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TELEPRESENÇA NO TELETANDEM: UM QUADRO TEÓRICO
Maria Luisa Vassallo
Università Ca’ Foscari di Venezia, Itália
UNESP - Universidade Estadual Paulista, Brasil
FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
marialuisavassallo@gmail.com
INTRODUÇÃO: O TANDEM. Em março de 2007 teve início o projeto brasileiro de educação a
distância em línguas estrangeiras TTB1 (TELETANDEM BRASIL: LÍNGUAS ESTRANGEIRAS
PARA TODOS), originado na universidade brasileira UNESP (Universidade Estadual Paulista). O
projeto associa uma forma de aprendizagem específica - o Tandem, que será descrita abaixo, a
recursos de comunicação a distância que recentemente começaram a obter uma grande difusão:
a telefonia pela Internet (VOIP, Voice over Internet Protocol) associada ao uso da webcam
(desktop videoconferencing) e ao Instant Messanging. O objetivo da presente comunicação é
refletir acerca dos efeitos da aplicação destes recursos tecnológicos à aprendizagem in-tandem.
O Tandem é um contexto de aprendizagem de línguas colaborativo e informal conhecido
na Europa há décadas (Herfurth, 1992, 1994), que sempre permaneceu como uma forma de
aprendizagem alternativa, pouco conhecida e pouco aplicada nos contextos institucionais. Trata-
se de um contexto de aprendizagem em dupla (Brammerts 2002), no qual as distinções
tradicionais professor⁄aluno ou par⁄par é substituída por uma relação de reciprocidade entre
parceiros complementares. A condição necessária para desenvolver um Tandem é a formação de
uma dupla de parceiros de língua diferente, cada um dos quais queira aprender um a língua do
outro. Esses parceiros entram em acordos mútuos e se encontram regularmente, desenvolvendo
sessões de Tandem durante as quais se ajudam, reciprocamente, a aprender as línguas-alvo,
desfrutando da competência de cada um na sua língua materna (ou de proficiência). Não se trata
de uma aprendizagem entre pares, por causa do grande desnível de competência e da falta de
uma autoridade externa. Tampouco se trata da clássica aprendizagem de línguas em sala de aula.
De fato, o professor institucional, neste contexto, cujo pressuposto é a autonomia, torna-se
mediador de aprendizagem ou facilitador e permanece em segundo plano, enquanto que o
Tandem é posto em prática pelos próprios parceiros. Em suma, o Tandem é um contexto de
aprendizagem sui generis (Vassallo & Telles, 2006), cujo elemento característico é a
reciprocidade.
Certamente, o que mais distingue o Tandem de outros contextos de aprendizagem é a
estrutura da sua sessão. Cada sessão de Tandem consiste de duas partes separadas,
desenvolvidas oralmente (geralmente por meio de uma conversa reflexiva entre os parceiros) uma
1 www.teletandembrasil.org
2
após a outra e dedicadas cada uma a um idioma.2 Na primeira parte da sessão, um dos parceiros
desempenha o papel de falante proficiente da língua que o outro está tentando aprender; na
segunda parte, com a troca dos idiomas, ele se torna o falante menos proficiente. A implicação
mais evidente é que cada Tandem sempre é definido por duas línguas:3 por exemplo, um Tandem
entre um mexicano e um brasileiro será um Tandem espanhol-português. Neste caso, cada
sessão deste Tandem será dedicada metade ao espanhol e metade ao português, implicando que
o enfoque das conversas entre os parceiros e do seu trabalho colaborativo será, em princípio,
sobre o México e sobre o Brasil, em termos não só lingüísticos como, também, culturais e
pessoais. Sendo assim, o Tandem é sempre caracterizado por um duplo horizonte de referência.
A duplicidade⁄multiplicidade de horizontes não é, em si, específica do Tandem, mas
caracteriza toda aprendizagem de línguas segundas ou estrangeiras. Estas sempre são
apreendidas por pessoas que já possuem uma língua e cultura materna. Freqüentemente, há um
desequilíbrio entre língua⁄cultura estrangeira e língua⁄cultura língua materna, uma das quais acaba
sendo menos relevante no contexto de aprendizagem (pensemos, por exemplo, no estudo do
inglês realizado na Inglaterra ou no México). No entanto, o esquema diádico do Tandem oferece
condições de equilíbrio maior: ambas as línguas do Tandem são igualmente relevantes, por
estarem ambas na condição de língua-alvo. Pode-se ver, aqui, um dos elementos de maior
destaque do Tandem: dentro do espaço físico e geográfico de encontro dos parceiros, este
contexto visa criar um âmbito de coexistência e compartilhamento de línguas e culturas, colocadas
no mesmo plano.
Os espaços materiais e simbólicos de desenvolvimento e de compartilhamento do Tandem
são, portanto, particularmente importantes.
No que diz respeito a este assunto, ou seja, em relação ao ambiente de desenvolvimento,
tradicionalmente se distinguem as seguintes formas de Tandem:4 (a) Tandem presencial, que foi a
primeira forma realizada, na Europa a partir do final dos anos sessenta; (b) e-Tandem, ou seja,
Tandem por e-mail, realizado na Europa e algures, a partir dos anos noventa; (c) Teletandem, ou
seja, Tandem por Instant Messaging desenvolvido por microfone e webcam, experimentado e
pesquisado no Brasil a partir de 2006 pelo Projeto Teletandem Brasil: Línguas estrangeiras para
todos5.
DO TANDEM AO TELETANDEM: O CONCEITO DE TELEPRESENÇA. O que muda na experiência do
espaço de encontro do Tandem quando este espaço, por meio da tecnologia, de material torna-se
virtual? Um Tandem realizado em espaços virtuais seria diferente de um Tandem realizado
presencialmente? Em qual forma e eventualmente por quais razões?
2 Além da reciprocidade e da autonomia, a separação das línguas é o terceiro pilar do Tandem (Brammerts, 2002; Vassallo & Telles,
2006).
3 A não ser que se trate de um tandem intercultural, no qual são trocadas informações sobre duas culturas, mas em uma só língua. Não
nos referimos, aqui, ao tandem intercultural.
4 Outras categorias de Tandem dependem da tipologia dos participantes e de seu envolvimento com uma instituição (Vassallo, 2006).
5 Na UNESP - Universidade Estadual Paulista. Ver www.teletandembrasil.org .
3
Estas perguntas dizem respeito ao papel da tecnologia na evolução do Tandem. Uma
forma de abordá-las pode ser a aplicação ao Tandem do conceito de telepresença, proposto
originariamente por Minsky (1980), a respeito da manipulação de objetos a distância e retomado
na década sucessiva, em relação a ambientes virtuais. Anteriormente limitada à área da filosofia
ou da neurofisiologia (Ijsselsteijn, 2003, 2005; Söffner, 2006), a discussão acerca de o que hoje
significa “estar lá” (Steuer, 1992:6) está ganhando cada vez mais interesse, devido às novas
condições do nosso dia-a-dia. Uma quantidade cada vez maior de atividades, com crescentes
implicações econômicas (Khalifa & Shen, 2004:2-4), está sendo realizada a distância; está se
tornando difícil distinguir entre presença física e outros tipos de presença, que implicam interações
ou operações sem deslocamento físico. Até na própria linguagem do dia-a-dia, usamos metáforas
espaciais para indicar o uso da Internet (estar em um site, estar no MSN, estar em Second Life) e
metáforas interacionais para a comunicação a distância; a possibilidade, já real, de se
experimentar ambientes virtuais por meio de interfaces elaboradas (como luvas e capacetes
digitais), de se realizar cirurgias a distância e até tele-guiar veículos em outros planetas anuncia
um futuro ainda mais multifacetado em termos de presença.
Devido ao grande numero de pesquisas na área da realidade virtual e dos sistemas de
tele-operação nos últimos quinze anos (Baren & Ijsselsteijn, 2005), a terminologia acerca da
presença e as próprias formas de medi-la têm se tornado cada vez mais complexas, com uma
certa falta de acordo dos pesquisadores e entre áreas de pesquisa. Em 2005, van Baren &
Ijsselsteijn listaram não menos de 70 propostas diferentes para se analisar e avaliar a presença
em ambientes virtuais e de comunicação escrita mediada pelo computador (CMC).6
Na literatura, costuma-se traçar uma distinção (dentre outros, Biocca et al., 2003; Heeter,
2002) entre telepresença (percepção espacial, referida ao estar em um ambiente por meio de
recursos tecnológicos7) e presença social (percepção de “estar junto com um outro” ou do “grau
de saliência de um outro durante uma interação” (Short et al., 1976). O primeiro conceito tende a
ser usado só na pesquisa acerca de ambientes virtuais, enquanto que o segundo geralmente se
refere à análise da CMC – Comunicação Mediada pelo Computador (cujo elemento fundamental é
considerado social e não espacial).
TELEPRESENÇA E TELETANDEM. O Teletandem não cabe exatamente nos esquemas
clássicos desta literatura, por duas razões.
Em primeiro lugar, o Teletandem (a) realiza interações um-a-um, diferentes daquelas um⁄
muitos ou muitos⁄muitos estudadas na pesquisa acerca da presença social; (b) apesar dos
objetivos comunicativos, implica também telepresença, porque usa uma interface configurada em
termos espaciais e porque visa perceber o espaço físico e geográfico do outro (c) usa recursos
6 Medir a presença online tem se tornado uma questão importante em termos econômicos, por questões de marketing online, de
vendas de videogames e de aplicativos especializados.
7 Semelhante ao conceito de presença física de Ijsselsteijn et al. 2000, ou de presença espacial de Lombard & Ditton, 1997; Biocca et
al., 2003; Heeter, 1992). Às vezes é usada a expressão abreviada presença.
4
(desktop videoconferencing), respectivamente, menos e mais complexos que os recursos usados
nos ambientes virtuais8 e da CMC tradicional.9 O estudo da presença no Teletandem, portanto,
não pode ser realizado separando os conceitos de telepresença e presença social e não pode se
apoiar nas pesquisas já realizadas até o momento.
Em segundo lugar, os esquemas clássicos da pesquisa acerca da telepresença implicam
uma distinção entre uma realidade física externa, experimentada “naturalmente”, e uma realidade
virtual considerada artificial, experimentada por recursos tecnológicos. Isto significa, conforme
Mantovani & Riva (1999), basear-se em um “realismo ingênuo” (Mantovani, 1995) ou em uma
“tradição racionalista” (Zahoric and Jenison, 1998), os quais não estão de acordo com o
embasamento teórico sócio-construtivista do Teletandem (Telles, 2005). Mais adequado a tal
embasamento é um outro pressuposto, porém ainda minoritário, segundo o qual “a presença é
sempre mediada por recursos físicos e conceituais, que pertencem a uma dada cultura. Sendo
assim, a presença ‘física’ em um ambiente, em princípio, não é mais ‘real’ ou verdadeira que a
telepresença ou a imersão em um ambiente virtual simulado” (Mantovani e Riva, 1999:545,
tradução nossa). Conseqüentemente, aceitamos como ponto de partida para a análise do
Teletandem, a definição de presença dada por Lombard & Ditton (1997). Estes pesquisadores
definem a presença como “a ilusão perceptiva de não mediação”. Trata-se de um hiperônimo que
compreende todas as formas de presença, incluindo presença física, telepresença e presença
social.
Examinaremos, abaixo, em relação ao Teletandem, alguns elementos tradicionalmente
associados à telepresença, tais como vividez e interatividade (Steuer, 1992), estendendo-os,
também, à presença social, conforme a pesquisa de Khalifa & Shen (2004).10
VIVIDEZ E INTERATIVIDADE. O primeiro elemento associado à telepresença é a vividez.
Segundo a clássica conceitualização de Steuer (1992), a vividez indica a riqueza de
representação do ambiente e é definida por dois elementos: o número de dimensões sensoriais
presentes ao mesmo tempo (amplitude de vividez) e a intensidade destas (profundidade da
vividez). Várias pesquisas mostram que uma maior vividez implica uma maior percepção de
telepresença e de telepresença;11 conforme os resultados de Khalifa e Shen (2004). Porém, a
vividez seria mais relevante para a presença social de que para a telepresença12.
8 Comum na realidade virtual, por exemplo, é o uso de um equipamento que permite que o sujeito se locomova no ambiente virtual por
meio de movimentos do seu próprio corpo, ou o uso de luvas virtuais. Isto não existe nos aplicativos de Instant messaging.
9 Os estudos acerca da presença social têm-se concentrado na área da CMC assíncrona escrita, ou seja, em ambientes de chat e
fórum. Ver, por exemplo, Tu, 2002, Hwang & Lombard, 2006, Lomicka & Lord, 2007.
10 mas deixando de lado a questão das formas de medi-los, para as quais nos remetemos ao citado texto de van Baren & Ijsselsteijn,
2005.
11 Ver, por exemplo, Bondareva et al. 2006. Ver Khalifa & Shen, 2004:10, para bibliografia acerca da relação entre vividez e
telepresença em ambientes virtuais e em sites da web.
12 Conforme Khalifa e Shen (2004:10), a vividez na presença social fornece “informações sensoriais acerca da expressão do rosto,
postura, roupa e outros sinais não verbais, reforça a intimidade e a imediatez – intimacy and immediacy – e a confiança entre os
parceiros“ (tradução nossa). Short et al. (1976) avaliam como meios providos de maior presença social, em ordem descendente, a
interação face-a-face, por vídeo e por áudio. A pesquisa por eles realizada, porém, diz respeito a uma forma de vídeo diferente daquela
implementada no Teletandem.
5
O segundo elemento é a interatividade. Este termo indica o potencial dos usuários de
modificar forma e conteúdo do ambiente em tempo real (Khalifa e Shen (2004:6) e a relação de
pertinência entre a nova mensagem e a precedente (Rafaeli, 1989). Uma maior interatividade,
conforme várias pesquisas, levaria a uma maior percepção de telepresença e de presença social.
Na pesquisa de Khalifa e Shen (2004:7-8), a interatividade resultou mais relevante para a
telepresença. A interatividade é definida por vários elementos. O primeiro elemento geralmente
considerado é o controle ativo (Liu & Shrum, 2002): ou seja, a variedade de ações voluntárias
possíveis, realizadas em um tempo dado, de forma previsível e condizente com o padrão físico13.
O segundo é a comunicação (Liu & Shrum, 2002): ou seja, a habilidade de trocar mensagens
recíprocas, com o ambiente e com o parceiro. Este elemento facilitaria a presença social (Khalifa e
Shen, 2004:9). O terceiro elemento é a velocidade: a rapidez da resposta da parte do aplicativo
de IM (Steuer 1992), ou da parte do parceiro (sincronicidade em Liu & Shrum, 2002; Tu, 2000). A
sincronicidade, dentro os outros citados, seria menos representativa na percepção de presença
social (Khalifa e Shen, 2004).
VIVIDEZ E INTERATIVIDADE NO TANDEM. Todos os critérios acima mencionados podem ser
aplicados ao Tandem, permitindo avaliar seja a telepresença seja a presença social em três
dimensões: (a) a comunicação participante⁄participante (b) a relação participante⁄interface (b) a
relação participante⁄espaço do parceiro.
RELAÇÃO PARTICIPANTE⁄PARTICIPANTE. O Tandem está fundamentado tanto em uma abordagem
comunicativa de ensino de línguas quanto em uma visão sócio-construtivista da linguagem. Sendo
assim, a língua neste contexto é apreendida pelo seu uso, em relação à sua função comunicativa
– e a comunicação desfruta, como é notório, vários canais sensoriais: daí a importância didática
da amplitude de vividez, no que diz respeito à comunicação com o parceiro. A profundidade de
vividez também é importante, porque no Tandem sempre há um dos parceiros que não é
proficiente na língua que está sendo usada; a relevância da clareza e da intensidade na
comunicação é maior do que em uma comunicação entre dois falantes proficientes. Quanto à
importância da interatividade, esta é inerente à própria definição do Tandem: não há reciprocidade
sem interatividade.
RELAÇÃO PARTICIPANTE⁄INTERFACE. A importância da vividez e da interatividade é mais fácil de se
individuar e de se avaliar no Teletandem, que faz uso de uma interface tecnológica, do que no
Tandem presencial. Porém, conforme a abordagem sócio-construtivista, pode-se falar de uma
interface também na presença física: “os indivíduos experimentam a ‘realidade’ por meio de esquemas
interpretativos gerados pelas estruturas sociais pré-existentes que moldaram seus processos de
socialização e vivem em uma ‘realidade’ que é geralmente um espaço social – tal como sala de aula,
escritório, vizinhança – na qual os indivíduos aprendem a perceber, categorizar e usar as possibilidades de
ação do ambiente em formas que tenham sentido e sejam socialmente reconhecíveis” (Mantovani e Riva,
13 Corresponde a range e mapping em Steuer (1992).
6
1999:545, tradução nossa). Deste ponto de vista, os critérios da avaliação da telepresença podem
oferecer um interessante desafio à pesquisa acerca do Tandem presencial.
RELAÇÃO PARTICIPANTE⁄ESPAÇO DO PARCEIRO. Como ressaltado anteriormente, a percepção do
ambiente físico, geográfico, simbólico e cultural do parceiro é um elemento fundamental para o
estabelecimento do duplo horizonte de referência do Tandem. Os modos como vividez e
interatividade possam ser reformulados em relação a este item é um dos desafios para a
pesquisa.
Como as dimensões acima mencionadas são presentes no Tandem presencial e no
Teletandem?14 A descrição, abaixo, tenta oferecer alguns elementos a respeito.
TANDEM PRESENCIAL. No Tandem presencial são compartilhados espaços físicos amplos, que
podem ser mudados facilmente. Os parceiros podem se encontrar em lugares privados, como um
apartamento, ou públicos - café, parque, sala escolar, dentre os quais podem escolher,
dependendo das características do Tandem envolvido (institucional ou não institucional), das
preferências e das possibilidades. Cada um destes espaços traz ao Tandem uma conotação
diferente, em termos de privacidade, de condições materiais de desenvolvimento (calma,
possibilidade de se ouvir bem, possibilidade de concentração, estímulos externos,
contextualização da língua falada etc) e, também, de significados culturalmente atribuídos ao
encontro.
Vividez. Na sessão de Tandem presencial, a fala e as atividades são desenvolvidas face-a-
face, ou seja, do ponto de vista perceptivo, fazendo uso dos cinco sentidos. As limitações são só
aquelas inerentes ao corpo de cada um. Compativelmente com os limites impostos pelas regras
de polidez, o parceiro pode ser visto, ouvido, tocado, cheirado; bebidas e comidas podem ser
compartilhadas e saboreadas juntos, objetos podem ser trocados, a visão não é limitada mas
coincide com o máximo ângulo possível ao olho humano - cada um controla sua visão e escolhe o
que olhar, o que dizer e muitos elementos da sua própria auto-apresentação. Informações chegam
de todos esses sentidos ao mesmo tempo. As trocas em tempo real, e face a face; cada uma
envolve todos os sentidos e a comunicação é extremamente complexa. A forma de comunicação
é oral, mas a esta pode ser associada a comunicação escrita – tarefas de casa podem ser
desenvolvidas e corrigidas, textos podem ser escritos na presença do outro.
Como esta riqueza sensorial afeta a percepção da interface cultural da comunicação e dos
espaços materiais e simbólicos do parceiro é uma questão a ser pesquisada. De qualquer modo,
pode-se supor que, nesta forma de Tandem presencial, a outra língua e a outra cultura sejam
intensamente associadas à pessoa do parceiro: as informações de tipo pessoal são
preponderantes, em comparação com as categorizações culturais, por causa da riqueza do tipo de
14 Não é analisado aqui o Tandem por e-mail.
7
comunicação. O enfrentamento de línguas e culturas é, portanto, antes de mais nada,
enfrentamento pessoal e em condições de máxima interatividade.
Interatividade. As sessões de Tandem presencial são caracterizadas por uma complexidade
muito grande da comunicação. O elemento crítico para o parceiro menos proficiente é o controle
ativo: é difícil gerenciar tantos canais de comunicação ao mesmo tempo, cuja intensidade não é
possível de ser reduzida. Velocidade e comunicação podem estar associadas a este aspecto.
TELETANDEM. No Teletandem, são compartilhados espaços reduzidos e limitados,15 que não
podem ser facilmente mudados16. O Teletandem pode ser desenvolvido em lugares públicos, tais
como lanhouses, Internet cafés ou laboratórios, ou em lugares privados, como o quarto de uma
casa. A condição necessária é que tais espaços sejam providos de uma conexão de banda larga.
A parte destes espaços realmente compartilhada com o parceiro, pelo menos no que diz respeito
à visão, é limitada pelo foco da webcam, pela posição do computador de mesa, pelas dimensões
da tela. Os espaços compartilhados são dois, fisicamente distantes.
Vividez. Os sentidos envolvidos são menos numerosos (só visão e ouvido) do que no Tandem
presencial. Deste ponto de vista, a vividez é menor; deve ser levada em conta, porém, a menor
distância que o uso da webcam obriga a manter entre os parceiros, que pode implicar uma
sensação de maior intimidade e, portanto, talvez, até uma maior sensação de presença social.
Interatividade. Os recursos usados são aqueles do Instant Messaging e da videofonia pela
Internet, tecnologia esta já bastante difundida. Os aplicativos usados (no projeto Teletandem
Brasil, geralmente o Windows Live Messenger) são gratuitos, disponíveis para todos e oferecem
formas muito variadas de ação e de comunicação. Os parceiros podem se ver, se falar, ouvir a
fala do parceiro e os sons ao redor; podem se escrever e trocar um bate-papo instantâneo, podem
deixar breves mensagens de chat offline um para o outro (que aparecerão na tela do parceiro
assim que ele ativará o aplicativo), ou mensagens mais longas por e-mail., Podem enviar,
também, mensagens SMS pelo telefone celular; podem trocar arquivos e imagens enquanto estão
falando ou estando offline; podem compartilhar pastas de arquivos que se atualizam
automaticamente; podem escrever anotações juntos, em um quadro de mensagens, oferecido
pelo aplicativo, que se abre nos dois computadores; podem, também, assistir juntos a vídeos
televisivos oferecidos pelo aplicativo e até compartilhar o conteúdo do próprio computador,
deixando o seu comando ao outro. A interatividade com o ambiente é igual para cada um dos
parceiros (desde que possuam igual competência no uso do aplicativo).
Em comparação com o Tandem presencial, o elemento mais característico do Teletandem
é a possibilidade de se optar por uma ou outra possível ação o forma de comunicação (por
exemplo, falar sem se ver) . No Tandem presencial a riqueza de canais de comunicação é muito
15 Porém cada parceiro, caso disponha de um laptop e de uma conexão sem fios, pode se locomover e mostrar outros espaços.
16 pela prevalência de computadores de mesa e⁄ou de conexões com fio e pelas limitações da webcam e da tela do computador . A
situação será provavelmente diferente quando for possível desenvolver o Teletandem por videotelefone móvel.
8
grande, porém o controle e a possibilidade de graduá-los são mínimas. Por outro lado, no
Teletandem, os vários recursos disponibilizados pelo Instant Messaging e por outros aplicativos
podem ser escolhidos e usados separadamente, dependendo da situação, das possibilidades e
das necessidades. Pode-se supor, portanto, que pelo menos o elemento de controle ativo seja
maior no Teletandem do que no Tandem presencial.
INOVAÇÕES TRAZIDAS PELA TECNOLOGIA. Um exemplo desta maneira de modular as ações e a
comunicação pode ser visto na lista, abaixo, que indica algumas ações que são possíveis só no
Teletandem, e não no Tandem presencial.
No Teletandem, diferentemente do Tandem presencial, os parceiros podem:
1. Escrever e falar ao mesmo tempo, com facilidade e naturalidade (isto é possível
porque, no Teletandem, a tela, o quadro de comunicação e o teclado estão sempre na
frente dos parceiros). Tal característica pode ajudar o parceiro menos proficiente.
2. Escrever e ver sem ouvir. Isto pode ajudar a treinar a escrita sem limitar a
comunicação.
3. Se relacionar de forma assimétrica - por exemplo, quando um parceiro envia as
imagens da webcam e⁄ou o som, enquanto que o outro só se comunica por escrita. Tal
configuração relacional pode favorecer o treinamento de habilidades separadas por
cada um dos parceiros.
4. Ver ao mesmo tempo, durante a comunicação, a imagem do parceiro e a própria
imagem. Isto pode influenciar a reflexão acerca das formas de comunicação não
verbal.
5. Ver, de perto, o rosto e a parte superior do tórax do parceiro, por causa das
características das modernas webcams, de forma mais aproximada do que aconteceria
na comunicação presencial. Tal configuração pode intensificar a presença social e
reforçar a aprendizagem.
6. Falar sem contato de olhos, sem serem considerados rudes. Isto pode ajudar o
parceiro pouco proficiente, o qual tem geralmente dificuldade a gerenciar a
comunicação verbal e não verbal ao mesmo tempo.
7. Manter um forte controle sobre sua auto-apresentação, maior do que na comunicação
presencial. De fato, o parceiro, pelo menos nas webcams comuns e nas interfaces de
IM usados pelo Teletandem, não pode manipular, a distância, a webcam do outro. A
não ser que este use uma webcam móvel17. Portanto, cada um pode limitar a visão do
espaço no qual ele se mostra. 18 Uma maior sensação de controle pode intensificar a
presença social e reforçar a aprendizagem.
17 Ou seja, uma webcam que se movimenta automaticamente seguindo os movimentos da pessoa.
18 Também, esta característica possui sérias implicações de privacidade. Por exemplo, a sessão poderia estar sendo assistida por
outras pessoas, ou poderia ser gravada sem que o parceiro se desse conta.
9
8. Trocar e examinar juntos, rapidamente, arquivos armazenados no computador de cada
um, compartilhar sites e assistir vídeos na Internet, sem interromper as atividades que
estão desenvolvendo. Isto aumenta a interatividade e a vividez, no que diz respeito à
percepção do espaço do parceiro e da interface de comunicação.
9. Perceber dois ambientes fisicamente distantes ao mesmo tempo. Isto reforça o duplo
horizonte de referência característico deste contexto didático.
CONCLUSÕES. A pesquisa acerca da telepresença e da presença social no Teletandem
ainda está em estado embrional. Porém, pelo menos no que diz respeito a algumas componentes
da telepresença e da presença social, os elementos aqui mencionados mostram claramente que,
no contexto do Tandem, a tecnologia promoveu uma mudança ao passar do Tandem presencial
ao Teletandem.. De forma mais geral, tais inovações mostram que, no âmbito da comunicação,
novas formas de presença estão emergindo – inovações que, talvez, se tornem o padrão em anos
futuros.
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