A mudança climática é um dos desafios mais complexos deste século. Nenhum país está imune a ela
nem pode vir a ser capaz de enfrentar individualmente os desafios interconectados que compreendem
decisões políticas e econômicas controversas. Tampouco, os avanços tecnológicos com consequências
globais de longo alcance (Banco Mundial, 2010a).
Estudos científicos, publicados em 2007 no Quarto Relatório de Avaliação (AR4) do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), indicaram que as alterações do clima relativas ao aquecimento global e ao aumento do nível do mar podem estar se intensificando. Estas alterações já
estão ocorrendo e podem ser verificadas através dos registros sobre eventos extremos, cada vez mais
frequentes.
As alterações climáticas provocam mudanças nos sistemas geofisicos, biólogicos e humanos. Dessa
maneira, impõem uma série de desafios ao desenvolvimento, com implicações sobre diversos setores:
sociais, econômicos e ambientais, relacionados à indústria, agricultura, comércio, segurança e bem-estar social (IPCC, 2007).
Segundo O’Brien e Leichenko (2008), as avaliações realizadas pelo IPCC confirmam que a mudança climática está contribuindo para transformações significativas do ambiente biofísico que afetarão ecossistemas, assentamentos humanos e recursos hídricos, bem como a produção de alimentos. Essas transformações poderão ter grandes implicações para nações, regiões, comunidades e indivíduos. À medida que a temperatura do ar da Terra aumenta os padrões pluviais mudam e eventos climáticos extremos, como secas, inundações e incêndios florestais, se tornam mais frequentes. Milhões de pessoas em áreas costeiras enfrentarão problemas relativos a enchentes e inundações associadas a tempestades e ao aumento do nível do mar (Banco Mundial, 2010a). Embora haja uma considerável incerteza sobre a trajetória futura da mudança climática, relacionada em parte com a quantidade e a taxa de emissões de gases de efeito estufa (GEEs), as consequências das mudanças representam uma ameaça sem precedentes à segurança humana (O’Brien e Leichenko, 2008). Na décima sexta Conferência das Partes (COP16), realizada em Cancun, no México, em 2010, destacou-se como principais compromissos assumidos pelas nações participantes, a redução de 1,5 ºC na temperatura do ar em futuro próximo; a adoção de mecanismos de desenvolvimento limpo (MDL)
e a difusão de novas tecnologias menos emissoaras de GEE; a criação do Fundo Climático Verde para
se financiar projetos, programas, políticas e outras atividades nos países em desenvolvimento, e, a
criação de um comitê de adaptação para promover a implantação de medidas mais coesas.
Em 2011, no encontro da Organização das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, realizado em
Durban, na África do Sul, foi entregue um documento reforçando a necessidade de implementação
do Protocolo de Quioto, do Plano de Ação definido na Indonésia em 2007, durante a COP13 e dos
acordos alcançados em Cancun, na tentativa de se evitar um retrocesso das negociações.
Visando compreender a realidade nacional, especialistas brasileiros se reuniram em 2011 para a
elaboração do Primeiro Relatório de Avaliação Nacional (RAN1) do Painel Brasileiro de Mudanças
Climáticas (PBMC). Tal documento se refere aos trabalhos realizados pelo Grupo de Trabalho 2 (GT-2)
sobre Impactos, Mitigação e Adaptação às Mudanças Climáticas, com o objetivo de fornecer subsídios
para decisões relativas às medidas de mitigação e à adaptação as mudanças climáticas no País.
A avaliação teve como ponto de partida os trabalhos científicos mais recentes, retratando de forma
ampla e atualizada os impactos causados pelas mudanças do clima no Brasil; a vulnerabilidade dos
ambientes naturais e humanos, e ainda, as medidas necessárias para se adaptar a esses efeitos e a
mitigá-los.
A questão central seria: como tornar o País mais resiliente à mudança do clima sem o aumento contínuo das emissões de GEEs e da degradação dos ecossistemas e, ao mesmo tempo, seguir perseguindo seu crescimento econômico? A mudança climática torna o desafio do desenvolvimento mais complicado, pois seu impacto pode ser sentido no aumento da frequência de ocorrência de tempestades, inundações, ondas de calor, secas e elevação do nível do mar, sobrecarregando todos os setores da sociedade brasileira.
As nações, de um modo geral, e substancialmente, os países em desenvolvimento precisam de expansões expressivas em sistemas de energia, transporte, produção agrícola e avanços tecnológicos.
Entretanto, se os meios tradicionais forem mantidos, as extensões, tão necessárias, produzirão mais
aquecimento em virtude das emissões de GEEs que provocarão (Banco Mundial, 2010a).
Um aquecimento adicional relativamente modesto exigirá grandes ajustes na forma como as políticas
de desenvolvimento são planejadas e implementadas, bem como na maneira como as pessoas vivem
e se sustentam. A questão não é simples, tampouco uma relação direta entre crescimento e emissões
de carbono para atmosfera, pois muitos processos produtivos ineficientes, usos irracionais dos recursos
naturais e desperdícios são responsáveis pelo aumento da concentração de CO2 na atmosfera (Banco
Mundial, 2010a).
A situação atual do clima exige grandes mudanças no estilo de vida, uma verdadeira revolução energética e a transformação do modo como lidamos com os recursos naturais. Nesse sentido, um processo de adaptação substancial é fundamental para se tentar reverter o panorama atual.
Dentro desse contexto, um panorama inicial das mudanças climáticas e a conjuntura nacional são
analisados no capítulo 3 do volume II do Relatório de Avaliação Nacional I do Painel Brasileiro de
Mudanças Climáticas. Já as principais questões avaliadas são discutidas no capítulo 4, dedicado ao tema dos recursos naturais e aos usos de manejos dos ecossistemas. Seu principal enfoque recai sobre os recursos hídricos, envolvendo os ecossistemas de água doce e terrestre, os sistemas costeiros e a segurança alimentar. Por sua vez, ao capítulo 5, a discussão trata dos aglomerados urbanos, da indústria e de infraestrutura. Neste último caso, a maior dificuldade foi encontrar literatura científica a respeito.
Ficou evidente a necessidade de se buscar mais informações sobre as questões de vulnerabilidade e de
adaptação relativas a este importante setor da sociedade brasileira.
No capítulo 6, as questões da saúde humana, do bem estar e de segurança são abordadas. Vários
trabalhos foram realizados nos últimos cinco anos sobre o primeiro desses temas. Porém, há claro desequilíbrio regional sobre as informações referentes aos impactos causados pelas mudanças climáticas
sobre ele.
Destaque especial foi dado aos temas subsistência e pobreza. Primeiro, por conta da dificuldade de se encontrar no País, referências científicas sobre a relação entre mudança climática e o assunto em questão. Segundo, porque é claro e evidente que as populações mais pobres serão as mais atingidas pelas alterações de clima. Daí a necessidade, de se apoiar, em futuro próximo, trabalhos que busquem fortalecer a pesquisa científica com forte aderência de questões relativas a recursos naturais à socioeconômica.
Ao capítulo 7 deste volume, são discutidas as questões relativas à adaptação e ao desenvolvimento econômico seus riscos, vulnerabilidades e oportunidades. Uma abordagem econômica é feita nesse
sentido, buscando coligir o que foi feito no País durante os últimos anos.
Finalmente, ao capítulo 8, os impactos intersetorias, vulnerabilidades e oportunidades são discutidos em cinco diferentes seções, que buscam regionalizar as abordagens.
As estruturas desses capítulos diferem entre si. Isso se explica pela quantidade de literatura científica, farta em algumas regiões do País – Sudeste, Sul, e norte por exemplo – e menor, nas regiões Nordeste e Centro-Oeste.
Com base na análise de documentos e em discussões realizadas entre os especialistas, considera-se que os impactos físicos, biológicos e humanos associados às mudanças do clima deverão variar consideravelmente no território brasileiro de acordo com características regionais, níveis de exposição e graus de degradação ambiental.
Todas as esferas de governo, a indústria, o comércio e a sociedade precisam estar envolvidos no
desenvolvimento de uma resposta nacional adequada. Portanto, o entendimento dessas alterações
climáticas em cada região é essencial para um planejamento estratégico e o processo de tomada de
decisão. Foi essa a base da abordagem do trabalho do GT2.