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Rev Bras Ter Intensiva. 2009; 21(1):38-44
Análise de percepções e ações de cuidados bucais
realizados por equipes de enfermagem em
unidades de tratamento intensivo
Perceptions and actions of oral care performed by nursing teams
in intensive care units
INTRODUÇÃO
As unidades de terapia intensiva (UTIs) foram criadas a partir da necessida-
de de atendimento do cliente cujo estado crítico exigia assistência e observação
contínua de médicos e enfermeiros e da necessidade de aperfeiçoamento e con-
centração de recursos materiais e humanos para o atendimento a pacientes graves,
mas tidos ainda como recuperáveis, e da necessidade de observação constante,
centralizando os pacientes em um núcleo especializado.(1)
Equipes interdisciplinares (profissionais de áreas afins entre si) e multidiscipli-
nares (em conjunto com profissionais de áreas especializadas fazem parte do dia a
dia destas unidades.
O paciente internado na UTI necessita de cuidados de excelência, dirigidos
não apenas para os problemas fisiopatológicos, mas também para as questões psi-
cossociais, ambientais e familiares que se tornam intimamente interligadas à doen-
ça física. A essência da multidisciplinaridade, profissionais de diferentes áreas atu-
ando sobre um mesmo paciente, em cuidados intensivos não está nos ambientes
Rodolfo José Gomes de Araújo1,
Layla Cristine Gomes de Oliveira2,
Leila Maués Oliveira Hanna3,
Adriano Maia Corrêa4, Liliane
Helena Vilar Carvalho5, Nair
Carolina Ferreira Alvares6
1. Mestre, Professor de Periodontia da
Universidade Federal do Pará - UFPA –
Belém (PA), Brasil.
2. Pós-graduanda em Biologia dos
Agentes Infecciosos e Parasitários da
Universidade Federal do Pará e Professora
de Periodontia da Universidade Federal
do Pará - UFPA - Belém (PA), Brasil.
3. Pós-graduanda em Odontologia da
Universidade Federal do Pará - UFPA
-Belém (PA), Brasil.
4. Doutor, Professor de Periodontia da
Universidade Federal do Pará - UFPA –
Belém (PA), Brasil.
5. Acadêmica do Curso de Graduação em
Odontologia do Centro Universitário do
Pará - CESUPA – Belém (PA), Brasil.
6. Acadêmica do Curso de Graduação em
Odontologia da Universidade Federal do
Pará - UFPA - Belém (PA), Brasil.
RESUMO
Objetivos: Buscando estabelecer um
perfil da percepção e realização dos cuida-
dos em saúde bucal prestados a pacientes
internados em unidades de tratamento
intensivo por equipes de enfermagem,
realizou-se um estudo com entrevistas
orientadas por um questionário.
Métodos: A população de estudo
foi constituída de profissionais de en-
fermagem divididos em três categorias
de formação: enfermeiros, técnicos de
enfermagem e auxiliares de enfermagem
que atuam em instituições hospitalares
públicas e particulares prestando serviços
em unidades de tratamento intensivo na
cidade de Belém - PA.
Resultados: A pesquisa desenvolvida
neste trabalho retornou com resultados, os
quais sugerem que os cuidados de higiene
bucal realizados nos pacientes hospitaliza-
dos em unidades de terapia intensiva são
escassos e inadequados, sendo necessárias
modificações nos cuidados dispensados atu-
almente, especialmente no ambiente noso-
cômial da equipe de atenção ao paciente.
Conclusão: A presença de cirurgião
dentista, a difusão dos conhecimentos de
odontologia preventiva e o uso de recursos
específicos de higiene bucal são medidas
sugeridas como tentativas de solucionar as
dificuldades apresentadas na manutenção
da saúde bucal e no tratamento das doen-
ças bucais, que afetam a saúde geral dos pa-
cientes hospitalizados. A atuação interdis-
ciplinar no atendimento a estes indivíduos
é defendida visando à obtenção de uma
melhor qualidade de vida prevenindo ou
minimizando patologias orais presentes.
Descritores: Equipe de assistência
ao paciente; Higiene bucal/enfermagem;
Unidades de terapia intensiva
Recebido da Universidade Federal do
Pará - UFPA – Belém (PA), Brasil.
Trabalho apresentado na 25ª Reunião
Anual da Sociedade Brasileira de
Pesquisa Odontológica, 2008, Águas de
Lindóia. [ Gomes de Araújo RJ, Gomes
de Oliveira LC Hanna LMO, Corrêa
AM. Análise de ações e percepções
sobre cuidados bucais realizados por
equipes de enfermagem em unidades de
tratamento intensivo. In: 25ª Reunião
Anual da Sociedade Brasileira de
Pesquisa Odontológica, 2008, Águas de
Lindóia. Brazilian Oral Research. São
Paulo, 2008. v. 22. p. 27-27].
Submetido em 26 de Junho de 2008
Aceito em 21 de Fevereiro de 2009
Autor para correspondência:
Rodolfo José Gomes de Araújo
Tv. Rui Barbosa 1533 / 302 - Nazaré
CEP: 66035-220 – Belém (PA), Brasil.
Fone: (91) 3225-3130 / (91) 8142-0444
E-mail: rodolfogomesaraujo@uol.com.br
ARTIGO ORIGINAL
Análise de percepções e ações de cuidados bucais 39
Rev Bras Ter Intensiva. 2009; 21(1):38-44
ou nos equipamentos especiais, mas no processo de tomada
de decisões, baseado na sólida compreensão das condições
fisiológicas, psicológicas do pacientes e novas terapias.
É essencial que pacientes de UTIs tenham cuidados de
higiene oral suficientes durante sua internação com o obje-
tivo de prevenir a instalação de patologias orais e possíveis
complicações de doenças bucais já existentes.(2)
Em pacientes hospitalizados, patógenos comumente
responsáveis pela pneumonia nosocomial são encontrados
colonizando placa dental e mucosa bucal destes pacientes.
Porém, boas técnicas de higiene bucal são capazes de pre-
venir o avanço da infecção da cavidade bucal para o trato
respiratório.(3)
Em aproximadamente 24 horas sem limpeza da cavida-
de oral é possível detectar clinicamente uma camada de pla-
ca dental. E a ausência ou a técnica de higiene bucal adotada
será intimamente ligada ao número e à espécie de microor-
ganismo encontrado na cavidade oral.(4)
Observou-se a rota de colonização traqueal no desenvol-
vimento da pneumonia associada à ventilação e constatou
que 80 de 100 pacientes tiveram colonização durante o pri-
meiro dia de ventilação endotraqueal. E a cavidade oral é a
primeira fonte de organismos patogênicos que causam esta
patologia.(5)
Vários estudos têm documentado que indivíduos hospi-
talizados tendem a apresentar higiene bucal deficiente, em
comparação com os pacientes ambulatoriais e os pacien-
tes controles da sociedade. Essa ausência de atenção com
a higiene bucal resulta no aumento da quantidade e com-
plexidade da placa dental, que pode favorecer a interação
bacteriana entre bactérias indígenas da placa e patógenos
respiratórios conhecidos, como Pseudomonas aeruginosa e
bacilos entéricos.(6)
Foram realizados estudos que avalia a prevalência de pa-
tógenos respiratórios colonizando a boca em um grupo de
pacientes internados em UTI, com uma atenção especial à
placa dental e à mucosa. Os autores observaram que 65% dos
pacientes examinados, a placa e a mucosa bucal apresentavam
patógenos respiratórios, entre eles Staphylococcus aureus, Pseu-
domonas aeruginosa e 10 gêneros de bacilos gram-negativos.
Esses pacientes apresentavam higiene oral deficiente, o que
pode, segundo o autor, influenciar na colonização da orofa-
ringe por microorganismos respiratórios e também há a hipó-
tese de que a flora normal da boca é alterada devido à algumas
enzimas que presentes na superfície da mucosa, deixando-a
mais favorável à aderência desses patógenos.(7)
Foram analisados os cuidados com a orofaringe 16 pa-
cientes internados em UTIs que faziam uso de ventilação
mecânica. Dados clínicos e demográficos eram registrados
a cada dia de internação através de coletas de microorganis-
mos com swabs, secreção traqueal e exames clínicos orais até
os aparelhos de ventilação fossem retirados. Sete pacientes
apresentaram xerostomia; dez lesões de lábios foram identi-
ficadas em nove pacientes; oito lesões de língua foram diag-
nosticadas em nove pacientes; e oito lesões de mucosa foram
registradas em nove pacientes. Quarenta e quatro por cento
dos pacientes demonstraram radiograficamente evidencias
consistentes com pneumonia. Microorganismos gram ne-
gativos foram evidenciados na orofaringe e na secreção tra-
queal simultaneamente. Embora a higiene da cavidade oral
seja considerada um procedimento com alto grau de dificul-
dade para ser realizado em pacientes entubados, sabe-se que
o mal estado da orofaringe pode ser relacionado com a aqui-
sição de organismos nosocomiais e a esta relação deveria ser
dada maior atenção. Portanto a análise sistemática e clinica
da orofaringe pode prevenir o surgimento e agravamento de
muitas infecções.(8)
O tratamento da orofaringe e a manutenção de uma hi-
giene favorável são procedimentos difíceis de serem realizados
em pacientes sob cuidados intensivos, principalmente naque-
les que fazem uso de ventilação mecânica devido ao difícil
acesso na cavidade oral.(9) O paciente intubado possui maiores
riscos de serem vitimas de colonizações de microorganismos,
pois a cavidade oral está em contato com outros instrumentais
como: fitas, afastadores bucais, tubos entre outros.(8) A função
do tubo oral endotraqueal é propiciar ventilação e proteção
para passagem de ar. A posição do tubo e de outros materiais
de suporte pode obstruir a visualização da cavidade oral e li-
mitar o acesso influenciando negativamente no processo de
higiene.(10) Desta forma, profissionais de enfermagem se sen-
tem relutantes a manipular o aparato necessário a respiração
do pacientes para realizar procedimentos de higiene. Por sua
vez, as fitas de fixação presentes muito próximas da cavidade
oral rapidamente se tornam fortemente contaminadas por
patógenos quando moléculas de saliva são manipuladas na
tentativa de realização de técnicas de higiene.(11)
Apesar da existência de importantes recursos como saliva
artificial, sugadores, antissépticos, escovas dentais elétricas e
raspadores de língua que podem ser utilizados para tratamen-
to oral em UTIs, estes raramente são usados. Dentre as razões
discutidas pela não utilização de tais ferramentas, a falta de
tempo disponível ou conhecimento do profissional responsá-
vel, e a falta de assistência de profissionais especializados em
saúde bucal dentro da UTI, são as mais relatadas.(12) Intera-
ções com técnicos de higiene dental poderiam aprimorar o
conhecimento e habilidade da equipe de enfermagem em
relação a cuidados orais.(1)
Higiene oral em UTIs é considerada um procedimento
básico, indispensável de enfermagem cujo objetivo é manter
a cavidade do pacientes saudável. Tais procedimentos são
40 Araújo RJG, Oliveira LCG, Hanna LMO,
Corrêa AM, Carvalho LHV, Alvares NCF
Rev Bras Ter Intensiva. 2009; 21(1):38-44
necessários para: obter e manter limpeza; prevenir infecções
/ estomatites; manter a mucosa oral úmida; promover con-
forto ao paciente.(13,14)
Em estudos com enfermeiras, diretores de hospitais e
enfermeiras domiciliares, constataram vários conceitos in-
corretos sobre práticas de cuidados dentais em pacientes
hospitalizados. A falta de conhecimento sobre patologias
odontológicas foi considerada ampla, abrangendo inúme-
ros aspectos como o exame da cavidade oral. As dificuldades
de locomoção e outras limitações físicas dos pacientes são
encaradas como as maiores dificuldades ou impossibilidades
para o cuidado odontológico. Foi estimado que 48% dos
profissionais que participaram da pesquisa não tinham tido
acesso a esses conhecimentos e 30% da amostra demons-
trou que estes não eram assuntos prioritários em suas fun-
ções.(15) Foi verificado que 83% do corpo de enfermagem
não recebeu treinamentos básicos acerca de saúde oral. Os
pesquisadores atentam para a necessidade de melhoria da
qualidade dos cuidados orais de pacientes geriátricos e con-
cluem que treinamentos apropriados e a presença do den-
tista no ambiente hospitalar contribuem para o aperfeiçoa-
mento dos conhecimentos e para melhor desempenho da
enfermagem em relação à saúde bucal dos pacientes.(16)
O presente trabalho teve como objetivo avaliar as per-
cepções e ações da equipe de enfermagem, quanto aos cui-
dados de saúde bucal prestados aos pacientes internados em
unidades de tratamento intensivo durante o processo de hi-
gienização bucal diário ao qual têm sido submetidos.
MÉTODOS
Visando à obtenção de um perfil da percepção dos cui-
dados bucais por equipes de enfermagem, fez-se uma pes-
quisa com abordagem estatística de análise de dados, envol-
vendo como população alvo profissionais de enfermagem
que atuavam em UTIs de hospitais públicos e particulares
localizados na cidade de Belém - PA, durante o período de
junho a novembro de 2007. É lícito esclarecer que foram
consideradas instituições destinadas a pacientes adultos com
o mínimo de oito leitos disponíveis para utilização.
Optou-se por não dividirem grupos distintos já que a
comparação entre hospitais públicos e particulares não ca-
racterizava objetivo do trabalho e a divisão entre grupos
comprometeria a exatidão e a coerência dos resultados.
Após submissão e registro da aprovação do comitê de
ética em pesquisa em seres humanos do centro de ciências
da saúde da Universidade Federal do Pará, a pesquisa foi,
então, desenvolvida por meio de entrevista realizada por
único entrevistador, cirurgião-dentista, utilizando questio-
nário estruturado.
Foram entrevistados profissionais de enfermagem, de
ambos os sexos, sem limites quanto idade, que atuavam em
23 unidades de tratamento intensivo pertencentes a 12 ins-
tituições públicas e privadas de saúde em Belém, capital do
estado do Pará.
O questionário foi formulado com 18 questões de múl-
tipla escolha. Este número foi determinado procurando-
se fazer menção aos assuntos mais significativos uma vez
que os profissionais estariam em seu horário de trabalho e
não disponibilizariam muito tempo para responder ao do-
cumento em questão. O tempo médio das entrevistas foi
cronometrado previamente e registrou-se que aproximada-
mente quatro minutos e trinta segundos seriam necessários
para a participação de cada membro escolhido.
A primeira parte do questionário, representada pelas
questões de 01 a 07, teve como objetivo avaliar o perfil do
corpo de enfermagem entrevistado quanto à categoria pro-
fissional, faixa etária, gênero, rendimentos, tipo de institui-
ção em que trabalha e formação do profissional.
As questões seguintes, de 8 a 11, fizeram referência à
participação em equipe multidisciplinar, ao contato ou não
com um cirurgião dentista e ao nível de conhecimento da
equipe de enfermagem no que diz respeito à odontologia e
sua relação com a saúde geral do indivíduo.
Foram avaliados, a partir da questão 12 a 17, os conhe-
cimentos e os cuidados que são realizados rotineiramente no
ambiente das UTIs ou orientados aos pacientes durante a per-
manência no hospital. Finalmente, avaliamos com a questão
18 o nível de interesse pelo corpo de enfermagem em receber
orientações sobre saúde bucal e aplicá-las clinicamente.
Para a aplicação do questionário, o entrevistador visi-
tou as instituições hospitalares portando uma carta elabo-
rada pelo orientador do projeto de pesquisa, propondo-se
a demonstrar os objetivos do estudo. Após divulgação do
parecer positivo da diretoria do hospital registrando a au-
torização para a realização das entrevistas, os questionários
eram entregues individualmente aos membros da equipe de
enfermagem. Aguardava-se que o profissional respondesse
às questões e as eventuais dúvidas eram solucionadas pelo
entrevistador, assegurando respostas conscientes e seguras
dos entrevistados. Importante mencionar que as visitas aos
hospitais ocorreram em todos os turnos (manhã, tarde e
noite), seguindo escalas de trabalho estabelecidas por cada
instituição hospitalar. Retornos às instituições eram neces-
sários quando se notava que não estavam presentes todos os
profissionais em atividade naquele período, objetivando-se
abordar as equipes de enfermagem em sua totalidade. Pro-
fissionais que estavam em períodos de férias ou em uso de
licenças profissionais não constaram em nossos relatórios
como parte do público-alvo do estudo. Os entrevistados
Análise de percepções e ações de cuidados bucais 41
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foram orientados e informados, por meio do termo de con-
sentimento livre e esclarecido, quanto à não-obrigatorieda-
de de sua participação, assim como quanto à garantia de
sigilo absoluto em relação a sua identidade e nome do local
de trabalho em que atuavam.
RESULTADOS
Foram realizadas 402 entrevistas com membros da equi-
pe de enfermagem, sendo 73 enfermeiros, 284 técnicos e 45
auxiliares de enfermagem. As respostas foram tabuladas e
submetidas à análise estatística conforme descrevemos abai-
xo. Verificamos que, em todas as categorias, a maioria dos
profissionais atua em equipes interdisciplinares conforme as-
sinala a tabela 1.
Com relação à presença de um cirurgião dentista efetivo
na equipe interdisciplinar que quase a totalidade dos entre-
vistados respondeu que as equipes das quais faziam parte não
dispunham de cirurgião-dentista. E, ainda, 86% dos entre-
vistados consideram necessária a presença deste profissional
na equipe, que poderia atuar, assim, nos casos onde houvesse
envolvimento odontológico.
No que diz respeito ao conhecimento da relação saúde-
bucal/saúde-geral, 99% dos entrevistados concordaram com
a afirmativa de que uma infecção na boca pode fazer com
que a saúde do resto do corpo seja prejudicada. Além dis-
so, 99,2% dos entrevistados acreditam que a higienização da
boca é importante durante a estada no hospital.
Podemos observar que a realização do exame da cavidade
bucal e/ou orientação para procurar um profissional da odon-
tologia para realizá-lo não é executada de acordo com as res-
postas fornecidas por 37% dos profissionais. Para um grupo,
que representa um percentual de aproximadamente 63% dos
entrevistados, o exame oral e/ou orientação é realizado.
Os profissionais entrevistados também responderam à
questões em relação ao fato de realizarem e orientarem seus
pacientes segundo os seguintes procedimentos: escovação
dental normal (sem auxílio de pessoas ou recursos especiais);
uso de cuba para escovação no leito. Verificou-se que 58% dos
entrevistados afirmaram realizar e/ou orientar seus pacientes
em relação a escovação dental normal. Quando solicitado aos
entrevistados, em questão aberta, que nomeassem a marca de
colutórios mais utilizada, obtivemos o índice de 100,00% de
resposta para cloreto de cetilpiridínio.
Recursos sob a forma de gel, spray, creme dental, enxa-
guatório e até chicletes, que atuam sobre os tecidos bucais
suavizando os efeitos da boca seca, são pouco divulgados na
classe de enfermagem: aproximadamente 90% dos entrevis-
tados relatam nunca terem ouvido falar desses produtos e,
quanto ao uso em hospitais, nenhum deles narrou alguma
experiência isolada de contato com esses recursos.
Avaliando o conhecimento dos profissionais de enferma-
gem a respeito de diversos temas odontológicos, aproximada-
mente 30% dos entrevistados responderam que têm conhe-
cimento sobre técnicas de escovação dentária. Aproximada-
mente 76% afirmam reconhecer os aspectos normais da cavi-
dade bucal e quando o assunto é as doenças mais comuns da
cavidade bucal, como cárie dental, gengivite, periodontite e
candidíase, 29% desconhecem. Dentre os entrevistados, 30%
julgam saber sobre higienização das próteses e interrupção do
uso destas e 29% afirmam ter conhecimentos sobre higiene
das mucosas. Quanto à limpeza da língua, aproximadamente
40% dizem conhecer bem o assunto e afirmam sua capacida-
de em orientar os pacientes, caso sejam questionados.
Foi questionada a realização de treinamentos específi-
cos sobre higiene bucal durante a formação profissional dos
membros da equipe de enfermagem. Observamos que apro-
ximadamente 42% dos profissionais receberam algum certo
conhecimento a respeito do assunto.
Em todas as categorias a classificação quanto à eficácia do
treinamento realizado é apontada como insuficiente por 74%
da amostra. O interesse por conhecimentos sobre saúde bucal
foi de 98%.
DISCUSSÃO
No que diz respeito ao cuidado direto do paciente, a maio-
ria dos estabelecimentos conta, em seu quadro de profissio-
nais, com médicos em diversas especialidades, enfermeiros,
técnicos e auxiliares de enfermagem. Outros profissionais são
encontrados em menor freqüência, tais como fisioterapeutas,
Tabela 1 - Você atua em equipe multi/interdisciplinar?
Sim Não Total
Frequência % Frequência % Frequência %
Enfermeira 72 17,9 1 0,2 73 18,2
Técnico de enfermagem 277 68,9 7 1,7 284 70,6
Auxiliar de enfermagem 45 11,2 0 0,0 45 11,2
Total 394 98,0 8 2,0 402 100,0
42 Araújo RJG, Oliveira LCG, Hanna LMO,
Corrêa AM, Carvalho LHV, Alvares NCF
Rev Bras Ter Intensiva. 2009; 21(1):38-44
nutricionistas e psicólogos.
A partir do questionamento da presença de um cirurgião-
dentista efetivo, que seria o responsável direto por casos rela-
tivos ao envolvimento odontológico consideramos, primei-
ramente, que os hospitais deveriam rever seus conceitos de
equipe interdisciplinar, para que o ingresso de um cirurgião-
dentista no ambiente hospitalar possa ser justificado.(1,2)
Podemos notar, por meio da análise estatística deste tra-
balho, que, mesmo não tendo suas atenções voltadas para a
prevenção e cuidados de higiene bucal, quando ressalta que
os cirurgiões dentistas, de certa forma, com o conhecimento
das enfermeiras.(17) A presença de um cirurgião-dentista nas
equipes hospitalares é necessária para 86% dos entrevistados
que reconhecem que o dentista poderia atuar nos casos onde
houvesse envolvimento odontológico. A literatura sobre a
odontologia na prática interdisciplinar, especificamente em
UTIs, é recente no Brasil, havendo poucas menções de den-
tistas atuando nesse setor antes da década de 90, em contra-
dição com muitos outros países. Entretanto, em virtude do
crescimento do número de pesquisas científicas no ramo da
odontologia relacionando alterações bucais com tantas outras
alterações orgânicas, ocorre um concomitante aumento de
interesse pela chamada “odontologia hospitalar”.
Durante as visitas que foram realizadas nas UTIs, obser-
vou-se que alguns pacientes podem não necessitar do uso de
ventilação mecânica e estarem aptos a realizar seus próprios
cuidados de higiene básica, requerendo ajuda por parte da
enfermagem É importante avaliar, portanto, o grau de inde-
pendência dos pacientes, pois o autocuidado deve ser esti-
mulado e a independência do paciente encorajada, não com
o intuito de se reduzir as obrigações da enfermagem, mas de
estimular a recuperação do paciente. Ressalta-se a importân-
cia da verificação do uso de próteses, as quais no momen-
to da internação e identificação não estão sendo utilizadas.
Nesses casos, recomenda-se que sejam mantidas em copos
etiquetados. Os dados obtidos nesta pesquisa demonstraram
que aproximadamente 100% dos pacientes não utilizam suas
próteses, ainda que não necessitem de ventilação mecânica.(18)
Na maioria dos casos verificou-se que as próteses eram entre-
gues a família ou acompanhantes no momento da internação
nas emergências e UTIs devido aos procedimentos de emer-
gência, contrariando pesquisadores que chamaram a atenção
para a importância do uso destes utensílios sempre que possí-
vel no ambiente hospitalar para prevenção de uma variedade
de alterações que podem ser provocadas, como modificações
na mucosa, diminuição da dimensão vertical de oclusão e re-
absorção de osso alveolar.
O paciente deverá ter uma higiene bucal adequada mes-
mo na ausência de dentes. Os autores sugerem massagens
para fortalecer as gengivas e a lavagem das próteses para re-
moção dos detritos alimentares que podem ferir o paciente e
incomodá-lo. Acrescenta-se, ainda, que seja de responsabili-
dade da enfermeira a observação do estado bucal do paciente,
constatando se ele usa próteses, se pode alimentar-se sozinho
e se tem capacidade mastigatória.(14) Os dados obtidos nesta
pesquisa auxiliarão a avaliação sobre a importância do profis-
sional de odontologia no ambiente das UTIs. A formação de
suas perguntas foi direcionada para o conhecimento das opi-
niões dos profissionais de enfermagem sobre sua capacidade
em realizar procedimentos de higiene oral em seus pacientes
da importância de um odontólogo que os orientasse ou rea-
lizasse tais práticas.
As orientações sobre os cuidados bucais deverão ser ade-
quadas às habilidades motoras e capacidade cognitiva do
paciente. Desse modo, os propósitos preventivos devem ser
compreendidos pelo paciente e por seu grupo de apoio (fami-
liares e/ou enfermagem). Muitas vezes, causas físicas ou men-
tais impedem uma higiene bucal satisfatória, sendo necessá-
rio o auxílio de alguém devidamente treinado. Um guia que
pode também ser sugerido à equipe de enfermagem sobre a
relação entre a necessidade de procedimentos adequados de
higiene bucal e diferentes níveis de dependência dos pacientes
encontra-se no quadro 1.
A prevenção e a promoção de saúde bucal em UTI é des-
tacada por meio de protocolos elaborados de acordo com as
necessidades individuais dos pacientes internados em UTIs,
recomendando a remoção mecânica da placa nos indivíduos
dentados utilizando, para esse fim, escovas dentais correta-
mente indicadas. Porém nenhuma das equipes observadas
obedecia algum tipo de protocolo individual referente à hi-
Quadro 1 – Procedimentos adequados de higiene oral e nível de dependência
Paciente
independente
Paciente que pode deambular Deslocar-se até uma pia e realizar a própria higiene
Estimular e orientar quanto às técnicas corretas
Paciente
Parcialmente
dependente
Pacientes que não podem se deslocar Oferecer uma cuba para higiene no leito
Pacientes com dificuldades motoras Recursos auxiliares como escovas com cabo adaptado, escovas elé-
tricas...
Paciente dependente Pacientes com impossibilidades motoras Higiene realizada por um cuidador ou pela enfermagem com esco-
vas comuns ou escovas elétricas
Paciente intubado Escovação e higiene com gaze e anti-séptico do tipo clorexidina 0,12%
Análise de percepções e ações de cuidados bucais 43
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gienização bucal. O mesmo procedimento era realizado para
todos os pacientes. Raramente, escovas dentais eram usadas
pelos próprios indivíduos, os quais se encontravam totalmen-
te independentes de cuidados especiais, sem orientação ou
incentivo de membros da equipe que os assistia.(19-21)
Com base em nossa pesquisa foi possível perceber que a
equipe de enfermagem responsável pelos cuidados de higiene
dos pacientes hospitalizados recebeu poucas informações a res-
peito dos métodos de controle de placa responsáveis pela ori-
gem das principais patologias bucais e que, ainda, desconhece
vários recursos de higiene bucal que poderiam ser utilizados
no ambiente hospitalar com significativas melhorias na ma-
nutenção e recuperação da saúde bucal desses indivíduos.(14-16)
Quanto à freqüência com que são realizados os cuidados espe-
cíficos de higiene bucal, são variadas as opiniões encontradas
por diferentes autores pesquisados.(1,3,14) A escovação utilizando
escova e pasta dental deve ser preconizada como cuidado básico
essencial, para que possa ser estendida a todos os pacientes que
precisam receber esse tipo de atenção. Observamos que proce-
dimentos de higiene bucal eram realizados apenas duas vezes ao
dia, nas UTIs escolhidas para nosso estudo, coincidindo com o
horário do banho pouco antes de iniciar o intervalo de tempo
destinado às visitas da família e acompanhantes.
Alguns autores afirmam que a melhor prevenção é a remo-
ção mecânica da placa pela escovação, pelo uso do fio dental e
por outros meios de higiene. São descritas na literatura diver-
sas técnicas de escovação dentária e, se compararmos o efeito
da limpeza dentária, nenhum método mostra-se superior a
outro, como descreve.(4,5,7) Estes autores afirmam que a dis-
posição e a capacidade do paciente, bem como os resultados
obtidos, independentemente da técnica de escovação utiliza-
da, são fatores mais importantes do que a seleção do método
de escovação dentária. Em 100% das UTIs visitadas a única
técnica de higienização bucal utilizada por equipes de enfer-
magem era com o uso de bastões envoltos por gaze embebida
em cloreto de cetilpiridínio. Nossa pesquisa reconheceu que,
de fato a higienização com escova para pacientes total ou par-
cialmente dependentes exige maiores habilidades e consome
maior espaço de tempo. Esta parece ser uma das razões para
a aplicação dos cuidados que vêm acontecendo nos hospitais
visitados. Recomenda-se que os cuidados efetuados em UTIs
sejam revistos, em benefício dos pacientes.
CONCLUSÃO
Com base nos resultados obtidos, chegou-se a algumas
conclusões:
Para manter a saúde oral em níveis satisfatórios, são ne-
cessárias modificações nos cuidados dispensados, atualmen-
te, no ambiente hospitalar pelas equipes de enfermagem;
As equipes de enfermagem estudadas pouco conhecem
a respeito dos métodos de controle de placa responsável pe-
las principais patologias bucais e dos diversos produtos que
podem ser utilizados na higiene bucal;
Os recursos disponíveis nos hospitais visitados são escassos
e impróprios, impossibilitando a manutenção da saúde oral e
dificultando o controle de infecções bucais já instaladas;
De acordo com as respostas recebidas, os profissionais
entrevistados não receberam formação adequada para reali-
zar procedimentos de cuidados bucais. Dessa forma, sugeri-
mos que os currículos de enfermagem sejam revistos e que
os conhecimentos em odontologia preventiva sejam mais
bem difundidos nessa classe de profissionais;
A presença de um cirurgião-dentista é sugerida como
uma tentativa de solucionar as dificuldades apresentadas na
manutenção da saúde oral e no tratamento de doenças bu-
cais que afetam a saúde geral dos indivíduos hospitalizados
em UTIs;
A interdisciplinaridade, no atendimento em UTIs, deve-
ria contemplar a presença de cirurgiões-dentistas integrados
aos princípios das equipes envolvidas. Os conhecimentos
difundidos no ambiente hospitalar seriam proveitosos, in-
clusive após a alta hospitalar, visando à obtenção da quali-
dade de vida para estes pacientes.
ABSTRACT
Objectives: A study was carried out, by means of a ques-
tionnaire for guided interviews seeking to establish a profile of
perceptions and oral care given by ICU nursing team to patients
in intensive care units.
Methods: e target population consisted of nursing prac-
titioners divided in three education categories: nurses, nursing
technicians and auxiliary nurses working at public and private
hospital institutions providing for intensive care unit patients
in Belem-PA. Dentistry experience has developed in this field
reporting scientific findings and practical applications on pre-
vention and reestablishment of the oral health in question.
Results: is survey disclosed results suggesting that oral
hygiene care given to intensive care units patients is insufficient
and inadequate requiring changes be made in the care now pro-
vided in the nosocomial environment by the nursing team.
Conclusion: Presence of a dentist, knowledge of preventive
dentistry, dissemination and use of oral hygiene specific resources
are means suggested in an attempt to resolve difficulties found in
oral health maintenance and treatment of oral diseases that affect
the general health of hospitalized individuals. Interdisciplinary
action for these individuals is advocated to achieve a better quality
of life by preventing or minimizing oral pathologies.
Keywords: Patient care team; Oral hygiene/nursing; Inten-
sive care units
44 Araújo RJG, Oliveira LCG, Hanna LMO,
Corrêa AM, Carvalho LHV, Alvares NCF
Rev Bras Ter Intensiva. 2009; 21(1):38-44
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