Este trabalho investiga caminhos alternativos para um entendimento de fenômenos linguísticos do tukano mais próximo à perspectiva ontológica dos falantes e, portanto, mais distante da epistemologia ocidental Moderna que subjaz os estudos linguísticos. Para tanto, realizo primeiramente uma revisão das bases sobre a qual a linguística hegemônica se ancora, mostrando as suas relações com Modernidade (Toulmin, 1990) e com a colonialidade (Mignolo, 1996, 2000, 2002, 2007). Em seguida, mostro como também a antropologia se constituiu através das dicotomias que caracterizam a epistemologia ocidental, mas buscou se distanciar de tal visão a partir de movimentos realizados desde a década de 1980. Opto por destacar os avanços realizados através do perspectivismo ameríndio (Viveiros de Castro, 1996, 2002, 2018), que, ao propor um movimento de descolonização permanente do pensamento, pode ser utilizado para pensar o desenvolvimento de uma linguística descolonial. Mostro também como o conceito perspectivista de “equívoco” se aplica à noção de “língua”, evidenciando que o que é língua se define através de uma perspectiva ontológica. Portanto, língua para os Tukano não é o mesmo que língua para não-indígenas ocidentais. Essa proposta é corroborada através de uma analogia entre as diferenças estruturais entre o sistema de classificação ictiológico ocidental e o sistema de classificação ictiológico tukano, tal qual mapeadas por J. P. Barreto (2013), e as diferenças entre o sistema linguístico ocidental e uma forma possível de conceber um sistema linguístico tukano, aqui sugerida. Finalmente, parto para as implicações dessa outra concepção de língua para a análise de três dados de eventos linguísticos em tukano coletados em campo. Proponho uma discussão sobre o sentido dos morfemas de evidencialidade que ocorrem nos dados discutidos, mostrando como a sua análise pode se beneficiar de uma perspectiva que não se atenha ao sentido estritamente linguístico de tais morfemas (tal qual proposto por Ramirez, 1997a), tampouco exclusivamente ao sentido do morfema em relação ao seu contexto imediato (como faz Aikhenvald, 2004, 2018), mas que procure entender a língua como parte integrante e constituinte de uma perspectiva ontológica distinta, tukano, na qual o processo de significação difere do ocidental.