Content uploaded by Christian Feest
Author content
All content in this area was uploaded by Christian Feest
Content may be subject to copyright.
ffoottóóggrraaffoo
aauussttrrííaaccoo
eennttrree
íínnddiiooss
bbrraassiilleeiirrooss
MARIO
BALDI
Q_Capa_frente.qxd 21.02.2013 06:30 Seite 1
MARIO
BALDI
Marcos Felipe de Brum Lopes
Christian Feest
ffoottóóggrraaffoo
aauussttrrííaaccoo
eennttrree
íínnddiiooss
bbrraassiilleeiirrooss
MMAARRIIOO
BBAALLDDII
ffoottóóggrraaffoo
aauussttrrííaaccoo
eennttrree
íínnddiiooss
bbrraassiilleeiirrooss
uma exposição no
Arquivo Nacional, Rio de Janeiro
2 de junho – 30 de junho 2009
Casa de Cultura Adolpho Bloch, Teresópolis, RJ
11 de julho – 10 de agosto 2009
Museu das Culturas Dom Bosco, Campo Grande, MS
24 de agosto – 27 de setembro 2009
organizada por
Museum für Völkerkunde, Viena
Secretaria Municipal de Cultura, Teresópolis
um evento FotoRio 2009
DDaaddooss IInntteerrnnaacciioonnaaiiss ddee CCaattaallooggaaççããoo nnaa PPuubblliiccaaççããoo ((CCIIPP))
Lopes, Marcos Felipe de Brum
Mario Baldi: fotógrafo austríaco entre índios brasileiros /
Marcos Felipe de Brum Lopes e Christian Feest. – Rio de
Janeiro: F. DUMAS História e Ciências Sociais, 2009
36p. : 26 il : 20,5 x 21 cm
ISBN 978-85-62607-00-4
1. História do Brasil. 2. História da Fotografia. 3. Antro-
pologia. I. Feest, Christian. II. Autor. III. Título.
CDU-77.03
© 2009 Kunsthistorisches Museum mit MVK und ÖTM
© 2009 Secretaria Municipal de Cultura, Teresópolis
Concepção e desenho: Christian Feest
Impresso no Brasil
Impressão: Contra Capa, Rio de Janeiro
Imagens na capa:
(frente)
“Que coisa estranha!” Um menino carajá [Uoni-Uoni] observando
uma câmera filmadora. Ilha do Bananal, 1938. Museum für
Völkerkunde, Viena, foto n.o37829_04923 (a partir do negativo
6x6).
(verso)
Autoretrato de Mario Baldi, no jornal A Noite. Rio de Janeiro,
1938–1939. Gelatina de prata, 23,4x17,1. Secretaria
Municipal de Cultura, Teresópolis, Coleção Mario Baldi [Baldi
n.o07052].
CURADORIA:
Christian Feest
Marcos F. de Brum Lopes
CONCEPÇÃO E PRODUÇÃO:
F. DUMAS História e Ciências Sociais
SUPORTE TECNICO:
Arquivo Nacional
COPAC – Mauro Domingues
Laboratório de Digitalização – Flávio Ferreira Lopes
APOIO CULTURAL:
Arquivo Nacional
Consulado Geral da Áustria no Rio de Janeiro
SSuummáárriioo
Prefácios ................................................................... 5
Jaime Antunes da Silva
Wanderley Peres
O projeto Baldi .......................................................... 7
Christian Feest e Marcos F. de Brum Lopes
Mario Baldi (1896–1957) ....................................... 9
Marcos F. de Brum Lopes
Mario Baldi e os Bororo ........................................... 17
Christian Feest e Viviane Luiza da Silva
Os índios Carajá na fotografia de Mario Baldi ....... 25
Marcos F. de Brum Lopes
Lista das obras exibidas .......................................... 34
Mario Baldi em sua tenda, nas margens do Rio Araguaia. Ilha do Bananal, 1936. Autor não identificado. Museum für Völkerkunde,
Viena, foto n.o37829_03148 (a partir do negativo 6x6).
4
É com satisfação que o Arquivo Nacional recebe a mostra
Mario Baldi: fotógrafo austríaco entre índios brasileiros,
um evento do circuito FotoRio 2009, com curadoria do
historiador Marcos F. de Brum Lopes e do antropólogo
Christian Feest, diretor do Museu de Etnologia de Viena.
Iniciativas como essa que estimulam a preser-
vação e a difusão de documentos sempre são bem-
vindas na casa uma vez que se coadunam com a nossa
própria missão institucional. Neste sentido, o Arquivo
Nacional tem sido especialmente sensível a propostas
que contemplam acervos iconográficos: desde a década
de 1980 produz sistematicamente exposições e publi-
cações nas quais as imagens são o foco principal. Além
disso, vem integrando ao seu patrimônio arquivístico
registros fundamentais para a história da fotografia em
nosso País como o Arquivo Família Ferrez, com cerca de
40 mil itens acumulados em mais de 150 anos e que
inclui documentos pessoais de Gilberto Ferrez e do seu
pai, tio e avô, respectivamente Júlio, Luciano e Marc
Ferrez, além do arquivo da firma Marc Ferrez & Filhos.
Ciente da importância do amplo acesso à docu-
mentação pública como estímulo a produção do conhe-
cimento tenho certeza que esta exposição abrirá novas
e ricas possibilidades de pesquisa tanto para os
estudos etnográficos como para os interessados em
cultura visual e história da fotografia.
Jaime Antunes da Silva
Diretor-Geral do Arquivo Nacional
A Secretaria Municipal de Cultura, em Teresópolis, tem
a honra de preservar parte de um tesouro que, hoje,
está dividido entre a Europa e o Brasil. Trata-se da
Coleção Mario Baldi, que compõe um conjunto de
documentos através do qual é preservada a memória
teresopolitana. Mario Baldi teve uma relação estreita
com a cidade de Teresópolis, desde os anos 1920 até
sua morte em 1957. Salvaguardar sua herança, de valor
inestimável para a História, é motivo de grande orgulho
para todos nós.
A Coleção Mario Baldi é de reconhecida impor-
tância para a preservação da memória visual brasileira.
Com a exposição Mario Baldi: fotógrafo austríaco entre
índios brasileiros dá-se início à divulgação dos ricos
registros fotográficos produzidos por Mario Baldi, que,
por caprichos típicos da trajetória documental, perma-
neceram por meio século na obscuridade. Reconhe-
cemos, então, a louvável iniciativa do Museu das
Culturas Dom Bosco, do Museu de Etnologia de Viena e
da Prefeitura Municipal de Teresópolis, que organiza-
ram a exposição e esta bela publicação.
Wanderley Peres
Secretário de Cultura de Teresópolis
PPrreeffáácciiooss
5
Mario Baldi entre os Bororos. Meruri, 1934. Museum für Völkerkunde, Viena, foto n.o37829_02786 (a partir do negativo 6x9).
Em princípio, Mario Baldi achou mais simples fotografar jovens e outras pessoas mais próximas dos Salesianos. Uma das primeiras
fotografias entre os Bororos mostra o fotógrafo sentado com adolescentes debaixo de uma mangueira (árvore frutífera e muito bem
aceita entre os Bororo).
6
Durante os anos de 1954 e 1956, Etta Becker-Donner,
diretora do Museu de Etnologia de Viena, visitou o Brasil
a fim de fazer trabalhos de campo etnográficos, linguís-
ticos e arqueológicos no Território Rondônia, vindo a
conhecer o fotógrafo austríaco Mario Baldi. Baldi já havia
desenvolvido um interesse especial pelos povos indíge-
nas brasileiros durante as três décadas em que viveu no
país, e Becker-Donner adquiriu 30 das suas fotografias
produzidas entre os Bororo, Carajá e Tapirapé.
Em 1959, dois anos depois o trágico falecimento
de Baldi entre os Tapirapé, o museu vienense recebeu
parte de sua herança, um acervo de 386 objetos etno-
gráficos carajá e o que parecia ser seu arquivo fotográfico:
quatorze caixas contendo ampliações ordenadas temati-
camente, folhas-contato organizadas em cartões, mais
de dez mil negativos e uma quantidade pequena de dia-
positivos. Apesar das inscrições esporádicas no verso
das ampliações, o acervo não dispunha de informações
documentais escritas, o que fez com que o fosse catalo-
gado de maneira primária, ainda que o seu valor e inte-
resse tenham sido prontamente reconhecidos.
Passados quase 30 anos e sem o conhecimento
do museu vienense, no fim dos anos 1980 a Secretaria
de Cultura da Prefeitura de Teresópolis recebeu, do
escritor e médico Arthur Dalmasso (1920–2006), a
outra parte da herança de Mario Baldi, incluindo não só
ampliações fotográficas e folhas-contato, mas também
artigos ilustrados, cartas e demais documentos pessoais
referindo-se ao fotógrafo e suas atividades.
Cerca de 20 anos depois da doação de Dal-
masso, Teresópolis e Viena descobriram que guardavam
as partes complementares de um importante tesouro, o
qual possibilitaria conceder a Mario Baldi seu merecido
lugar na história da fotografia brasileira. Em pouco
tempo as duas instituções iniciaram mútua cooperação,
intercambiando informações cruciais para o maior e
melhor conhecimento dos seus acervos.
A exposição acompanhada pela presente publica-
ção é o primeiro passo para que Mario Baldi e a sua obra
sejam levados a um público amplo. Fazendo jus à
atuação de Mario Baldi, fotógrafo dedicado em larga
medida ao retrato dos indígenas brasileiros, e à área de
atuação do museu vienense, a mostra expõe à aprecia-
ção do século XXI imagens etnográficas e publicações
periódicas ilustradas que representam dois povos indíge-
nas brasileiros: os Bororo e os Carajá. O que se vê não são
os índios tais como eram, tampouco como o são hoje. São
construções visuais, narrativas fotográficas dos indígenas
brasileiros, tais como eram vistos e interpretados por um
fotógrafo da primeira metade do século passado.
Agradecemos a todos que nos ajudaram na mon-
tagem do projeto: Margit Krpata, Christine Zackel, Julia
Binter, Sabine Wolf e Thomas Weidenholzer na Áustria e
Patrícia Siqueira, Viviane Luiza da Silva e Regina Rebelo
no Brasil. Um agradecimento especial a Kurt Weinkamer
(1926–2009), falecido recentemente em Salzburg, pela
dedicada cooperação com a pesquisa. Agradecemos ao
Arquivo Nacional, Museu das Culturas Dom Bosco,
Secretaria Municipal de Cultura de Teresópolis e Museu de
Etnologia de Viena pelo apoio e exibição da mostra.
Reinhold Steinberger, Consul Geral da Áustria no Rio de
Janeiro, pelo apoio à exibição da mostra e à publicação
deste catálogo, bem como ao FotoRio 2009 por incluir a
mostra em seu circuito.
7
OO
pprroojjeettoo
BBaallddii
Christian Feest e Marcos F. de Brum Lopes*
*Bolsista do CNPq –Brasil.
Mario Baldi em seu escritório, na rua São Clemente 206, Botafogo. Rio de Janeiro, década de 1940. Autor não identificado [Emmy
Baldi]. Gelatina de prata, 29,2x23,5. S.M.C. Teresópolis, Coleção Mario Baldi [Baldi n.o10.004 E:31].
8
Mario Baldi, fotógrafo-etnógrafo, fotojornalista e escritor,
nasceu na cidade austríaca de Salzburg, em 1896.
Estudou no seminário St. Paul, no sul da Áustria, onde
tomou gosto pela etnologia (Völkerkunde) e geografia
histórica. A família Baldi era uma família de fotógrafos.
Gregor Baldi, tio de Mario, possuía uma galeria de arte
e o maior estúdio fotográfico da Áustria Oitocentista
(Weidenholzer 2003, Weinkamer 2000). A carreira de
fotógrafo iniciou-se durante a I Guerra Mundial, quando
Mario Baldi entrou para o exército como voluntário nas
linhas da Liga Austro-Húngara. O fotógrafo relata:
Fui então incorporado, por empréstimo do F.A.R. II,
regimento em Cracóvia (Polônia), como pirotécnico.
De lá fui ao front com a 10,4 cm F.K. Bateria 12/II R
à Galícia, como reconhecedor (Baldi s/d a: 2).
A I Guerra Mundial foi um grande laboratório para o início
de sua prática fotográfica, já que, como reconhecedor,
era necessário que produzisse imagens de caráter
documental. Além de fotografias aéreas e panoramas
dos campos de manobra, Baldi deixou interessante
testemunho das instalações das tropas: acampamentos,
armamentos, meios de transporte, alimentação e
diversão dos soldados. Fotografou, ainda, moradores
das regiões russas e turcas pelas quais passou, centros
urbanos destruídos pelos bombardeios, igrejas e escolas
abandonadas, bem como soldados turcos e judeus.
O fim do século XIX e início do XX era um tempo
em que o progresso e a modernização do espaço
urbano ditavam o ritmo do cotidiano. Mario Baldi,
oriundo de uma burguesia comercial de Salzburg, estava
inserido neste contexto, sobretudo porque vivia numa
cidade onde ocorriam exposições fotográficas, como a
Internationalen Photographischen Ausstellung in
Salzburg, de 1895. O ambiente cosmopolita e moderno
impregnava o dia-a-dia das pessoas. Era comum um
homem urbano do Império Austro-Húngaro se deparar
com narrativas e imagens de partes remotas do
planeta, o que, em Mario Baldi, exercia certo fascínio. Ao
fim da guerra, após ser capturado algumas vezes pelos
russos, fugindo em todas as ocasiões, Baldi foi transferi-
do para a reserva. Quedada a monarquia austríaca,
Baldi intentou emigrar para Namíbia, porém sem
sucesso. O plano frustrado de deixar a Áustria em
direção à África não o fez esmorecer, e austríaco, que
contava 25 anos, seu irmão e alguns amigos emigraram
para o Brasil, deixando a Europa no vapor Poconé em
1920 e chegando ao Rio Janeiro em Março de 1921.
Conta o fotógrafo:
Até 1925, dirigi tratores, fui lavrador, guarda-
noturno, fotógrafo itinerante, jardineiro, pedreiro,
construí uma rede telegráfica para o governo, fiz
uma expedição aos índios que tornou a ser um
desastre incomparável e cheguei, finalmente, ao Rio
de Janeiro com meu amigo que contraiu malária e
uma fortuna inacreditável de 20 mil Réis, onde
trabalhei como jardineiro e caseiro num convento de
freiras, começando a anotar minhas aventuras para
os jornais da minha pátria, as quais, mais tarde,
ilustrei com fotografias (Baldi s/d a: 3).
Ainda no mesmo ano de sua chegada no Brasil, Mario
Baldi publicou relatos de suas passagens pelo país em
jornais europeus. Os temas das suas reportagens ver-
savam sobre o interior do Estado do Rio de Janeiro,
principalmente a região serrana, já que se fixou num
rancho em Teresópolis, Estado do Rio de Janeiro.
Descreveu as fazendas, os diferentes tipos de cultivo e
MMaarriioo
BBaallddii
((11889966–11995577))
Marcos F. de Brum Lopes
9
o modo de vida rural. A Salzburger Volksblatt [Folha
Popular Salzburguesa] publicou uma nota introdutória à
reportagem de Baldi sobre os tropeiros de Teresópolis,
na qual é mencionado o peso do interesse etnográfico
do austríaco:
Um Salzburguês no Brasil: O tenente Mario Baldi,
oriundo de uma família conhecida de Salzburg, é um
dos poucos emigrados austríacos que conseguiram
estabelecer-se e, com sucesso, começar uma vida
nova em terra remota. Cheio de amor à vida e
vitalidade, ele sabe bem acomodar-se às condições
locais. Os seus animados relatos de viagens são bem
conhecidos, especialmente para os leitores do
Salzburger Volksblatt. Tendo sido voluntário do
exército desde o início da Guerra Mundial, Baldi foi
para o Brasil em 1920. Até agora trabalhou num
rancho (São Sebastiano de Teresópolis) e agora está
preparando-se para uma expedição ousada por todo
o Brasil, seguindo o Rio Paraná até Buenos Aires.
Entre os motivos da viagem estão os estudos
científicos e a investigação pormenorizada dos povos
indígenas da região (Salzburger Volksblatt ca. 1922).
Depois de temporadas de trabalho, nas quais ganhava
algum dinheiro, viajava pelo Brasil atuando como
fotógrafo itinerante. O campo fotográfico começava a
delinear-se com clareza já nos primeiros anos de Brasil,
tempo em que o austríaco já fotografava na capital
republicana e no interior do Estado do Rio de Janeiro.
Ele relata que fotografava os nativos, principalmente os
mulatos, que desejavam quantos retoques fossem
necessários para que parecessem brancos. Sobre a
remuneração não poupou ironias:
Agora tenho uma nova fonte de renda. Eu fotografo,
por muito dinheiro, os nativos. Qualquer negro sujo,
que não ganha muito, tem Réis suficientes para
comprar, pagando, com um grito de alegria, o preço
mais alto. Ele deve sair “bem claro”. Se retocarem
bem o filme de forma que apareça na imagem quase
branco, fica por demais contente (Baldi s/d b).
Na medida em que ficou conhecido na Áustria por suas
reportagens, aproximou-se de uma importante figura da
nobreza européia: o príncipe D. Pedro de Orleans e
Bragança, neto do segundo imperador do Brasil, que
passava sempre três temporadas anuais em Salzburg.
Esta fase, iniciada em 1925, foi determinante para a
carreira fotográfica de Mario Baldi: com o fim do exílio
à Família Imperial, ao neto de D. Pedro II foi permitido
viajar ao Brasil a fim de explorar as terras do antigo
império de seus ascendentes. Mario Baldi tornou-se
copeiro na casa do príncipe. Pelas relações da Família
Real com a nobreza austríaca e após uma consulta de
d. Pedro, o neto, à Grã-duquesa da Toscana, com quem
a família Baldi relacionava-se desde muito, o austríaco
passou de garçom a secretário e fotógrafo do príncipe,
documentando as viagens exploratórias do nobre, que
há muito tempo desejava estudar as terras brasileiras
e caçar animais selvagens, uma de suas paixões. A
primeira expedição foi feita em 1927, com caminhões,
um verdadeiro “raid” automobilístico que sangrou o
Brasil desde a fronteira com a Bolívia até Rio de
Janeiro. Foi nesse período que Baldi especializou-se em
fotografia e reportagens cinematográficas. Em 1936,
nova expedição foi feita com a família de d. Pedro, que
percorreu diversos rios do Nordeste, Norte e Centro-
Oeste do Brasil e visitou tribos indígenas. Para Mario
Baldi, o “nome” feito em função dessas viagens com
tão ilustre companhia foi a porta de entrada na
imprensa brasileira.
À época que Mario Baldi chegou ao Brasil, a
imprensa ilustrada brasileira já possuía quase 20 anos
de desenvolvimento. Desde inícios do século XX, ela
servira como uma representação da sociedade bur-
guesa, que por sua vez, lançava mão da fotografia de
forma a re-afirmar e inventar comportamentos, costumes,
enfim, um modo de vida. Como argumenta Ana Maria
Mauad (1990: IV), as revistas ilustradas atuavam como
instrumentos de coesão da classe burguesa, ao
mesmo tempo figurante na produção das imagens e
leitora do produto final.
Pode-se dividir a história da imprensa ilustrada
em dois períodos: de 1900 a 1928 e de 1928 aos anos
1950. Esta divisão, já tornada clássica pela historio-
grafia, tem por marco a criação de O Cruzeiro, revista
que viria revolucionar a fotorreportagem no Brasil a
10 Marcos F. de Brum Lopes
partir de 1928. As principais publicações da primeira
fase (1900–1928) eram a Revista da Semana, Fon-Fon
e Careta. Nestas publicações, a fotografia já era bem
valorizada, juntamente com o texto, cujo conteúdo era
confirmado pela presença de imagens ilustrativas. O
teor do material publicado, como observou Mauad
(1990: IV), bailava entre o crítico e o cômico, apresen-
tando, também, caráter educativo. Principalmente após
1920, as revistas ilustradas serviam como verdadeiros
manuais da vida moderna, civilizada e burguesa.
A revista O Cruzeiro revolucionou o estilo de publi-
cação ilustrada mais pela técnica jornalística do que
pelo conteúdo. Espelhando-se nas revistas norte-
americanas como a Look e a Life, introduziu no jornalis-
mo brasileiro técnicas modernas de reprodução foto-
gráfica em papel e concepções narrativas onde as foto-
grafias ditavam o texto das reportagens. As imagens
fotográficas não seriam mais desconexas, apenas
ilustrando e confirmando passagens do texto, mas
apresentariam mensagens ao leitor através das rela-
ções estabelecidas entre si. Os anos 1940 foram os
mais significativos em termos de mudança, já que foi
neste período que O Cruzeiro incorporou as formas do
fotojornalismo norte-americano, creditando as fotogra-
fias a seus autores e investindo nas dobradinhas
repórter/fotógrafo.
Mario Baldi participou deste processo, apare-
cendo na imprensa ilustrada ainda na primeira fase
(1900–1928). Àquela época, não havia fotojornalistas
profissionais, pois o próprio conceito de fotojornalismo
– imagens que narrassem uma história e fotógrafos
que assinassem seu trabalho – não estava plenamente
desenvolvido, ao menos na imprensa brasileira. Os
anos de formação de Baldi como fotógrafo de imprensa
foram os mesmos anos de consolidação da fotorrepor-
tagem brasileira, período no qual já assinava suas
reportagens fotográficas, fato inusitado no contexto da
época.
A imprensa ilustrada européia abriu espaço para
que Baldi publicasse suas imagens e palavras, com os
devidos créditos de autor, sobre as viagens realizadas
no Brasil. A ousadia das explorações do príncipe, que
cruzou todo o país desde a Bolívia até o Rio de Janeiro
de automóvel, foi o que lhe garantiu reportagens nas
revistas ilustradas européias, algumas dedicadas a
automóveis, entre o fim da década de 1920 e a primei-
ra metade dos anos 1930, tempo em que voltou à
Europa. Este foi o período de maturação do fotojornalis-
mo europeu, principalmente na região germanica. A
Mario Baldi (1896–1957) 11
Mario Baldi. Petrópolis (?), 1926. Cartão postal feito para seu pai,
Alois Baldi. S.M.C. Teresópolis, Coleção Mario Baldi.
Alemanha era o país com maior número de publicações
ilustradas nas décadas de 1920–30, contexto que viu o
surgimento dos primeiros fotojornalistas modernos
(Sousa 2004: 72). Baldi se encaixa na descrição feita
por Jorge Pedro Sousa (2004: 77) sobre esses homens:
“eram jovens que trabalhavam como ‘freelances’ e
redigiam eles mesmos os textos e legendas que
acompanham suas fotografias, sempre assinadas”.
Talvez freelance não seja o termo ideal para o modo de
agir de Baldi, já que era funcionário e documentarista
do príncipe. Porém, para as revistas ilustradas, era
mais um fotógrafo que vendia seus artigos e foto-
grafias. Além de fazer conferências e apresentar em
Salzburg e Viena diapositivos sobre suas viagens, Baldi
escreveu diversos artigos para revistas ilustradas,
austríacas e alemãs.
De volta ao Brasil em 1934, Mario Baldi foi con-
tratado pela missão salesiana para rodar um filme
sobre os esforços religiosos dos missionários no interior
do Mato Grosso. Nesta empreitada, além do filme,
grande quantidade de fotografias foi produzida,
algumas publicadas no Rio de Janeiro, a partir de 1935,
ao fim da expedição. Em 1936, Baldi viajou novamente
em companhia do príncipe D. Pedro, que agora levava
sua família para conhecer o interior brasileiro.
No ano de 1947, o fotógrafo se fixou definitiva-
mente em Teresópolis, região serrana do Estado do Rio
de Janeiro. Em sua residência montou seu atelier foto-
gráfico, laboratório e um pequeno museu etnográfico
que abria para visitação do publico serrano. Na cidade,
prestou serviços importantes à Pro-Arte, instituição cul-
tural fundada por Theodor Heuberger, produzindo as
fotografias do I Curso Internacional de Férias Pró-Arte
(1950), evento no qual palestrou sobre suas expedi-
ções etnográficas.
Mario Baldi prestou serviços fotográficos para o
jornal A Noite, Diários Associados, Serviço de Proteção
ao Índio (SPI), Fundação Brasil Central (FBC). Trabalhou
para o Ministério de Educação e Saúde, nos tempos do
Estado Novo (1937–1945), participando da produção
fotográfica para o livro nunca publicado sobre Getúlio
Vargas, A Obra Geutliana, idealizado por Gustavo Capa-
nema. Fez a documentação fotográfica para o impor-
tante livro de Adolfo Moralles de los Rios Filho (1941–
1942) sobre Gandjean de Montigny. Foi companheiro
dos Irmãos Villas Bôas, Chico Meirelles, fez dobra-
dinhas jornalísticas com Lincoln de Souza, e produziu
algumas das últimas fotografias de Raymond Maufrais,
o famoso repórter da France Press que, como Percy
Fawcet, desapareceu nas matas tropicais. Num tempo
em que os fotógrafos lutavam por espaço e reconheci-
mento no campo da imprensa, foi um dos pioneiros no
12 Marcos F. de Brum Lopes
Mario e Emmy Baldi, com artefatos bororo. Três Lagoas, Mato
Grosso do Sul, 1934. Autor não identificado. Gelatina de prata,
16,2x22,7. S.M.C. Teresópolis, Coleção Mario Baldi [Baldi n.o
02636].
recebimento de créditos de autor por suas fotografias
reproduzidas em revistas ilustradas e mesmo jornais
diários. Suas fotografias hoje ilustram livros sobre os
índios brasileiros, como o de Herbert Baldus (1970)
sobre os Tapirapé e o de Lincoln de Souza (1952–
1953) sobre os Xavante.
Em 1950, Baldi publicou Uoni-Uoni conta sua
história, um livro em que constrói um narrador indígena
para contar alguns episódios de suas diversas
expedições (Baldi 1950). Dois anos depois, o livro foi
publicado na Alemanha sob o título de Uoni-Uoni oder
die letzten Indianer am großen Wasser (Baldi 1952).
Mario Baldi e a prática etnográfica
Nos primeiros anos de Brasil, na década de
1920, Baldi já travara contato com os índios brasileiros.
Ainda que não se dedicasse a esta atividade profissio-
nalmente, por não ter formação científica em etnologia,
o austríaco cultivava o interesse pelo que então era
visto como exótico e pode ser classificado entre aqueles
amadores viajantes de um período em que as atividades
do antropólogo e do etnógrafo confundiam-se com a
desses curiosos sobre partes “incógnitas” do planeta.
Sem perder de vista a distância entre o profissio-
nal etnógrafo e o viajante, é possível afirmar, ao menos
Mario Baldi (1896–1957) 13
Mario Baldi em seu escritório, na rua São Clemente 206, Botafogo. Rio de Janeiro, década de 1940. Autor não identificado [Emmy
Baldi?]. Gelatina de prata, 16,9x11,2. S.M.C. Teresópolis, Coleção Mario Baldi [Baldi n.o10.000 E:31].
no caso de Baldi, que houve uma oficialização da ativi-
dade etnográfica enquanto prática ao longo de sua
trajetória. É importante sublinhar esta perspectiva, pois
o período no qual Baldi esteve no Brasil coincidiu com o
processo de delimitação das ciências sociais e humanas,
um período em que as disciplinas da história, sociologia
e antropologia se especializavam e se distinguiam. Neste
contexto, Baldi aparece ainda como explorador herdeiro
do século XIX, do estilo cultivado pela National Geo-
graphic, porém em diálogo com produções acadêmicas
como as de Herbert Baldus (1936), cujo artigo na revista
Espelho é ilustrada com fotografias de Baldi. Em notas
explicativas ao texto de Uoni-Uoni conta sua história, os
Ensaios de Etnologia Brasileira, de Baldus (1937), são
citados. Assim, a produção literára ficcional, fotográfica e
jornalística de Mario Baldi esteve em diálogo com outro
tipo de literatura, a etnográfica, cujas características a
distingue das outras. Essa eclética confluência literária
14 Marcos F. de Brum Lopes
Autoretrato de Mario Baldi, no jornal A Noite. Rio de Janeiro, 1938–1939. Gelatina de prata, 23,4x17,1. S.M.C. Teresópolis, Cole-
ção Mario Baldi [Baldi n.o07052].
aponta para uma tradição quanto ao tema das viagens
expedicionárias e dos indígenas: muitos se dedicavam à
escrita sobre os sertões, e faziam da temática um campo
de construções de identidades, memórias e projetos
nacionais (Garfield 2000).
Talvez seja essa uma das principais característi-
cas que tornam interessante a prática foto-etnográfica
de Mario Baldi. Seu ecletismo sustenta seu perfil de
intelectual que atua em campos diversos como a foto-
grafia, a escrita e a etnografia, detentor de competência
para traduzir e mediar, pela escrita da luz e do verbo, a
diversidade cultural brasileira.
O fotógrafo faleceu em 1957, numa viagem feita
em companhia de sua segunda esposa, a holandesa
Ruth Yvonne Fimmen (Ruth Baldi). No mesmo dia em
que a sepultou, pois foi morta por uma picada de cobra,
o fotógrafo sofreu um ataque cardíaco enquanto des-
cansava numa rede indígena. Os índios Tapirapé
enterraram ambos juntos, na sua aldeia.
Bibliografia
Baldi, Mario
s/d a Stammbaum. Secretaria Municipal de Cultura de Teresó-
polis, S.P.H.A.C, Coleção Mario Baldi, MB-B32.
s/d b Die Leute im Rio Preto-Tale. Salzburger Volksblatt. Secre-
taria Municipal de Cultura de Teresópolis, S.P.H.A.C, Coleção
Mario Baldi, MB-P-PC-C1/24.
1950 Uoni-Uoni conta sua história. São Paulo: Melhoramentos.
1952 Uoni-Uoni oder Die letzten Indianer am großen Wasser.
Düsseldorf: Bastion-Verlag.
Baldus, Herbert
1936 Licocós – As bonecas dos Carajás. Espelho 21 (dezem-
bro 1936). Rio de Janeiro. Secretaria de Cultura de Teresó-
polis, S.P.H.A.C, Coleção Mario Baldi, MB-P-PC-C1/64.
1937 Ensaios de Etnologia Brasileira. Brasiliana (Grande
formato), Biblioteca Pedagógica Brasileira Sér. 5, 101. São
Paulo–Rio de Janeiro–Recife: Companhia Editora Nacional.
1970 Tapirapé: tribo Tupi no Brasil Central. São Paulo: Com-
panhia Editora Nacional.
Garfield, Seth
2000 As raízes de uma planta que hoje é o Brasil: os índios e
o Estado-Nação na era Vargas. Revista Brasileira de História
20(39). São Paulo.
Mauad, Ana Maria
1990 Sob o signo da imagem. Tese de Doutorado, Universi-
dade Federal Fluminense, Niterói.
Rios Filho, Adolfo Morales de Los
1941–1942 Gandjean de Montigny e a evolução da arte
brasileira. Fotografias de Mario Baldi. Rio de Janeiro: Empresa
A Noite.
Salzburger Volksblatt
ca. 1922 Secretaria Municipal de Cultura de Teresópolis,
S.P.H.A.C, Coleção Mario Baldi, MB-P-PC-C1/18.
Sousa, Jorge Pedro
2004 Uma história crítica do fotojornalismo ocidental.
Chapecó–Florianópolis: Argos–Letras Contemporâneas.
Souza, Lincoln de
1952–1953 Entre os Xavantes do Roncador. Rio de Janeiro:
Ministério de Educação e Saúde, Serviço de Documentação.
Weidenholzer, Thomas
2003 Salzburger Fotografien 1880–1918 aus dem Fotoatelier
Würthle. Salzburg: Schriftenreihe des Archivs der Stadt Salzburg.
Weinkamer, Kurt
2000 Die Familie Baldi. Salzburg Landeskunde Info 04/2000.
Salzburg.
Mario Baldi (1896–1957) 15
Mario Baldi. Rio Araguaia, 1956. Gelatina de prata, 17,5x17,3.
S.M.C. Teresópolis, Coleção Mario Baldi [Baldi n.o16.258].
Vista da aldeia Meruri. 1934. Museum für Völkerkunde, Viena, foto n.o37829_02791 (a partir de ampliação 18x24).
A aldeia bororo é estabelecida, próxima de algum rio, sendo dividida em duas metades, os Ecerae ao norte e os Tugarege ao sul.
O modelo da aldeia não se manteve devido à extinção de alguns clãs, problemas territoriais e sociais. Após o contato com os não
índios, a maioria do povo Bororo, introduziu em seu cotidiano, móveis, eletrodomésticos e utensílios comuns à cultura ocidental.
16
Até onde sabemos, a carreira de Mario Baldi como
fotógrafo dos povos indígenas no Brasil teve inicio em
outubro de 1934, após ter sido contratado pelos
Padres Salesianos para produzir um filme sobre o
trabalho missionário entre os Bororo de Mato Grasso. O
fotógrafo carregava consigo uma máquina cinemato-
gráfica Agfa Movex 30 e 4000 metros de filme Novo-
pan. Montou sua base de trabalho em Lageado, parte
superior do Rio Garças, e durante os três meses se-
guintes fez uma viagem às aldeias bororo de Meruri no
Rio Barreiro, Sangradouro no Rio Sangradouro, e Jaru-
dori no Rio Vermelho. O filme foi projetado em São
Paulo em 1935, porém hoje seu paradeiro é desconhe-
cido. Somente alguns resultados fotográficos da expe-
dição foram publicados nos jornais do Brasil e da
Europa e estão mais bem documentados pelos nega-
tivos e ampliações conservados nas coleções de fotos
do Museu de Etnologia (Museum für Völkerkunde) em
Viena. Das 136 fotografias produzidas nas aldeias
Bororo por Baldi, 31 datam da segunda visita a Meruri
em 1936, em companhia do príncipe Dom Pedro de
Orleans e Bragança.
Para avaliar o significado das fotos de Mario
Baldi, será útil observar os Bororo e sua história
anterior à década de 1930 (com atenção especial a
sua relação com os Salesianos) e proporcionar uma
visão geral do registro visual da vida Bororo,
especialmente até aquele período.
O contato euro-brasileiro com os Bororo teve
início no século XVII, quando diversos grupos do
mesmo tronco lingüístico, Macro-Jê, foram encontrados,
sendo observado alguns nomes diferentes, principal-
mente na área entre o Rio Araguaia e Rio Paraguai, se
estendendo até a Bolívia e Goiás e em algum momento
também até Minas Gerais. Subsistindo através da
caça, pesca e coleta, seus contatos com a sociedade
colonial eram intermitentes até o afluxo dos bandei-
rantes paulistas do século XVIII, o que fez aumentar as
hostilidades naquele século e no seguinte, afetando
principalmente a coletividade dos grupos ocidentais
chamados Bororo da Campanha e Bororo do Cabaçal.
Isto resultou num grande declínio da população,
assimilação e em perda de partes de suas terras.
OsBororo Ocidentais perderam suas terras e, em última
instância, a sua identidade coletiva e tradicional.
Alguns dos Bororo Orientais, muitas vezes
identificados pelo genérico termo “Coroados”, que
vivem em torno da nascente do Rio Lourenço, Rio das
Mortes e Rio Garças, foram deslocados nas Colônias de
Tereza Cristina, localizada no Rio Prata, e Isabel, no
Piquiri, ambos afluentes do Rio São Lourenço. Sob a
influência de Cândido Mariano da Silva Rondon,
receberam parcelas de terras reservadas depois da sua
“pacificação” em 1901.
Neste difícil processo de pacificação e de proteção,
um importante papel foi desempenhado pelos Salesia-
nos, que em 1895 foram colocados no comando da
Colônia Tereza Cristina pelo Dr. Manoel Murtinho, Presi-
dente do Estado de Mato Grosso, estabelecando base
da missão em 1902 na Colônia Sagrado Coração e em
1906 na Colônia do Sangradouro, com postos avan-
çados em Meruri, Jarudori e outras aldeias bororo. Além
do seu trabalho religioso e social, os Salesianos se
dedicaram a investigações etnográficas intensivas da
língua e da cultura bororo, resultando numa primeira
grande monografia em 1925, produzida por P. Antonio
17
MMaarriioo
BBaallddii
ee
ooss
BBoorroorroo
Christian Feest e Viviane Luiza da Silva
Colbacchini, seguida pela monumental Enciclopédia
Bororo, de P. César Albisetti e P. Ângelo Jayme Venturelli
(1962–1976). Para os Bororo, o sério interesse dos Sale-
sianos em seu modo de vida tradicional pode ter sido
difícil de compreender, em função da meta de conver-
são e de preparação dos indígenas para a incorporação
à sociedade nacional, mas definitivamente ajudou-lhes
a manter o seu orgulho de suas próprias práticas cultu-
rais (veja Baldus 1937). A presença e o conhecimento
dos Salesianos sobre os Bororo, também, os fez impor-
tantes intermediários e porta-detentores de pesquisa,
como, notavelmente, Claude Lévi-Strauss, em 1935,
quem mais contribuiu para a importância da etnografia
bororo para teorias antropológicas, em especial no
campo da organização social.
O interesse etnográfico nos Bororo data desde
1780 – período em que etnologia passou a ser conside-
rada uma disciplina separada. Um pequeno grupo de
artefatos Bororo foram coletados nessa época por
Alexandre Rodrigues Ferreira, seguido por uma coleção
muito maior, reunida entre 1825–1827, pelo naturalista
austríaco Johann Natterer, a quem devemos, também,
os primeiros registros da língua Bororo, o relato mais
antigo e substancial de sua cultura, e os primeiros
retratos Bororo. Aproximadamente no mesmo período
as imagens Bororo produzidas foram por Aimé-Adrien
Taunay e Hercules Florence, artistas que acompanha-
vam a expedição de Georg Heinrich von Langsdorff.
Embora os Bororo fossem visitados e descritos
pelos viajantes e naturalistas durante as décadas se-
guintes, resultando em coleta de artefatos etnográficos,
demorou até 1888 para que uma pesquisa intensa
fosse realizada. Foi neste ano que, no decurso de uma
expedição alemã para o Brasil, Karl von den Steinen
visitou os Bororo na Colônia Tereza Cristina e dedicou-os
um capítulo do relato desta expedição. Von den Steinen
foi acompanhado pelo antropólogo Paul Ehrenreich,
cujas fotografias foram utilizadas para ilustrar o livro e
constituiu o primeiro registro fotográfico substancial dos
Bororo e, ao mesmo tempo, Wilhelm, primo de Karl von
den Steinen, produziu um significativo conjunto de de-
senhos etnográficos complementando as fotografias.
No início do século XX, o mais completo registro
fotográfico da vida e cultura Bororo foi produzido pelos
Salesianos, somado à documentação visual produzida
entre 1900 e 1922, pelos fotógrafos que trabalhavam
para a Comissão Rondon (Cândido Rondon, incluindo
seu filho Benjamin Rondon), e para os missionários pro-
testantes William A. Cook em 1901 e Alexander Hay, em
1919, o antropólogo checo Vojtech FricËem 1905, o aven-
tureiro britânico Henry A. Savage-Landor, em 1911, e
outros.
É improvável que qualquer uma destas imagens
fosse conhecida por Mario Baldi antes do seu primeiro
encontro com os Bororo e, por isso, temos de assumir
que ele não foi influenciado pelos trabalhos de seus
antecessores. É óbvio, porém, que Baldi deve ter trans-
18 Christian Feest e Viviane Luiza da Silva
“Uma índia centenária bororo.” Meruri, 1934. Museum für Völ-
kerkunde, Viena, foto n.o37829_02808 (a partir do negativo
6x6).
Índia usando um colar confeccionado com dentes de jaguar,
denominado pelos Bororo adugo-ó, por via de regra este adere-
ço não é usado diariamente, restringindo-se às festas.
portado em sua memória uma idéia generalizada dos
povos indígenas, baseada tanto na percepção generali-
zada romântica européia adquirida durante a infância e
juventude na Áustria e durante o período em que viveu
no Brasil na década anterior.
O impacto da primeira experiência pessoal de
Baldi da vida numa comunidade indígena (especialmente
nas circunstâncias específicas dos Bororo na década de
1930) foi abrandada pela presença e orientação dos
Salesianos para quem trabalhava. Existe uma fotografia
que mostra Baldi jogando dama com Padre Albisetti em
Jarudori, em dezembro de 1934, e podemos imaginar
como o conhecimento sobre os Bororo foi transferido in-
formalmente em tais definições do experiente missio-
nário-etnógrafo austríaco para o neófito. As legendas de
Baldi a respeito de suas imagens refletem claramente
esta influência em seu uso da auto-designação “Orarimu-
gudoge” para os Bororo e pela inclusão de informações
etnográficas que não seriam observadas na prática de
algumas semanas de contato com a cultura bororo.
As ampliações fotográficas em Viena indicam que
Baldi, provavelmente, em 1936, preparou quatro grupos
de fotografias para a publicação – todos com legendas
em inglês e alemão – apenas uma das quais aparente-
mente foi publicada mais ou menos baseada nesta sele-
ção (editado, mas com legendas). “Alerta - Cayamos!”
apareceu em uma revista ilustrada Suíça (Baldi 1936a)
e tratava de um recente conflito mortal entre os Bororo e
os Xavante e a fracassada tentativa dos Salesianos para
estabelecer relações pacíficas entre os dois grupos. O
segundo grupo fotográfico intitulava-se “Um posto avan-
çado da civilização” e mostrava atividades tradicionais
dos habitantes de Meruri e Sangradouro, tais como
obtenção o fogo, a fabricação de cestos e cerâmica, ou o
processsamento da alimentação, em especial o milho e
a mandioca, mas os coloca no contexto da influência dos
missionários sobre as práticas sociais (tais como o
abandono das casas do homens e da desintegração da
estrutura do clã).
O trabalho missionário dos Salesianos em si é o
tema do “Caminho espinhoso”, que não só transmite
uma idéia da natureza árdua do processo de conver-
são, mas também fornece algum julgamento sobre a
estratégia salesiana em trabalhar com crianças. O texto
de Baldi pode refletir sua posterior experiência entre os
Carajá, como em sua afirmação “infelizmente, todos os
missionários se sentem obrigados a vestir o pobre nu
selvagem. Mas, logo que o missionário vira as costas,
todos da aldeia gozam da pintura de sua tribo, em sua
bela pele morena.” O último grupo de fotografias é
dedicado para ao complexo ritual fúnebre bororo, em
que o mítico herói é representado através de danças,
denominada Marido. Aqui as imagens criam a ilusão de
um modo de vida tradicional totalmente isento da in-
fluência da sociedade nacional, ora dominante, en-
quanto que o texto acompanhado revela a dívida de
Baldi para a etnografia salesiana.
Mario Baldi e os Bororo 19
Obtendo o fogo. Sangradouro, 1934. Museum für Völkerkunde,
Viena, foto n.o37829_02839 (a partir do negativo 6x6).
Os Bororo obtêm o fogo através do atrito de dois pauzinhos
convenientemente esfregados entre si. Um fica na posição
horizontal no chão e o outro, é rodado velozmente com as pal-
mas das mãos.
Vinte e oito das fotografias bororo, produzidas
por Baldi, foram usadas para ilustrar cinco artigos em
jornais brasileiros (Autor desconhecido 1936, Baldi
1935b, 1936b, Magalhães 1935, Raeders 1936). Até
nos dois casos em que Baldi era responsável pelo texto,
não sabemos se ele mesmo escolheu as fotografias. É
notável, no entanto, que existe apenas uma pequena
sobreposição com as imagens nos quatro grupos de
imagens de Baldi. Salvo em Agfa Novedades as imagens
são fortemente cortadas para compor o layout da
publicação, e várias delas são reproduzidas espelhadas,
indicando que para os editores a composição formal
das imagens foi de importância secundária em relação
ao assunto exótico.
Mas cortes foram feitos, também, pelo próprio
Baldi nas ampliações feitas a partir de seus negativos.
Enquanto nos primeiros anos da sua carreira Baldi
utilizou pequenos negativos de vidro, no ano de 1930
ele havia mudado para uma câmara com as seguintes
descrições: Rolleiflex 2¼ de 2¼ polegadas, o que lhe
permitiu produzir não apenas negativos 6 por 6
centímetros sobre a Agfa Isochrome rollfilm, mas
também com a ajuda de um adaptador que produziu
negativos 6 por 9 centímetros. Dado que as impressões
são quase todas em papel com uma 1:1,5 largura/
altura, a impressão a partir do negativo implicava ne-
cessariamente alguma forma de edição das imagens
gravadas nos negativos. As impressões na coleção de
Viena mostram que Baldi em vários casos, variou suas
escolhas editoriais, incluindo tanto formatos horizontais
quanto verticais.
O fato de que alguns negativos foram recortados,
por ele mesmo, em tamanhos diferentes pode ter sido
o resultado de um acidente que ocorreu na volta de
Lageado para São Paulo, quando durante o cruzamento
do rio o baú de Baldi com todos seus filmes não revela-
dos caiu na água. Enquanto a maioria dos filmes apa-
rentemente sobreviveram ao infortúnio com poucos
danos, alguns dos negativos mostraram-se danificados
por contacto com água.
Na sua contribuição com a Agfa Novedades, Baldi
relata algumas dificuldades encontradas na produção
das fotografias. Os índios Bororo mais velhos de Jaru-
dori, ele diz, "estão vendo no filmador e no apparelho
fotográfico um feitiço", fugindo para o mato, porém,
sendo vencidos pela curiosidade a respeito das máqui-
nas misteriosas. Os índios civilizados das colônias,
entretanto, temiam menos a máquina fotográfica do
que ser fotografados sem roupas apropriadas, para a
decepção do fotógrafo que queria fotografar da forma
mais natural os habitantes indígenas de Mato Grosso
(Baldi 1935b).
Apesar destes problemas menores, que corres-
pondem de perto às experiências de outros fotógrafos
de outras partes do mundo, Baldi foi capaz de produzir
um notável grupo de imagens, que abrange uma ampla
gama de assuntos. A maior série, cerca de um quinto de
todo o conjunto, é dedicada ao ritual funerário (incluindo
retratos de alguns dos participantes em suas vestimen-
tas cerimoniais ou mostrando a utilização de instrumen-
tos musicais) e uma dança realizada pelos Bororo,
durante a visita de Dom Pedro. Outras séries de imagens
são dedicadas a um concurso de arqueiros e à pescaria,
mas muitas das imagens focam representações
especificas de variadas atividades, incluindo os
processos tecnológicos, cura, transporte, jogos, nata-
ção e descanso. Homens e mulheres são retratados
tanto individualmente como em grupos, tanto nas tradi-
cionais e “civilizada”, com atenção especial para fotos
de mulheres e seus filhos. Os mais dispostos a serem
fotografados acabou por serem as crianças, que “com
alguns presentes, são gratos para o nosso desidera-
tum” (Baldi 1935b) e, conseqüentemente, estão repre-
sentados em destaque nas fotografias de Baldi.
Existem também várias cenas da aldeia trans-
mitindo uma impressão da vida quotidiana das comuni-
20 Christian Feest e Viviane Luiza da Silva
Dança em frente da casa dos homens. Jarudori, 1934.
Museum für Völkerkunde, Viena, foto n.o37829_02889A (a
partir do negativo 6x6).
Baldi descreve como “os guerreiros [homens adultos] come-
çam sua dança circular em frente da casa dos homens. O feiti-
ceiro [bari] liderando o grupo agitando seu ‘maracá de espirito’
e andando na roda em volta da sepultura.”
Mario Baldi e os Bororo 21
dades. O fato de que os salesianos e freiras são co-
mumente representados deriva, naturalmente, da fun-
ção de Baldi, que trabalhava para a missão. Entretanto,
suas escolhas são notáveis, uma vez que a fotografia
etnográfica tende a destacar a "cultura tradicional" e, em
conseqüência, termina por negar a existência de
processos e agentes de mudança cultural.
Evidentemente, a documentação visual produzida
por Baldi entre os Bororo não é completamas oferecem
uma rica e equilibrada visão de vários aspectos da
cultura bororo na década de 1930. Isto se torna par-
ticularmente óbvio por uma comparação com as fotos
produzidas por outras pessoas durante a mesma
década, incluindo o trabalho dos antropólogos Vincenzo
Petrullo em 1931, Claude Lévi-Strauss, em 1935, o
suíço viajante Hans Morf em 1937, e Pietro Grisoni,
que foi empregado como um condutor pelos Salesianos
no final nos anos 1930. Enquanto as fotos tiradas por
Morf e Grisoni permanecem inéditas até hoje, algumas
das que foram tomadas por Lévi-Strauss e Petrullo
(juntamente com as fotos pelo jornalista David M.
Newell) foram utilizadas para ilustrar o artigo sobre os
Bororo, no Handbook of South American Indians (Lowie
1946), bem como as publicações de seus autores
(Petrullo 1932, Lévi-Strauss 1936). Entre as fotos dos
Bororo publicadas no período estão também àquelas
produzidas por Herbert Baldus, em 1934 e 1935 (Bal-
dus 1937). As fotografias de Baldi formam o maior
conjunto de fotografias tiradas durante esta década.
A diferença entre a fotografia antropológica e
aquela do fotojornalista Mario Baldi é claramente
revelada através de um olhar sobre as imagens toma-
das por Lévi-Strauss, atualmente preservada no Musée
du quai Branly em Paris. Para o seu campo de trabalho,
o antropólogo, escolheu a aldeia Quejare (Kejara)
próxima ao Rio Vermelho, não muito longe de Jarudori,
porque considerou ser a mais tradicional, ou seja, não
afetada pela influência salesiana, embora o seu
principal informante que vive na aldeia tinha sido
educado pelos Salesianos (veja Lévi-Strauss 1957). Em
parte, devido sua escolha, existem apenas duas de 78
fotos mostrando uma pessoa vestida “civilizada”,
outras indicações de qualquer contato com a
sociedade nacional, são igualmente ausentes. Como
nas fotografias de Baldi, é dado um destaque especial
ao ritual funerário na documentação de Levi-Strauss,
neste caso, trata-se de quase metade das fotos. Outro
grande conjunto de imagens trata de casas, incluindo
algumas cenas da aldeia, mas principalmente focando
em construções individuais e algumas de suas caracte-
rísticas. O terceiro grupo é composto por retratos, a
maioria homens, e muitos dos retratos seguindo um
estilo antropológico bastante antigo baseado em
tomadas frontais e de perfil. As fotografias restantes
mostram alguns detalhes como as vestimentas, a
22 Christian Feest e Viviane Luiza da Silva
Padre César Albisetti com crianças Bororos. Jarudori, 1934.
Museum für Völkerkunde, Viena, foto n.o37829_02869 (a par-
tir do negativo 6x9, cortado).
O missionário salesiano César Albisetti foi também um dos
principais etnógrafos da cultura bororo. Baldi comentou várias
vezes as práticas missionarias para chamar a atenção das cri-
anças distribuido presentes e narrando contos.
forma como os Bororo lançam as flechas, e dois barcos
abandonados. A absoluta falta de interesse do antro-
pólogo nos processos tecnológicos e em grande parte
da cultura material (exceto as casas como a cultura
material de organização social) é tão significativa
quanto o foco na cultura tradicional. As fotografias de
Lévi-Strauss, por conseguinte, são estritamente limita-
das aos pontos focais de sua investigação e se
revestem de valor especial a partir de sua conexão com
a informação escrita recolhida no decurso do trabalho
de campo. As imagens de Mario Baldi são muito mais
amplas em comparação etnográfica, mas têm de ser
contextualizadas, am grande parte, a partir de outras
fontes do período.
Bibliografia
Albisetti, César, e Angelo J. Venturelli
1962–1976 Enciclopédia Bororo. 3 volumes. Campo Grande:
Museu Regional Dom Bosco.
Autor desconhecido
1936 Matto Grosso – Terra das maravilhas. Espelho 2(12,
marzo 1936). Secretaria Municipal de Cultura de Teresópolis,
S.P.H.A.C, Coleção Mario Baldi, MB-P-PC-C2/49.
Baldi, Mario
1935a Expedições com Agfa. AGFA Novidades 1935(5). São
Paulo. Secretaria Municipal de Cultura de Teresópolis,
S.P.H.A.C, Coleção Mario Baldi, MB-P-PC-C2/44.
1935b Expedições com Agfa. AGFA Novidades 1935(7). São
Paulo. Secretaria Municipal de Cultura de Teresópolis,
S.P.H.A.C, Coleção Mario Baldi, MB-P-PC-C2/46.
1936a Achtung Cayamos ... ! Das Leben im Bild 52 (46, 14
novembre 1936). Zofingen. Secretaria Municipal de Cultura
de Teresópolis, S.P.H.A.C, Coleção Mario Baldi.
1936b No sertão do Araguaya. A Noite Illustrada (1 dezembre
1936). Secretaria de Cultura de Teresópolis, S.P.H.A.C,
Coleção Mario Baldi, MB-P-PC-C2/61.
Baldus, Herbert
1937 Ensaios de Etnologia Brasileira. Brasiliana (Grande for-
mato), Biblioteca Pedagógica Brasileira Sér. 5, 101. São
Paulo–Rio de Janeiro–Recife: Companhia Editora Nacional.
Colbacchini, Antonio
1925 I Bororos Orientali “Orarimugudoge” del Matto Grosso
(Brasile). Contributi Scientifici delle Missioni Salesiane del
Venerabile Don Bosco 1. Torino: Societa editrice.
Lévi-Strauss, Claude
1936 Contribution à l’étude de l’organisation sociale des in-
diens Bororo. Journal de la Société des Américanistes de
Paris, n.s. 28: 269–304. Paris.
1957 Tristes Trópicos. São Paulo: Anhembi.
Lowie, Robert H.
1946 The Bororo. In: Julian H. Steward (ed.), Handbook of South
American Indians, vol. 1 (Bulletin of the Bureau of American
Ethnology 143, Washington), 419–434.
Magalhães, Basilio de
1936 Classificação dos Borôros de Matto Grosso. Espelho
2(10, janeiro 1936). Secretaria Municipal de Cultura de
Teresópolis, S.P.H.A.C, Coleção Mario Baldi, MB-P-PC-C2/48.
Petrullo, Vincent M.
1932 Primitive Peoples of Matto Grosso, Brazil. The Museum
Journal 23(2): 83–173. Philadelphia.
Raeders, Georges
1935 Á procura dos indios Chavantes. Espelho 1(1, abril 1935).
Secretaria Municipal de Cultura de Teresópolis, S.P.H.A.C,
Coleção Mario Baldi, MB-P-PC-C2/47.
Mario Baldi e os Bororo 23
“Bororos pescando.” Meruri, 1936. Museum für Völkerkunde,
Viena, foto n.o37829_03046 (a partir do negativo 6x6).
A rede de pesca dos Bororo é feito de fibra de buriti, na qual
são adaptadas duas varas finas e maleáveis. Denomina-se
buke (“tamanduá-bandeira”), por que seus contornos assemel-
ham-se aos deste animal.
24
“Mãe Caraja fumando com
criança.” Ilha do Bananal,
1938. Gelatina de prata,
23,9x29,9. S.M.C. Teresópo-
lis, Coleção Mario Baldi [Baldi
n.o04915].
Os índios Carajá compõem a família lingüística Carajá,
do tronco Macro-Jê, e habitam a Ilha do Bananal e
extensões do Rio Araguaia, correspondendo a parte
significativa da fotografia de Mario Baldi. Além do valor
etnográfico, a produção visual do fotógrafo tem uma
vertente de interesse histórico no que toca a temática
indígena e a fotografia brasileira, mais especificamente,
a relação entre o interior do Brasil e os círculos urbanos
onde eram folheadas as páginas das revistas ilustradas
nas quais o fotógrafo publicava suas imagens e
palavras.
As duas expedições dedicadas ao contato com os
índios Carajá que figuram nas fotografias da exposição
Mario Baldi: fotógrafo austríaco entre índios brasileiros,
ocorreram na segunda metade dos anos 1930. A
primeira delas, em 1936, foi feita em companhia do
príncipe D. Pedro de Orleans e Bragança, neto de D.
Pedro II, e garantiu a Baldi cerca de 20 números
consecutivos de reportagens na folha carioca A Noite
Illustrada. Os trabalhos de Mario Baldi como secretário
de D. Pedro abriram-lhe as portas para o mundo da
fotografia de imprensa no Brasil, o que levou o jornal A
Noite a envia-lo como fotógrafo, em 1938, à região do
Rio Araguaia. Desta vez, deveria acompanhar e fotogra-
far a expedição de filmagem de Doralice Avellar,
formada em fotografia e cinematografia na Alemanha,
que desejava produzir um filme sobre o Brasil para
concorrer em um festival de cinema europeu. O trabalho
rendeu a Baldi um contrato oficial como fotógrafo do
jornal A Noite.
A produção fotojornalística sobre o chamado
“sertão” tinha como contrapartida o consumo urbano
da alteridade étnica e cultural, traduzida pelo uso do
25
OOss
íínnddiiooss
CCaarraajjáá
nnaa
ffoottooggrraaffiiaa
ddee
MMaarriioo
BBaallddii
Marcos F. de Brum Lopes
O príncipe D. Pedro de Orleans e Bragança, neto de D. Pedro II,
com duas índias Carajá. Ilha do Bananal, 1936. Gelatina de
prata, 12x18. S.M.C. Teresópolis, Coleção Mario Baldi [Baldi n.o
03192].
termo “raça”. Porém, no contexto das décadas de 1930
e 1940, mais do que a satisfação de curiosidades de
uma população leitora supostamente ávida pelo
exótico, as narrativas se revestiam de uma importância
nacional, na medida em que refletiam sobre a incorpo-
ração efetiva de espaços até então desconhecidos ao
território nacional. Controlar os habitantes, dominar a
natureza e resistir aos infortúnios das matas era tão
vital para o movimento quanto escolher apropriada-
mente as palavra e imagens que se tornariam
fragmentos convincentes da atuação civilizadora dos
citadinos sobre os indígenas e sertanejos. Grande parte
de tais fragmentos foi levada à apreciação dos mundos
urbanos através da imprensa, no interior da qual o
fotojornalismo construiu uma nova forma de experiência
visual e narrativa para leitores que visualizavam o
“sertão” no conforto de suas casas e cafés.
Protagonistas dessa tradução visual, fotógrafos
como Mario Baldi construíam suas narrativas em dialogo
com tal cultura letrada e urbana de forma mais ou
menos explícita. Seus trabalhos, se não atuavam como
propaganda anunciada dos esforços de classificação e
controle da paisagem e habitantes do interior, sugeriam
interpretações e chamavam os leitores à reflexão sobre
a alteridade étnica e cultural do país. As fotografias e
textos de Mario Baldi que representam as duas
expedições em questão se aproximam da última
perspectiva.
Dentre as cerca de 300 fotografias produzidas na
expedição de 1938, destacam-se aquelas que valorizam
o encontro de dois principais pólos, o branco e o índio.
Mario Baldi, mesmo sendo austríaco e há apenas 11
anos no Brasil (o fotógrafo passou os anos entre 1928 e
1934 na Europa), foi sensível às demandas ideológicas e
discussões sociológicas acerca da formação do povo
brasileiro. A expedição em si mesma estava destinada a
construir e narrar o Brasil a partir de alguma essência do
que fosse, de fato, o país e seu povo. Não sem motivo, os
expedicionários passaram por cidades nordestinas e
terminaram na Ilha do Bananal, para filmar os índios
Carajá. Doralice Avellar, responsável pelas filmagens,
elegeu o índio como centro de atenção de seu filme, que
seria levado à Europa. Já Mario Baldi narrou a expedição
em fotografias que representavam a diversidade étnica,
fazendo dela um retrato do Brasil.
De acordo com Renato Ortiz, os anos de 1930 e
1940 foram aqueles em que a intelectualidade
brasileira tentou equacionar o problema da identidade
nacional a partir da diversidade étnica e cultural que
pluralizava a população do país. A questão era antiga:
um território vasto e uma população dividida entre
26 Marcos F. de Brum Lopes
“Pintar remos.” Mato Verde, Ilha do Bananal, 1936. Museum
für Völkerkunde, Viena, foto n.o37829_03248 (a partir de
negativo 6x9).
Esses instrumentos fluviais são confeccionados em forma de
folha de bananeira, cortados inteiriços de um tronco de árvore
e, depois, adornados com desenhos.
europeus, negros e indígenas. Ao final do século XIX,
delineia-se entre a intelectualidade o pensamento do
Brasil-cadinho, ou seja, de um Brasil resultado do cruza-
mento das três raças (Ortiz 1985: 37). Não obstante, a
miscigenação racial era um entrave ao progresso, aos
olhos de grande parte dos autores oitocentistas. Com o
regime republicano e, principalmente, nos anos 1930,
com a reorientação social e cultural promovida pelo
Estado Novo (1937–1945), a miscigenação passa a ser
considerada componente da identidade brasileira,
muito em função da obra seminal de Gilberto Freyre,
Casa Grande e Senzala, cuja idéia central era apreender
o país a partir de pólos diversos e complementares
(Ortiz 1985: 42).
De fato, quando consideramos a produção visual
de Mario Baldi, vemo-la articulada com tal reflexão do
que seria o Brasil, sua identidade nacional e seu povo.
Em 1938, o fotógrafo já havia percebido que a identi-
dade brasileira passava pela discussão das raças e que,
dado o preconceito e pessimismo com que a miscigena-
ção fora tratada nas décadas anteriores, o novo projeto
de Brasil deveria investir na problemática dos contatos
culturais e não sobre a incompatibilidade racial. Como
lidar com o inevitável choque oriundo de um Brasil urba-
no que almejava avançar sobre um Brasil incógnito? O
cruzamento das raças poderia resolver a questão (Ortiz
1985: 92). Consideramos que tal argumentação nunca
deixou de dar destaque maior à contribuição dos bran-
cos ao projeto de civilização brasileira. Particularmente
expressiva é a longa reportagem fotográfica produzida
por outro fotógrafo, Jean Manzon, e publicada na revista
Paris Match, 14 anos depois da expedição de Mario Baldi.
Metade de uma das páginas é dedicada à fotografia de
legenda Rouge, blanc et noir. Na imagem, o homem
branco domina o enquadramento, sendo o único que
olha diretamente para a objetiva da câmera fotográfica,
enquanto o negro e o índio complementam a cena e
traduzem visualmente o título da reportagem: “Brésil”
(Paris Match 1952).
As fotografias da expedição de 1938 aproximam-
se de um olhar fotojornalístico, voltado para a
construção do acontecimento, do inusitado e de uma
narração, diferentemente das imagens de 1936, mais
próximas da observação etnográfica. Naturalmente,
Baldi preocupou-se com a função que lhe foi designada
pelo jornal: cobrir jornalisticamente a expedição de
filmagem. Para além dessa justificativa que pode
parecer automática, o trabalho do fotógrafo foi uma
oportunidade para que construísse sua idéia de Brasil,
de povo brasileiro, deslocando o índio do foco de
observação e articulando-o com a presença de outra
cultura estranha ao indígena, a do branco, que pode ora
dominar seus enquadramentos, ora estabelecer pólos.
As fotografias valorizam as reações desses pólos num
encontro que se revestia de projeto nacional. Através da
dramatização da captura do indígena pelas lentes da
câmera de Doralice Avellar, o fotógrafo reflete sobre a
diversidade cultural brasileira, que apreende o índio em
imagem e verbo. Em contrapartida, Mario Baldi produz
imagens nas quais o branco é deslocado de seu lugar
de destaque e é articulado à cultura que lhe é estranha,
ou seja, a indígena.
Os índios Carajá na fotografia de Mario Baldi 27
Doralice Avellar filmando uma índia Carajá. Ilha do Bananal,
1938. Gelatina de prata, 23,6x17,4. S.M.C. Teresópolis, Coleç-
ão Mario Baldi [Baldi n.o04935].
Quantas poses existem nessas fotografias? Mario Baldi produz
registros de registros e dramatiza a “captura” dos índios pelas
lentes de máquinas.
A produção de um sentido visual dedicado à
diversidade cultural e à questão do choque de culturas
tem em Doralice Avellar um de seus principais
sustentáculos. Mario Baldi elevou a companheira de
viagem a símbolo de brasilidade. Num primeiro olhar,
pode-se dizer que isso confere superioridade absoluta à
civilização do branco no discurso visual do fotógrafo.
Porém, Doralice Avellar é, em si mesma, produto genuíno
do Brasil, uma vez que é filha de pai escandinavo e mãe
índia brasileira (Baldi 1950: 5). A variação baldiana do
mito do cruzamento das raças faz com que o Brasil,
simbolizado pela fotógrafa meio européia meio índia, vá
28 Marcos F. de Brum Lopes
“Doralice voltando d’um passeio a Canoa.” Pintada como índia, nas margens do Rio Araguaia. Ilha do Bananal, 1938. Gelatina de
prata, 23x17. S.M.C. Teresópolis, Coleção Mario Baldi [Baldi n.o04952].
Mulher moderna, meio européia meio índia. Mario Baldi fez da fotógrafa um símbolo de brasilidade. Doralice aprendeu a manejar
máquinas fotográficas e de cinema na Europa. No Brasil, à beira do Rio Araguaia, Mario Baldi fotografou sua companheira de via-
gem manejando instrumentos de uma cultura estranha.
a busca de si mesmo, reconheça sua origem primeira,
sua origem indígena.
Ao longo do tempo, não esteve livre de tensões
tal narratividade do pensamento de Mario Baldi. Ao
contrário, o fotógrafo bailava entre uma visão romântica
do índio, a valorização de sua cultura como genuina-
mente brasileira (Baldi 1950: 6) e a idéia de que o
avanço do litoral sobre o interior produziria o Brasil do
futuro (Baldi 1936a). Pode-se estabelecer, segundo
nossa visão, fases distintas na trajetória do fotógrafo
quanto a esse aspecto, que responderam a certas
demandas pessoais e sociais. Considerando 1934 o
marco inicial das expedições foto-etnográficas, temos os
anos de 1934–1936 como a fase de compromisso com
as missões salesianas de Mato Grosso, entre os índios
Bororo. Nesse período, o tom das reportagens de Baldi
é o do enaltecimento dos feitos religiosos dos salesia-
nos, como se pode constatar em Baldi (1936b).
Entre 1936 e 1938, o austríaco fez trabalhos
para o jornal A Noite como freelance, por exemplo,
cobrindo a viagem de Getúlio Vargas ao estado de
Minas Gerais, em 1936. Depois da expedição de 1938,
quando é contratado oficialmente como repórter foto-
gráfico, iniciam-se contatos mais próximos com o
Estado Novo (1937–1945). Baldi inicia, então, a fase de
Os índios Carajá na fotografia de Mario Baldi 29
“Araguaia Exped. 1936”. Mãe e filho Carajá. Ilha do Bananal,
1936. Gelatina de prata, 22,3x27,9. S.M.C. Teresópolis, Cole-
ção Mario Baldi [Baldi n.o03262].
“Araguaia Exped. 1938”. Um índio Carajá pinta o corpo de uma
índia. Ilha do Bananal, 1938. Gelatina de prata, 22,3x27,2.
S.M.C. Teresópolis, Coleção Mario Baldi [Baldi n.o05035].
intensos diálogos com o S.P.I. e F.B.C., assumindo um
papel de mediador entre os mundos urbanos e
“sertanejos”. O compromisso com a Marcha para o
Oeste resulta num tom otimista quanto à atuação do
governo federal que, através dos referidos órgãos,
visava incorporar os indígenas ao projeto nacional
brasileiro. O surgimento da expedição Roncador-Xingu,
nos anos 1940, teve papel importante nessa fase
marcada pela transformação da idéia de espaço na de
território nacional (Baldi 1947, Menezes 2000).
Em 1949, Mario Baldi retira-se dos Diários
Associados, ao qual havia se vinculado naquele mesmo
ano juntamente com o diretor do jornal A Noite, Vasco
Lima. Tem início, assim, uma fase mais madura e livre
na qual o fotógrafo publica seu livro Uoni-Uoni conta sua
história, uma obra ímpar em certos aspectos. Baldi
continuou a valorizar a empreitada nacional nos anos
1950, como se percebe na reportagem de 1954 (Baldi
1954), mas voltou-se muito mais para expedições autô-
nomas, sobretudo após seu segundo casamento, com a
holandesa Ruth Yvonne Fimmen, também expedicionária
e estudiosa de povos africanos.
Esta breve periodização serve para que se
perceba que os anos de 1940 foram de intensa
maturação e reflexão sobre o problema do indígena e do
projeto nacional que avançava sobre o Oeste brasileiro.
O fim de seu vínculo empregatício com a imprensa
carioca correspondeu ao início de uma nova fase, na
qual as fotografias dos Carajá, de 1938, figuram nas
páginas de Uoni-Uoni conta sua história, 12 anos depois
de sua produção na Ilha do Bananal. A reinterpretação
das fotografias recupera o tema dos encontros culturais
e da necessidade de levar-se em conta a figura do índio
na construção da identidade nacional.
A história é contada pelas falas de um narrador
ficcional, um pequeno índio Carajá. Essa é a primeira e
principal característica da obra enquanto uma forma de
aproximação entre o leitor urbano e o mundo indígena:
significa o próprio índio falando ao não índio. A primeira
parte do livro versa sobre o modo de vida indígena, suas
lendas e costumes, quando, não raro, o narrador tece
julgamentos sobre a civilização branca. A segunda parte
é dedicada à chegada da expedição de Baldi e Avellar à
Ilha do Bananal. Assim como nas fotografias, o texto
valoriza o que o fotógrafo pensava sobre a reação
indígena à chegada do branco civilizado, entretanto,
agora, explorando a intertextualidade imagem/palavra.
Nas imagens em que brancos e índios são
representados, o tema do estranhamento norteia a
produção do sentido visual, como na bela imagem em
que se vê um pequeno índio contemplando a máquina
filmadora e na imagem em que Uoni-Uoni presenteia
Doralice Avellar com uma flecha. Enquanto o índio se
apequena frente à câmera filmadora, na segunda
30 Marcos F. de Brum Lopes
“Que coisa estranha!” Um menino Carajá [Uoni-Uoni] observan-
do uma câmera filmadora. Ilha do Bananal, 1938. Gelatina de
prata, 12,4x12,9. S.M.C. Teresópolis, Coleção Mario Baldi
[Baldi n.o04923].
“Eis o esquisito bicho de pernas de caranguejo gigante. Ele
está zunindo que nem uma casa de marimbondo bravo. Mas
meu irmão grande diz que são apenas as tripas do bicho que
estão com fome” (Baldi 1950: 79).
imagem o índio enche o centro do enquadramento e sua
posição de destaque sugere, ao mesmo tempo, a
pequenez do branco frente ao novo.
Assim também ocorre nas fotografias nas quais a
alteridade toma contornos de interação. Nelas, vemos o
branco e o índio, cada um ao seu modo, ensinando algo
ao outro. Aquilo que antes era estranho, passa ser o
ponto de contato entre as culturas, como na imagem em
que Doralice Avellar leva o pajé Kuhubara a olhar através
da câmera e naquela em que Doralice Avellar (que no
livro recebe o nome de Behederu) toma aulas de arco e
flecha. É significativo o fato de que, nas sociedades
indígenas, os homens são os únicos a manejar o arco e
flechas. Enquanto o pajé não sabe como olhar pela
câmera, Behederu tampouco sabe menejar o arco e
flechas. As distâncias culturais são narradas pela
interação dos homens e mulheres que as representam.
Esta breve incursão pelas imagens da expedição
de 1938 publicadas em Uoni-Uoni, não quer sugerir um
olhar romântico sobre o pensamento de Mario Baldi, o
qual pereceria livre de preconceitos e hierarquizações
raciais típicas de seu tempo. A escolha do índio como
narrador de sua própria história, por mais peculiar que
possa ter sido, não significa uma abordagem pura e
objetiva sobre a questão indígena no Brasil. O autor não
consegue resolver o problema do choque de culturas, as
diferenças existentes entre os protagonistas da narrativa
saltam das páginas e chegam ao leitor, ele mesmo um
Outro em relação ao narrador, que é um índio.
A confissão de Baldi no prefácio ao livro reflete
certa incerteza e expectativa de uma resolução
posterior ao problema, ainda não encontrada pelo
projeto nacional: “O meu maior contentamento seria
que dêste livro resultasse um pouco de amizade, ou
melhor compreensão dos leitores, para com os nossos
irmãos de raça indígena, que como se sabe são os que
têm mais direito, por assim dizer, a êste território imenso,
e que representam, cem por cento, o Brasil” (Baldi
1950: 6). A raça indígena é raça irmã, no entanto,
representa genuinamente o Brasil. Os índios têm direito
a terra, mas o que dizer da fórmula “as nossas selvas e
seus filhos” (Baldi 1950: 6), constantemente utilizada
por Baldi e outros para designar o “sertão” e os
indígenas?
Os índios Carajá, na fotografia de Mario Baldi,
foram representados na construção de uma visão de
Brasil específica, datada da primeira metade do século
XX, na qual o mito do cruzamento das raças foi elevado
ao patamar de substância da identidade nacional. Não
obstante, a equação que se resolvia ao nível do discurso
Os índios Carajá na fotografia de Mario Baldi 31
“Uoni-Uoni presenteia Behederu [Doralice Avellar] com uma
flecha de caça”. Ilha do Bananal, 1938. Gelatina de prata,
12x17,5. S.M.C. Teresópolis, Coleção Mario Baldi [Baldi n.o
04944].
32 Marcos F. de Brum Lopes
não escondia totalmente os choques étnicos e culturais
que emergiam do avanço do Brasil urbano sobre o Brasil
“incógnito”. As fotografias desses índios, produzidas em
1938 e que refiguram no livro de Baldi, não só são frutos
do período no qual foram produzidas e publicadas, mas
também compõem a interpretação dada pelo fotógrafo
ao complexo processo de convivência, conflito e nego-
ciação entre as sociedades indígenas e os demais grupos
sociais brasileiros.
Bibliografia
Baldi, Mario
1936a Imagens do Rio Araguaia – O Béro Ô Can dos indios
Carajás. Espelho – A revista da vida moderna 21. Rio de
Janeiro. Secretaria de Cultura de Teresópolis, Coleção Mario
Baldi, MB-P-PC-C2/63.
1936b Sertão do Araguaya. A Noite Illustrada 382. Rio de
Janeiro. Secretaria de Cultura de Teresópolis, Coleção Mario
Baldi, MB-P-PC-C2/61.
1947 Território interditado! A Noite Illustrada. Rio de Janeiro.
1950 Uoni-Uoni conta sua história. São Paulo: Edições Melho-
ramentos.
1954 Arranca-se uma nova pista de aviões nas matas do
Xingú. Manchete 131. Rio de Janeiro. Secretaria de Cultura de
Teresópolis, Coleção Mario Baldi, MB-P-PC-C3/131.
Menezes, Maria Lucia Pires
2000 Parque Indígena do Xingu: a construção de um território
estatal. Campinas: Unicamp.
Ortiz, Renato
1985 Cultura Brasileira e identidade nacional. 2aedição. São
Paulo: Editora Brasiliense.
Paris Match
1952 Brésil. Secretaria de Cultura de Teresópolis, Coleção
Mario Baldi, MB-P-A.
Os índios Carajá na fotografia de Mario Baldi 33
Doralice Avellar atira com arco e flecha, com os índios Carajá.
Ilha do Bananal, 1938. Gelatina de prata, 16x23. S.M.C. Tere-
sópolis, Coleção Mario Baldi [Baldi n.o04978].
“Uoni-Uoni mexe nervosamente os dedos, porque Behederu
está segurando errado a flecha” (Baldi 1950: 69).
“O feiticeiro ‘Kuhubara’ gosta muito de olhar pela objetiva da
‘Askania’.” llha do Bananal, 1938. Gelatina de prata, 17,5x
19,4. S.M.C. Teresópolis, Coleção Mario Baldi [Baldi n.o
04921].
Doralice Avellar leva o pajé Kuhubara a olhar através da
câmera. De início, o pajé não vê coisa alguma. “Cerra bem os
olhos e bem perto do tubo. Assim, está bem! Vês alguma coisa
agora?” (Baldi 1950: 76).
Mario
Baldi
Mario Baldi – foto reportagem – fotografia – cinema 16 m/m. Cartão
de visitas de Mario Baldi. Teresópolis, s/d. S.M.C.T., Coleção
Mario Baldi, MB-D-DP.
Mario e Emmy Baldi. Três Lagoas, Mato Grosso do Sul, 1934. Autor
não identificado, gelatina de prata, 16,2x22,7. S.M.C.T., Coleção
Mario Baldi [Baldi n.o02636]. Ilustrada na página 12
Expedições com AGFA. Texto e fotografias de Mario Baldi. In: AGFA
Novidades 7 (1935). São Paulo. S.M.C.T., Coleção Mario Baldi,
MB-P-A.
Á procura dos índios Chavantes. Texto de Georges Readers e
fotografias de Mario Baldi. In: Espelho – A revista da vida
moderna 2 (Abril de 1935). Rio de Janeiro. S.M.C.T., Coleção
Mario Baldi, MB-P-PC-C2/43.
A Dansa do Huruana. Fotografias de Mario Baldi. In: Illustração
Brasileira. Rio de Janeiro, ca. 1937. S.M.C.T., Coleção Mario
Baldi, MB-P-A.
Carajás e Tapirapés. Texto e fotografias de Mario Baldi. In: A Noite
Illustrada 390 (26 de Janeiro de 1937). Rio de Janeiro. S.M.C.T.,
Coleção Mario Baldi, MB-P-A.
AGFA Novidades – Revista bimensal para divulgação da fotografia
18 (s/d [1937]). Fotografia de Mario Baldi. São Paulo. S.M.C.T.
Coleção Mario Baldi, MB-P-A.
Wir filmen am Araguaya. Fotografias de Mario Baldi. In: Münchner
Illustrierte Presse 5 (2 de Fevereiro de 1939). Munique. S.M.C.T.,
Coleção Mario Baldi, MB-P-A.
Calendário AGFA. Fotografia de Mario Baldi. 1939. S.M.C.T.,
Coleção Mario Baldi, MB-P-A.
Autoretrato de Mario Baldi, no jornal A Noite. Rio de Janeiro,
1938–1939. Gelatina de prata, 23,4x17,1. S.M.C.T., Coleção
Mario Baldi [Baldi n.o07052]. Ilustrada na página 14.
“Caricatura do Mendez dos desenhistas da A Noite. 1940.”
Reprodução fotográfica da caricatura de Mendez. S/l, [1940].
Gelatina de prata, 22,7x15,8. S.M.C.T., Coleção Mario Baldi.
Mario Baldi. Detalhe da caricatura de Mendez. S/l, [1940].
Gelatina de prata, 17,5x23,2. S.M.C.T., Coleção Mario Baldi.
Mario Baldi em seu escritório, na rua São Clemente 206, Botafogo.
Rio de Janeiro, década de 1940. Autor não identificado [Emmy
Baldi?]. Gelatina de prata, 16,9x11,2. S.M.C.T., Coleção Mario
Baldi [Baldi n.o10.000 E:31]. Ilustrada na página 13.
Mario Baldi em seu escritório, na rua São Clemente 206, Bota-
fogo. Rio de Janeiro, década de 1940. Autor não identificado
[Emmy Baldi]. Gelatina de prata, 29,2x23,5. S.M.C.T., Coleção
Mario Baldi [Baldi n.o10.004 E:31]. Ilustrada na página 8.
Mario Baldi posando junto ao cartaz “O Oeste para os Brasileiros.”
S/l [Rio de Janeiro?], 1941. Autor não identificado. Gelatina de
prata, 23,4x16. S.M.C.T., Coleção Mario Baldi [Baldi n.o10.067].
Baldi, Mario. Uoni-Uoni conta sua história. São Paulo 1950:
Melhoramentos. Exemplar 1: Acervo de Marcos Felipe de Brum
Lopes; exemplar 2: S.M.C.T., Coleção Mario Baldi.
Baldi, Mario. Uoni-Uoni oder die letzten Indianer am großen Was-
ser. Düsseldorf 1952: Bastion-Verlag. Acervo de Marcos Felipe
de Brum Lopes.
Mario Baldi. Rio Araguaia, 1956. Gelatina de prata, 17,5x17,3.
S.M.C.T., Coleção Mario Baldi [Baldi n.o16.258]. Ilustrada na
página 15.
Bororo
Mario Baldi entre os Bororo. Meruri, 1934. M.V.V., foto n.o37829_
02786 (a partir do negativo 6x9). Ilustrada na página 6.
Padre César Albisetti com crianças Bororos. Jarudori, 1934. M.V.V.,
foto n.o37829_02869 (a partir do negativo 6x6, cortado). [“O
caminho espinhoso” 5.] Ilustrada na página 22.
Vista da aldeia Meruri. 1934. M.V.V., foto n.o37829_02791 (a
partir do negativo 6x6 e de duas ampliações editadas por Mario
Baldi 18x24). Ilustrada na página 16.
LLiissttaa
ddaass
oobbrraass
eexxiibbiiddaass
34
Abreviações
Baldi n.oNumero conferido por Mario Baldi às suas fotografias,
em ordem cronológica. Corresponde ao número do
negativo no caso do M.V.V. e ao número das fotos-
contato no caso da S.M.C.T.
M.V.V. Museum für Völkerkunde, Viena
S.M.C.T. Secretaria Municipal de Cultura, Teresópolis
Vista da aldeia Meruri. 1936. M.V.V., foto n.o37829_03036 (a
partir do negativo 6x6 cortado). [“Um posto avançado da civiliza-
ção” 2.]
Crianças na drenagem de madeira em Meruri. 1934. M.V.V., foto
n.o37829_02810 (a partir do negativo 6x6).
Bororos durante uma viagem. Jarudori, 1934. M.V.V., foto n.o
37829_02871 (a partir do negativo 6x6).
Meninos tomando banho. Meruri, 1934. M.V.V., foto n.o37829_
02845 (a partir do negativo 6x6).
Menino com peixes. Meruri, 1936. M.V.V., foto n.o37829_ 03052
(a partir do negativo 6x6).
“Bororos pescando.” Meruri, 1936. M.V.V., foto n.o37829_03046
(a partir do negativo 6x6). Ilustrada na página 22.
Caçadores com as suas flechas. Jarudori, 1934. M.V.V., foto n.o
37829_02886C (a partir do negativo 6x6).
“Uma índia centenária bororo.” Meruri, 1934. M.V.V., foto n.o37829_
02808 (a partir do negativo 6x6). Ilustrada na página 18.
“Um velho Bororo.” Meruri, 1934. M.V.V., foto n.o37829_02814 (a
partir do negativo 6x6). [“Alerta ... Cayamos!” 2.]
Mães com suas crianças. Sangradouro, 1934. M.V.V., foto n.o
37829_02837 (a partir do negativo 6x6).
Menina com um papagaio. Jarudori, 1934. M.V.V., foto n.o37829_
02872 (a partir do negativo 6x6 cortado).
Mulheres preparando farinha da mandioca. Meruri, 1934. M.V.V.,
foto n.o37829_02797 (a partir do negativo 6x6). [“Um posto
avançado da civilização” 6.]
Meninas pilando milho. Sangradouro, 1934. M.V.V., foto n.o
37829_02843 (a partir do negativo 6x6). [“Um posto avançado
da civilização” 5.]
Mulher fazendo um cesto (baquité). Meruri, 1934. M.V.V., foto n.o
37829_02796 (a partir do negativo 6x6).
Mulheres fazendo cerâmica. Sangradouro, 1934. M.V.V., foto n.o
37829_02841 (a partir do negativo 6x6). [“Um posto avançado
da civilização” 7.]
Homem cortando folhas de palmeira. Sangradouro, 1934. M.V.V.,
foto n.o37829_02835 (a partir do negativo 6x6).
Obtendo o fogo. Sangradouro, 1934. M.V.V., foto n.o37829_ 02839
(a partir do negativo 6x6). [“Um posto avançado da civilização”
8.] Ilustrada na página 19.
Meninos jogando damas. Sangradouro, 1934. M.V.V., foto n.o
37829_02881 (a partir do negativo 6x9).
Tirando sangue para curar a dôr de cabeça. Sangradouro, 1934.
M.V.V., foto n.o37829_02834 (a partir do negativo 6x6).
Dança em frente da casa dos homens. Jarudori, 1934. M.V.V., foto n.o
37829_ 02889A (a partir do negativo 6x6). Ilustrada na página 20.
A dança do Buriti. Jarudori, 1934. M.V.V., foto n.o37829_02896 (a
partir do negativo 6x6).
Dança fúnebre. Meruri, 1936. M.V.V., foto n.o37829_03059 (a
partir do negativo 6x6).
“Um joven dançador.” Jarudori, 1934. M.V.V., foto n.o37829_
02900 (a partir do negativo 6x6).
“Indio Bororo tocando uma cabaça.” Jarudori, 1934. M.V.V., foto
n.o37829_02901 (a partir do negativo 6x6).
Festa no fim da ceremônia. Jarudori, 1934. M.V.V., foto n.o37829_
02898 (a partir do negativo 6x6).
“O orientador da dança.” Meruri, 1936. M.V.V., foto n.o37829_
03064 (a partir do negativo 6x6). Ilustrada na página 35.
“Guerreiro Bororo pronto para a dança.” Meruri, 1936. M.V.V., foto
n.o37829_03067 (a partir do negativo 6x6).
Carajá
Mario Baldi em sua tenda, nas margens do Rio Araguaia. Illha do
Bananal, 1936. Autor não identificado. Gelatina de prata,
11,8x17,1. S.M.C.T., Coleção Mario Baldi [Baldi n.o03148].
Ilustrada na página 4.
O príncipe D. Pedro de Orleans e Bragança, neto de D. Pedro II,
com duas índias Carajá. Ilha do Bananal, 1936. Gelatina de
prata, 12x18. S.M.C.T., Coleção Mario Baldi [Baldi n.o03192].
Ilustrada na página 25.
35
“O orientador da dança.” Meruri, 1936. Museum für Völker-
kunde, Viena, foto n.o37829_03064 (a partir do negativo 6x6).
“Aqui vemos o orientador da dança, aquele que estimula os
figurantes e lhes dá o compasso necessário” (Baldi 1936b).
O Huruanã. Uma índia deposita comida para os espíritos. Santa
Isabel, Ilha do Bananal, 1936. Gelatina de prata, 10,9x15,9.
S.M.C.T., Coleção Mario Baldi [Baldi n.o03212].
“Dança Huruanã. O chefe e o feiticeiro (com adorno de plumas).”
Santa Isabel, Ilha do Bananal, 1936. M.V.V., foto n.o37829_
03215 (a partir do negativo 6x6).
“‘Tarzan.’ Menino Carajá.” Santa Isabela, Ilha do Bananal, 1936.
M.V.V., foto n.o37829_03231 (a partir do negativo 6x6).
Criança numa rede confeccionada por mulheres Tapirapé, depois
de raptadas pelos Carajá. Mato Verde, Ilha do Bananal, 1936.
M.V.V., foto n.o37829_03247 (a partir do negativo 6x6).
“Pintar remos.” Mato Verde, Ilha do Bananal, 1936. M.V.V., foto n.o
37829_03248 (a partir do negativo 6x9). Ilustrada na página 26.
Modo de transporte carajá de víveres e peixes. Mato Verde, Ilha do
Bananal, 1936. M.V.V., foto n.o37829_03258 (a partir do
negativo 6x6).
“Araguaia Exped. 1936.” Mãe e filho Carajá. Ilha do Bananal,
1936. Gelatina de prata, 22,3x27,9. S.M.C.T., Coleção Mario
Baldi [neg. n.o03262]. Ilustrada na página 29.
“Principe D. Pedro e mulheres Carajá solicitando ao tabaco.” Ilha
do Bananal, 1936. Gelatina de prata, 17,4x11,5. S.M.C.T.,
Coleção Mario Baldi [Baldi n.o03366].
Doralice Avellar. Fotógrafa. Ilha do Bananal, 1938. Gelatina de
prata, 17x12. S.M.C.T., Coleção Mario Baldi [Baldi n.o04769].
Aldeia carajá. Ilha do Bananal, 1938. M.V.V., foto n.o37829_
04881 (a partir do negativo 6x6).
“Chefe Indio (Carajá).” Ilha do Bananal, 1938. M.V.V., foto n.o
37829_04892 (a partir do negativo 6x6).
“A pequena Kohabiru.” Ilha do Bananal, 1938. M.V.V., foto n.o
37829_04901 (a partir do negativo 6x6).
Doralice Avellar filmando uma índia Carajá. Ilha do Bananal,
1938. Gelatina de prata, 23,6x17,4. S.M.C.T., Coleção Mario
Baldi [Baldi n.o04914]. Ilustrada na página 27.
“Mãe Caraja fumando com criança.” Ilha do Bananal, 1938.
Gelatina de prata, 23,9x29,9. S.M.C.T., Coleção Mario Baldi
[Baldi n.o04915]. Ilustrada na página 24.
“O feiticeiro ‘Kuhubara’ gosta muito de olhar pela objetiva da
‘Askania’.” llha do Bananal, 1938. Gelatina de prata, 17,5x19,4.
S.M.C.T., Coleção Mario Baldi [Baldi n.o04920]. Ilustrada na
página 27.
“Que coisa estranha!” Um menino carajá [Uoni-Uoni] observando
uma câmera filmadora. Ilha do Bananal, 1938. Gelatina de
prata, 12,4x12,9. S.M.C.T., Coleção Mario Baldi [Baldi n.o
04923]. Ilustrada na capa e na pagina 30.
“Trabalhando com a ‘Elmar 9cm’.” Doralice Avellar fotografando
uma índia Carajá. Ilha do Bananal, 1938. Gelatina de prata,
17,4x23,6. S.M.C.T., Coleção Mario Baldi [Baldi n.o04939].
“Uoni-Uoni presenteia Behederu [Doralice Avellar] com uma flecha
de caça”. Ilha do Bananal, 1938. Gelatina de prata, 12x17,5.
S.M.C.T., Coleção Mario Baldi [Baldi n.o04944]. Ilustrada na
capa e na pagina 31.
Doralice Avellar filma a chegada de uma canoa carajá nas mar-
gens do Rio Araguaia. Ilha do Bananal, 1938. Gelatina de prata,
16,3x11,2. S.M.C.T., Coleção Mario Baldi [Baldi n.o04946].
“Doralice voltando d’um passeio a Canoa.” Pintada como índia,
nas margens do Rio Araguaia. Ilha do Bananal, 1938. Gelatina
de prata, 23x17. S.M.C.T., Coleção Mario Baldi [Baldi n.o04952].
Ilustrada na página 28.
Doralice Avellar observa o interior de uma cabana carajá. Ilha do
Bananal, 1938. Gelatina de prata, 17,5x17,3. S.M.C.T., Coleção
Mario Baldi [Baldi n.o04966].
Doralice Avellar filma o Huruanã. Ilha do Bananal, 1938. M.V.V.,
foto n.o37829_04972 (a partir do negativo 6x6).
Doralice Avellar atira com arco e flecha, com os índios Carajá. Ilha
do Bananal, 1938. Gelatina de prata, 16x23. S.M.C.T., Coleção
Mario Baldi [Baldi n.o04978]. Ilustrada na página 33.
Um grupo de índios Carajá conversando com Doralice Avellar. Ilha
do Bananal, 1938. Gelatina de prata, 23,2x17,5. S.M.C.T.,
Coleção Mario Baldi [Baldi n.o05008].
“Doralice deixa-se pintar com os desenhos da tribu e do clan.” Ilha
do Bananal, 1938. Gelatina de prata, 17,2x21,9. S.M.C.T.,
Coleção Mario Baldi [Baldi n.o05029].
“Araguaia Exped. 1938”. Um índio Carajá pinta o corpo de uma
índia. Ilha do Bananal, 1938. Gelatina de prata, 22,3x27,2.
S.M.C.T., Coleção Mario Baldi [Baldi n.o05035]. Ilustrada na
página 29.
Pintura corporal dos Carajá. Ilha do Bananal, 1938. M.V.V., foto n.o
37829_05040 (a partir do negativo 6x6).
A casa dos bichos. Local onde os Carajá guardam as máscaras
rituais. Ilha do Bananal, 1938. Gelatina de prata, 11,7x10,5.
S.M.C.T., Coleção Mario Baldi [Baldi n.o05056].
Uma índia Carajá pinta o rosto de Mario Baldi. Ilha do Bananal,
1938. Gelatina de prata, 10,7x14,8. S.M.C.T., Coleção Mario
Baldi [Baldi n.o05027].
36 Lista das obras exibidas