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Arq Bras Cardiol
2003; 81: 343-8. Strelec e cols
Conhecimento sobre a doença e a tomada de remédios para HA
343343
Escola de Enfermagem e Faculdade de Medicina da USP
Correspondência: Décio Mion Jr - Instituto Central do HC - Av. Dr. Enéas de
Carvalho Aguiar, 255, 7º, s/7032 - Cep 05403-900 - São Paulo, SP
E-mail: deciomion@uol.com.br
Recebido para publicação em 2/5/02
Aceito em 24/3/03
Arq Bras Cardiol, volume 81 (nº 4), 343-8, 2003
Maria Aparecida A Moura Strelec, Angela M. G. Pierin e Décio Mion Jr.
São Paulo, SP
A Influência do Conhecimento sobre a Doença e a Atitude Frente
à Tomada dos Remédios no Controle da Hipertensão Arterial
Artigo Original
A hipertensão arterial representa sério problema de
saúde pública, pela sua elevada prevalência, de 15% a 20%
na população adulta e mais de 50% nos idosos1. Além dis-
so, junto com o tabagismo, diabetes e dislipidemia constitui-
se em importante fator de risco para as doenças cardiovas-
culares responsáveis por cerca de 30% das mortes2.
O tratamento anti-hipertensivo tem, como principal ob-
jetivo, reduzir a morbidade e mortalidade cardiovasculares3,4 .
Apesar da sua efetividade, a hipertensão arterial é pouco
controlada. Estudos no nosso meio mostraram que, apro-
ximadamente, um terço dos pacientes estava com a pressão
arterial controlada5,6. Assim, a falta de controle da pressão
arterial é um desafio para os profissionais de saúde. Vários
fatores interferem na adesão ao tratamento7. Dentre eles des-
tacam-se o conhecimento do paciente sobre a doença e o seu
comportamento frente à tomada dos remédios. Neste senti-
do, Morisky e Green8 apresentam uma escala de auto-relato,
teste de Morisky e Green, composta de quatro perguntas para
identificar atitudes e comportamentos frente à tomada de re-
médios, que têm se mostrado úteis para identificação de pa-
cientes aderentes ou não ao tratamento.
Apesar da auto-informação estar sujeita a problemas,
como omissão, falhas de memória e falhas no processo co-
municativo, este é um método ainda bastante usado em es-
tudos, por apresentar correlações importantes com outros
métodos9. Até o momento, em nosso meio, não há registro
da utilização do teste de Morisky e Green na avaliação do
controle e adesão do hipertenso ao tratamento. Além disso,
considera-se relevante estudar a influência do conhecimen-
to e atitudes referidas por hipertensos frente ao tratamento
medicamentoso, no controle da pressão arterial. O presente
estudo teve como objetivo: relacionar o controle da pressão
arterial com: a) o teste de Morisky e Green, b) o conhecimen-
to sobre a doença e tratamento, c) a atitude frente à tomada
dos remédios, d) o comparecimento às consultas médicas,
e) a opinião do médico.
Métodos
Trata-se de um estudo descritivo exploratório, com
abordagem quantitativa, de 130 pacientes com hipertensão
arterial primária leve ou moderada, (diastólica entre 90 e
Objetivos - Relacionar o controle da pressão arterial
com o teste de Morisky e Green, o conhecimento sobre a
doença, a atitude frente à tomada dos remédios e o compa-
recimento às consultas e juízo subjetivo do médico.
Método - Foram estudados 130 hipertensos: 73%
mulheres, 60 ± 11 anos, 58% casados, 70% brancos, 45%
aposentados, 45% 1º grau incompleto, 64% renda fami-
liar de 1 e 3 salário mínimo, índice de massa corporal 30
± 7 Kg/m2, 11 ±9,5 anos de conhecimento da doença e 8 ±
7
anos de tratamento.
Resultados - Apenas 35% dos hipertensos apresenta-
vam pressão arterial controlada, maior tempo de trata-
mento (10 ± 7 vs 7 ± 6,5 anos; p < 0,05) e predomínio de
aposentados. O teste de Morisky-Green não se relacionou
com controle da pressão arterial. Na avaliação da atitude
frente à tomada dos remédios os pacientes controlados
apresentaram nota significativamente mais elevada do que
os não controlados (8 ± 1,9 vs 7 ± 2; p < 0,05). Os hiper-
tensos apresentaram altos níveis de conhecimento em re-
lação à doença e tratamento, porém sem relação com con-
trole da pressão arterial. A maioria (70%) compareceu en-
tre 3 a 4 consultas médicas, sem influência no controle da
pressão arterial. Os médicos atribuíram notas significa tiva-
mente mais elevadas para a adesão ao tratamento aos pa-
cientes controlados (6 ± 0,8 vs 5 ± 1,2; p < 0,05).
Conclusão - O conhecimento, o teste de Morisky-
Green e o comparecimento às consultas não influenciaram
no controle da pressão arterial.
Palavras-chave: hipertensão arterial, controle, adesão,
tratamento
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Conhecimento sobre a doença e a tomada de remédios para HA Arq Bras Cardiol
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109mmHg e/ou sistólica entre 140 e 179mmHg); com idade >
18 anos; sem doenças associadas, como infarto agudo do
miocárdio, acidente vascular cerebral, doenças renais e dia-
betes mellitus; em tratamento há pelo menos seis meses,
que concordaram em participar do estudo e assinaram ter-
mo de consentimento livre e esclarecido. O estudo obteve
aprovação do comitê de ética local.
Os hipertensos foram entrevistados após consulta
médica, respondendo às questões do teste de Morisky e
Green e dois formulários, um de atitudes frente à tomada
dos remédios e outro de conhecimento em relação à doença
e tratamento.
O teste de Morisky-Green é formado pelas questões: 1)
você, alguma vez, esquece de tomar seu remédio? 2) você,
às vezes, é descuidado quanto ao horário de tomar seu re-
médio? 3) quando você se sente bem, alguma vez, você dei-
xa de tomar o remédio? 4) quando você se sente mal com o
remédio, às vezes, deixa de tomá-lo? De acordo com o proto-
colo do teste de Morisky e Green8, considera-se aderente ao
tratamento o paciente que obtém pontuação máxima de 4
pontos e não aderente o que obtém 3 pontos ou menos.
Utilizou-se também um formulário composto por 10
questões para avaliar a atitude frente ao tratamento medica-
mentoso, atribuindo-se um ponto para cada atitude positi-
va esperada. O conhecimento em relação à doença e trata-
mento também foi avaliado por meio de 10 questões com
respostas verdadeiro ou falso, sendo atribuído um ponto a
cada resposta verdadeira.
Para a análise da pressão arterial utilizaram-se os valores
anotados no prontuário do paciente. Rotineiramente, a me-
dida da pressão arterial é realizada com o paciente sentado,
após 5min de repouso, com aparelho aneróide calibrado. Fo-
ram considerados hipertensos controlados, os pacientes
com pressão sistólica < 140mmHg e diastólica < 90mmHg,
média dos valores da pressão arterial dos últimos 6 meses.
A classificação da adesão do hipertenso ao tratamen-
to, conforme opinião dos médicos, foi avaliada através de
atribuição de notas que variavam de 1 a 7, e de classificação
em adesão total, parcial ou nula.
As respostas obtidas nos três processos foram compa-
radas com a pressão arterial, sensibilidade, especificidade e
acurácia de cada questão. A associação entre as variáveis
classificatórias foi verificada com o teste qui-quadrado ou
teste da razão de verossimilhança ou com o teste exato de
Fisher. As variáveis contínuas foram apresentadas em ta-
belas contendo médias, desvio padrão, observadas em uma
única condição e analisadas com o teste t-Student ou teste
da soma de pontos de Wilcoxon. Os valores de p < 0,05 foram
considerados significantes.
Resultados
Do total de 130 pacientes estudados apenas 35% esta-
vam com a pressão arterial controlada (< 140/90mmHg), 23%
apresentavam hipertensão no estágio I (leve), 24% estágio
II (moderada), 17% hipert ensão sistólica isolada e 1% hiper-
tensão estágio III (grave).
Analisando-se as características biossociais, hábitos
de vida, tempo de doença e tratamento, os dados da tabela I
mostram que somente a ocupação e tempo de tratamento in-
fluenciaram de modo significante (p < 0,05) no controle da
pressão arterial. Os aposentados e as donas de casa foram
os que mais apresentaram controle da pressão arterial. Os hi-
pertensos controlados tinham mais tempo de tratamento do
que os não controlados (10 ± 7 vs 7 ± 6,5 anos; p < 0,05). Ve-
rificou-se ainda, que os níveis da pressão arterial dos
pacientes não controlados foram significativamente mais
elevados que os dos controlados.
Os dados da tabela II apresentam os resultados do
teste Morisky e Green. Das quatro questões avaliadas, os
maiores percentuais de atitudes positivas, do total de hiper-
tensos estudados, frente à tomada dos medicamentos, foram
para “não deixar de tomar os remédios mesmo sentindo-se
mal” (83%) e “não deixar de tomar o remédio quando sentem-
se bem” (72%). Somente a questão “descuido do horário da
tomada das medicações” associou-se de modo significativo
(p < 0,05) ao controle ou não da pressão arterial, ou seja, os
pacientes não controlados descuidaram-se mais do horário
dos remédios (74%) do que os pacientes controlados (26%).
A somatória dos pontos dos hipertensos controlados
e não controlados, de acordo com o preconizado no teste de
Morisky e Green, mostrou que 77% apresentaram pontua-
ção ≤ 3, portanto, não aderentes. O controle da pressão arte-
rial não influenciou de modo significante nessa classifica-
ção. O total de atitudes positivas frente à tomada dos remé-
dios, analisadas pelo teste de Morisky e Green, apresentou
especificidade satisfatória (70%), revelando a proporção
entre pacientes não controlados, que apresentaram atitude
negativa e o total dos que não estavam com a pressão arte-
rial controlada. Porém, a sensibilidade foi baixa (39%), de-
tectando a relação entre os indivíduos que apresentavam a
pressão arterial controlada com atitude positiva frente à to-
mada dos remédios e o total dos hipertensos com pressão
arterial controlada. Considerando-se acurácia de 59%, con-
clui-se que o teste de Morisky e Green não foi eficiente para
relacionar controle da pressão arterial e atitude positiva fren-
te à tomada dos remédios.
Além do teste de Morisky e Green utilizou-se outro
questionamento também com o objetivo de avaliar atitudes
frente à tomada dos remédios. Na tabela III encontra-se o
percentual expressivo dos pacientes apontando atitudes
positivas. Somente a questão relativa à tomada dos remé-
dios, mesmo quando a pressão estava controlada, asso-
ciou-se com o controle da pressão arterial. Os pacientes
não controlados referiam-se a deixar de tomar os remédios
mais do que os pacientes controlados (83% vs 17%;
p < 0,05). Do total das 10 questões, verificou-se que 6 das
respostas apresentaram sensibilidade satisfatória (>70%),
porém apenas na questão “anota horário de tomada dos re-
médios”, a especificidade foi satisfatória (76%).
Analisando-se a média da pontuação obtida nas 10
questões que avaliaram atitudes positivas frente à tomada
dos remédios observou-se que nos pacientes controlados
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Conhecimento sobre a doença e a tomada de remédios para HA
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Tabela I - Distribuição dos pacientes hipertensos controlados e não controlados de acordo com as características sócio-estruturais,
hábitos de vida e dados da doença
Grupo
Controlados (n=46) Não controlados (n=84) Total (n=130)
Características n%n%n%
Sexo
Masculino 11 31 24 69 35 27
Feminino 35 37 60 63 95 73
Estado civil
Solteiro 3 37 5 63 8 6
Casado 26 34 50 66 76 58
Viúvo 12 43 16 57 28 22
Separado 2 33 4 67 6 5
Amasiado 3 25 9 75 12 9
Raça
Branca 35 38 56 62 91 70
Não – branca 11 28 28 72 39 30
Ocupação *
Aposentado 26 45 32 55 58 45
Do lar 18 37 30 63 48 37
Autônomo 0 0 10 100 10 8
Desempregado 1 14 6 86 7 5
Outros 0 0 2 100 2 1
Escolaridade
Analfabeto 9 33 18 67 27 21
Sabe ler e escrever 7 25 21 75 28 21
1º Grau completo 5 50 5 50 10 8
1º Grau incompleto 22 38 36 62 58 45
2º Grau incompleto 3 60 2 40 5 4
Superior 0 0 2 100 2 1
Renda familiar (sal. mínimo)
< 1 2 100 0 0 2 1
1 até 3 29 34 57 66 86 64
4 até 5 4 22 14 78 18 14
5 até 7 7 58 5 42 12 9
7 até 10 1 20 4 80 5 4
> 10 3 50 3 50 6 5
Uso de hormônios 2 50 2 50 4 3
Fumo 1 10 9 90 10 8
Bebidas alcoólicas 3 33 6 67 9 7
Atividade física 16 41 23 59 39 30
Idade 60 ±12 59 ±11 60 ±11
Tempo hipertensão 12 ±9 10 ±9,5 11 ±9,5
Tempo tratamento* 10 ±7 7 ±6,5 8±7
IMC (Kg/m2)29 ±6 30 ±7 30 ±7
PAS/PAD(mm Hg) 127 ±7 / 79 ± 5 150 ± 10* / 93 ± 7* 142 ± 14 / 88 ± 9
* p < 0,05
Tabela II - Distribuição dos hipertensos controlados e não controlados no teste Morisky e Green, sensibilidade, especificidade e acurácia
Grupo
Controlado Não controlado Total Sensibilidade % Especificidade % Acurácia %
n%n%n%
Esquece de tomar remédio
Sim 20 31 44 69 64 49 57 52 54
Não 26 39 40 61 66 51
Descuidado no horário
Sim 15 26 43 74* 58 45 67 51 53
Não 31 43 41 57 72 55
Sente bem, deixa de tomar o remédio
Sim 11 30 26 70 37 28 76 31 47
Não 35 38 58 62 93 72
Sente mal, deixa de tomar o remédio
Sim 8 37 14 63 22 17 39 70 59
Não 38 35 70 65 108 83
* p < 0,05
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Conhecimento sobre a doença e a tomada de remédios para HA Arq Bras Cardiol
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ela foi significativamente mais elevada do que nos não con-
trolados (8±1,9 vs 7±2; p < 0,05). Quando realizou-se corte
em 7, também houve relação significante, porém, inversa,
maior percentual de pacientes não controlados na faixa de
pontuação ≤ 7, quando comparados aos controlados (73%
vs 27%; p < 0,05).
Os dados da tabela IV mostram que o conhecimento
dos pacientes hipertensos foi satisfatório. Apenas em duas
questões, o percentual de acerto foi inferior a 50%, “pres-
são alta é assintomática” (30%) e “hipertensão pode ser tra-
tada sem remédios” (11%). A sensibilidade foi satisfatória
(>70%) em 7 questões (doença crônica, complicações, trata-
mento contínuo, praticar exercícios físicos, perder peso, di-
minuir o sal e nervosismo), indicando sensibilidade para se
associar o conhecimento da doença e tratamento com o
controle da pressão arterial. Porém, só duas questões, hi-
pertensão é assintomática, e pressão alta pode ser tratada
sem remédios, revelaram especificidade satisfatória.
Apesar dos altos níveis de conhecimento em relação à
doença e ao tratamento, não houve associação com o con-
trole da pressão arterial, também revelado pelas médias simi-
lares obtidas pelos hipertensos controlados e não controla-
dos, (7 ± 1 e 7 ± 1,5; respectivamente).
Analisando-se o comparecimento às consultas médi-
cas no período de seis meses, a maioria dos pacientes (70%)
compareceu entre 3 e 4 consultas, 5% em 6 consultas e 10%
em apenas 2 consultas. Não houve associação significativa
(p > 0,05) entre controle da pressão arterial e número de com-
parecimento às consultas.
Na avaliação da adesão dos pacientes ao tratamento
feita pelos médicos, as notas foram significativamente mais
elevadas para os hipertensos controlados em relação aos
não controlados (6 ± 0,8 vs 5 ± 1,2; p < 0,05).
Em relação ao tratamento medicamentoso, verificou-se
que pouco mais da metade (56%) dos pacientes tinha pres-
crição de dois medicamentos anti-hipertensivos, 26% um
medicamento e 18% três ou mais. Os medicamentos mais fre-
qüentes foram os diuréticos em monoterapia ou associados
com drogas de ação central, inibidores da enzima de conver-
são e antagonistas dos canais de cálcio. Os pacientes com
pressão arterial não controlada tiveram número significati-
vamente mais elevado (p < 0,05 ) de drogas prescritas em
relação aos controlados (tab. V).
Discussão
Os dados do presente estudo evidenciaram que os pa-
cientes hipertensos no teste de Morisky e Green referiram
atitudes positivas em relação à tomada dos remédios, porém
sua associação com o controle ou não da pressão arterial
foi pouco significativa, exceto para a questão “descuido do
Tabela III - Distribuição dos hipertensos controlados, e não controlados de acordo com as respostas obtidas no formulário para avaliar atitude frente à
tomada dos remédios, sensibilidade, especificidade e acurácia.
Grupo
Controlado Não controlado Total Sensibilidade % Especificidade % Acurácia %
n%n%n%
Anota horário
Sim 13 40 20 60 33 25 28 76 59
Não 33 34 64 66 97 75
Toma no mesmo horário
Sim 29 34 57 66 86 66 63 32 43
Não 17 39 27 62 44 34
Associa com atividades
Sim 26 39 41 61 67 52 57 51 53
Não 20 32 43 68 63 48
Toma quando sai
Sim 37 37 64 63 101 78 80 24 44
Não 9 31 20 69 29 22
Providencia antes de acabar
Sim 38 35 70 65 108 83 83 17 40
Não 8 36 14 64 22 17
Leva quando viaja
Sim 45 38 74 62 119 92 98 12 42
Não 1 9 10 91 11 8
Toma com a pressão controlada
Sim 39 44 50 56 89 68 85 40 56
Não 7 17 34 83* 41 32
Deixa de tomar quando ingere bebida alcoólica
Sim 4 29 10 71 14 11 91 12 40
Não 42 36 74 64 116 89
Deixou de tomar nos últimos 30 dias
Sim 19 31 43 69 62 48 59 51 54
Não 27 40 41 60 68 52
Faltou à consulta
Sim 11 30 26 70 37 28 76 31 59
Não 35 38 58 62 93 72
*p<0,05
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Conhecimento sobre a doença e a tomada de remédios para HA
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Tabela IV - Distribuição dos hipertensos controlados e não controlados de acordo com as respostas obtidas na avaliação do conhecimento em relação à
doença e tratamento
Grupo
Controlado Não controlado Total Sensibilidade % Especificidade % Acurácia %
n%n%n%
Pressão alta é para toda vida
Verdadeiro 39 38 64 62 103 79 85 24 45
Falso 7 26 20 74 27 21
Hipertensão é assintomática
Verdadeiro 19 46 22 54 41 32 41 74 62
Falso 27 30 62 70 89 68
Pressão alta é 14 por 9
Verdadeiro 26 36 46 64 72 55 57 45 49
Falso 20 34 38 66 58 45
Pressão alta traz complicações
Verdadeiro 43 35 80 65 123 95 93 5 36
Falso 3 43 4 57 7 5
O tratamento é para a vida toda
Verdadeiro 43 39 68 61 111 85 93 19 43
Falso 3 16 16 84 19 15
Pressão alta pode ser tratada sem remédios
Verdadeiro 6 40 9 60 15 11 13 89 62
Falso 40 35 75 65 115 89
Fazer exercícios físicos controla a pressão
Verdadeiro 33 34 63 66 96 74 72 25 42
Falso 13 38 21 62 34 26
Perder peso controla a pressão arterial
Verdadeiro 38 36 69 64 107 82 83 18 41
Falso 8 35 15 65 23 18
Diminuir o sal controla a pressão
Verdadeiro 45 35 82 65 127 98 98 2 36
Falso 1 33 2 67 3 2
Diminuir o nervosismo controla a pressão arterial
Verdadeiro 44 35 82 65 126 97 96 2 35
Falso 2 50 2 50 4 3
Tabela V - Distribuição dos hipertensos controlados e não controlados
e o número de medicamentos prescritos.
Grupo
N.º de drogas Controlado Não controlado* Total
n%n%n%
1 18 53 16 47 34 26
2 20 27 53 73 73 56
≥3 7 30 16 70 23 18
Total 45 35 85 65 130 100
* p < 0,05
horário da tomada das medicações” Observou-se também
que os hipertensos apresentaram conhecimento satisfató-
rio em relação à doença e tratamento e mais uma vez com
fraca associação com o controle ou não da pressão arterial.
Ressalta-se porém, que na avaliação mais abrangente, com
maior número de questionamentos sobre as atitudes frente
ao tratamento medicamentoso, verificou-se que houve rela-
ção significante entre a pontuação obtida e o controle da
pressão arterial. Portanto, os teste de Morisky e Green e co-
nhecimento sobre doença e tratamento não apresentaram
abrangência suficiente para predizer o controle da pressão ar-
terial. No presente estudo a avaliação dos hipertensos com o
referido teste foi pontual e com tratamento em curso, o que
talvez justifique os resultados encontrados.
Apenas cerca de um terço dos hipertensos estudados
estava com a pressão arterial controlada, similar ao encontra-
do na literatura6,7,10 . A influência da aposentadoria e mais
tempo de tratamento no controle da pressão poderia ser justi-
ficada pela maior disponibilidade de dedicação ao tratamento.
Estudos têm mostrado que idade mais elevada, baixa escola-
ridade, baixa renda, menos de 5 anos de doença associam-se
ao abandono e controle inadequado da pressão arterial7,11 .
Os profissionais de saúde têm procurado orientar os
hipertensos quanto à importância do controle da pressão
arterial por medidas medicamentosas ou não. A educação
em saúde para os hipertensos é relevante para o êxito no
controle da pressão arterial12 ,13 . Na tentativa de melhorar a
adesão ao tratamento medicamentoso dos hipertensos em
relação à atitude frente ao tratamento medicamentoso, algu-
mas recomendações fazem parte da prática usual. Na pre-
sente investigação, procurou-se relacionar ao controle da
pressão arterial algumas destas recomendações. Os resulta-
dos mostraram que o total de pontuação frente às respostas
positivas dos hipertensos coincidiu com o grau de controle
da pressão arterial: os pacientes que apresentaram pressão
arterial controlada alcançaram notas significativamente
mais altas do que os não controlados (p < 0,05), apesar de,
isoladamente, as questões não se relacionarem com o con-
trole da pressão arterial, exceto para uma questão.
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16. Lahdenpera TS, Kyngas HA. Levels of compliance shown by hypertensive
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Destaca-se que na associação do conhecimento sobre
a doença e tratamento com o controle da pressão arterial,
também avaliados na presente investigação, o conhecimen-
to satisfatório expresso pelos hipertensos, não se relacio-
nou com o controle da pressão arterial. Esse dado talvez in-
dique que os hipertensos que compuseram a amostra do
estudo, apesar de expressarem conhecimentos dos aspec-
tos importantes sobre a doença e tratamento, não realiza-
ram, em seus hábitos de vida, mudanças suficientes para al-
cançar o controle da pressão arterial. Também merece desta-
que que o conhecimento é racional, e a adesão é um proces-
so complexo, envolvendo fatores emocionais e barreiras
concretas, de ordem prática e logística14 ,15 .
O comparecimento às consultas também pode ser um
parâmetro para avaliar a adesão ao tratamento9, mas na pre-
sente investigação não se relacionou com o controle ou não
da pressão arterial.
A classificação da adesão dos hipertensos feita pelos
médicos, associou-se ao controle da pressão, revelando,
provavelmente, que os médicos têm conhecimento da situ-
ação de controle de seus pacientes.
Os achados deste estudo apontam para a necessidade
de uma abordagem multidisciplinar, na qual a vivência de
cada paciente, seus valores, crenças e práticas culturais
sejam reconhecidos e abordados. Para tanto, é importante
trabalhar o contexto social e psicossocial do paciente. O en-
volvimento com a problemática de saúde, expresso por ati-
tudes e sentimentos positivos, só tende a favorecer a ade-
são ao tratamento e conseqüente controle da hipertensão,
além de interação efetiva com a equipe multidisciplinar em
um processo de aceitação e respeito mútuos16 .
Nossos dados evidenciam que, apesar dos pacientes
referirem atitudes positivas em relação ao tratamento medi-
camentoso e bom nível de conhecimento sobre doença e
tratamento, o controle da pressão arterial não foi satisfató-
rio, caracterizando a necessidade de medidas que visem me-
lhor controle da pressão arterial, tornando o tratamento um
problema que deve ser enfrentado por todos: o hipertenso,
família, comunidade, instituições e equipe de saúde.