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NOVA
SUBSPÉCIE
DE
CAPRIMULGUS (LlNNAEUS) (AVES,
CAPRIMULGIDAE)
DO
EspíRITO SANTO, BRASIL
Rúmulo
Rihon I
ABSTRACT. A
NEW
SLlBSPEC
I
ES
OF
(À
I'RIMULGUS
(UNNAEIIS)
(AVlõ\.
CAPRIMUl.ü
lll
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FROM
EwíKITO
SANTO.
BRAZIL.
A
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as
a
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suhsp~ci~s
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Pygmy
Nightjar
Caprillllllglls hirundinacclIs
(Spix.
1825
).
This
repres~nls
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speci~s.
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with
which
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plumage
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KEY
WORDS.
Aws.
Capt7l11l1lglls
hirtmdinacel~'.
n<!w
subsp~cies.
Espírilo
Sanlo
.
Bra
zi
l
Os hacuraus, aves da família cosmopolita Caprimulgidae, são pouco
conhecidos
devido a seus háhitos noturnos e fraca diferenc
ia
ção morfológica. Este
é o caso da maioria das
espécies brasileiras e particularmente de C({prilllulgus
hirundinaceus Spix, 1825.
Esta espécie de bacurau, caracterizada pelo tamanho diminuto e coloração
pálida, é conhecida
somente por poucos exemplares do Nordeste do Brasil.
CORY
(1918) ficou em dúvida sobre a
lo
calidade-tipo de Spix, mas examinou
13
espécimen:;
pr
ovenientes da região da caatinga, reconhecendo as suhspécies
crissalis Cory, 1915 e ce({rae (Cory, 1917) baseando-se
em
pequenas variações
de coloração. Entretanto,
HELLMA
YR
(1929) designa Feira de Santana (Bahia)
como localidade-tipo
de
Spix e coloca
Ch.
crissalis
em
sinonímja
com
a forma
típica,
reconhecendo apenas a subspécie cearae pela coloração "decidedly paler",
revisão com a qual concorda
PINTO
(1938). Desde então, a espécie
foi
considerada
endêmjca da caatinga nordestina com raros registros. A
úni
ca informação hiológica
consiste da gravação
de quatro vocalizações realizada por J. Vielliard
em
08-XII-1973 (Serra Talhada, Pernambuco, exemplar identiticado como
('eame
e
depositado no Museu Nacional do Rio de Janeiro rMNRJ] por J. Vielliard) e
puhlicada por
HARDY
(1980).
Desde o início da década de 1980, resgistrou-se na região de Colatina
(Espírito Santo) um
pequeno hacurau negro nas lajes que
aí
são comumente
encontradas. Em
1993
,
coI
dou-
se
um
exemplar que
foi
comparado com o material
do Museu Nacional do
Rio de Janeiro (MNRJ), onde uma série de C({prilllulgus
nigrescens
Cahanis, 1848, consistindo de
18
espécimen:; amazônicos e um de
I)
Deral1amenl
ll
ck
Biologia
Geral.
Set,)r
,k
Ecologia.
Universidade
Federal
d
~
Vi'llsa.
36570
-000
Viçosa.
Minas
Gerais.
Brasil.
Revta
bras.
Zool.
12
(2):
333·337,
1995
334
RIBON
Jequitinhonha (Minas Gerais), este último exemplar (MNRJ
nO
31357) assim
identiticado
por
H. Sick, nos levou a concluir que o exemplar em questão pertencia
a esta
espécie. Voltando ao local da
calda,
foram realizados experimentos
de
play-bllck
com
a tita publicada
por
HARDY
(1980), primeiro com a vocalização
de
C.
nigrescens. Não se ohteve resposta e se prosseguiu com a voz
de
C.
hirundi-
nllceus. A tentativa
foi
bem sucedida. Uma ave respondeu prontamente
com
as
mesmas
quatro vocalizações publicadas; repetindo o pllly-bllck na noite seguinte,
o indivíduo respondeu novamente e aproximou-se permitindo
confirmar
sua
conformidade
com o exemplar coletado.
Munidos desta informação, reavaliaram-se os
caracteres morfológicos do
espécimen, concluindo tratar-se de uma nova subespécie de
C.
hirulldillllceus que
é
descrita a seguir.
Caprimu/gus hirundinaceus vielliardi,
ssp.n.
Figs 1, 4, 6
Subspécie
dedicada ao
co
lega Prof. Dr. Jacques
M.E.
Vielliard,
em
reconhecimento à sua contribuição ao estudo bioacústico da avifauna hrasileira.
Holótipo
macho.
Adulto
(testículos
3x4mm;
crân
io
ossificado),
19-IX-1993,
BRASIL,
Espírito Sanw: Colatina
(19°32'S
- 40
0
37'W,
altitude
de
aproximadamente 40m), íris marrom-escuro,
R.
Ribon leg., taxidermista G.
T.
de
Matlos. Depositado na coleção ornitológica do Museu
de
Biologia Mello Leitão
(M
BM
L), Santa Tereza, Espírito Santo.
Descrição.
Todo
o lado dorsal com aspecto geral
marrom
fortemente
enegrescido (cor
nO
19
"Dusky Brown" de Smithe, 1975) e salpicado
de
ferrugem
(cor
nO
39 "Cinnamon"
de
Smithe, 1975). As cores a seguir, quando diferentes
destas
já
descritas, não
t~m
similares em
SMITHE
(1975), sendo variaç<ies sutis
destas duas anteriores: fronte negra com diminutas manchas
de
cor
ferrugem na
borda
das penas; alto da cabeça
com
manchas ferrugem mais ahundantes, tormando
um delgado
co
lar terrugíneo na base da nuca; dorso e coherteiras supracaudais
com
pequenas manchas ferrugíneas. Lado ventral de coloração geral negra estriada
de
ferrugem: penas do mento com pontas esbranquiçadas; na garganta as penas
são hrancas somente
com
as
pontas de coloração negra ou ferrugem claro.
formando uma nítida mancha guIar hranca. As penas
do peito são negras com uma
ou duas faixas ferrugem, sendo que esta
cor
tende ao hranco
em
alguns pontos,
dando
a esta região um aspecto geral negro estriado de hranco e terrugem. O
ahdômem
e o ventre contrastam c
om
o peito, tendo uma tonalidade mais ferrugínea,
a maior
porção de cada pena sendo desta
cor
, atravessada por uma ou duas htixas
negras. As penas da região do crisso são predominantemente ferrugens,
com
pequenas manchas negras. Asas pontiagudas, com as primárias de
cor
fuligem
escura
e a horda do vexilo externo um pouco mais clara. A porção média do vexilo
interno
das quatro primárias mais externas apresenta uma malll:ha hranca, muito
pequena na primária mais externa, e mais extensa nas
tr~s
outras, formando uma
nítida faixa branca. Contígua a esta, na quinta primária há apenas uma fraca
mancha
de
cor
fuligem-amarronzada. As demais primárias possuem amhos
os
Revta
bras.
Zoo!.
12
(2):
333
-
337.
1995
Nova
subespécie
de
Caprimu/gus
...
335
2
4
Figs
1-6.
(1,4,6)
Caprimu/gus hirundinaceus vielliardi,
ssp.n.,
holótipo
macho,
vista
lateral
(1),
detalhes
da
asa (4) e
da
cauda (6) vista
debaixo.
(2,
3,
5)
Caprimu/gus hirundinaceus
hirundinaceus
(Spix,
1825),
macho
ZUEC
N°
1529,
vista
lateral no seu
habitat
(2),
detalhes
da
asa (3) e da cauda (5)
vistas
debaixo.
Guaxe
original realizado graciosamente por Frederico
lencioni.
Revta bras. Zool.
12
(2):
333
-
337,
1995
336
RIBON
vexilos de
cor
fuligem. Secundárias desta mesma
cor
com o vexilo interno
manchado
de
ferrugem. Terciárias da mesma
cor
que o dorso,
marrom
fortemente
enegrescido,
salpicadas de ferrugem claro, apresentando algumas manchas maio-
res desta mesma cor. Coberteiras inferiores ferrugíneas, parcialmente manchadas
de negro;
coberteiras superiores fuligem escuro,
com
pequenas manchas ferrugem
ou ferrugem esbranquiçado. Cauda: por cima semelhante ao dorso, por baixo
fuligem
escuro salpicado de ferrugem claro no
par
de retrizes centrais e trans-
faciado
desta
cor
no vexilo interno das demais. Vexilo interno da retriz mais
externa (primeira)
e ambos vexilos da segunda
com
larga faixa branca na ponta.
Vibrissas longas. Bico negro. Tarsos emplumados
com
o mesmo padrão
de
coloração
do abdômem; dedos negros. Comprimento total
193m111,
cúlmen
9mm,
asa I
37nun,
cauda
91
mm, tarso 20mm.
Diagnose. Pelas proporções, vibrissas desenvolvidas e tarsos
emplumados
pertence ao
gênero
Caprimulgus; a voz e o padrão
de
coloração se re
tt!
rem à
esp~cie
hirundinaceus; difere
de
C hirundinaceus hirundinaceus (Figs
2,
3, 5) pela
coloração
enegrescida e pelo tamanho total nitidamente maior; vive
sobre
aflora-
mentos rochosos; por enquanto, conhecida somente da localidade-tipo.
DISCUSSÃO
A localidade-tipo de
Ch.
vielliardi encontra-se distante da distribuição
aM
então conhecida para a
esp~c~e
e situa-se no domínio da Mata Atlântica, totalmente
diferente do domínio
da
caatinga, da qual
era
considerada endêmica. Touavia,
vielliardi tem por habitat lajes ensolaradas que se assemelham aos ambientes
da
esp~cie
no Nordeste, onde "pousa sobre areia
ou
lajes" segundo
SICK
(1985). A
região
de
Colatina (Espírito Santo) caracteriza-se pela vegetação relativamente
seca,
bem
diferente das matas
de
tabuleiro e de encostas no Estado. Esta região
apresenta uma ocorrência notável de afloramentos rochosos, que
criam
um
ambiente bem particular.
No Nordeste, a
esp~cie
parece apresentar uma nítida variação de coloração
que
talvez esteja relacionada
com
a coloração do substrato. Não existem dados que
permitam
estabelecer essa correlação, mas,
no
caso de viellillrdi, a coloração
enegrescida está
claramente harmonizada com a cor das lajes nas quais vive.
Chamada
de " bacurauzinho-da-caatinga" por
SICK
(1985), a
esp~cie
tem
agora sua distribuição consideravelmente ampliada e descontínua. Todavia,
em
função
da
nova localidade, deve-se procurar a espécie
em
regiões intermediárias
e vizinhas.
O exemplar
de
Jequitinhonha (MNRJ
nO
31357), identificado
por
H.
Sick, merece
ser
reavaliado.
Tamb~m
é necessário pesquisar os amhientes rocho-
sos
que
se encontram
atrav~s
do norte de Minas Gerais e ao longo das regiões
baixas e
com
lajes do Espírito Santo até o norte do Rio de Janeiro.
A população de Colatina, circunscrita às áreas fitofisionômicas particulares
dos lajedos, parece ser abundante, ao ponto
de
ser bem conheciua uos moradores
da zona rural. Apesar disto, devido à extrema localização e rigorosas exigências
ecológicas desta população, medidas de preservação devem
ser
tomadas para
garantir sua sobrevivência.
Revta
bras.
Zool.
12
(2):
333
-
337.
1995
Nova
subespécie
de
Caprimulgus
...
337
AGRADECIMENTOS.
A
1ll~lI
S
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Andr~a
O.
Barros.
p~lo
apoio
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outra
forma.
tornar
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possívd
a
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trahalh,
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Revta
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Zool.
12
(2):
333
-
337,1995