Reconhecer emoções é um recurso crucial no contexto jurídico. Cada vez mais se ouve falar da importância desta área do conhecimento, mas será que conseguimos distinguir as suas oportunidades reais, baseadas na ciência, daquilo que por vezes vimos em determinadas séries televisivas e publicações de entretenimento?
A título de exemplo, refira-se a ideia errónea, amplamente disseminada, de que 93% do processo de comunicação é não-verbal, nos pode conduzir a dar uma ênfase excessiva a esta em detrimento da comunicação verbal (Lapakko, 1997, 2007). No decorrer de um julgamento, o foco excessivo no comportamento das testemunhas, arguidos, etc., em sacrifício da linguagem verbal, é naturalmente inadequado. A regra dos 7%, 38%, 55%, para as palavras, voz e comportamento não-verbal, respetivamente, pode fazer algum sentido, mas apenas e quando as pessoas estão a falar acerca de emoções e quando não existe congruência entre o que é dito e aquilo que o corpo manifesta (Mehrabian & Wiener, 1967; Mehrabian & Ferris, 1967). Outro dos mitos que existe em matéria de reconhecimento emocional é o de que desviar o olhar é um sinal de mentira. Não existe evidência científica que suporte tal correlação. Trata-se de um mito. Dos 24 estudos científicos revistos, apenas um não rejeitava esta hipótese (Bond, Omar, Mahmoud, & Bonser, 1990).
Na sequência, parece relevante para os autores partilharem as vantagens e as limitações do reconhecimento emocional em ambiente jurídico, com base naquilo que a ciência tem vindo a descobrir nesta área do conhecimento, dado que os mitos nesta área podem trazer consequências graves para o apuramento da verdade (Navarro, 2010).
O desenvolvimento da descodificação emocional, através da face, do corpo e da voz, pode ajudar advogados e decisores a compreenderem melhor aquilo que as pessoas sentem, para além daquilo que dizem, como é o caso dos arguidos, das testemunhas, etc. Por outro lado, estarmos mais conscientes da nossa comunicação não-verbal, e como esta pode estar a ser percecionada pelos outros, também se assume como uma vantagem fundamental na barra do tribunal. A comunicação não-verbal representa uma parte relevante do processo de comunicação e a face, em concreto, é um meio através do qual as pessoas procuram naturalmente colher informação acerca do estado emocional do outro. No entanto, nem sempre é fácil compreender a realidade emocional do outro através da face. A título de exemplo, o reconhecimento das Microexpressões Faciais (ex., Ekman, Hager, & Friesen, 1981; Frank & Ekman, 1993, 1997; Porter & ten Brinke, 2008) pode ser extremamente relevante para advogados, juízes, procuradores e jurados, dado que estas se constituem como sinais prováveis de emoções que o outro está a tentar conter ou mascarar (ex., Porter & ten Brinke, 2008). No entanto, por estas ocorrerem muito rapidamente, nem sempre é fácil observá-las e formação adequada é necessária nesta área do conhecimento. Porém, não só a face é relevante para melhor se compreender o comportamento humano no ambiente jurídico. Os gestos, a forma como a pessoa se movimenta, o vestuário, etc., são ingredientes fundamentais para mais eficazmente aferirmos aquilo que o outro sente em cada momento.
Os principais objetivos deste capítulo são:
a) em que medida os julgamentos rápidos influenciam as decisões de âmbito jurídico;
b) o comportamento não-verbal e o reconhecimento emocional;
c) o papel da inteligência artificial (IA) no reconhecimento facial e emocional;
d) a avaliação da credibilidade.