O psicodrama brasileiro sempre se caracterizou por um trabalho intenso e variado com grupos. Tanto numa perspectiva processual, grupos terapêuticos praticados nos consultórios e nas instituições de atendimento psiquiátrico ou psicológico; quanto nos chamados atos psicodramáticos (prefiro este nome geral) ou, como querem alguns, atos socionômicos, atos esses de duração curta (algumas horas) modo que a experiência dos psicodramatistas brasileiros foi se moldando através dos anos com o dia a dia deste tipo de trabalho, aperfeiçoado artesanalmente com a supervisão que, a principio, era dada pelos pioneiros deste modo de intervenção. Neste período heróico do psicodrama brasileiro, de fins dos anos 1960 até quase a virada do ano 2000, a literatura psicodramática sobre grupos era muito escassa, limitando-se a um ou outro artigo isolado publicado em nossas revistas. Nos anos 1970, mesmo os supervisores disponíveis frequentemente indicavam bibliografia sobre grupos nos livros sobre o assunto, de orientação exclusivamente psicanalítica, sem qualquer fisionomia psicodramática. Tal registro histórico não deve nos causar estranheza, tendo em vista a maneira como o psicodrama foi se instalando no Brasil, até conquistar sua própria identidade, firmando-se pela excelência da sua prática e pelo peso da sua produção teórica. Das muitas versões históricas do nosso psicodrama, quase não se fala na importância que o Serviço de Psiquiatria do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo desempenhou no movimento psicodramático brasileiro. Em meados dos anos 1960, o chefe deste serviço, Clóvis Martins, propôs a seus comandados que desenvolvessem trabalhos de grupos na instituição, visando melhorar a qualidade do trabalho assistencial, evitando resumir os atendimentos a uma farta distribuição de medicamentos nas consultas de ambulatório. Vários desses profissionais, que mais tarde foram os responsáveis pela implantação do psicodrama no Brasil, iniciaram atendimentos de grupos, adotando o modelo psicanalítico, que era o que se difundia naquela ocasião. Trabalhavam em duplas (um deles sendo um observador/anotador que permanecia o tempo todo de boca fechada), vestiam terno e gravata formalmente e faziam sua própria terapia com psicanalistas conhecidos (alguns em grupo). Há uma publicação da época, editada pelo próprio hospital, juntando trabalhos sobre grupos, de orientação psicanalítica, daqueles que vieram a se tornar depois os primeiros psicodramatistas brasileiros. Esta publicação é ilustrada com fotos que registram o terno e a gravata. Sem entrar em detalhes de como através de congressos tais profissionais entraram em contato e se encontraram com o psicodrama, para o que interessa aqui, é natural que esses futuros psicodramatistas se apoiassem mais tarde na literatura psicanalítica disponível sobre grupos quando se tornaram professores e supervisores de psicodrama. Em 1999, Wilson Castello de Almeida organizou um livro de diversos autores, Grupos, a proposta do psicodrama, que coletou artigos sobre grupos psicodramáticos dispersos na literatura brasileira 1 Originalmente publicado como capítulo de um livro de vários autores (org. Gandolfo,M.I; Nery, M.P.), Intervenções grupais: o psicodrama e seus métodos (2012). São Paulo: Ágora. 2 Psiquiatra, psicodramatista, professor-supervisor didata da Sociedade de Psicodrama de São Paulo (SOPSP), credenciado pela Federação Brasileira de Psicodrama (Febrap), autor de diversos livros e artigos de psicodrama.