria dos quais apresenta
estádios intermédios que os correlaciona com os
demais. Correspondem a quatro formas preser-
vadas diferentes de obter alimento produzidas
por outros tantos tipos diferentes de produtores
ou, o que parece mais correcto, são o resultado
das vicissitudes de apenas um único grupo de
organismos, com uma morfologia muito seme-
lhante. Facto ainda mais extraordinário e úni-
co é a grande diversidade de comportamentos de
alimentação observáveis em Penha Garcia que,
quando aparecem conjugados numa mesma laje,
lembram uma verdadeira “montanha-russa” pe-
B - estação 7 (escala=2cm).
A - proximidades da estação 57;
A - O trilho ocorre associado a galerias em forma de U do tipo
Diplocraterion paralellum (estação 14);
B - Pegadas cortadas por estruturas cilíndricas do tipo Skolithos
(proximidades da estação 57).
Fig. 4 – Diplichnites isp. são trilhos atribuídos à actividade de loco-
moção de trilobites.
Fig. 5 – Merostomichnites isp. A seta indica o sentido de locomoção.
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las curvas, voltas, arcos e cruzamentos dos sulcos
bilobados (Fig. 3A, D, E). Há quase 500 milhões
de anos, as trilobites seriam capazes de grandes
proezas artísticas, que só actualmente podem ser
compreendidas e admiradas.
Os trilhos de pegadas do tipo Diplichnites (Fig. 4)
são relativamente comuns nos quartzitos de Pe-
nha Garcia, sendo normalmente atribuídos à ac-
tividade locomotora de trilobites. Esta correlação
genética deriva da composição morfológica das
impressões, geralmente em forma de crescente
simples, bífido ou com padrões radiais, presentes
em duas adas de séries paralelas (mais ou me-
nos complexas por variação preservacional), com
forte obliquidade em relação à linha média e dis-
posição simétrica em “V”. Por outro lado, obser-
va-se ocasionalmente a transição das formas de
Diplichnites para Cruziana.
Os trabalhos de campo recentemente efectuados
em Penha Garcia levaram à descoberta de um tri-
lho e de séries de impressões atribuídas, para já,
a Merostomichnites isp., sendo o segundo do género
conhecido em Portugal e o primeiro com locali-
zação ao alcance de todos. O trilho principal pode
ser visto facilmente a 102m do topo da sequência,
em grande bloco in situsituado junto do cami-
nho que vai da Barragem para as piscinas fluviais.
Esta forma rara representa locomoção contínua
paralela à camada com apêndices morfológica e
dimensionalmente idênticos (Fig. 5). As grandes
dimensões da estrutura (mais de 13cm de largu-
ra), a morfologia das pegadas e o padrão de loco-
moção permitiram inferir um grande Phylloca-
rida como o possível produtor de Merostomichnites,
constituindo esta a única evidência indirecta da
presença mais antiga em Portugal de toda uma
subclasse de organismos.
As galerias do tipo Arthrophycus alleghaniensis (Fig.
6) correspondem a feixes tridimensionais de ra-
mificações em cacho ou que curvam tendencial-
mente num único sentido. É uma forma de com-
portamento preservada no registo estratigráfico
que desapareceu há mais de 435 milhões de anos.
Esta icnoespécie pode apresentar um padrão di-
vagante e com entrecruzamento de estruturas,
como acontece em exemplares observados no vale
do Ponsul. Quanto aos produtores de Arthrophycus,
e no caso de A. alleghaniensis, a presença de anela-
ções transversas ao longo das galerias em U, en-
tre as quais, em espécimes bem preservados, se
podem observar finos pregueamentos paralelos,
testemunham a actuação peristáltica (movimen-
to semelhante à descida do bolo alimentar pelo
esófago) de um organismo vermiforme celomado
sedimentívoro. Este apresentaria uma cutícula
de revestimento com nas rugas funcionalmen-
te eficazes para facilitar o processo de escavação,
implicando o movimento de sedimento ao longo
do animal.
As ocorrências de níveis quartzíticos grosseiros
apresentam abundantes e finas estruturas cilín-
dricas verticais, simples, atribuíveis a Skolithos line-
aris (Fig. 7). Já em pleno vale do Ponsul, a meio da
Formação do Quartzito Armoricano, é frequente
encontrar níveis de Skolithos intercalados com ou-
tros de Cruziana. O número de estruturas é imen-
so, constituindo uma verdadeira biostratificação
que na literatura especializada foi denominada
de piperock. A sua ocorrência, inusitada em pa-
Fig. 6 – Arthrophycus alleghaniensis (estação 74, escala=20cm).
Fig. 7 Skolithos a cortar uma Cruz iana rugosa. As setas indicam
exemplos (proximidades da estação 52).
Os Testemunhos que as Rochas nos Legaram Geodiversidade e Potencialidades do Património do Canhão F luvial de Penha Garcia 43
visível. No caso de Daedalus halli, o movimento das
duas extremidades do tubo terá diferido na sua
amplitude. A extremidade que estaria em contac-
to com a interface água-sedimento mostra uma
curta deslocação quando comparada com a ex-
tremidade mais profunda, o que origina a forma
cónica característica (Fig. 9A). A deslocação de
uma estrutura rectilínea gida no interior dos
sedimentos é problemática se não for auxiliada
por um mecanismo ciliar que disponha o sedi-
mento para trás do organismo em movimento. A
dimensão da estrutura é função da instabilidade
na sedimentação, como resultado do reajuste do
organismo seu produtor no nível de ocupação.
leoambientes então dominados pelos produtores
de Cruziana, é interpretada como uma instalação
efémera de uma comunidade de organismos poli-
quetas ou foronídeos com modos de vida genera-
listas imediatamente após cada evento tempestíti-
co, em condições impróprias para os organismos
mais especializados e característicos desses paleo-
ambientes de plataforma. Por vezes, certos tubos
verticais abrem em cone no sentido ascendente,
designando-se por Monocraterion.
As formas de Arenicolites são outro tipo de estru-
turas produzidas após cada evento tempestíti-
co. Tendem a aparecer para o topo da formação
quartzítica (Fig. 8). Correspondem a galerias em
U, simples, orientadas perpendicularmente à ca-
mada, produzidas possivelmente para habitação
de poliquetas ou pequenos crustáceos que se ali-
mentariam de partículas em suspensão na água.
O seu alinhamento com o presumível sentido
das paleocorrentes está relacionado com a oxige-
nação contínua da estrutura, fornecimento ali-
mentar e/ou com o afastamento dos dejectos do
organismo da sua área de alimentação. Quando
apresentam um spreite intermédio motivado por
equílibrio ecológico face a variações na taxa de
sedimentação, estas galerias em U têm a designa-
ção de Diplocraterion.
Ainda dentro das galerias vermiformes verticais,
podem ser encontradas formas de Daedalus em Pe-
nha Garcia. São curiosas escavações que retraba-
lham o sedimento nas três direcções do espaço por
deslocamento helicoidal (D. halli) ou horizontal
(D. labechei) de uma galeria vertical a oblíqua, com
forma de J; o eixo de enrolamento é raramente
Fig. 8 – Galeria em U simples atribuída a Arenicolites isp.
(estação 70).
Fig. 9 – Daedalus predomina nos níveis arenosos tempestíticos da
parte média e superior da sequência de Penha Garcia.
A - Daedalu s halli a cortar laminação do tipo hummocky (estação 17;
escala = 15cm);
Como causa deste comportamento será o seu há-
bito suspensívoro. O modo de vida do produtor
de D. labechei é equivalente ao inferido para D. halli.
O comportamento assumido difere apenas no
facto da inexistência de reajustes no nível de ocu-
pação motivados por erosão/sedimentação. Com
efeito, o movimento lateral da galeria faz-se num
plano curvo, sem variação vertical do seu posi-
cionamento (Fig. 9B). Este pode gerar rculos
sucessivos ou prolongar-se no plano de estratifi-
cação por quase 1m.
Por m, são abundantes as galerias horizontais
simples de vermes, sobretudo em níveis onde tam-
bém ocorrem as Cruziana, os quais erraram através
do substrato marinho escavando túneis em busca
de detritos orgânicos, desde cadáveres a micro-
partículas. As estruturas que produziram são de-
nominadas de Palaeophycus ou de Planolites, consoan-
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te o preenchimento é semelhante ou difere da sua
composição em relação à matriz sedimentar.
Na Fig. 10 são identificados os vários grupos de
organismos que participaram nos ecossistemas do
Ordovícico Inferior de Penha Garcia, reconheci-
dos a partir do seu registo icnológico.
3. Uma palavra para os ecossistemas actuais de
Penha Garcia
As serranias de Penha Garcia oferecem, pela
inacessibilidade do relevo e pelo desenvolvimen-
to áreas florestadas, protecção para uma avifau-
na muito diversificada dominada pelas rapinas,
contando com elementos em sério risco de ex-
tinção. A lontra refugia-se no vale do Ponsul, um
dos poucos predadores do introduzido lagostim-
americano, um voraz crustáceo que tem relegado
para último plano o lagostim-europeu.
As comunidades botânicas das cristas quartzíticas
de Penha Garcia marcam pela sua originalidade,
pela especialização a solos muito imaturos, es-
sencialmente siliciosos e muito pobres em outros
constituintes químicos. São de salientar as tur-
feiras existentes no vale do Ponsul, em depen-
dência directa de pequenas surgências de água,
as quais constituem verdadeiros santuários pau-
tados por dezenas de espécies num espaço exíguo
de apenas alguns metros. É frequente o Sphagnum
(esfagno) e a delicada planta carnívora Drosera ro-
tundifolia (erva-orvalhinha), esta última em risco
de extinção. As turfeiras de Penha Garcia são
elementos quase únicos em áreas de clima me-
diterrânico (Manuel João Pinto, Jardim Botâ-
nico de Lisboa, Comun. pessoal). No entanto,
permanecem desconhecidas a todos aqueles que
as pisam enquanto passeiam junto ao leito do rio
Ponsul para ver os icnofósseis. Estes santuários
correm um sério risco, se não forem conjugados
os interesses geológicos e biológicos.
4. O Património etnográfico e monumental de
Penha Garcia
Penha Garcia é uma povoação alcandorada na
crista quartzítica dominada pelas rnas de um
castelo medieval roqueiro, que soube aproveitar
o penhascoso substrato para edificar a defesa de
bens e gentes ao longo de séculos. Da atalaia iso-
lada no ponto mais alto da zona, denominada de
“Castelo da Bufa”, são ainda visíveis a base circular
em argila com 6m de diâmetro. A casa tradicio-
nal aplica a rocha quartzítica e quartzo filoniano
nas suas paredes. A unidade moageira do Vale do
Ponsul, a mais importante do concelho de Ida-
nha-a-Nova e ainda hoje muito bem conservada,
resulta do aumento de eficiência hidráulica do
Rio Ponsul por encaixe na sequência quartzítica
ao longo de um canhão fluvial apertado.
As fragas quartzíticas, com os seus recantos, lajes
com padrões “hieroglíficos” de génese misterio-
sa (icnofósseis) e escuras cavidades (surgências de
nascentes ao longo de zonas de falha), contribuí-
ram para uma etnografia diversificada que soube
ultrapassar as últimas décadas de grande desen-
volvimento tecnológico e social. Sobrevive hoje à
custa de uma população maioritariamente idosa e
dos esforços de investigadores que se dedicam ao
seu levantamento e registo.
B - Daedalus labechei (Serra da Gorda, proximidades de Monfor-
tinho).
Os Testemunhos que as Rochas nos Legaram Geodiversidade e Potencialidades do Património do Canhão F luvial de Penha Garcia 45
Fig. 10 – O bestiário das serranias de Penha Garcia, à escala: um dos maiores triunfos da Paleoicnologia, estudando os vestígios
fossilizados da actividade biológica, é o da reconstituição de comunidades biológicas com reduzido ou nulo potencial de fossilização.
Estas comunidades foram, por vezes, compostas maioritariamente por organismos sem um esqueleto fortemente mineralizado, ex-
tintos há já muitos milhões de anos. De outra forma, ficariam para sempre perdidos entre as memórias fragmentárias do tempo.
No sentido dos ponteiros do relógio e de cima para baixo: crustáceo filocarídeo que nada livremente na coluna de água deslocando-se
ao fundo para se alimentar; vermes foronídeos/poliquetas sedentários em estruturas verticais, que se alimentam de matéria orgânica
que capturam em suspensão; celenterado (anémona) epibentónico séssil; verme poliqueta sedentário com galeria de habitação em
U; verme poliqueta errante que escava os sedimentos em busca de matéria orgânica; trilobite asafídeo que viveu livremente sobre o
fundo marinho, escavando o substrato em busca de detritos orgânicos (de notar as três ordens de grandeza dimensional (estádios de
crescimento?) existentes cujo valor médio da população é dado pela dimensão da trilobite disposta no centro-mais à direita). Pela
mesma ordem, gravuras adaptadas de Rolfe (1969), Bromley (1990) e Harrington et al. (1959).
2 cm
Carlos Neto de Carvalho
46
5. Interesse Patrimonial do legado cultural de
Penha Garcia
As razões para a necessidade de preservação do
conjunto de interesse cultural de Penha Garcia
sob a alçada jurídica encontram-se sintetizadas
nas seguintes principais valências do patri-
nio.
Património Paleontológico
· As camadas ou lajes com icnofósseis de Penha
Garcia apresentam grande raridade e fenómenos
únicos em toda a estratigrafia portuguesa;
· A preservação das estruturas apresenta detalhes
raros ou únicos a nível mundial;
A diversidade e abundância dos icnofósseis per-
mite compreender de forma inigualável ecossis-
temas existentes na região num intervalo com-
preendido entre há 490 e 480 milhões de anos;
· Os icnofósseis de Penha Garcia fazem parte da
memória colectiva desde tempo imemoriais (as
Cobras Pintadas);
· A jazida paleontológica de Penha Garcia é clás-
sica nos estudos paleontológicos portugueses;
· A jazida paleontológica de Penha Garcia é reco-
nhecida, pelo seu interesse científico, pela comu-
nidade científica nacional e internacional.
Património Geológico
· A Geologia local condicionou a ocupação do es-
paço ao longo de milénios;
· A arquitectura tradicional utiliza matérias-pri-
mas reportadas às litologias locais;
· A paisagem foi fortemente condicionada e es-
truturada pela evolução geológica da área;
· Os recursos geológicos são abundantes, caracte-
rísticos e possuem fácil acessibilidade, com con-
dições mais do que adequadas para uma fruição
científica, pedagógica e turística.
Património Biológico
· Diversidade botânica e faunística, com espécies
raras ou em vias de extinção;
· Biótopos de relevância regional e de elevada ra-
ridade nacional;
Património Histórico-Arqueológico
· Composto pelas ruínas medievais do Castelo de
Penha Garcia e do “Castelo da Bufa”;
· Elementos referenciais para a compreensão da
História da área geográfica envolvente à Bacia do
Tejo e fundamentais para o conhecimento histó-
rico de Penha Garcia;
Património Etnográfico
· Elevada preservação da maior unidade moageira
do concelho de Idanha-a-Nova;
· Paisagem de características rurais pouco inter-
vencionada nos tempos mais recentes.
Considera-se, segundo os artigos e da Lei
nº 107/2001, que o património cultural descrito
apresenta bens de interesse relevante a nível do
concelho de Idanha-a-Nova, designadamente pa-
leontológico, geológico, histórico, arqueológico,
arquitectónico e etnográfico pela sua antiguida-
de, autenticidade, originalidade, singularidade,
raridade e exemplaridade, devendo ser conside-
rada a necessidade urgente de protecção e valori-
zação através da classificação como Conjunto de
Interesse Municipal.
O Património Paleontológico Português (PPP)
(Cachão et al. 1998) constitui o conjunto de re-
cursos paleontológicos nacionais que, pela sua
relevância a título científico, educativo ou outro
constituam um bem patrimonial fundamental
que deverá ser valorizado como entidade sim-
bólica de uma comunidade ou de uma região e
preservado para as futuras gerações. Para a clas-
sificação de uma jazida paleontológica como PPP
deve haver um conjunto de critérios, tão diversos
quanto sólidos, que permitam reconhecer o seu
carácter ímpar e o melhor modo de explorar as
suas potencialidades. O trabalho científico exer-
cido nestes últimos anos na região de Penha Gar-
cia permitiu angariar um conjunto de factores
paleontológicos de extraordinário interesse nos
vários domínios científico, educativo e cultural
(no sentido de Cachão e Silva, 1999).
Os Testemunhos que as Rochas nos Legaram Geodiversidade e Potencialidades do Património do Canhão F luvial de Penha Garcia 47
Critérios científicos
Critério tafonómico
Na Formação do Quartzito Armoricano, onde
condicionalismos tafonómicos não permitiram
a fossilização da quase totalidade dos restos es-
queléticos, são as marcas de actividade das popu-
lações de organismos que denunciam a presença
fervilhante de vida, em tempos tão remotos. Os
icnofósseis são extremamente comuns nas for-
mações argilo-quartzíticas de Penha Garcia. De
entre eles, ressalta à vista com frequência a for-
ma bilobada e curvilínea, por vezes de grandes
dimensões e forte relevo, com a denominação de
Cruziana. A qualidade de preservação de todos os
icnofósseis em geral, e de Cruziana em particular, é
excelente, apresentando-se por vezes em grandes
lajes, onde é possível fazer análises etológicas e
estudos de interacção entre estruturas biogénicas
de origem diversa. Para este registo paleontoló-
gico de elevada e rara qualidade terá contribuído
grandemente a granulometria e grau de conso-
lidação dos sedimentos contemporâneos da acti-
vidade dos organismos produtores das pistas, em
íntima relação com as condições paleoambientais
reinantes. Todavia, a exposição dos icnofósseis
em grandes lajes foi favorecida pela estruturação
tectónica de toda a sequência, a qual terá vertica-
lizado as camadas sedimentares, combinada com
o encaixe do Rio Ponsul paralelamente à direcção
das camadas, resultando numa garganta rochosa
sem coberto vegetal importante nem uma camada
espessa de solo a esconder e deteriorar as ocorrên-
cias fossilíferas. Deste modo, é possível analisar
as superfícies das camadas em ambas as vertentes
do vale do Ponsul, ao longo de quase toda a se-
quência, como quem espreita, uma a uma, todas
as páginas de um livro. Consideramos, após co-
nhecimento sistemático de todas as cristas quart-
zíticas portuguesas (Neto de Carvalho, in prep.),
que as condições de preservação dos icnofósseis
de Penha Garcia são únicas em Portugal e apre-
sentam elevada raridade a nível mundial.
Critério paleoecológico
A diversidade de icnofósseis presente na sequên-
cia de Penha Garcia permite inferir um conhe-
cimento mais aprofundado dos ecossistemas ma-
rinhos bentónicos, característicos da plataforma
continental, datados de mais de 480 milhões
de anos. Os icnofósseis permitem determinar
o modo de vida das comunidades bióticas e suas
adaptações às variações ambientais, como se-
jam as modificações da composição do substrato
face à espessura da coluna de água e à acção das
frequentes tempestades que assolavam os fun-
dos marinhos. Nestas associações de icnofósseis
é possível estudar a ecologia de organismos sem
estruturas esqueléticas mineralizadas, o que lhes
confere um baixo potencial de fossilização. Na
condição citada encontram-se igualmente os ór-
gãos da zona ventral, incluindo o aparelho loco-
motor das trilobites, cuja morfologia, modo de
funcionamento e aplicações podem ser conheci-
das a partir dos diversos icnofósseis atribuídos a
este grupo de organismos.
Critérios educativos
Potencial pedagógico
A qualidade de exposição dos afloramentos e os
excelentes exemplos de estruturas geológicas ob-
serváveis nos blocos que constituem o PR3-Rota dos
Fósseis e em afloramento (descritos num roteiro,
caso a caso, em capítulo próprio), conferem a este
circuito paleoicnológico/geológico um interesse
singular na divulgação e sensibilização do grande
público para as Geociências.
Potencial didáctico
O circuito geológico, de ampla acessibilidade aos
pontos de maior interesse, apresenta grandes po-
tencialidades em actividades lectivas de campo,
passíveis de serem ajustadas a qualquer grau de
ensino. Os alunos poderão aprender os conceitos
básicos de Geologia e da Paleontologia a partir,
por exemplo, da observação das características
morfológicas dos icnofósseis e da caracterização
das rochas associadas, estruturas sedimentares,
tectónicas e geomorfológicas. Poderão ainda re-
lacionar a Geologia com as práticas milenares de
aproveitamento dos georrecursos (castelo medie-
val para defesa, a unidade moageira do Rio Ponsul
para a produção de farinha). Estas observações no
campo estimularão não um desenvolvimento
Carlos Neto de Carvalho
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a nível cognitivo e sócio-afectivo, como também
sensibilizarão o aluno para a defesa e preserva-
ção de um património natural e etnográfico que
deverá ser considerado seu (educação para a cida-
dania).
O circuito geológico encontra-se disponível du-
rante o ano inteiro, permitindo visitas de ín-
dole científico-cultural (Geoturismo), as quais
poderão incidir sobre o estudo dos icnofósseis,
sua interpretação etológica e extrapolações para
o conhecimento da evolução da vida nos primei-
ros estádios de radiação morfológica e comporta-
mental. É possível ainda apreender conceitos ao
nível das Ciências da Terra a partir de exemplos
elucidativos e, por vezes, espectaculares e únicos.
Poder-se-á relacionar as propriedades físicas das
rochas quartzíticas com a sua popular utilização
como material de construção dos moinhos junto
do rio, recentemente reconstruídas, assim como
do castelo e das casas tradicionais da vila.
No âmbito deste critério e a título exemplifica-
tivo desenvolveu-se, no evento da Geologia no
Verão 2001 - uma iniciativa à escala nacional, e
com grande sucesso, do Ministério da Ciência e
Tecnologia -, um conjunto de excursões turís-
tico-científicas à Via Icnológica do vale do Ponsul
e a Penha Garcia, sob a coordenação científica
conjunta de elementos do Centro de Geologia da
Universidade de Lisboa, do Museu, Laboratório e
Jardim Botânico da Universidade de Lisboa e da
Associação de Defesa e Desenvolvimento da Ser-
ra da Gardunha (Neto de Carvalho et al. 2001).
Estas excursões, abertas ao público, trouxeram à
região dezenas de pessoas de diversos pontos do
país (Fig. 11).
Critérios culturais
Valor histórico
A série quartzítica de Penha Garcia é considera-
da uma jazida paleontológica clássica, conhe-
cida e estudada desde os trabalhos pioneiros de
Nery Delgado (Delgado, 1885). Um século mais
tarde, o geólogo inglês Ronald Goldring provou
a formação intra-estratal dos icnofósseis do tipo
Cruziana, os quais reflectem o comportamento de
alimentação manifestado pelas trilobites, tendo
para tal seccionado e radiografado, entre outras,
algumas amostras provenientes de Penha Garcia
(Goldring, 1985). Este trabalho contribuiu para
“arrefecer” uma longa e por vezes acesa discussão
entre reputados especialistas que se dedicam ao
estudo do modo de vida das trilobites, um gran-
de grupo de artrópodes há muito extinto. Os re-
sultados obtidos por este autor permitiram um
conhecimento mais profundo dos mecanismos
biológicos que permitiram às trilobites e a outros
artrópodes morfologicamente homólogos realizar
estruturas do tipo Cruziana. Desta forma, a jazida
deverá ser considerada um marco na história da
Paleontologia portug uesa e internacional.
Fig. 11 – Exemplo do interesse demons-
trado pelos icnofósseis de Penha Garcia
durante a Geologia no Verão’01.
Os Testemunhos que as Rochas nos Legaram Geodiversidade e Potencialidades do Património do Canhão F luvial de Penha Garcia 49
Valor espiritual
A expressão popular Cobra Pintada utilizada em Pe-
nha Garcia para designar algumas estruturas do
tipo Cruziana parece ser muito antiga e pode ser re-
lacionável com a designação Bicha Pintada de Vila de
Rei, estrutura de origem biológica anteriormente
interpretada como símbolo de culto ofiolátrico
Celta (Neto de Carvalho et al. 1999, 2000). O
verdadeiro significado socio-etimológico (antro-
pológico) destas variantes e o seu alcance geog-
fico encontram-se em fase de rasteio.
O circuito paleontológico/geológico/etnográfico
de Penha Garcia encontra-se inserido numa área
de grande valor patrimonial histórico. Esta po-
voação enquadra-se na medieval linha defensiva
da fronteira beirã, hoje em dia um circuito mo-
numental, de onde se poderão destacar, pela sua
relevância e proximidade, as povoações de Ida-
nha-a-Velha, Monsanto e Penamacor. A utiliza-
ção dos quartzitos como fonte de matéria-prima
para construção data nesta região, pelo menos,
da construção do castro lusitano precedente ao
castelo medieval de Penha Garcia. Em toda a po-
voação ainda hoje se denota a tipologia litológica
do substrato onde foram implantadas as primi-
tivas habitações, os resguardos para os animais e
as edificações comunitárias. Esta prática, presen-
temente em declínio, de construção com blocos
quartzíticos e com lajes de quartzitos com icno-
fósseis, comporta uma dimensão cultural, passí-
vel de ser compreendida à medida que se vagueia
pelas ruas de Penha Garcia e, sobretudo, quando
se realiza o circuito geológico que desce ao vale do
Rio Ponsul.
Neste espaço natural que é o vale do Rio Pon-
sul, onde as Ciências da Terra podem ser estu-
dadas da melhor forma, quer seja ao nível básico
e secundário ou ao nível universitário, com ex-
celentes exemplos de fácil compreensão, e onde
existem evidências singulares de formas de vida
de cerca de 480 milhões de anos, urge fazer
algo mais de forma a dar a conhecer e a dinami-
zar esta verdadeira e monumental sala de aula em
plena Natureza. O seu crescente interesse cientí-
fico encontra-se bem patente nas iniciativas de-
senvolvidas em 2001 no âmbito da Geologia no
Verão acima referidas e na recente visita a Penha
Garcia da equipa de trabalho do eminente Pale-
ontólogo alemão, Prof. Dr. Adolf Seilacher (Pré-
mio Crafoord 1992, pela Academia de Ciências
da Suécia), a qual teve como principal objectivo
realizar moldes em látex de lajes com icnofósseis
para a sua exposição internacional itinerante Fossil
Art, tendo quatro destes sido exibidos no Japão em
2001 (Seilacher, 2001: 30-31) e em Porto Ale-
gre, Brasil, no ano transacto (Seilacher, 2003:
40-41).
Quanto à protecção e preservação destes espaços
e estruturas geológicas, o circuito PR3-Rota dos Fós-
seis apresenta características quase singulares em
Portugal. É comum encontrar a frase É PROI-
BIDO DANIFICAR OS FÓSSEIS” escrita junto
de alguns focos de interesse. É frequente a popu-
lação local, pessoas simples mas sensibilizadas há
muito para a preservação de um legado patrimo-
nial que considera seu, indicar espaços onde se
podem encontrar icnofósseis em maior quanti-
dade, deixando sempre a advertência “há ali mui-
tas pedras…mas não leve as pedras de cá…”. Este
é um caso único num país que agora “acorda”
para as elevadas potencialidades do seu patrimó-
nio natural, ainda que algo delapidado pela de-
gradação que tem vindo a sofrer através de actos
vergonhosos, alguns com a “bênção” de entidades
estatais. Contra o abandono e destruição, o vale
do Ponsul e os seus icnofósseis contam actual-
mente com a vigincia intensa do Sr. Domingos,
funcionário da autarquia que acompanha aten-
tamente os visitantes e impede, não raramente,
a acção furtiva de colectores maioritariamente
oriundos de Espanha.
Estes cumes fragosos que deram protecção du-
rante milénios a populações receosas pela perda
das suas vidas e dos seus poucos haveres, vêem-se
nesta era de crescente progresso, quando Lisboa
se encontra apenas a uma distância de 3 horas por
auto-estrada, quase destituídos de uma popula-
ção cada vez mais envelhecida, face a um modo de
vida rude e de poucas oportunidades. Contudo,
e mais uma vez, a solução para a desertificação
humana nesta região pode passar pelo aproveita-
mento turístico-cultural das construções monu-
mentais e dos espaços naturais inerentes às cristas
quartzíticas escarpadas e à profunda garganta do
Rio Ponsul, onde a um cenário idílico se acresce
uma imensa base de informação científica (geo-
lógica e biológica) e cultural.
Carlos Neto de Carvalho
50
Agradecimentos
O autor agradece o reconhecimento da impor-
tância do património geológico de Penha Garcia
pela ProGeo-Portugal que, associada à National
Geographic Portugal, atribuiu em 2004 o Pré-
mio Geoconservação à Câmara Municipal de
Idanha-a-Nova.
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Carlos Neto de Carvalho
52
Anexo
Roteiro do Parque Icnológico de Penha Garcia
com inventário dos bens de interesse geológico,
paleontológico, arqueológico e etnogfico no
perímetro em classificação
O percurso pedestre PR3 – Rota dos Fósseis inicia-
se no Largo do Chão da Igreja. Existe parque de
estacionamento, sanitários públicos, parque in-
fantil, centro de reciclagem e placa explicativa do
percurso com mapa. O caminho, quase sempre
muito bem indicado, sobe na direcção da Rua do
Espírito Santo, passando à esquerda da alva cape-
la. Esta rua vai desembocar no Largo das Portas
da Vila, com fonte, forno comunitário e a antiga
placa de madeira que indicava o percurso para os
fósseis. O circuito faz-se agora pela Rua da Praça,
por entre casas de paredes quartzíticas. Esta rua
espraia-se um pouco na Travessa do Canto do Pe-
lourinho. Antigo símbolo da autonomia munici-
pal perdida para Idanha, o pelourinho de Penha
Garcia é sebastianista. O percurso aumenta de
declive na Rua do Pelourinho até atingir o Largo
da Igreja, onde se situa a Igreja matriz. Aqui exis-
te mais uma placa com indicações dos percursos
pedestres e da escola de escalada, outro aprovei-
tamento turístico dos quartzitos. A Igreja matriz
guarda uma Virgem do Leite, imagem em Pedra
de Ançã, esculpida pelo mestre João Afonso em
1469.
Estação 1
Mirante sobre a garganta do Vale do Ponsul. O
canhão fluvial do Rio Ponsul resulta da erosão
provocada pelo encaixe epigénico do rio, for-
ça motriz dos moinhos construídos no seu leito.
Pode observar-se grande parte da sequência es-
tratigráfica da Formação do Quartzito Armori-
cano ao longo das vertentes íngremes do canhão
fluvial, assim como os dois flancos quartzíticos da
dobra sinclinal de Salvador-Penha Garcia-Ter-
mas de Monfortinho, no centro da qual se situam
as unidades xistentas suprajacentes à sequência
quartzítica.
O percurso prolonga-se pelas escadarias do cas-
telo. Desde logo se vêm icnofósseis nas primeiras
pedras que encimam o muro do mirante (peque-
nas Cruziana e Daedalus seccionados pelo plano de
estratificação, em preservação do tipo Humilis).
Estação 2
Junto da placa indicativa do PR3, existe fraga de
quartzito composta por 7 espessas camadas, de
cor cinza-amarelada, com planos bem definidos
mas ondulados, muito fracturadas e recristaliza-
das, de atitude S0=N30ºW, 62ºNE.
Esta sequência é cortada por falha com preen-
chimento quartzoso F1= N56ºW, ~40ºSW, sendo
intersectada por fractura que vem do castelo F2=
N80ºE, 40ºSW.
Ao longo da escadaria do castelo, são abundantes
os icnofósseis de Cruziana, seja em formas côncavas
preenchidas por sedimento de composição distin-
ta da matriz, seja em formas convexas. Pequenos
bancos e muretes convidam ao descanso e à con-
templação da paisagem sobre o núcleo da dobra e
as sequências quartzíticas, seja sobre a Superfície
de aplanação poligénica de Castelo Branco.
Estação 3
Magficos icno-
fósseis podem ser
encontrados no
último muro das
escadas de acesso à
porta Sul do cas-
telo, assim como
no início do cor-
rimão do lado di-
reito, com formas
de origens diver-
sas, colocadas
de propósito.
Os Testemunhos que as Rochas nos Legaram Geodiversidade e Potencialidades do Património do Canhão F luvial de Penha Garcia 53
Estação 4
Ruínas do castelo medieval, sobranceiro ao po-
voado, todo ele construído em quartzito, apro-
veitando as camadas quartzíticas para melhorar
as defesas. As ruínas do castelo medieval, para
além do seu interesse histórico-arqueológico, são
um belo mirante geomorfológico sobre a crista
quartzítica do flanco Norte do sinclinal, o núcleo
xistento e afundado do sinclinal, a Superfície
de Aplanação de Castelo Branco, os Inselberge de
Monsanto-Moreirinha, ao fundo a Cordilheira
Central (Serra da Estrela) e os relevos residuais
de dureza da Murracha, Murrachinha e de Pedras
Ninhas, sobre a linha da Falha do Ponsul.
resultar de ero-
são provocada
por nascentes
agora extintas.
As rochas apre-
sentam colora-
ção negra nas
zonas menos ex-
postas e para o
interior da lapa,
desaparecendo
junto da densa
rede de diacla-
ses. Resulta de
intensa precipi-
tação de óxidos
de manganês. A
surgência fica numa zona de falha com intensa
fracturação N20ºE, sendo algumas destas falhas
preenchidas por veios de quartzo leitoso.
Estação 6
Filão de quartzo leitoso com cristais zonados e
orientação N70ºW. Por vezes, apresenta agrega-
dos de goethite.
Sai-se pela porta Norte por escadaria que desce,
com muitos icnofósseis, alguns deles delicada-
mente preservados.
Observa-se bairro tradicional de casas quartzí-
ticas e muretes afeiçoados às possantes camadas
quartzíticas. Vira-se à direita para a Rua da Lapa,
que desce a calçada em quartzito que vai na direc-
ção da Barragem. O caminho calcetado, a ago-
ra denominada Via Icnológica, percorre as camadas
quase perpendicularmente, desde a parte infe-
rior à parte superior da Formação do Quartzito
Armoricano, na Barragem. É como subir na es-
cala do tempo geológico, permitindo observar as
sucessivas modificações paleoambientais.
Estação 5
Lapa do Castelo. Logo à entrada do espaço recen-
temente intervencionado, encontra-se colocada
no muro grande Cruziana furcifera cortada por tubos
verticais de Skolithos. O chão do novo espaço en-
contra-se coberto por lajes de grauvaque do Gru-
po das Beiras, extrínsecas ao local. A lapa parece
Estação 7
Projecção rochosa com níveis decimétricos de
quartzitos em alternância com silto-argilitos la-
minados cinzentos alterados para vermelho, com
Cruziana goldfussi irregularmente meandrizante,
fazendo semi-círculos ou dispondo-se de modo
quase rectilíneo. Pela largura homogénea, foi
produzida por um único organismo. Estes níveis
são cortados por Monocraterion. Ocorrem algumas
camadas com a superfície coberta com fendas de
Carlos Neto de Carvalho
54
sinérese. Num nível micáceo, 10cm acima, ob-
serva-se Diplichnites (Fig. 4B). Plano de falha a cor-
tar série estratificada: F= N42ºW, 16ºSW, com
estrias e esquírolas a dar sentido de movimento
para NW.
Estação 8
5m mais à frente, do lado esquerdo, comprida
laje quartzítica com marcas de ondulação simé-
tricas (ripples de onda) que indicam direcção de
paleocorrentes NE-SW. Nos planos perpendicu-
lares aos planos de camada vê-se laminações ho-
rizontais, comum no membro médio xistento da
sequência de Penha Garcia. Bem próximo vê-se
outro exemplo de ripples de onda, mas com direc-
ção NNE-SSW.
Estação 9
Junto da curva em cotovelo à direita. Várias Cru-
ziana furcifera com lobo central, em epirrelevo côn-
cavo, formando arcos, com preenchimento siltí-
tico da camada sobrejacente, a cortar plano com
ripples de corrente assimétricas a dar sentido para
NNW.
Estação 10
Numerosas lajes na calçada com icnofósseis, como
galerias de vermiformes e Cruziana em epirrelevo
côncavo e hiporrelevo convexo, o que sugere que
estas estruturas seriam galerias produzidas no in-
terior dos sedimentos.
Laje solta com as clássicas “cobras pintadas”, for-
mas intermédias C. furcifera-goldfussi mal preserva-
das, revelando comportamento sinuosoidal, leve-
mente meandriforme, com incremento dimen-
sional por mudança de nível ocupacional. Apenas
está representada uma dimensão de largura (em
torno dos 45mm), o que indica um único pro-
dutor. As pistas são atravessadas por galerias ver-
ticais do tipo Monocraterion. Acima da placa onde
se lê “é proibido danificar os fósseis” vê-se rocha
solta com Monocraterion, outras lajes com Cruziana,
uma delas tombada com C. furcifera com inflexão
teichichnóide. 2m para a esquerda, laje caída com
“circling behavior” em C. furcifera-goldfussi dextrógiro e
sinistrógiro.
Estação 11
Berma do caminho à direita. 2 grandes lajes ser-
viram para construir calçada, com preservação
magfica de grandes C. rugosa e de pequenas C.
goldfussi, ambas mostrando comportamento line-
ar, inseridas num contexto de elevada bioturba-
ção no plano de camada por pequenas C. furcifera
curvilíneas (Fig. 3A). C. goldfussi de 26mm de lar-
gura e prolonga-se de uma forma rectilínea qua-
Os Testemunhos que as Rochas nos Legaram Geodiversidade e Potencialidades do Património do Canhão F luvial de Penha Garcia 55
se perfeita por 104cm, estando fracturada dos
dois lados. O mesmo acontece com C. rugosa que
se prolonga por 130cm, tendo 95mm de largo.
Durante o percurso, a Cruziana mergulha em U,
aumentando em largura para 115mm e tem, por
vezes, marcas do lobo genal. A laje encontra-se
totalmente bioturbada no plano de camada por
Cruziana de várias dimensões que se entrecruzam
com muita frequência. Ocorrem as 4 icnoespé-
cies do grupo Cruziana rugosa (incluindo C. rouaulti)
mais um Rusophycus (escavação vertical produzida
por trilobites). Existem rias inflexões aperta-
das e várias estruturas a promover rculos pas-
sando da preservação goldfussi para furcifera. O Ru-
sophycus tem 32mm de largura por 40mm de com-
primento. Embora as Cruziana sejam muito abun-
dantes existem apenas 2 medidas para as larguras
de C. furcifera-C. goldfussi e apenas 1 medida para C.
rugosa.
À esquerda, desenvolvem-se em afloramento do-
bras nos níveis xisto-quartzíticos nos, que co-
meçam por verticalizar ou inverter a inclinação,
desenvolvendo logo a seguir complicadas dobras
vergentes para NNE, com planos axiais N50ºW.
Estas foram geradas durante a formação da gran-
de dobra de Penha Garcia, devido às camadas de
quartzitos com espessura métrica imediatamen-
te sobrejacentes que serviram como barreira de
dureza. São dobras de arrasto de uma falha nor-
mal WNW-ESE (aqui denominada Falha da Bar-
ragem) com componente vertical de movimen-
to normal e subida do bloco N. Para ESE esta
falha vai gerar mais dobras de arrasto no topo
do membro xistento. A deformação em regime
frágil gerou a fracturação observada nas cama-
das quartzíticas inferiores do membro superior
segundo dois planos ortogonais, o que dá origem
aos blocos prismáticos que ocorrem na continu-
ação da falha para oriente.
Pode encurtar-se o PR3, se descer para o rio à di-
reita até à ponte de madeira e depois subir pelos
moinhos.
Estações 12
Junto da ponte, no muro à direita, foram colo-
cadas diversas lajes com Cruziana, com algumas
das maiores pistas descobertas. Trata-se de uma
grande C. rugosa com 26cm de largura, que é ca-
racterizada por apresentar lobos genais que pos-
suem depressão central, o que demonstra que a
ponta genal correspondente deveria ser convexa.
No muro do lado direito existe bloco com pis-
ta que tem marca do cefalão, lobo em crescente
transverso à estrutura com início nos lobos genais
e deformação na zona central. Pode ter sido pro-
duzido pela trilobite Neseuretus devido a apresentar
marca de doblura cefálica fortemente convexa.
Estação 13
Rabiscos de Daedalus (preservação Humilis) na cal-
çada, um pouco depois de passar o grande aflo-
ramento de camadas quartzíticas métricas verti-
calizadas.
Estação 14
Passada a barragem, segue-se vereda à esquerda
por 20m que sai do percurso principal, até zona
plana entre duas fragas. A laje central apresenta
rara Merostomichnites assim como Arenicolites (Fig. 5A).
Arenicolites tem um preenchimento que difere da
matriz e o plano de estratificação corta apenas as
bases das estruturas o que indica a profundidade
no sedimento atingida por todas as restantes for-
mas etológicas. Estas galerias em U podem mos-
trar spreite (distúrbio sedimentar) entre as porções
verticais das galerias, o que as identifica como
gradações para Diplocraterion. As estruturas Arenicoli-
tes-Diplocraterion mostram orientação preferencial e
chegam a entrecruzar-se. Existe ainda Cruziana em
epirrelevo côncavo preenchidas e sub-impressões
de C. furcifera. Por detrás desta fraga são comuns
as C. furcifera e C. goldfussi rectilíneas e curvas para
além de camadas com estruturas HCS (tempesti-
tos), visíveis se se seguir o caminho sinuoso que
volta ao PR3. Existe ainda C. rugosa em U, secções
verticais de Arenicolites formando pares de pontu-
ações. Uma das camadas apresenta ripples de onda
que indicam direcção de paleocorrentes NE-SW.
Existe uma camada com circling behavior sinistrógiro
de Cruziana goldfussi. Por fim, no canto esquerdo do
afloramento ocorre C. furcifera que corta várias la-
minações, mantendo o estilo preservacional.
Estação 15
Seguindo pela calçada, encontram-se belas Cru-
ziana furcifera e C. rugosa em epirrelevo côncavo, as
quais resultam de um efeito de carimbo da com-
pacção diagenética-tectónica.
Carlos Neto de Carvalho
56
Estação 16
Bases de camada à direita e ligeiramente abaixo
da estação 14, com piperock de Skolithos assim como
Monocraterion em nível pouco bioturbado.
O trilho passa pelo núcleo de moinhos corres-
pondente à unidade moageira mais importan-
te do concelho Idanha-a-Nova pelo número de
edifícios que acompanham o Ponsul ao longo do
canhão fluvial e pelo elevado estado de preserva-
ção e de acesso ao grande público. Encontra-se
perfeitamente adaptado à geologia local. Junto,
amontoado caótico de blocos quartzíticos pro-
venientes do membro superior da Formação do
Quartzito Armoricano, resultado da actuação da
Falha da Barragem sobre a rede ortogonal de dia-
clases que corta os quartzitos.
Estação 17
Na primeira casa de quartzito à esquerda do cami-
nho, existe uma grande laje na parede que mos-
tra fendas de sinérese e outra com Monocraterion. À
volta da casa existe unidade xisto-quartzítica com
vários níveis com fendas de sinérese, sobretudo
no afloramento que está por detrás da casa. Um
nível tem ripples simétricas a dar orientação das
paleocorrentes NNE-SSW.
Nesta zona mostram-se as duas fragas com mais
lajes com icnofósseis in situ encontradas na região
de Penha Garcia, separadas por linha de água, ao
fundo do qual se desenvolve um pequeno prado
sustentado por muros tradicionais de quartzito.
Estação 18
A seguir à piscina fluvial, logo à esquerda do per-
curso, ocorrem numerosas lajes in situ com a clás-
sica Cruziana furcifera em circling behavior (Fig. 3C),
para além de níveis com fendas de sinérese. Uma
laje próxima apresenta C. goldfussi e C. furcifera for-
mando quase um círculo. Corresponde à laje em
que Cruziana ocorre marcada com tinta preta. 5m
acima desta laje ocorre nível com numerosas gale-
rias horizontais de vermes (Palaeophycus) apresen-
tando um forte índice de bioturbação no plano de
camada. Algumas lajes deste percurso terão sido
sinalizadas com tinta no início da década de 80.
Aqui a sequência está dobrada (dobra secundária)
em antiforma com vergência para NE.
Estação 19
Logo após sair da zona da fraga, por debaixo de
um sobreiral. Grandes Cruziana rugosa, apresen-
tando uma das melhores preservações registadas
a nível mundial (Seilacher, comun. pessoal). O
modo de formação de Cruziana requere argilas ti-
xotrópicas ou com coesão microbiana e diagénese
diferencial para que se produza o “efeito de ca-
rimbo” ou sub-impressão. As elevadas dimensões
das 13 C. rugosa mostram que esta seria produzida
por organismo ou espécie de maiores dimensões
que as C. furcifera e C. goldfussi. As C. rugosa cortam
e são cortadas por marcas de vermes. A camada
mantém as características de bioturbação intensa
Os Testemunhos que as Rochas nos Legaram Geodiversidade e Potencialidades do Património do Canhão F luvial de Penha Garcia 57
por 5m. É um nível de quartzito com 10cm de
espessura, cuja camada infrajacente é um silto-
argilito micáceo cinzento-azulado com 20cm de
espessura, numa sequência com alternâncias rít-
micas; os topos das camadas quartzíticas apresen-
tam-se ondulados e com laminações horizontais
ou HCS. Pequena falha inversa N30ºE, inclina-
da, com dobra de arrasto, a cortar o afloramen-
to.
O percurso atravessa o rio segundo uma técnica
ancestral, de pedra em pedra (as poldras), junto
da cascata da piscina fluvial produzida pela aber-
tura da levada de moinho.
Estação 20
No topo do caminho, junto de grande bloco
quartzítico, bela panorâmica sobre a sequência
monoclinal, aqui e além complicada por aperta-
das dobras secundárias que se vêem sobretudo nas
porções heterolíticas finas.
Estação 21
Na base rochosa de casa, à esquerda de caminho
sinuoso, junto da gueira, belas ripples de onda
cortadas por Monocraterion, o que significa que estes
seriam pós-deposicionais.
Junto da fonte datada de 1919 encontram-se
grandes planos de camada com ripples de onda que
dão orientação N W-SE. Passa-se à direita de pe-
quena mesa onde se pode merendar junto do rio
e de moinho em funcionamento, por dentro do
qual se passa. O caminho segue junto à margem
direita do rio, passando por moinhos e passadiços
feitos com troncos, seguindo a levada. O cami-
nho vira à direita numa casa e volta novamente
à direita para começar a subir, voltando na à
esquerda ao longo de um sobreiral. O caminho
volta a inflectir para a direita na casa nº 4.
Estação 22
próximo da casa nº 1 existe pequeno afloramen-
to com níveis metargilíticos amarelo-rosados
correspondentes aos depósitos turbidíticos do
Grupo das Beiras, imediatamente infrajacentes
e em discordância angular, com a Formação do
Quartzito Armoricano.
O caminho volta a intersectar a Avenida Joaquim
Lopes Dias para virar logo à esquerda, subindo na
direcção da igreja, através de escadaria suave com
bela perspectiva à direita sobre o membro médio
da Formação do Quartzito Armoricano.
Estação 23
O afloramento quartzítico encontra-se bastante
fracturado, indiciando a presença de falha im-
portante com possível orientação E-W, inclinan-
do para S.
A escadaria da Rua do Reduto vai dar novamente
ao Mirante da Igreja.
Estação 24
Pouco mais à frente da estação 17 existe fraga com
vários veis bioturbados. Perto do topo vê-se a
grande laje com C. rugosa orientadas. Na base, rip-
ples de onda indicando direcção NNE-SSW. Nu-
merosas lajes in situ com ripples. Cruziana sinuosoidal
(Laje 6) ou curvilíneas, dispostas em camadas
como um livro rabiscado entreaberto.
Próximo da estação 17, nas unidades à esquerda
da furda, ripples a dar direcção NE-SW em quatro
níveis, sendo que outros três níveis dão orienta-
ção NNW-SSE. Na base, camada quartzítica com
HCS e abundantes Daedalus halli.
Carlos Neto de Carvalho
58
Estação 25
No caminho pedonal junto da albufeira da Bar-
ragem, observa-se a transição gradual da Forma-
ção do Quartzito Armoricano para a Formação
de Brejo Fundeiro. A atitude das camadas é aqui
S0=(N32ºW, 76ºNE).
Estação 26
Grande laje solta com Daedalus a cortar estruturas
HCS nos dois estilos preservacionais em associa-
ção (tipo normal e tipo Humilis). Logo abaixo ob-
servam-se em afloramento base de camada com
fendas de sinérese.
Estação 27
Afloramento com numerosos níveis HCS, Humi-
lis, fendas de sinérese e, eventualmente, Skolithos.
Ripples de onda dão direcção das paleocorrentes
NNE-SSW. Fractura com direcção E-W, possi-
velmente com movimento vertical atendendo à
formação de dois blocos desnivelados. Os níveis
tempestíticos com Daedalus são muito frequentes
no membro médio e isto vê-se muito bem neste
sector.
Estação 28
Níveis com várias C. rugosa e C. furcifera. São estru-
turas de várias dimensões, produzidas por orga-
nismos em vários estádios de desenvolvimento,
alimentando-se com comportamentos muito se-
melhantes.
Estação 29
Magfica laje onde se mostra a interacção de Cru-
ziana rugosa com galerias de vermes. São cerca de 42
grandes C. rugosa. No lado direito desta laje ocorre
uma C. rouaulti apenas com 2mm de largo. Exis-
tem algumas fendas de sinérese. A maior parte
das marcas de vermes são oblíquas ou paralelas
ao curso de Cruziana. As marcas de vermes mudam
frequentemente de nível ocupacional, assim como
C. rugosa. Uma das galerias vermiformes mostra
um tipo diferente de constrições peristálticas,
com espaçamento de quase 10mm e abaulamen-
tos, o que poderá indicar retrocesso pela mesma
direcção.
Os campos de pasto para as trilobites seriam em
áreas pontuais, atendendo à distribuição agre-
gada de Cruziana. Outra laje, cerca de 2m abaixo
da anterior, é composta por C. furcifera que pene-
tra em C. rugosa deslocando-se no sentido inver-
so que, por sua vez, é penetrada por pequena C.
furcifera deslocando-se no mesmo sentido. Estas
estruturas cortam e são cortadas por galerias de
vermes com 9mm de diâmetro com anelações
transversas. Observa-se ainda C. goldfussi a cortar
C. rugosa onde se vê marca genal no lado esquerdo
da pista.
Estação 30
Circling behavior em C. furcifera a fazer quase um cír-
culo fechado. Encontra-se mal preservada.
Estação 31
Nível com Palaeophycus pouco sinuosos, de diâmetro
regular de 3mm e extensões decimétricas desen-
volvidas no mesmo plano ocupacional. A camada
que lhe sucede é dominada por Daedalus halli que se
mostra incompleta, pois corta normalmente -
rias camadas mas é truncada pela camada sobre-
jacente. Podem ocorrer em níveis com espessura
Os Testemunhos que as Rochas nos Legaram Geodiversidade e Potencialidades do Património do Canhão F luvial de Penha Garcia 59
de várias dezenas de metros, entre a crista, mais
elevada, e o Vale das Casas. O ressalto morfológi-
co prolonga-se para SE pela Barroca do Tendeiro
até ao Pinhal do António Paulo, chegando aqui a
deslocar a crista do Carvalhal.
Belo mirante sobre toda a garganta do Ponsul,
observando-se numerosas dobras secundárias na
sequência quartzítica. Local com colmeias típi-
cas, em casca de sobreiro.
inferior a 20cm. Um pouco abaixo, nível siltítico
onde, num pequeno espaço, se observam estru-
turas enrugadas (wrinkle structures). Estas tendem
a ocorrer ocasionalmente no membro médio da
Formação e correspondem à actuação de corren-
tes de fundo no mar ordovícico sobre um nível de
areia coeso por acção bacteriana.
Estação 32
Falha com direcção N34ºE, vertical, com caixa
preenchida com brecha de falha de 1m de espes-
sura, apresentando cimento ferruginoso e vacúo-
los preenchidos com goethite. A partir desta fa-
lha, as camadas inflectem de direcção, tornando-
se muito irregulares até à perda da definição de
planos de camada, devido a intensa fracturação e
recristalização.
Estação 33
A discordância entre a Formação do Quartzito
Armoricano e o Grupo das Beiras parece ser aqui
de natureza tectónica, por falha de desligamento
esquerdo, com orientação N70ºW. A falha é im-
portante visto a deformação fazer-se sentir numa
faixa de mais de 50m de espessura, sendo ainda
discernível pelo ressalto na paisagem, na ordem
Estação 34
Grande bloco tombado da crista para o rio, en-
contrando-se invertido no seu leito. C. rugosa fa-
zendo dois U ao longo do seu percurso, com gran-
de variação dimensional em função da profun-
didade alcançada (passa de 111mm para 124mm).
C. furcifera aparece aqui a fazer 3 arcos, com uma
largura idêntica.
Estação 35
Topo de camada junto ao solo com fracturas mos-
trando dendrites ferruginosas, raros Daedalus,
fendas en échelon a dar cisalhamento direito com a
direcção N28ºW e fracturação posterior ortogo-
nal com fendas a dar cisalhamento esquerdo.
Estação 36
Grande exposição de base de camada com ripples
de onda em nível quartzítico trico do mem-
bro inferior, a dar orientação das paleocorrentes
NE-SW.
2 falhas paralelas ( direcções N86ºW, 70ºSW) na
vertente que sobe para o mirante.
Estação 37
Dobras apertadas com vergência para N.
Carlos Neto de Carvalho
60
Estação 38
Rusophycus muito pequenos. Podem encontrar-se
muitos calhaus com icnofósseis a atapetar o chão.
Monocraterion com auréola de deformação sedimen-
tar envolvente.
Estação 39
Geode com cristais euédricos de quartzo hialino
em veio de quartzo leitoso com a atitude N54ºW,
localizado em pleno caminho que liga os moinhos
à E.M. 1275.
Estação 40
Monocraterion apresentando uma auréola de defor-
mação sedimentar (em positivo seria uma de-
pressão em torno da galeria), com alguns Daedalus
e Cruziana mal preservadas. Observam-se igual-
mente galerias sem auréolas atribuíveis a Skolithos.
Pode existir relação genética entre Skolithos e Mono-
craterion, constituindo o primeiro icnogénero sec-
ção transversal dado em nível mais profundo que
Monocraterion. Sendo os topos das camadas erosivos
é difícil ter a certeza absoluta desta afirmação. Ri-
pples de corrente a dar sentido das paleocorrentes
para NNW.
O percurso ao longo do membro superior, sem-
pre a subir e passando ao longo das vias de esca-
lada, apresenta belas paisagens sobre o núcleo do
sinclinal e aspectos de caos de blocos nos quart-
zitos com fracturação provocada por dois planos
principais.
Estação 41
Estrutura pouco preservada em sequência de
quartzitos puros, métricos, unilobada, com pa-
drão scribbling ou circling característico de Cruziana.
Toda a camada se encontra bioturbada por Sko-
lithos. A pouca preservação deve ser sinsedimen-
tar, resultante da formação em ambiente litoral
sob acção constante das ondas. Ocupa uma área
de cerca de 3m numa extensão em largura maior
xima de 2m.
Estação 42
Falha normal N38ºE, com dobras de arrasto e
intensa fracturação dos quartzitos a dar o sentido
de movimento.
Estação 43
Galerias de vermes extensas (Palaeophycus) que se
entrecruzam e bonitas fendas de sinérese sub-
prismáticas. Gruta paralela ao plano de cama-
da resultante da exsurgência de antiga nascente
onde se observam 2 planos de diaclases que geram
pequenos paralelipípedos nos níveis psamíticos.
Existem dentro desta gruta pelo menos 4 grandes
C. rugosa.
Estação 44
Falha inversa WSW-ENE evidenciada pela bre-
chificação intensa dos quartzitos. O seu movi-
mento pode ser observado no PR3, no 1º cotovelo
do caminho à direita, a seguir à lapa do caste-
lo. Ocorrem aqui várias exsurgências. Próximo,
existem veios de quartzo leitoso com cerca de
50cm de espessura.
Estação 45
Junto do nº7 da Rua da Lapa existe afloramen-
to de quartzitos deformados muito próximos do
Grupo das Beiras (contacto das duas unidades
por falha?).
Estação 46
Grande laje com mais de 15m de altura que é atra-
vessada por fractura N56ºE, sub-vertical. Esta fa-
Os Testemunhos que as Rochas nos Legaram Geodiversidade e Potencialidades do Património do Canhão F luvial de Penha Garcia 61
se, algumas formando scribbles após percursos rec-
tilíneos de mais de 50cm. Observam-se ainda
estruturas HCS. No prolongamento de algumas
C. goldfussi ocorrem Rusophycus por aprofundamento
da estrutura. Predomina C. goldfussi sobre C. furci-
fera. Observam-se ainda algumas raras galerias de
vermes. A colonização pelo produtor de C. rugosa
parece ser pioneira em relação às restantes estru-
turas (indiciando comunidades diferentes).
Estação 48
Numa placa caída, observam-se 2 Cruziana furcife-
ra com a mesma largura (46mm) mostrando um
comportamento teichichnóide em curva que termina
na parte mais profunda (zona de inflexão) com
marca de verme na zona do sulco central, com 10
e 11mm de diâmetro, em interacção com o bor-
do direito e bordo esquerdo da estrutura. Não se
sabe quem é que corta quem mas é curioso a pro-
cura da paralelização entre as estruturas, levando
a inflexões apertadas. Grande Cruziana rugosa com
duas marcas genais. Os lobos genais possuem
14mm de lado.
Estação 49
Grandes e numerosas Cruziana rugosa e algumas C.
furcifera e C. goldfussi em interacção com algumas
galerias de vermes. Aparece ainda Diplichnites, um
pouco mais acima, com 15mm de largura do tri-
lho.
Estação 50
Gigantescas C. rugosa em interacção com galerias
vermiformes de 10mm de diâmetro com constri-
ções anelares. Sendo cilíndricas, não mostram
evidências de deformação tectónica/diagenética.
lha é posterior à fracturação no plano de camada
N-S. Em redor da falha mostram-se abundantes
estruturas espiraladas. Terá uma origem bioglí-
fica ou tectónica? As estruturas dispõem-se em
porções da camada, de uma forma heterogénea.
Dá a ideia que foram actuadas por movimentos ao
longo dos planos da camada. O preenchimento
não difere da matriz.
Estação 47
“Pala das Cobras Pintadas”. Conjunto de 3
grandes placas invertidas. Uma das lajes mostra
uma perfuração circular com 10cm de diâme-
tro, o que indica acção do Homem na disposição
das lajes. Uma camada in situ mostra a tecto ripples
linguóides cortadas por Cruziana em galerias con-
vexas unilobadas e intrastratais, mostrando que
estas estruturas seriam produzidas no interior
dos sedimentos. O índice de bioturbação nestas
placas vai de IB3 a IB5, em zona de 12m2. Aqui
está presente todo o grupo-rugosa a entrecruzar-
Carlos Neto de Carvalho
62
Estação 51
Base de camada com fendas de sinérese e pseu-
do-nódulos. Interacção de galeria de verme com
sulco axial de C. rugosa. Esta sequência de 2m de
espessura possui ainda camada muito bioturbada
com C. rouaulti de 2 a 7mm de largura, produzindo
abundantes scribbling traces.
Estação 52
Laje 21. Numerosas C. furcifera semi-circulares
com 1 C. rugosa contemporânea. A laje tem 3x1m.
Estação 55
Laje 24. Base de camada com abundantes scribbles
apertados de C. rouaulti. Ocorrem ainda algumas
estruturas do icnogénero Helminthoidichnites com
1mm de diâmetro ou inferior. A laje é atravessada
por alguns Daedalus. Esta camada tem mais de 4m
de extensão mas a bioturbação só é distinguível
em 2m. É a melhor laje com C. rouaulti observada
pelo autor em Portugal. Os veis onde aparece
apenas C. rouaulti seriam “escolas” como acontece
com alguns crustáceos. Ripples de corrente a dar
sentido das paleocorrentes para N.
Estação 53
Compridos Skolithos linearis (decimétricos) em ca-
madas métricas de quartzito, junto dos muros do
bairro tradicional.
Estação 54
C. furcifera em mudança progressiva de nível ocu-
pacional ficando só um lobo visível até desapare-
cer. Na transição apresenta a morfologia típica de
C. rugosa. Em laje situada 5m acima na sequência
mostram-se pequenas C. rugosa muito bem preser-
vadas com lobos marginais, indícios de relação
genética com o resto do grupo C. rugosa. O espa-
çamento entre crenulações é muito apertado. São
cortadas por fendas de sinérese e por finas gale-
rias de vermes com 2mm de diâmetro.
Estação 56
Nos níveis centimétricos a milimétricos de xistos
e quartzitos podem ocorrer slumps gravitacionais.
Não deverá ser deformação tectónica uma vez que
as dobras não têm um sentido de vergência defi-
nido.
Os Testemunhos que as Rochas nos Legaram Geodiversidade e Potencialidades do Património do Canhão F luvial de Penha Garcia 63
Estação 57`
Grande laje com bioturbação densa (IB 4 a IB5)
de C. furcifera e C. goldfussi, com algumas C. rugosa
contemporâneas. A camada prolonga-se por 20m
(interrompida), sempre bastante bioturbada.
Ocorre ainda C. rouaulti e galerias de vermes. As
estruturas foram maioritariamente geradas por
um mesmo indivíduo. A coesão dos sedimentos
era de tal ordem que o mesmo organismo corta
a sua estrutura sem deformação e “penetra” a es-
trutura prévia. Isto deverá resultar de compacção
quando o sedimento ainda estava plástico, pró-
prio de zonas de abundante acarreio sedimentar.
A compacção é pene-contemporânea da formação
das pistas.
Estação 58
C. furcifera de 26mm de largura mostra-se acompa-
nhada ao longo de 120mm por galeria de verme
de 9mm de diâmetro, sub-paralela e logo abai-
xo do eixo axial. A galeria do verme acompanha
todas as variações de profundidade da pista. Não
parece haver relação entre o diâmetro das galerias
de vermes e a largura das pistas de trilobites que
sugira uma relação predador-presa. Talvez haja a
exploração estratégica das Cruziana por parte dos
vermes. Apresenta ainda várias C. furcifera em U.
Estação 59
Falha inversa (N65ºE, 70ºNNW), junto da leva-
da do segundo conjunto de moinhos.
Estação 60
Apertadas dobras de arrasto a dar movimento ca-
valgante do bloco S ao longo da Falha da Barra-
gem.
Estação 61
Grande C. rugosa e laje com ripples de interferên-
cia cortadas por numerosas fendas de sinérese e
formas afins das microbial sand chips que dão um as-
pecto granulado em áreas restritas, cortadas por
fendas de sinérese (que se mostram posteriores),
em laminação silto-argilítica. No prolongamen-
to desta laje para a direita observa-se Diplichnites,
pegadas de trilobites e um Rusophycus onde se nota
a localização do hipostoma, dos lobos produzidos
pelos apêndices cefálicos e a marca da doblura a
toda a volta. Direcção das paleocorrentes NNE-
SSW dado por ripples de onda.
Estação 62
Exposição de camada com 10x4m com ripples de
onda e de interferência a dar direcção das pale-
ocorrentes N-S, cortadas por grandes fendas da
família das fendas de sinérese, de grandes di-
mensões, com terminações cegas. Atrás desta laje
existem diversas C. furcifera e C. goldfussi. 10m abai-
Carlos Neto de Carvalho
64
xo ocorre camada com numerosas Cruziana furcifera
produzidas por um número restrito de organis-
mos atendendo à pouca variação das larguras.
Estação 63
Quase todas as camadas apresentam evidências de
bioturbação, maioritariamente produzidas por
trilobites. As Cruziana apresentam uma preserva-
ção excepcional dos bióglifos, própria do membro
médio desta sequência. O Índice de Bioturbação
raramente atinge o IB3. O domínio é quase ab-
soluto de Cruziana. Observam-se ainda estruturas
unilobadas curvas em epirrelevo convexo e Pala-
eophycus anelados no tecto das camadas, com até
13mm de diâmetro, cilíndricos, sem evidências
de deformação diagenética/tectónica.
Estação 64
A Falha da Barragem prolonga-se por esta zona
tendo gerado dobras de arrasto com vergência
para NE, junto a caixa de falha bem definida.
semi-círculos. Neste local, próximo da zona da
falha da barragem, sub-paralelos à estratificação,
existem filões de quartzo leitoso com vacúolos.
Estação 66
Sobreposição de numerosas e grandes Cruziana ru-
gosa e C. goldfussi. As C. rugosa mostram disposição
teichichnóide em leque dado pelos feixes divergentes
de lobos genais de um mesmo lado. Existem ainda
algumas C. rugosa associadas a galerias de vermes.
Falha inversa (N26ºE, 52ºSE), com movimento
dado por desfasamento de camadas e por intensa
fracturação das rochas.
Estação 67
Exposição de 2m por pouco mais de 50cm, com
grandes C. furcifera curvilíneas. Falha N-S com
grandes cavidades ao longo da zona de falha (ex-
surgências que aproveitaram esta zona de fraque-
za estrutural).
Estação 68
Espectaculares dobras de arrasto mesoscópicas
em S, fracturadas pelo plano axial, com vergên-
cia para NE.
Estação 69
Laje encontrada com as formas meandriformes de
C. furcifera-goldfussi (Fig. 3E). A laje tem pouco mais
de 2,5m por 5cm de espessura. Mostra mudanças
de nível ocupacional progressivas, formando ar-
cos e sinusóides. Existe uma galeria de Arthrophycus
alleghaniensis e estruturas Cruziana techichnóides que dis-
persam em feixes, como em Arthrophycus. No pro-
longamento da laje para a direita existem alguns
pequenos Rusophycus mal preservados. Na camada
abaixo abundam as fendas de sinérese. 2m abaixo
Estação 65
Grande plano de camada exposto numa área de
4x2m, com C. furcifera e C. rugosa formando diversos
Os Testemunhos que as Rochas nos Legaram Geodiversidade e Potencialidades do Património do Canhão F luvial de Penha Garcia 65
Estação 72
No bordo esquerdo da fraga existe topo de cama-
da com grandes bolas de quartzito flanqueadas
por xisto que só ocorrem na proximidade da falha
normal N60ºE que aqui passa.
Estação 73
Cruziana de padrão rabiscado, como sub-impressão
unilobada, por vezes levemente bilobada quando
rompe a última laminação, sem presença de bió-
glifos que não chegaram tão profundamente.
Estação 74
Nível com Arthrophycus alleghaniensis assumindo com-
portamentos lineares (Fig. 6). 50cm abaixo ocorre
laje com Cruziana goldfussi muito pouco marcadas e pe-
quenos Rusophycus com dimensões 26x23mm e 15x22,
bem como uma marca em crescente da doblura do
cefalão com 22mm de largura, semelhante às Cruzia-
na superficiais que ocorrem associadas. Existe ainda
uma diminuta C. rugosa com 38mm de largura. Pró-
ximo, fica uma laje com grandes C. rugosa sub-para-
lelas (Fig. 3F), orientadas quase todas no sentido S.
Faz sentido se a orientação das paleocorrentes pre-
dominantes fosse para N, como parece ser o caso
a partir das leituras efectuadas pelas ripples de cor-
rente. Algumas formas de C. rugosa anteriores a estas
possuem um sentido N. Dada a variação dimensio-
nal das larguras, é evidente a formação destas pis-
tas por mais do que um organismo. Na mesma laje
observa-se C. furcifera com 33mm de largura, parale-
la a galeria de verme com 9mm de diâmetro que se
prolonga na zona do sulco axial ao longo de 50cm,
acompanhando sempre a galeria do verme todas as
alterações de nível estratinómico da Cruziana. 30cm
abaixo ocorre camada com possível Merostomichnites, o
raro icnogénero produzido por locarídeos.
ocorre camada com circling behavior dextrógiro de
C. goldfussi.
Estação 70
Antiga zona de extracção ilegal de quartzitos
onde teria havido, até há bem pouco tempo, uma
grande laje com abundantes Diplocraterion que terá
caído ou sido retirada. Neste novo nível encon-
tram-se raros Diplocraterion, fendas de sinérese, C.
goldfussi em vários estádios de preservação (na de-
pendência do nível estratinómico ocupado nestes
sedimentos coesos), assim como grande C. rugosa
em nível estratinómico que não permitiu a inci-
são dos bióglifos.
Estação 71
Camada com grande C. rugosa (Fig. 3H) , a maior
do mundo em largura no conhecimento presente
(24mm). Esta é cortada e corta pequenas e nu-
merosas C. furcifera, que são cortadas por fendas de
sinérese. No entanto, a C. rugosa não é cortada por
estas. A laje prolonga-se por mais de 3m para a
esquerda, sempre com largura inferior a 50cm,
com grandes C. rugosa, pequenas C. furcifera e fendas
de sinérese. No nível abaixo ocorre C. rouaulti.
... A paisagem geológica do Geopark Naturtejo é o natural reflexo da sua geodiversidade, que se traduz por mais de 600 milhões de anos (Fig. 1) Geopark Naturtejo, ainda que em sectores muito limitados, iniciou-se numa fase precoce deste tipo de trabalho em Portugal (Neto de Carvalho, , 2003Carvalho, , 2004Carvalho, , 2005aSequeira & Serejo Proença, 2004;Carvalho et al., 2006). O Inventário do Património Geológico e Geomineiro do Geopark Naturtejo é um instrumento adaptado à área geográfica do território, pretendendo-se inventariar o património geológico mas também a vertente geomineira com base nos valores científico, didáctico, cultural, ecológico e estético, à escala regional e local.Com este instrumento deseja-se estabelecer e fortalecer uma estratégia de geoconservação no âmbito das políticas da Conservação da Natureza e Ordenamento do Território, promover a valorização e divulgação dos geossítios, dinamizar actividades de educação e geoturismo e monitorizar os geossítios. ...
... A paisagem geológica do Geopark Naturtejo é o natural reflexo da sua geodiversidade, que se traduz por mais de 600 milhões de anos (Fig. 1) Geopark Naturtejo, ainda que em sectores muito limitados, iniciou-se numa fase precoce deste tipo de trabalho em Portugal (Neto de Carvalho, , 2003Carvalho, , 2004Carvalho, , 2005aSequeira & Serejo Proença, 2004;Carvalho et al., 2006). O Inventário do Património Geológico e Geomineiro do Geopark Naturtejo é um instrumento adaptado à área geográfica do território, pretendendo-se inventariar o património geológico mas também a vertente geomineira com base nos valores científico, didáctico, cultural, ecológico e estético, à escala regional e local.Com este instrumento deseja-se estabelecer e fortalecer uma estratégia de geoconservação no âmbito das políticas da Conservação da Natureza e Ordenamento do Território, promover a valorização e divulgação dos geossítios, dinamizar actividades de educação e geoturismo e monitorizar os geossítios. ...
Conference Paper
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No âmbito do tema do workshop faz-se a aplicação dos conhecimentos adquiridos no Geopark Naturtejo com uma excursão através do Sinclinal de Ródão e de alguns dos seus geossítios e outros afloramentos com interesses e relevâncias variados, que vão do meramente científico a uma combinação (quase) sustentável da proteção do património geológico com o seu uso geoturístico. Realça-se num ano particularmente catastrófico para o ambiente em Portugal, a necessidade de um efectivo ordenamento territorial que entenda a dinâmica natural e cultural da paisagem.
... This is a small trail (3 km) that attracts hikers manly by the natural and cultural heritage, such as the outstanding fossil located in the Ponsul's gorge, the watermills and the quartzite-rock traditional architecture, witchery and legends, and the medieval castle. Besides the attractive scenery, increased in the summer by appealing river pool, this is a very important geosite, with international relevance, that has been studied since the late 19th century [6][7][8][9]. The quartzite cliffs from the the Ponsul river valley, show the record of 36 different animal behaviours dating back to 480 million years ago, evidencing extraordinary abundance and preservation, some of the most complex behavioural patterns developed by marine arthropods called trilobites during their lifetime. ...
Article
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This paper presents a counting system project for the Naturtejo Global Geopark, which is structured in two phases. The objective of the first phase was to develop, install and test an electronic system able to remotely count the number of visitors on the Naturtejo Geopark walking routes and touristic sites. The data is reported through a web interface. A Pilot test is currently installed on Trail PR3 – “Fossil’s Route”, near the village of Penha Garcia. Since May 2015, more than 6000 tourists where monitored. The second phase of the project aims to track tourists based on the detection of Wi-Fi signals generated by their smartphones. Thanks to data mining algorithms, useful insights can be extracted that helps to understand the behaviour of tourists when they travel around the large territory of the Geopark.
... Special foraging behavior such as scribbling and circling (Neto de Carvalho, 2004, 2006 Fig 4B). Full relief preservation in C. rugosa Group is known since Lebesconte (1883). ...
Article
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The largest ever described Cruziana, more than 200 mm wide, are not uncommon in the Lower-to-Middle Ordovician Armorican Quartzite Formation, at the Ichnological Park of Penha Garcia, central Portugal. They are the most visible trace fossils of ichnocoenoses dominated by classic arthropod intrastratal burrows, tunnels, and trackways, and Skolithos piperocks in a shallow marine, transgressive siliciclastic succession. The typical “Armorican Quartzite” of the Skolithos Ichnofacies is overlaid by a sequence of alternating storm-related quartzites and pelites of the Cruziana Ichnofacies, where the Cruziana rugosa Group is far abundant and shows a unique diversity of behaviors. A quantitative comparison of the Cruziana ichnospecies from Penha Garcia with the trilobite communities from the Middle Ordovician of Canelas, where large body clusters of asaphids are common, was preliminarily performed with the aim of establishing a genetic relationship and eventual trophic migratory paths across trilobite ontogenesis. The gregarious behavior commonly found in discrete beds totally covered by Cruziana is explained under the trilobite clustering paleobiology, as detritus feeding congregations where the opportunity for scavenging cannot be ruled out. The large body size inferred for some of the Cruziana rugosa trilobite producers may be correlated with the high latitude position of Penha Garcia in the shores of Gondwana during the Ordovician times, the diversification of food resources and abundance, and the capacity to explore them and thrive in oxygen-depleted substrates, that may have resulted in “polar gigantism” among them.
... É de sublinhar a ocorrência de rochas quartzíticas, da Formação do Quartzito Armoricano, que formam o sinclinal de Penha Garcia, que vai desde Salvador, Penha Garcia, Termas de Monfortinho e se prolonga para lá da fronteira com Espanha (Neto de Carvalho, 2004). Também se verifica a ocorrência de depósitos mais recentes de idade fundamentalmente Quaternário (aluviões do vale abandonado da Ribeira da Meimoa e Rio Bazágueda). ...
... Tratam-se dos vestígios mais antigos deste grupo de artrópodes encontrados em Portugal. O património paleontológico de Penha Garcia continua a revelar valores significativos à medida que são feitas novas descobertas pelos investigadores que ali trabalham, sustentados pela nobre herança deixada por grandes paleontólogos como Nery Delgado, Roland Goldring e Adolf Seilacher (Delgado, 1885, Goldring 1985, Neto de Carvalho, 2004, 2006, Seilacher, 2007. O Parque Icnológico de Penha Garcia e o seu diversificado património geológico são percorridos pela Rota dos Fósseis, um percurso pedestre temático que atravessa a garganta rochosa do rio Ponsul e inclui também a Casa dos Fósseis, um espaço que alberga espécimes de fósseis, rochas e minerais locais e interpreta os processos de fossilização e os comportamentos deixados pelos organismos que aí viveram. ...
Article
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Penha Garcia Ichnological Park is the most important fossil site and one of the most significant geosites of international relevance, in the territory of Naturtejo UNESCO Global Geopark. This municipal protected area is a key site for the study of trace fossil diversity at high paleolatitudes in the early stages of the Great Ordovician Biodiversification Event. Most famous among 21 ichnotaxa is Cruziana, interpreted as foraging burrows of trilobites, present in high abundance and excellent preservation. They are among the largest fossils found anywhere in the Lower Paleozoic, not uncommonly several meters long and over 20 cm wide, covering large bedding planes almost completely. The birthplace of Naturtejo Geopark is now a nature school, one of the most visited outdoor sites by schools in Portugal. It also became a reference for geotourism in this country because of the Fossil Trail that allows visitors to access a natural fossil art gallery in the Variscan-folded cliffs of the Ponsul Gorge. The Fossil Home provides the interpretation of the local geoheritage, and additional attractions are the Templar castle and church viewpoints, the climbing school, the secular watermills, the views over the lake in the heart of the syncline, and the Pego river pool. This is a major geotourism destination in the center of Portugal. The in situ conservation of fossils in this ‘outside museum’ is a challenging subject, which is being monitored using 3D high-resolution modeling of the whole gorge and the main fossil sites there to an mm-scale precision.
Chapter
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The Global Ordovician Biodiversification Event (GOBE) was undoubtedly one of the most significant evolutionary events in the history of the marine biosphere. A continuous increase in ichnodiversity occurs through the Ordovician in both shallow- and deep-marine environments. The earlier view that early Paleozoic deep-marine ichnofaunas are of low alpha diversity has been challenged by discoveries of moderately diverse associations. Interestingly, however, the increase in global ichnodiversity through the Ordovician is not paralleled by an increase in ichnodisparity of bioturbation structures. In fact, whereas global ichnodiversity in the Ordovician almost doubled Cambrian levels, Ordovician ichnodisparity of bioturbation structures is roughly similar to that resulting from the Cambrian explosion. Macroboring organisms also display significant evolutionary innovation and diversification in shallow-water hardgrounds and other carbonate substrates, resulting in the Ordovician Bioerosion Revolution. Along with this macroboring ichnodiversity and ichnodisparity increase is a significant rise in the rate of bioerosion in carbonate substrates. Ichnofaunal changes in lower-shoreface and offshore siliciclastic deposits through the Ordovician reveal faunal turnovers resulting from the evolutionary radiation. Lower Ordovician deposits tend to be dominated by abundant trilobite-produced trace fossils. Middle to Upper Ordovician shallow-marine ichnofaunas tend to show more varied behavioral patterns and trilobite trace fossils are rarely the dominant components. During the early Paleozoic, the tiering structure of ichnofaunas became more complex, as a result of both the addition of deeper tiers and of a wider variety of biogenic structures in previously occupied tiers. Infaunalization by deposit feeders in offshore siliciclastic environments was most likely diachronous, with the establishment of a mid-tier infauna first in Laurentia and Baltica, and only subsequently in Gondwana.
Article
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Thick quartzite beds with large bedding planes exposures thoroughly bioturbated with Deadalus desglandi, that can be followed for several kilometers, were discovered in the Lower Ordovician (Floian) of the Armorican Quartzite Formation at Muradal Mountain, UNESCO Naturtejo Geopark (Central Portugal). The complex architecture of this form of Daedalus is discussed and the model of “subtidal pumping”, based on the presence of a draft-fill channel in each one of the burrows, is introduced to explain the feeding pattern in “clean” quartzites. Extremely crowded monoichnospecific levels show that they were strongly controlled by shifting substrate conditions but mostly limited in time, pointing to the colonization of event beds by soft-bodied populations in very shallow marine and very dynamic settings. The magnitude of the Daedalus ichnofabric fluctuations shows that sandflat substrate colonization by the Daedalus producer after each event was intense, mostly sequential, with an exclusive and almost total occupation of the emptied ecospace. The presence of only one preserved behavioral strategy, the substrate depth affected by these structures, the high density of burrows and passive patchiness rates are characteristics of rselected populations. Such large-scale and frequent disturbance events as storms, extreme on a gradient of disturbance intensities, were responsible for some of the earliest opportunistic behaviours in the fossil record. Daedalus was among the most resilient of them in the Early Paleozoic of this part of the world.